Remuneração e renda mínima: dignidade do trabalhador e insuficiência econômica

Autores: Ricardo Carvalho Fraga

Desembargador Federal do Trabalho do TRT4, Representante da Amatra IV junto ao Fórum Mundial de Juízes

Luiz Alberto de Vargas

Desembargador Federal do Trabalho do TRT4, Assessor Especial da Presidência da AMB

 publicado em 29.10.2010

1 A globalização e a passagem do século
 
A globalização econômica acelerada que caracteriza o final do século passado e o início do século XXI tornou a insegurança dos seres humanos e o desemprego as principais preocupações políticas da maioria dos países. Tal diagnóstico é da Organização Internacional do Trabalho, que, reconhecendo a ineficácia dos mercados para solucionar o problema, exorta os governos a assumir suas responsabilidades, especialmente em relação à proteção social e ao diálogo social.

De fato, conforme dados da própria OIT, o aumento da pobreza e da desigualdade no mundo assumem contornos alarmantes, ameaçando a própria coesão da sociedade.(1) Metade dos 2,8 bilhões de trabalhadores no mundo vive com uma remuneração de menos de US$ 2 por dia (menos de R$ 6 por dia), e 18% (550 milhões), com menos de US$ 1 por dia.(2) São escassas as chances de melhoria para esse enorme contingente de trabalhadores presos a atividades mal remuneradas, de baixa produtividade e que exigem pouca instrução e quase nenhuma formação profissional.

Em um mundo cada vez mais competitivo, em que o emprego tornou-se bem escasso,(3) a ideia do "pleno emprego", surgida como princípio-guia da política econômica nos chamados Estados de Bem-Estar Social, parece um objetivo abandonado(4) e cada vez mais inalcançável. Coloca-se, urgentemente, na pauta de discussão de todos os governos, o sério problema de prover a subsistência material de grande parte da população mundial, desempregada ou subempregada.
Assim, trata-se de pôr em questão que responsabilidades incumbem hoje aos governos, tanto na promoção do emprego de qualidade como na adoção de políticas compensatórias que, ao menos, diminuam o grave problema da pobreza que, em muitos países, ameaça a própria governabilidade democrática.(5)

2 A globalização e a escassez do emprego

A concorrência mundial sem precedentes produziu a destruição dos empregos melhor remunerados (assim entendidos aqueles formalizados, por prazo indefinido e a tempo completo), assistindo-se, simultaneamente, à proliferação do trabalho não formalizado, precário, parcial ou desprovido de proteção social.

Conforme Márcio Pochmann, no último quartel do século XX, a economia mundial foi marcada por três características principais: a rápida expansão do comércio mundial, a ampliação da liquidez internacional e a nova onda tecnológica. Tais fatores, juntamente com a promoção de políticas liberalizantes (alteração do papel do Estado na economia, desregulação dos mercados de capital, financeiros e do trabalho), contribuíram para o acirramento da competição intercapitalista, aprofundando as desigualdades socioeconômicas mundiais.(6) A repercussão no mundo do trabalho foi profunda: crescente desemprego e aumento da desigualdade de salários e renda, seja no plano entre nações ricas e pobres, seja no interior de cada país. Os países de economia não desenvolvida transformaram-se em "uma grande feira internacional de concorrência pelo oferecimento de mão de obra a custos decrescentes".(7)

Como resultado, temos a escassez de emprego, ao menos aquele que possa assegurar ao trabalhador e à sua família um mínimo de dignidade e segurança.

Na liberação sem limites da economia global, são os trabalhadores que mais sofrem, já que a mercadoria que oferecem (sua força de trabalho) ingressa no mercado de trabalho em posição estruturalmente desfavorável, agravada por uma concorrência intraclasse de âmbito global. Conforme OFFE,(8) "o trabalhador acaba sempre em uma posição desfavorável quando firma um contrato de trabalho em situação de livre concorrência", basicamente, por quatro motivos: 1) A força de trabalho entra no mercado como uma mercadoria especial, cuja abundância foge às possibilidades de regulação dos próprios trabalhadores, pois esta depende dos "processos demográficos não estratégicos e das regras institucionais da atividade reprodutiva humana". Assim, não há como limitar o número de pessoas que, estando em idade ativa, irão oferecer sua força de trabalho; 2) a força de trabalho é completamente dependente dos meios de subsistência oferecidos no mercado, o que a leva a "abrir mão de suas opções estratégicas para submeter-se a todas as condições impostas pela demanda no momento e a aceitar o salário corrente oferecido; 3) os compradores da força de trabalho tendem a se tornar mais independentes da oferta de trabalho, já que as mudanças tecnológicas podem permitir manter a produção em patamares estáveis com menor utilização da mão de obra, podendo-se dizer que, a título de resumo, as necessidades do lado da oferta são muito mais rígidas que as da demanda; 4) o capital tem maior liquidez em relação à força de trabalho, pois pode-se renovar constantemente pela compra de novos equipamentos ou pela expansão da área de atuação, enquanto a possibilidade de renovação da força de trabalho por meio de educação e treinamento alteram muito pouco a qualidade de sua oferta em relação às possibilidades de renovação do capital.

Exatamente, talvez, pelo reconhecimento da estrutural vulnerabilidade do trabalhador já na celebração do contrato de trabalho, estruturou-se o Direito do Trabalho, que, limitando a autonomia individual, conforme Délio Maranhão, buscou "conciliar as exigências de respeito humano à pessoa do trabalhador com as da rentabilidade econômica das empresas".(9) Esses direitos passam a ser duplamente solapados: de um lado, pela "fuga do Direito do Trabalho", na qual se assiste ao retorno de tipos contratuais próprios do Direito Civil;(10) por outro lado, pelo crescimento da chamada "economia informal".(11) Da mesma forma, o ideal do "pleno emprego" foi abandonado, não se podendo mais acreditar que seja possível erradicar a pobreza meramente pelo crescimento econômico e pela geração de empregos.

Coloca-se em pauta o dilema de assegurar a subsistência de boa parte da população, desempregada ou subempregada.

3 O papel do Estado no Constitucionalismo Social e a insuficiência econômica

Parece não haver dúvidas quanto à imprescindibilidade da atuação do Estado, seja na regulação do contrato de trabalho, seja intervindo no mercado laboral com vistas à promoção do emprego, uma vez que o livre mercado tem-se mostrado insuficiente para satisfazer as necessidades concretas do homem como ser social, que se mantém e se reproduz à margem das relações meramente econômicas.(12)

Por outro lado, é preciso não esquecer o compromisso histórico dos Estados de Bem-Estar Social, surgidos após a segunda guerra mundial, em relação à promoção da igualdade e da crescente prosperidade material.

Tal compromisso está expresso em diversos documentos de direito internacional e em grande parte das Constituições contemporâneas;(13) nele se inclui o dever do Estado em propiciar o sustento por meio do trabalho digno e, na impossibilidade deste por qualquer causa involuntária (doença, velhice, desemprego), garantir-lhe uma remuneração mínima que propicie a sua subsistência e a de sua família.

Particularmente relevante é a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), que prevê diversos direitos trabalhistas, depois repetidos em várias Constituições, inclusive a brasileira:

“Art. XXIII:

1. Todo homem tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis à proteção contra o desemprego.

2. Todo homem que trabalha tem direito a uma remuneração por igual trabalho.

3. Todo homem que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.

4. Todo homem tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses.

Art. XXIV: Todo homem tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.

Art. XXV:

1. Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.”

Da mesma forma, também importante são as normas contidas no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU (1966), do qual o Brasil é signatário, tendo ratificado tal tratado em 24.01.92 (Decreto de Promulgação nº 591, de 06.07.92):

“Art. 6º Os Estados-Partes no presente Pacto reconhecem o direito ao trabalho, que compreende o direito que têm todas as pessoas de assegurar a possibilidade de ganhar a sua vida por meio de um trabalho livremente escolhido ou aceite, e tomarão medidas apropriadas para salvaguardar esse direito.

1. As medidas que cada um dos Estados-Partes no presente Pacto tomará com vista a assegurar o pleno exercício deste direito devem incluir programas de orientação técnica e profissional, elaboração de políticas e de técnicas capazes de garantir um desenvolvimento econômico, social e cultural constante e um pleno emprego produtivo em condições que garantam o gozo das liberdades políticas e econômicas fundamentais de cada indivíduo.

Art. 7º Os Estados-Partes no presente Pacto reconhecem o direito de todas as pessoas de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, que assegurem em especial:

a. uma remuneração que proporcione, no mínimo, a todos os trabalhadores:

I. um salário equitativo e uma remuneração igual para um trabalho de valor igual, sem nenhuma distinção, devendo, em particular, às mulheres ser garantidas condições de trabalho não inferiores àquelas que beneficiam os homens, com remuneração igual para trabalho igual;

II. uma existência decente para eles próprios e para as suas famílias, em conformidade com as disposições do presente Pacto;

b. condições de trabalho seguras e higiênicas;

c. iguais oportunidades para todos de promoção no seu trabalho à categoria superior apropriada, sujeito a nenhuma outra consideração além da antiguidade de serviço e da aptidão individual;

d. repouso, lazer e limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas pagas, bem como remuneração nos dias de feriados públicos.

(...)

Art. 9º Os Estados Partes no presente Pacto reconhecem o direito de todas as pessoas à segurança social, incluindo os seguros sociais.

(...)

Art. 11º

1. Os Estados-Partes no presente Pacto reconhecem o direito de todas as pessoas a um nível de vida suficiente para si e para as suas famílias, incluindo alimentação, vestuário e alojamento suficientes, bem como a um melhoramento constante das suas condições de existência. Os Estados-Partes tomarão medidas apropriadas destinadas a assegurar a realização desse direito reconhecendo para esse efeito a importância essencial de uma cooperação internacional livremente consentida.”

É de citar-se, também, a Carta Democrática Interamericana: Políticas de Desarrollo y Lucha contra la Pobreza, que, em relação ao trabalho, proclama que

“(i) Toda persona tiene derecho al trabajo, a la libre elección de su trabajo, a condiciones equitativas y satisfactorias de trabajo y a la protección contra el desempleo.

(ii) Toda persona tiene derecho, sin discriminación alguna, a igual salario

por trabajo igual.

(iii) Toda persona que trabaja tiene derecho a una remuneración equitativa y satisfactoria, que le asegure, así como a su familia, una existencia conforme a la dignidad humana y que será completada, en caso necesario, por cualesquiera otros medios de protección
social.”

O compromisso social expresso em tais documentos internacionais foi acolhido na Constituição Federal do Brasil, que "consagra diretrizes e princípios que justificam a utilização do salário como instrumento da justiça retributiva".(14) Assim, cita-se a "dignidade da pessoa humana" e "os valores sociais do trabalho" como fundamentos do Estado (art. 1º); a obrigação do Estado de "construir uma sociedade livre, justa e solidária", de "erradicar a pobreza" e de "reduzir as desigualdades sociais" (art. 3º).

Da mesma forma, "a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social" (art. 170).

Também relevante é o art. 7º, que elenca vários direitos trabalhistas, para todos os trabalhadores, da cidade e do campo. A melhor exegese de tal norma constitucional leva ao entendimento de que tais direitos sociais não se limitam aos empregados, assim entendidos os que possuem um vínculo trabalhista de emprego, mas a todos os trabalhadores.(15) Entre os direitos ali expressos estão o direito à proteção contra despedida arbitrária ou sem justa causa (inciso I); seguro-desemprego (inciso II); salário mínimo (inciso III); piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho (inciso IV); irredutibilidade salarial, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo (inciso V); garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável (inciso VII); salário-família, pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda (inciso XII); redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII); aposentadoria (XXIV); assistência gratuita aos filhos e aos dependentes desde o nascimento até os seis anos de idade em creches e pré-escolas (XXV); seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa (XXVIII); proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (XXX); proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência física (XXXI); proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos (XXXII); igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso (XXXIV).

Importante lembrar que tais direitos, por serem fundamentais,(16) são dotados de aplicabilidade imediata, na forma do art. 5º, parágrafo 1º, da mesma Carta Magna.

Por fim, merece citação ainda o disposto nos artigos 170, VIII ("busca do pleno emprego"), 193 ("a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais"), 201 (que estabelece a obrigação da Previdência Social, entre outros, de "cobertura dos eventos de doenças, invalidez, morte e idade avançada", "proteção à maternidade, especialmente à gestante", "proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário", "salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda" e "pensão por morte de segurado, homem ou mulher, a cônjuge ou companheiro e dependentes") e 203 (que prevê assistência social a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social).

De especial relevância o art. 201, parágrafo 2º, quando estabelece que "nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo".

Não parece haver dúvida, portanto, quanto às obrigações do Estado não apenas com a sustentação material dos cidadãos, mas com a garantia de uma vida digna e segura, na qual o direito ao trabalho assume o protagonismo.

Ocorre que o Constitucionalismo Social estruturou-se ao par com a diretriz econômica do pleno emprego, na perspectiva de uma prosperidade duradoura e de uma oferta crescente de postos de trabalho. Assim, o Direito do Trabalho se constituiu em uma rede de proteção destinada aos trabalhadores empregados,(17) no pressuposto de que o desemprego ou o subemprego não fossem mais do que uma anomalia do sistema, a ser superada ao longo do tempo pela ação corretiva do Estado. Assim, se o direito ao trabalho não é uma promessa factível de ser cumprida pelo Estado de Bem-Estar Social, o Direito do Trabalho mostra-se insuficiente, já que sua efetividade se aplica a uma porção cada vez mais reduzida de trabalhadores, ou seja, aqueles que logram obter um posto de trabalho.

Na medida em que o desemprego deixa de ser uma anomalia e passa a ser um componente estrutural do sistema econômico, apresenta-se o problema de garantir a grande parte dos cidadãos – que não obtém um emprego ou mantém um subemprego – uma retribuição mínima, o que somente é factível pela ação do Estado, sobre o qual cada vez mais repousam as esperanças de manutenção/refundação do pacto social que fundou a modernidade.(18)

4 O crescimento econômico e a abordagem econômica do problema da pobreza e da desigualdade

Estabelecida a imprescindibilidade da ação estatal para regulação da economia, em consonância com os princípios norteadores que alicerçam o Estado Social moderno, há de se precisar mais concretamente que tipo de atuação é adequada para erradicação da pobreza e redução da desigualdade.

Do Estado se espera, em primeiro lugar, que promova o crescimento econômico,(19) de forma que gere empregos em número ao menos suficiente para atender à demanda representada pelos jovens em idade de ingresso no mercado de trabalho.

Infelizmente, a segmentação do mercado laboral e o aproveitamento quase exclusivo pelo capital dos ganhos de produtividade propiciados pela rápida absorção tecnológica têm propiciado um "crescimento econômico sem emprego", a frustrar as expectativas dos que preconizavam o rápido desenvolvimento econômico como a melhor solução – senão a única – para redução do desemprego e para a promoção do bem-estar geral.

Como bem adverte Ignacy Sachs, ainda que o crescimento acelerado seja uma condição necessária para a criação de postos de trabalho dignos, o crescimento econômico, por si só, não é suficiente para a redução da pobreza e da desigualdade, pois não se pode prescindir de políticas públicas para aumentar a densidade dos empregos a serem criados.(20)

Conforme o Diretor-Geral da OIT, Juan Somavia, a geração de empregos de qualidade deve ser encarada como parte integrante das estratégias nacionais de desenvolvimento, pois o crescimento econômico não pode se tornar um fim em si mesmo.(21)

Da mesma forma que a geração de empregos satisfatórios não depende exclusivamente do crescimento econômico, também não basta o desenvolvimento econômico para que se obtenha uma redução das desigualdades. Políticas públicas meramente indutoras do progresso econômico mais beneficiam, em regra, os setores sociais melhor aquinhoados, sendo equivocado pensar que a produção em abundância propicie a elevação do consumo dos setores menos privilegiados e, assim, diminua a desigualdade social.

A respeito desse tema, interessante o pensamento de Luiz Enrique Alonso:

“En el desarrollo del capitalismo contemporáneo, abundancia y escasez – satisfacción y necesidad – no son dos polos contrapuestos que se anulan el uno al otro, de tal modo que el incremento del primero suprime al segundo definitivamente; ni el crecimiento tampoco es un proceso que gracias a sus efectos pueda instaurar en el ámbito del consumo los principios del liberalismo democrático, dejando la desigualdad relegada a un lugar externo de su propio avance. Por el contrario el crecimiento mismo se realiza en función de la desigualdad, ésta es
a la vez su base de actuación y su resultado: la dinámica de la producción diversificada, la renovación formal permanente y la obsolescencia planificada de los objetos no responde a ningún modelo de igualación por el consumo, sino de diferenciación y clasificación social que, con cierta autonomía limitada, reproduce en el ámbito de la distribución, el orden de la diferencia que arranca de la esfera de produccíón.”(22)

Portanto, acreditar no crescimento econômico por si só como a solução do desemprego é um equívoco político, pois desconsidera todos os aspectos do problema, em especial a responsabilidade do Estado na manutenção dos compromissos sociais assumidos no pós-guerra.

Assinala-se ao Estado o dever de combater a pobreza por meio de ações políticas concretas, que podem adotar variadas formas, como a indução à criação de novos e melhores empregos, a extensão da proteção social aos mais débeis ou, mesmo, a intervenção no mercado laboral, como a fixação do salário mínimo ou do valor mínimo das prestações sociais. Em qualquer caso, trata-se de ações firmes, que impliquem real transferência de renda aos setores menos favorecidos e que levem adiante o dever constitucional de promoção da igualdade.(23)

De plano há de se rejeitar propostas que, ao contrário de aproximar soluções para o problema do desemprego, agravam mais a precariedade do emprego oferecido. A competição "para baixo"(24) dos salários entre os países em desenvolvimento tem levado à flexibilização laboral e à proliferação de trabalhos precários como equivocada estratégia de atração de investimentos transnacionais. A fracassada política espanhola(25) de precarização dos empregos nas décadas de 80/90 demonstrou que o rebaixamento da proteção social e a precarização do trabalho não leva à criação de empregos, apesar de seu alto custo social.(26)

Ao contrário, espera-se do Estado que promova a criação de empregos de qualidade, formalizados, por prazo indefinido e a tempo completo. Márcio Pochman(27) aponta cinco elementos-chave para a determinação da quantidade e da qualidade do emprego da força de trabalho no capitalismo contemporâneo:

1. Promover políticas macroeconômicas, como base na determinação do volume global da ocupação de cada nação, sendo o comportamento – maior ou menor do que a taxa de crescimento – da demanda agregada (investimento e consumo) revelador da situação geral do emprego da força de trabalho. A defesa do pleno emprego, a partir da utilização efetiva das forças produtivas capitalistas, seria o resultado histórico de um compromisso político estabelecido pelos principais atores sociais, com capacidade de instrumentalizar as políticas macroeconômicas voltadas para a universalização do bem-estar social.

2. Elevar o paradigma técnico-produtivo que estabelece as condições operacionais de uso do trabalho e do capital (intensivo/extensivo) nas atividades mercantis. Quanto mais avançado tal paradigma, maior tende a ser o uso intensivo do capital e mais produtivo o emprego da força de trabalho, com efeito multiplicador imediato para toda a economia, inclusive atividades não mercantis.

3. Promover políticas de bem-estar social utilizando os grandes fundos de financiamento público e privado, organizados em institutos governamentais ou não governamentais, para estabelecer o acesso às garantias mínimas de proteção social. As políticas de bem-estar social passam a definir o grau possível de incorporação da classe trabalhadora aos frutos do desenvolvimento econômico. Ao mesmo tempo, as políticas de bem-estar social podem se mostrar funcionais à sustentação do crescimento econômico, gerando novas formas de ocupação e de ganhos de renda nos segmentos não mercantis da economia.

4. Estabelecer um sistema de relações de trabalho que, impondo padrões regulatórios básicos do mercado de trabalho, contribua para o estabelecimento de maior ou menor grau de concorrência no interior da classe trabalhadora. Em cada país, o direito do trabalho define o marco geral de uso (jornada e condições de trabalho) e a remuneração da mão de obra (rendimentos e custo total do trabalho) por meio de regras formais (países europeus) ou informais (países de língua inglesa). Quanto mais democrático e centralizado o padrão de contratação coletiva de trabalho e mais reguladas as formas de contratos irregulares, maiores as possibilidades de homogeneização do padrão de uso e remuneração da força de trabalho (custo da mão de obra e as relações de trabalho).

5. Promover políticas de emprego que orientem tanto a redução dos desajustes nas ocupações e nos rendimentos que ocorrem no plano nacional, regional e setorial quanto os problemas de qualificação profissional, alocação de mão de obra, condições e relações de trabalho, tempo de trabalho, entre outros.

Assim, um conjunto de ações coordenadas e articuladas por tais políticas pode levar ao uso pleno da força de trabalho, com "elevada funcionalidade na determinação da quantidade e da qualidade do emprego".(28)

5 O trabalho decente como parâmetro mínimo fixado pela OIT

Em sintonia com a meta estabelecida pela Organização das Nações Unidas de reduzir pela metade a pobreza mundial até 2015, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem definida a promoção do trabalho decente como sua principal tarefa a ser desenvolvida nos próximos anos. Assim, a OIT, na 87a Conferência Internacional do Trabalho (Genebra, junho de 1999), deliberou que, atualmente, sua finalidade primordial “é promover oportunidades para que os homens e as mulheres possam conseguir um trabalho decente e produtivo, em condições de equidade, segurança e dignidade humana”.(29)

Por trabalho decente se entende aquele cuja remuneração é adequada, exercido em condições de equidade e segurança e capaz de dar uma vida digna à pessoa
. Tal exigência contempla o acesso ao emprego em condições de liberdade, o reconhecimento dos direitos básicos do trabalho que garantam que não haja discriminação ou assédio moral; que o trabalhador receba um salário que permita satisfazer suas necessidades e responsabilidades econômicas básicas, sociais e familiares; que se logre um nível de proteção social adequado para o trabalhador e para os membros de sua família; que se garanta o direito de expressão e de participação, direta ou indireta, por meio de suas organizações representativas eleitas.(30)

Numa tentativa de maior precisão, Sachs apresenta o trabalho decente como sendo o emprego (“ocupação”) assalariado e por conta própria, com proteção social básica (i.e., pelo menos a proteção de acidentes e doenças ocupacionais, aposentadoria e auxílio-maternidade), com respeito aos princípios e aos direitos fundamentais no trabalho (i.e., em liberdade e igualdade entre homens e mulheres e raças, sem trabalho infantil, sem trabalho forçado, e com direitos de associação e de negociação), e com diálogo social – i.e., com representantes de governos e de organizações de empregadores e de trabalhadores (e, quando os governos e seus parceiros sociais julgarem adequado, de outras organizações não governamentais da sociedade civil).(31)

O que se busca, enfim, é a fixação de parâmetros para a avaliação do trabalho oferecido, abaixo dos quais não se pode admitir que este tenha condições mínimas de segurança e dignidade, compatíveis com o atual estágio civilizatório das relações sociais.

Desse modo, conectam-se os direitos sociais do trabalho aos direitos humanos, buscando-se que a relativa efetividade internacional que se logrou alcançar em relação aos chamados “direitos humanos de primeira geração” seja também estendida aos de “segunda geração”, quais sejam, aqueles que configuram os direitos econômicos e sociais.(32)

6 A remuneração como parte essencial da definição de trabalho decente

Ainda que a remuneração não seja o único conteúdo da definição de trabalho decente, não há dúvidas de que seja sua característica principal, uma vez que dele depende a própria sobrevivência do trabalhador.

A garantia de remuneração tem diversos aspectos, variando substancialmente conforme a inserção do cidadão no mercado laboral. Para os empregados, a proteção deriva diretamente do princípio de proteção característico do Direito do Trabalho,(33) englobando a irredutibilidade salarial; a proibição de descontos não autorizados; a estipulação de salário mínimo; a limitação da jornada de trabalho; a majoração em caso de prestação extraordinária, noturna ou em turnos de revezamento; entre outros; sendo que, no caso brasileiro, muitas dessas normas protetivas estão inseridas na própria Constituição Federal, como já se teve oportunidade de demonstrar.

De substancial importância é a atuação estatal no sentido de assegurar que o valor real dos salários não seja corroído pelo processo inflacionário. O aumento do desemprego repercute severamente sobre o nível salarial dos empregados,(34) sendo irreal a proposta de deixar à livre negociação coletiva a fixação de normas de reajustamento salarial periódico. No Brasil, com a revogação das normas legais de recomposição salarial, tornou-se a Justiça do Trabalho, por meio de poder normativo, peça essencial na garantia da remuneração real de boa parte das categorias profissionais.

Por outro lado, no Brasil, a proteção do trabalhador não empregado, subempregado ou inserido no mercado informal ainda tem muito a se desenvolver. Ainda que haja cobertura médica independentemente da inserção do mercado formal, a proteção previdenciária é insuficiente, sendo ainda incipiente a institucionalização do chamado "direito à renda mínima", benefício desvinculado do mercado laboral.

7 Direito do trabalho seguro e digno

Como leciona Alan Supiot, há de se distinguir a segurança no trabalho e a segurança por meio do trabalho.(35)

A ideia de segurança no trabalho deve ser ampla, abarcando disposições que assegurem uma proteção dos trabalhadores contra lesões físicas (como regras relativas à higiene, à segurança e à medicina do trabalho, aos acidentes de trabalho, às enfermidades profissionais, assim como normas que representem a responsabilização civil objetiva do empresário pelos riscos do negócio); que estendam a proteção a todos os aspectos da existência biológica do trabalhador (em especial, a regulação dos tempos de trabalho, que preservem seus períodos de descanso, seus ritmos biológicos, a prevenção da fadiga, etc.); que contemple juridicamente todos os eventos imprevistos de caráter físico que impeçam ou dificultem o cumprimento do contrato de trabalho (idade, sexo, maternidade, enfermidade, etc.).

Já a segurança por meio do trabalho não se trata de conseguir que o trabalhador saia ileso da relação de trabalho, mas precisamente que, além disso, ele encontre os meios para perpetuar sua força de trabalho, quer dizer, os meios para viver e fazer viver os seus (segurança econômica). Trata-se de garantir a segurança da remuneração do trabalhador, que se expressa essencialmente no direito a um salário mínimo.(36)

Historicamente, conforme ensina Supiot, por muito tempo a ideia de um salário mínimo, também chamado mínimo vital, foi acoplada ao pensamento de Ricardo, pelo qual "os salários não podem exceder por muito tempo o preço necessário para permitir aos trabalhadores subsistir bem ou mal e perpetuar sua espécie sem crescimento nem diminuição".(37)

O conceito de salário mínimo evoluiu do estritamente necessário para reprodução da força de trabalho para o "salário digno" ou "salário suficiente", ou seja, aquele que resulte das exigências sociais que resultam do estado geral de riqueza da sociedade a que pertence o trabalhador. Pode-se citar como exemplo de enunciação do conceito de salário digno aquele contido no art. 7º, IV, da Constituição Federal brasileira, qual seja,

"salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim."

Por fim, ainda com base no pensamento de Supiot, mais recentemente, a evolução do conceito de retribuição mínima leva a se determinar seu valor não apenas pelo nível de vida mínimo que se calcula de acordo com o custo de vida em determinado momento, mas também de acordo com a evolução geral da remuneração do trabalho.(38)

8 Proteção social para todos

Não basta, porém, pensar na criação de empregos de qualidade como suficiente para a erradicação da pobreza e o aumento da segurança social. Cada vez mais, na economia globalizada, os empregos, ainda que por tempo indefinido, não são duradouros, já que sujeitos à volatilidade do mercado instável e imprevisível, varrido sistematicamente pelo "turbilhão de desvalorização e racionalização, aparentemente imparável".(39)

Nesses termos, não se pode mais falar em estabilidade no emprego, sendo corrente falar-se hoje na "individualização dos riscos"(40) para caracterizar uma profunda insegurança no emprego,(41) sempre ameaçada pelas demissões em massa, pelos deslocamentos empresariais ou pela falência em massa das empresas até há pouco tempo sólidas.

O sistema de seguridade social foi criado sob a ideia simples de que o trabalhador deve ser protegido contra os principais riscos que o ameaçam na relação de trabalho, quais sejam, o desemprego, a enfermidade e a velhice. A proteção previdenciária implica a socialização de tais riscos e assegura ao trabalhador, por meio de diversos mecanismos jurídicos (interrupção do contrato de trabalho, salário-doença, auxílios previdenciários, seguro-desemprego e aposentadoria), a manutenção da percepção de seus ganhos, assegurada ou pelo empregador, ou pela Previdência, pública ou privada.

Entretanto, a proteção previdenciária é distinta em relação ao grau de inserção do trabalhador no mercado de trabalho formal.

Como aponta o Relatório da Comissão de Especialistas da Comissão Europeia,(42) a Seguridade Social na Europa tem sofrido processos distintos. De um lado, as prestações familiares e a cobertura de riscos por enfermidade tendem a adquirir um caráter universal, desconectando-se do emprego. Por outro lado, a evolução do sistema de aposentadoria tende a um fortalecimento do caráter contributivo e, consequentemente, da vinculação com o emprego. A primeira evolução permite remediar lacunas de proteção social dos assalariados atípicos. Em contrapartida, a segunda evolução reduz a oportunidade desses trabalhadores se beneficiarem de uma aposentadoria completa.

Tais tendências se reproduzem também na América Latina e, em particular, no Brasil, como demonstra a mais recente reforma previdenciária (2003), em que se enfatizou o caráter contributivo do regime de aposentadoria e tornou ainda mais duras, em termos de tempo de serviço, as exigências para que o trabalhador alcance a aposentadoria.

É preciso relembrar a importância crucial da Previdência Social brasileira para a erradicação da pobreza, especialmente para as regiões mais pobres.(43) Não obstante, recorrentemente se fala, no país, de nova "Reforma da Previdência", sempre ao gosto do liberalismo econômico, tornando-a superavitária e menos pública, ou seja, no rumo inverso do que seria desejável e que foi claramente traçado pelo legislador constituinte.

Por outro lado, ainda longe estamos de assegurar proteção previdenciária suficiente para boa parte dos trabalhadores, quais sejam, aqueles que integram a chamada "economia informal". Esse tipo de trabalho, normalmente precário e insuficiente para garantir a subsistência digna do trabalhador, não assegura a este nenhum tipo de cobertura previdenciária, deixando todos os riscos por conta do próprio trabalhador. Esse tipo de situação pode ser dramática, como no caso de doença profissional ou acidente do trabalho, constituindo-se em um dos mais sérios problemas sociais a serem urgentemente enfrentados pela sociedade brasileira.

No Brasil, segundo dados do PND, mais de 55 milhões de pessoas enfrentam problemas de exclusão social, o que representa mais da metade da população economicamente ativa (PEA). As piores condições de trabalho recaem sobre a população de raça negra e sobre as mulheres, que são as que menos possibilidades têm para se inserir no mercado de trabalho. Os trabalhadores desses setores encontram-se nos empregos pior remunerados, com menor taxa de proteção social, o que os direciona para o mercado informal.(44)

Segundo Ignacy Sachs, o Brasil sofre de um problema duplo:

"há um déficit de empregos novos capazes de absorver os contingentes adicionais que entram no mercado de trabalho; por outro lado uma parcela significativa de ocupações existentes não atende aos critérios básicos de “trabalho decente” da OIT, em termos de remuneração, condições e relações de trabalho satisfatórias. Em particular, isso diz respeito aos trabalhadores informais, empenhados em estratégias de sobrevivência que não devem ser confundidas com estratégias de desenvolvimento. A transformação gradual das ocupações precárias em oportunidades de trabalho decente e a formalização – mesmo que parcial e gradual – dos trabalhadores e microempreendedores informais são tão importantes quanto a criação de empregos novos."(45)

Está posta a discussão para que essa transformação das ocupações precárias não signifique um rebaixamento dos patamares de direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores formalizados. Todo o incentivo fiscal, especialmente para pequenas e médias empresas, para a promoção/formalização do emprego pode ser uma boa medida, desde que não implique qualquer retrocesso em relação aos direitos trabalhistas já assegurados aos trabalhadores formais. Em relação aos encargos sociais, há de se ter em conta que, ao contrário do que se propaga nos grandes meios de comunicação de massa,(46) "o peso dos encargos sociais no custo de trabalho não é elevado, sobretudo quando comparado com vários países", e que "as propostas de alteração de parte de todo o conjunto de encargos sociais teriam efeito diminuto sobre o já reduzido custo da mão de obra no Brasil".(47)

9 O direito do cidadão a uma renda mínima

Na economia capitalista, a única possibilidade do cidadão comum ter acesso ao mercado de bens e serviços é por meio de sua prévia inserção no mercado de trabalho.(48) Aos desempregados ou aos que sequer lograram o primeiro emprego, resta uma dupla exclusão: da esfera produtiva e da esfera de consumo. José Iglesias Fernandes aponta, ainda, uma terceira exclusão: como a passagem pelo mercado laboral é requisito indispensável para a obtenção das prestações previdenciárias mais importantes (auxílio-doença, aposentadoria ou salário-desemprego), quem não cumpre um período mínimo de contribuição previdenciária fica desassistido justamente nos períodos de maior necessidade.

Justifica-se, assim, a criação de mecanismos redistributivos pelos quais todo cidadão, independentemente de sua situação dentro do sistema produtivo, tenha direito a uma renda mínima que sirva para cobrir suas necessidades básicas e as de sua família
.(49) Tal renda não se confunde com o salário mínimo, já que este deve contemplar todos os aspectos de uma vida digna e segura e, inclusive, incorporar uma "tendência ao progresso", por meio da previsão de reajustes que representem uma elevação gradual do padrão de vida dos trabalhadores.(50)

Essa a base conceitual de todos os programas de renda mínima, como o Bolsa-Família, implementado pelo governo brasileiro.

Há certa controvérsia quanto à incondicionalidade de tal auxílio. Há partidários de que a renda mínima seja alcançada para todos, sem pré-condições; e há os que pretendem o estabelecimento de "pré-condições mínimas" para a concessão do auxílio.(51) Os primeiros sustentam que a capacidade produtiva de uma sociedade é resultado de todo o saber científico e técnico acumulado por gerações, sendo justo que os frutos do patrimônio comum sirvam ao conjunto dos indivíduos, incondicionalmente. Já os segundos apontam as dificuldades práticas de fixar o valor do benefício: se este fosse muito baixo, haveria o risco de uma dualização da sociedade (entre os empregados e os que recebem o auxílio insuficiente) e o desestímulo ao trabalho, além do caráter injusto de uma renda de base que seja paga também para os ricos.

Em função de tais argumentos e, principalmente, pelos altos custos financeiros de implementação dos programas de renda mínima, tem-se adotado o pagamento de auxílios somente nos casos de determinados níveis de insuficiência econômica.

O que parece claro é que não faz mais sentido limitar a concessão do benefício aos que se inseriram previamente no mercado laboral, nem mesmo vincular seu pagamento à comprovação de procura de emprego pelo beneficiário. A escassez do emprego, além da proliferação do trabalho precário e do trabalho informal, tendem a tornar tais exigências um "beco sem saída", no qual o beneficiário torna-se prisioneiro da condição quase impossível de, por conta própria, superar as limitações próprias que justamente ensejaram sua exclusão do mercado laboral formal.

Por outro lado, de todo desejável que tais programas de renda mínima sejam ligados a atividades que incentivem o beneficiário na busca de trabalho e renda de forma que, em um futuro próximo, torne-se desnecessária a continuidade do pagamento do auxílio. Assim, programas que associem a renda mínima com a formação ou o aperfeiçoamento profissional são bons exemplos de propostas de transferência de renda que, ainda que suficientes para garantir uma existência mais digna ao beneficiário, não o induzem a uma situação de dependência da assistência recebida.

10 Duas das mais pesadas dívidas sociais brasileiras: o trabalho infantil e o trabalho escravo

Ainda que o último relatório da Organização Internacional do Trabalho, divulgado em maio de 2006, tenha destacado o Brasil pelas ações de combate ao trabalho infantil,(52) muito existe a ser feito até a erradicação do trabalho infantil em nosso país.

Há de se superar, antes de tudo, os valores culturais e ideológico que, na sociedade, ainda a fazem tolerar ou subestimar o trabalho infantil,(53) tornando-o visível em todos os seus malefícios à infância, para que a própria sociedade passe a combatê-lo. Por outro lado, a existência de programas sociais, como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti)(54) e o Bolsa-Família,(55) representam formas bem-sucedidas de transferência de renda para as famílias mais carentes, que merecem ser aperfeiçoadas e ampliadas como forma reconhecidamente eficiente de combate à exclusão social.

Por fim, a mesma intensa campanha realizada por órgãos governamentais e entidades da sociedade civil feita em relação ao trabalho infantil deve ser feita quanto ao trabalho escravo. Os quase vinte mil trabalhadores resgatados ao longo dos últimos doze anos pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego demonstram inequivocamente que o Brasil ainda convive com a odiosa prática do trabalho escravo, ocorrida sobretudo nas áreas de expansão da fronteira agrícola, no chamado "arco do desmatamento amazônico".(56)

Conforme a OIT, Convenção 29, trabalho escravo ou obrigatório designa "todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de qualquer penalidade e para o qual ele não se ofereceu de espontânea vontade".

No Brasil, o trabalho escravo caracteriza-se pela vinculação dos trabalhadores a dívidas fraudulentas (referentes à alimentação, transporte e equipamentos de trabalho, contraídas desde que são aliciados – em valores muito superiores aos salários inicialmente acordados), em que são impedidos de sair devido ao isolamento geográfico que as grandes propriedades existentes em plena floresta amazônica impõem (a dezenas ou centenas de quilômetros de distância das vias de acesso ou das cidades mais próximas) ou ameaçados pela presença inibidora de guardas armados que os castigam ou até mesmo os matam caso haja tentativa de fuga.(57)

O Brasil, um dos últimos países a abolir a escravatura no século XIX, não pode mais conviver com a prática do trabalho escravo, o que exige a conscientização da sociedade e a participação ativa das entidades representativas da sociedade civil.

Pode-se concluir que o trabalho infantil e o trabalho escravo não são apenas resquícios do passado. Certamente surgiram em outros modos de produção. Todavia, persistem no atual e são realimentados. Para tal afirmativa, recordem-se alguns aprendizados e os ensinamentos de István Mészáros.

Sabe-se que, na história, não existem momentos “neutros”. Avançamos, em termos de regras sociais mais humanas, ou retrocedemos. Não há como deixar a roda da história imóvel.

Os estudos de István Mészáros apontam as dificuldades de superação, hoje e no futuro, de certas características do atual modo de produção, que inclusive tendem a perdurar por mais algum tempo, acaso insuficientemente combatidas. Diz que

“A fragmentação do trabalho não pode ser eliminada pela ‘socialização da produção’ capitalista. Nem pode ser superada – em vista das estruturas materiais, profundamente arraigadas, da divisão global tradicional do trabalho – durante um longo tempo após a evolução política socialista. É por isso que as mediações materiais necessárias em questão, caracterizadas por uma capacidade vital para promover a redução progressiva do papel restritivo das determinações materiais herdadas, devem ser a estrutura reguladora da vida social durante todo o período histórico de transição. (...) Desse modo, não somente os riscos estão aumentando e as confrontações se agudizando, mas também as possibilidades para um resultado positivo estão postas numa nova perspectiva histórica. Precisamente porque os riscos estão crescendo e tornando-se potencialmente mais explosivos, o repositório de compromissos, que formalmente tem servido tão bem às forças do ‘consenso político’, está cada vez mais vazio, bloqueando certos caminhos e abrindo outros, enquanto demanda a adoção de novas estratégias.”(58)

No atual marco histórico, o trabalho infantil e o trabalho escravo são apenas as faces mais visíveis e mais escandalosas do trabalho não digno. Para a sua superação, cada vez mais é necessária a construção de outras relações sociais.

Notas

1. “La estructura hiperfragmentada de los accesos al actual mercado de trabajo lo hace explosivo e inadministrable en el sentido más genuinamente social del término. Mercado maximamente flexibilizado que para los contextos más empobrecidos, o con poca o nula capacidad de formación, acabe generando un caos, no creativo precisamente, sino destructivo de las instituciones y demoledor de las esperanzas personales (...).” (ALONSO, Luis Enrique. Trabajo y posmodernidad: el empleo débil. Madrid: Fundamentos, 2000. p. 104)

2. Relatório Mundial do Emprego, OIT, 1994.

3. OLEA, Manuel Alonso. El trabajo como bien escaso y la reforma de su mercado. Madrid: Civitas, 1995 (Cuadernos Civitas).

4. "Na época em que a Declaração dos Direitos Humanos foi concebida, o pleno emprego e a difusão dos benefícios por meio do Estado estavam na ordem do dia da agenda política dos países desenvolvidos. Meio século depois, os valores subjacentes à transnacionalização dos mercados, como a livre circulação de capitais e a ênfase a ganhos incessantes de produtividade, se converteram em imperativos categóricos e transcenderam os limites da economia, contaminando todas as esferas da vida." (FARIA, José Eduardo. O cinquentenário da Declaração dos Direitos Humanos, artigo publicado em O Estado de São Paulo, 20 jul. 1998)

5. Estimo que se presentan factores que atentan contra la gobernabilidad democrática, como, por ejemplo, que uno de cada dos trabajadores de la región latinoamericana reciba una remuneración que lo sitúa en el umbral de la pobreza. Por otro lado, tampoco ayuda a consolidar la institucionalidad del Estado de Derecho que una creciente mayoría de la población en la edad de trabajar no está cubierta por la legislación laboral.” (ZENDER, Ignacio Basombrío. Carta Democrática Interamericana: políticas de desarrollo y lucha contra la pobreza)

6. POCHMANN, Márcio. O emprego na globalização: a nova divisão internacional do trabalho e os caminhos que o Brasil escolheu. São Paulo: Boitempo, 2001. p. 80.

7. POCHMANN, Márcio, ob. cit., p. 81.

8. OFFE, Clauss. Capitalismo desorganizado: transformações contemporâneas do trabalho e da política, São Paulo, 1989, p. 322, citado por FARIA, José Eduardo, in Interesse Público versus interesse privado: as antinomias jurídicas na gestão econômica.

9. MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 8. ed. Fundação Getúlio Vargas, 1980. p. 16. Ainda: "Encerra este direito profunda significação moral que não deve ser esquecida e que vai coincidir, em última análise, com aquele mesmo ideal, de valor permanente e absoluto, de que se fez expressão a Declaração dos Direitos do Homem – ideal falseado pela economia capitalista – o respeito à dignidade do trabalhador (...). O salário não é apenas o preço da força de trabalho: é o meio de subsistência de um ser humano, a quem a sociedade não pode negar o direito a uma existência digna" (idem). No mesmo sentido, Francisco Rossal de Araújo: "O Direito do Trabalho também pode ser visto sob o prisma da dignidade do ser humano. Na sua origem está a reação de que o trabalho humano possa ser juridicamente tratado como mera mercadoria" (ARAÚJO, Francisco Rossal de. O Direito do Trabalho e o ser humano, in Anais do XII Encontro Regional da Amatra RS, Porto Alegre: HS, 1998. p. 14).

10. "La expresión ‘huida del Derecho del Trabajo’ ha hecho fortuna. Viene a significar la utilización preferente de figuras contratuales no laborales para definir determinadas prestaciones de servicio y correlativamente el éxodo hacia formas jurídicas típicamente civiles o mercantiles, en supuestos de descentralización productiva y contratación externa de servicios profisionales, que se amplía también a la prestación de determinados trabajos atípicos." (BAYLOS, Antonio. La "huida" del Derecho del Trabajo: tendencias y límites de la deslaboralización. In: ALARCON, Manuel Ramón; MIRÓN, Maria del Mar (coords.). El trabajo ante el cambio del siglo: un tratamieto multidisciplinar. Barcelona: Marcial Pons, 2000. p. 35)

11. Economia informal como sendo "o conjunto de atividades econômicas que o estado de necessidade social ou a busca de lucros ilícitos leva a que sejam realizadas informalmente, de modo que não são detectadas, nem medidas, nem consideradas nas condições nacionais" (PRADO, Ney. Economia informal e o direito no Brasil. São Paulo: LTr, 1991. p. 26).

12. "las necesidades no satisfechas en la sociedad industrial aparecen no por la insuficiencia de producción, sino por el tipo de producción para el deseo, o lo que es lo mismo, la necesidad como fenómeno social no tiene validez económica si no presenta la forma de un deseo solvente individual monetarizable; quedan así desasistidas todas aquellas necesidades que, por diferentes motivos históricos, escapan a la rentabilidad capitalista, marcando con ello los límites de su eficiencia asignativa en la medida que el mercado únicamente conoce al homo economicus – que sólo tiene entidad de comprador, productor o vendedor de mercancías – y desconoce al hombre en cuanto ser social que se mantiene y reproduce al margen de la mercancía.” (ALONSO, Luis Enrique, idem, p. 43)

13. O chamado "constitucionalismo social" inicia-se pela Constituição da Suíça (1896) e pela Constituição do México (1917), sendo esta a primeira que "arma um quadro significativo dos direitos sociais do trabalhador, muitos dos quais foram repetidos nas Cartas Magnas de alguns países latino-americanos (SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 13).

14. SÜSSEKIND, Arnaldo. ob. cit., p. 167.

15. A esse respeito, VARGAS, Luiz Alberto. Um novo paradigma para a interpretação constitucional da relação de trabalho. In: ARAÚJO, Francisco Rossal de (coord.). Jurisdição e Competência da Justiça do Trabalho. São Paulo: Cetra-LTr, 2006.

16. Conforme José Afonso da Silva, a doutrina mais consequente reconhece nos direitos sociais "a natureza de direitos fundamentais, ao lado dos direitos individuais, políticos e do direito à nacionalidade. São direitos fundamentos do homem social" (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 151).

17. "El derecho constitucional al trabajo proyecta su eficacia hacia un doble destinatario: los poderes públicos, como garantes de una legislación orientada a su pleno desarrollo y fiscalizador de los posibles incumplimientos y el empresario, que si bien no puede ser compelido a la asignación directa de un puesto de trabajo en la fase precontratual, una vez perfeccionado el contrato ha de abstenerse de cualquer actuación contraria al derecho comentado." (MARRERO, Alberto Guanche. El derecho del trabajador a la ocupación efectiva. Madrid: Civitas, 1993. p. 25)

18. A ideia de "contrato social da modernidade" como sendo "a grande narrativa em que se funda a obrigação política moderna" está em SANTOS, Boaventura de Souza. Reinventar a democracia: entre o pré-contratualismo e o pós-contratualismo. PAOLI, Maria Celia (org.). Petrópolis: Vozes, 1998 (Coleção Zero à Esquerda).

19. “Como o emprego é a ponte entre o crescimento econômico, a erradicação da pobreza e as oportunidades de desenvolvimento humano, a redução sustentável da pobreza não é possível sem crescimento econômico rápido e sustentado. Dois canais básicos ligam a redução da pobreza ao crescimento. São eles: a) o canal das prestações sociais, ou seja, recursos gerados pelo crescimento (por exemplo, impostos) que podem potencialmente ser usados pela sociedade para prestar serviços aos pobres; b) o canal da renda pessoal, ou seja, o crescimento da economia através do emprego que potencialmente se traduz em rendimentos pessoais mais elevados entre os pobres.” (Relatório de Desenvolvimento Humano de 2003 da África do Sul, p. 6, citado em SACHS, Ignacy. Trabalho decente: ponte entre o “econômico” e o “social”, disponível no site da OIT, www.ilo.org)

20. "Sem dúvida, a volta ao crescimento acelerado é uma condição necessária para a criação de oportunidades de trabalho decente. Porém os exemplos da China e da Índia, onde o coeficiente de elasticidade de emprego baixou para apenas 0,1, mostram que não podemos prescindir de políticas públicas para aumentar a densidade em empregos da trajetória de crescimento econômico, sob pena de cairmos na armadilha de jobless growth ou mesmo job loss growth, ou seja, crescimento sem emprego ou crescimento destruidor de empregos." (SACHS, Ignacy, ob. cit.)

21. "Não é possível esperar que somente o crescimento promova o emprego para aqueles que mais necessitam e reduza a pobreza extrema na região. É necessário incorporar explicitamente o objetivo de geração de trabalho decente nas estratégias nacionais de desenvolvimento, incluindo a geração de políticas trabalhistas específicas." (Declaração do Diretor-Geral da OIT, Juan Somavia, na abertura da XVI Reunião Regional Americana da Organização Internacional do Trabalho, Brasília, maio 2006)

22. ALONSO, Luis Enrique. Trabajo y posmodernidad: el empleo débil. Madrid: Fundamentos, 2000. p. 40.

23. Ao assim intervir no mercado de trabalho, o Estado, no dizer de Márcio Pochmann, transforma-se em um "agente de socialização de renda", o que nada mais é do que a redistribuição dos fundos sociais, formados a partir das cotizações dos empregadores e dos empregados e ainda das receitas provenientes dos tributos. POCHMANN, Márcio. Políticas do trabalho e de garantia de renda no capitalismo em mudança. São Paulo: LTr, 1995. p. 30.

24. "O internacionalismo, outrora inventado pelos líderes operários social-democratas para fazer frente aos avanços capitalistas, mudou desde há muito tempo de campo. (...) Quarenta e cinco marcos a hora pelo trabalho especializado na Alemanha: é demasiado caro; os britânicos trabalham por menos da metade e os checos, por um décimo disso." (MARTIN, Hans-Peter; HARALD, Schumann. A armadilha da globalização: o assalto à democracia e ao bem-estar social. Lisboa: Terramar, 1998)

25. Conforme Antonio Baylos, "a flexibilização dos direitos trabalhistas na Europa não causou benefícios nem aumentou o nível de emprego, mas apenas precarização. Para o sistema espanhol, a desregulamentação foi um equívoco" (entrevista a Informativo Anamatra, a. VIII, n. 54, out. 2004).

26. “En resumidas cuentas, es importante subrayar que no hay gran evidencia que sustente la postura hegemónica de que la reducción de la protección social y/o el aumento de las facilidades de despido y contratación temporal hayan disminuido significativamente el desempleo, al menos en las cantidades que permita resolver la enorme problemática del desempleo que los países europeos presentan. De ahí que se requiera el desarrollo de otras políticas públicas cuyo impacto en reducir el desempleo sea mayor y más efectivo que las ya probadas sin crear a la vez el coste social que aquellas políticas hoy están creando, tales como la polarización social y la pobreza como fenómeno de masas.” (NAVARRO, Vicenç. Neoliberalismo y Estado del bienestar. Barcelona: Ariel, 1997. p. 43)

27. POCHMANN, Márcio. O Trabalho sob fogo cruzado. São Paulo: Contexto, 2000. p. 108.

28. POCHMANN, Márcio. Ob. cit., p. 110.

29. O trabalho decente é o ponto de convergência dos quatro objetivos estratégicos da OIT, ou seja, a promoção dos direitos fundamentais no trabalho; o emprego; a proteção social; e o diálogo social, tornando-se o norte que deve orientar as decisões da organização e definir o conteúdo de suas ações internacionais nos próximos anos. Trabalho decente. Relatório do Diretor-Geral da OIT à 87a Conferência Internacional do Trabalho, Genebra, jun. 1999.

30. SEBGEBERGER, Philippe Egger Werner. Problemas y políticas del trabajo decente. Boletín de la Organización Internacional del Trabajo, n. 151, 2001.

31. SACHS, Ignacy, ob. cit.

32. Os direitos sociais também são chamados direitos prestacionais e são filhos do século XX. Tornam o Estado devedor dos indivíduos relativamente a ações concretas, visando garantir um mínimo de igualdade entre os cidadãos e o bem-estar social. São direitos que se efetivam "através" ou "por meio" do Estado e, por isso, sofrem a objeção do pensamento (neo)liberal, tradicionalmente contrário à intervenção do Estado. Por isso, a questão da efetividade dos direitos sociais é tema candente e de urgência.

33. A esse respeito, RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr.

34. O desemprego influencia diretamente o nível salarial dos empregados, como aponta Márcio Pochmann: "No caso de livre funcionamento do mercado de trabalho, o processo de determinação do salário torna-se dependente diretamente do grau de escassez e de abundância da força de trabalho. As empresas dificilmente possuem uma estrutura previamente definida de cargos e salários estáveis, o que significa dizer que o rendimento assalariado sofre a influência direta da oferta da mão de obra no mercado de trabalho" (POCHMANN, Márcio. Políticas do trabalho e de garantia de renda no capitalismo em mudança. São Paulo: LTr, 1995. p. 25).

35. SUPIOT, Alan. Crítica del derecho del trabalho. Madrid: Ministério de Trabajo y Asuntos Sociales, 1996. p. 93.

36. "Nacido de la necesidad de garantizar la seguridad del trabajador, su seguridad física en la empresa, el derecho del trabajo debía tender naturalmente a garantizar la seguridad de los ingresos del trabajador. (...) Esta garantía de los ingresos del trabajador se desarrolla en dos planos diferentes: por una parte, el de los ingresos del trabajo y, por otra, el de los ingresos de sustitución, que permiten al trabajador subsistir cuando no puede trabajar." (SUPIOT, Alan, ob. cit., p. 96-98)

37. RICARDO. Principles of political economy and taxation, citado em SUPIOT, ob. cit., p. 99.

38. "La vieja idea del salario justo, que defienden los sindicatos, no puede acomodarse a una situación en que los trabajadores menos pagados no tengan su parte del enriquecimiento general de la nación. (...) Se aprecia aquí la dinámica de la idea de seguridad por medio del trabajo, (...) que ha conducido a un objetivo de garantía económica de ‘participación en el desarrollo económico de la nación’, conforme o Código de trabajo francés, art. L, 141-2 y 141-4.” (SUPIOT, Alan, ob. cit., p. 100-101)

39. MARTIN, Hans-Peter; HARALD, Schumann. A armadilha da globalização: o assalto à democracia e ao bem-estar social. Lisboa: Terramar, 1998. p. 113.

40. BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo. Barcelona: Paidós, 1998. p. 163.

41. O conceito em MATTOSO, Jorge. A desordem do trabalho. São Paulo: Scritta, 1995. A esse respeito: A insegurança no emprego se centra na introdução, em praticamente todos os países avançados, de facilidades para as demissões. Assim, em um processo de aproximação da legislação comunitária, se extinguiu a autorização administrativa para demissões individuais e se reduziram consideravelmente as possibilidades de controle judicial sobre os motivos dos empregadores para realizar as demissões. Como se sabe, a proteção contra a despedida imotivada é uma das peças-chave do sistema protetivo, uma vez que a instabilidade no emprego (e o risco de perder o emprego por mero exercício da vontade patronal) torna o empregado bastante mais vulnerável em sua relação com o empregador. Ademais, passou-se a admitir a contratação a título precário (eventuais ou temporais), passando esse coletivo um número percentual expressivo da massa assalariada (VARGAS, Luiz Alberto de. Panorama da precarização laboral. Revista do TRT 4a Região, Porto Alegre, dez. 2005).

42. p. SUPIOT, Alan. Trabajo y Empleo: transformaciones del trabajo y futuro de Derecho del trabajo – Informe para la Comisión Europea. Valencia: Tirant to blanch, 1999. p. 221.

43. Até 1988, data da promulgação da Constituição Federal, que reconheceu inúmeros direitos previdenciários aos mais carentes (em especial a garantia de que nenhum benefício de prestação continuada tenha valor inferior ao salário mínimo), majoritária parcela dos trabalhadores rurais recebia algo em torno de 50% do salário mínimo em seus benefícios. Tal distorção foi corrigida, ao menos em parte, graças à uniformidade dos sistemas urbano-rural na Constituição de 1988. (COSTA, José Ricardo Caetano. Previdência e neoliberalismo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 60)

44. Em 2001, enquanto a proporção de homens ocupados no setor informal era de 51%, entre as mulheres o índice era 7,2% superior. Os dados revelam ainda que uma em cada três mulheres brasileiras não recebe remuneração ou desempenha trabalho doméstico. No caso das empregadas domésticas, apenas uma em cada quatro tem carteira de trabalho assinada. Já entre os negros, a taxa de desemprego atingiu 10,6% em 2001, superando a dos brancos em 2,5%. No caso das mulheres negras, 13,8% estavam desempregadas no mesmo ano. Entre as mulheres negras, 23,9% trabalham no serviço doméstico e 41,9%, em ocupações sem remuneração. Com relação à população com nível superior, o mercado de trabalho tende a valorizar mais os homens do que as mulheres, com exceção dos empregos “tipicamente femininos”, como professoras de educação básica e enfermeiras. Os dados são da Pesquisa Nacional de Amostras de Domicílios (Pnad) do IBGE, 2001.

45. SACHS, Ignacy, ob. cit.

46. Estudo realizado pelo Prof. Anselmo Santos, do Cesit da Unicamp, demonstra que, utilizada a metodologia correta, os encargos sociais representam em torno de 23% dos rendimentos monetários do trabalhador – e não 100%, como se afirma comumente na imprensa (SANTOS, Anselmo Luis dos. Encargos sociais e custo do trabalho no Brasil. Campinas: Unicamp, 1995 [Cadernos do Cesit].)

47. POCHMANN, Márcio. ob. cit., p. 175-7.

48. "Quien no consiga vender su fuerza de trabalho, convertirse en persona mercancía, se convertirá en persona marginación." (FERNÁNDEZ, José Iglesias. El derecho ciudadano a la renta básica: economía crítica del bienestar social. Madrid: Los libros de la catarata, 1998. p. 173)

49. "Una renta, por ser un derecho ciudadano, no tiene por que estar legitimada por el ‘derecho al trabajo’, ni por los derechos emanados de la propiedad. Porque seguir pensando en la vuelta al pleno empleo como medio de asegurar el bienestar de los ciudadanos, como hacen liberales y keynesianos, es ‘continuar argumentando sobre el esquema de las sociedades industriales: los primeros apelan al productivismo mientras que los segundos insisten en el ‘trabajismo’. Ni unos ni otros tienen en cuenta las nuevas condiciones creadas por las mutaciones técnicas del sistema productivo’ (...). ‘...ha llegado el momento de dejar de identificar responsabilidad social y ciudadana con el hecho de tener un trabajo asalariado’.” (FERNÁNDEZ, José Iglesias, ob.cit., p. 183)

50. Teoricamente, o aumento real dos salários, acima da inflação de determinado período, representa a justa distribuição da produtividade que deve beneficiar a ambos os parceiros da relação laboral. Outra faceta da mesma luta pela distribuição dos ganhos de produtividade é a proposta de diminuição da jornada de trabalho sem redução salarial, o que implica uma elevação do valor do salário-hora pago. A esse respeito, RIECHMANN, Jorge. Entre el reino de la necesidad y la libertad: los conflictos en torno al tiempo de trabajo. In: RIECHMANN, Jorge; RECIO, Albert. Quien parte y reparte...: El debate sobre la reducción del tiempo de trabajo. 2. ed. Barcelona: Icaria, 1999.

51. EUZEBY, Chantal. Uma revolução tranquila do trabalho, Le Monde diplomatique, set. 2000. Caderno de Debates, p. 28.

52. De acordo com a organização, o Brasil tinha em 1992 um total de 7,4 milhões de crianças de cinco a 17 anos que trabalhavam. Em 2004, esse número havia caído para 4,8 milhões de jovens.

53. O trabalho infantil "é tolerado por parcela significativa da sociedade pelos mitos que ele enseja – ‘formativo’, ‘educativo’, ‘prepara a pessoa para o futuro’; pela pouca densidade da educação escolar obrigatória de qualidade ofertada pelo poderes públicos; além da inexistência de uma rede de programas sociais complementares à educação escolar, tão fundamentais ao desenvolvimento da infância. (...) A sociedade, influenciada por esses motivos, associa o ‘não trabalho’ à ‘marginalidade’ e à ‘delinqüência’, corroborando com a ideia de que o trabalho é o formador por excelência das crianças e dos adolescentes das camadas populares” (A CUT contra o trabalho infantil, 1997).

54. O Peti "destina-se às famílias com filhos na faixa etária de 7 a 14 anos, submetidos a trabalhos caracterizados como perigosos, insalubres, penosos ou degradantes nas zonas urbana e rural. (...) Um dos instrumentos do Programa é a Bolsa Criança Cidadã, concedida mensalmente às famílias com crianças e adolescentes de 7 a 14 anos que se comprometem a retirá-los do trabalho e mantê-los na escola. (...) Ao oferecer a Bolsa Criança Cidadã, o Programa objetiva criar condições mínimas para que a família possa promover suas necessidades básicas e complementar sua renda, sem depender do trabalho da criança e do adolescente. (...) A concessão e a manutenção mensal da Bolsa Criança Cidadã às famílias está condicionada à frequência da criança e do adolescente no ensino fundamental e nas atividades socioeducativas oferecidas pela Jornada Ampliada, bem como ao abandono da atividade laboral. O Programa busca mais do que o acesso, a permanência e o sucesso escolar da criança e do adolescente. Nesse sentido, incentiva um segundo turno de atividades – a Jornada Ampliada, pelo qual as unidades escolares ou de apoio, reforçadas com recursos humanos e materiais, asseguram a alimentação, a orientação nos estudos, o esporte e o lazer” (MPAS. Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – Peti. Manual de Operação).

55. O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda com condicionalidades que beneficia famílias pobres (com renda mensal por pessoa de R$ 60,01 a R$ 120,00) e extremamente pobres (com renda mensal por pessoal de até R$ 60,00) (Site do Ministério do Desenvolvimento Social – http://www.mds.gov.br).

56. AUDI, Patrícia. Escravidão não abolida. In: VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves. Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTr, Anamatra, 2006. p. 75.

57. ob. cit., p. 77.

58. MÉSZÁROS, István. Para além do Capital. São Paulo: Boitempo, 2002. p. 1.062-1.063.

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., out. 2010. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS