A Assistência Oncológica no SUS(1)


Autora: Maria Inez Pordeus Gadelha

Médica Cancerologista Clínica, Assessora e Diretora-Substituta do Departamento de Atenção Especializada da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde

 publicado em 03.05.2012


Introdução

Na área de Oncologia, o SUS é estruturado para atender de uma forma integral e integrada os pacientes que necessitam de tratamento de neoplasia maligna. A alta complexidade na Rede de Atenção Oncológica inclui hospitais habilitados, como Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) ou Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon) e aqueles estabelecimentos de saúde não hospitalares autorizados, como Serviços Isolados de Radioterapia, que, como os de Quimioterapia, vêm, desde 2005, integrando-se a hospitais para a sua habilitação conjunta como Unacon, como complexo hospitalar. Os hospitais habilitados como Unacon ou Cacon – a grande maioria hospitais gerais, de ensino ou não, e não hospitais especializados (ditos “de câncer”) – devem oferecer assistência especializada e integral ao doente de câncer, atuando no seu diagnóstico e tratamento. Essa assistência abrange sete modalidades, que devem atuar integradamente: diagnóstico, cirurgia, radioterapia, quimioterapia (oncologia clínica, hematologia e oncologia pediátrica), medidas de suporte, reabilitação e cuidados paliativos, sendo que a reabilitação e os cuidados paliativos, para conforto e comodidade dos doentes, podem ser prestados em rede, conforme a decisão pactuada dos gestores estadual e municipais. Já os Serviços Isolados de Radioterapia realizam procedimentos relativos apenas à radioterapia, necessitando os doentes de hospitais para a cobertura das demais modalidades assistenciais, nem sempre garantidas – seja por autorregulação institucional, seja por conduta terapêutica discordante.

O presente texto busca apresentar como se estrutura e funciona a alta complexidade em Oncologia no SUS e representa um consolidado de diversos documentos, artigos e notas técnicas, sendo que os atos normativos relacionados em anexo também representam fonte bibliográfica.

A rede de atenção oncológica e a oncologia no SUS

Costuma-se confundir “câncer” com “oncologia”, não se atentando que a oncologia é uma parte do controle do câncer, a da assistência terapêutica especializada.

De imediato, vale abrir um parêntese para ressaltar a importância que cada vez mais assume a prevenção quaternária, no sentido de proteger as pessoas do risco que se agrega pelas ações de prevenção primária (promoção da saúde), secundária (prevenção de doenças) ou terciária (tratamento de doenças ou condições) por excesso de programas de rastreamento (muitos não validados); medicalização de fatores de risco; solicitação de exames complementares em demasia; excesso de diagnósticos; medicalizações desnecessárias de eventos vitais ou adoecimentos benignos autolimitados (contusões, partos, resfriados, lutos etc.); pedidos de exames ou tratamentos devido ao medo dos pacientes ou à pressão por eles exercida; e intervenções em razão do medo dos médicos (medicina defensiva).

A despeito do nome, Atenção Oncológica diz respeito à rede de ações e serviços que devem ter atividades integradas, de modo a desenvolver a promoção da saúde (inclusive evitando o câncer, como o de pulmão, o de pele e o de colo uterino); a detecção precoce de cânceres curáveis ou controláveis (do colo uterino e de mama, por exemplo); o tratamento dos cânceres curáveis, controláveis ou incuráveis (incuráveis per se ou por estarem em estágio avançado); e os cuidados paliativos dos doentes sem indicação de terapia antineoplásica. O Gráfico1 (clique aqui para acessar o ANEXO) busca expressar a integração que deve haver entre os diversos níveis de um sistema de saúde, com vistas a se prover essa Atenção em rede.

Assim, a Rede de Atenção Oncológica, apesar do nome inapropriado, engloba o controle do câncer e vai além da Oncologia, que é uma parte desse controle e representa a alta complexidade na terapêutica do câncer.

Hoje, no Brasil, há 288 estabelecimentos de saúde credenciados no SUS que, isolada (hospitais) ou integradamente em complexos hospitalares (hospitais e serviços de radioterapia de complexo hospitalar) somam 269 habilitações na alta complexidade, em todos os estados federativos (Tabelas 1 e 2 (clique aqui para acessar o ANEXO)), conforme se pode observar no Anexo da Portaria SAS 102, de 03.02.2012 (disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/
sas/2012/prt0102_03_02_2012.html>). Além destes, há 13 serviços isolados de radioterapia, todos privados com fins lucrativos, autorizados a prestar serviços ao SUS (Tabela 2 (clique aqui para acessar o ANEXO)), enquanto não se integram a hospitais, para a habilitação destes como Unacon com Serviço de Radioterapia.

Além dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos de média e alta complexidade, clínicos e cirúrgicos não classificados especificamente como oncológicos, o SUS financia o tratamento especializado do câncer como um todo, ou seja, tratamento cirúrgico, radioterapia, quimioterapia, iodoterapia (indicada para caso de carcinoma diferenciado da tireóide) e transplantes. O tratamento cirúrgico, os transplantes e a iodoterapia, via Autorização para Internação Hospitalar (AIH); as radioterapia e quimioterapia, via Autorização para Procedimento de Alta Complexidade (Apac), majoritariamente. Os estabelecimentos de saúde credenciados no SUS registram, respectivamente, a suas habilitações, os tratamentos em AIH (hospital) e Apac (hospital e serviço isolado de radioterapia), conforme procedimentos tabelados.

Algumas diretrizes diagnósticas e terapêuticas consideradas estratégicas (seja para orientar a incorporação de novas tecnologias pelos hospitais, seja pela identificação de má prática assistencial ou de desvios de codificação e cobrança) no âmbito da atenção oncológica no SUS estão definidas em alguns textos normativos do Ministério da Saúde (leucemia mieloide crônica de crianças, adolescentes e adultos; tumor do estroma gastrointestinal do adulto; iodoterapia do carcinoma diferenciado da tireóide; hormonioterapia do adenocarcinoma de próstata; e leucemia linfoblástica aguda cromossoma Philadelphia positivo de crianças e adolescentes), que, com os demais regulamentos específicos da assistência oncológica, encontram-se relacionados em anexo, atualizados em fevereiro de 2012.

Ressalta-se que, com a publicação da Portaria SAS 420, de 25.08.2010, que atualizou os procedimentos de radioterapia e de quimioterapia, o Ministério da Saúde passou a submeter à consulta pública outras diretrizes diagnósticas e terapêuticas do câncer, já válidas para efeito da regulação de procedimentos, como as do Carcinoma Colorretal; do Carcinoma de Fígado; do Carcinoma de Pulmão; do Linfoma Difuso de Grandes Células B; de Tumor Cerebral no Adulto; e da Neoplasia Maligna Epitelial de Ovário.

Muitos são os esquemas quimioterápicos aplicáveis à quimioterapia do câncer, e, conforme se pode ver no “Manual de Bases Técnicas – Oncologia” (atualizado periodicamente) e na tabela de procedimentos do SUS (disponível em: <http://sigtap.datasus.gov.br/tabela-unificada/app/sec/inicio.jsp>, com versão mensalmente disponibilizada), aqueles relativos à quimioterapia do câncer são genericamente chamados quimioterápicos, sejam eles de que classe farmacológica for, inclusive hormonioterápicos, bioterápicos (entre os quais se encontram os anticorpos monoclonais), imunoterápicos, alvoterápicos ou antiangiogênicos. O conteúdo desse Manual e a observância dos atributos dos procedimentos oncológicos orientam a sua autorização.

Especificamente quanto à quimioterapia do câncer, inexiste relação de medicamentos antineoplásicos no SUS, e, hoje, exceto pelo Mesilato de Imatinibe (Glivec) para a quimioterapia da Leucemia Mieloide Crônica, da Leucemia Linfoblástica Aguda Cromossoma Philadelphia Positivo de crianças e adolescentes e do Tumor do Estroma Gastrointestinal do adulto, nem o Ministério da Saúde nem as secretarias de saúde fornecem diretamente medicamentos contra o câncer. Quando para uso oncológico, antineoplásico, o fornecimento de medicamentos não se dá por meio de programas de medicamentos do SUS, como, por exemplo, o de medicamentos excepcionais (hoje, ditos do Componente Farmacêutico Especializado – Portaria GM/MS Nº 2.981, de 26 de novembro de 2009(*)), sendo o esquema terapêutico e o fornecimento dos medicamentos responsabilidade dos estabelecimentos devidamente credenciados e habilitados para a prestação de serviços oncológicos no âmbito do SUS. A Tabela de Procedimentos do SUS não refere medicamentos oncológicos, mas situações tumorais específicas, que orientam a codificação desses procedimentos, que são descritos independentemente de qual esquema terapêutico seja utilizado.Eles são compatíveis com o diagnóstico de câncer em várias localizações, estágios e indicações, organizadas por linhas e finalidades terapêuticas, grupos etários (adultos e menores de 19 anos) e utilização especial. Essa distribuição já se baseia em esquemas quimioterápicos (ditos comumente “protocolos”, no Brasil) respectivamente indicados e estabelecidos, e cabe exclusivamente ao médico assistente a prerrogativa e a responsabilidade pela prescrição, conforme as condutas institucionais adotadas, e ao estabelecimento de saúde, a sua padronização, a sua aquisição e o seu fornecimento, devendo codificar o respectivo procedimento conforme a situação nele descrita.

Ou seja, os estabelecimentos habilitados em Oncologia pelo SUS são os responsáveis pelo fornecimento dos medicamentos antineoplásicos que, livremente, padronizam, adquirem e prescrevem, devendo observar protocolos e diretrizes terapêuticas do Ministério da Saúde vigentes, quando existentes.

Os medicamentos antineoplásicos somam mais de uma centena de substâncias e apresentam-se como um número maior de produtos comercializados, e, com poucas exceções, vários são os medicamentos, os esquemas quimioterápicos e as terapêuticas possíveis para um tipo específico de câncer, pois a quimioterapia se faz com diversos medicamentos antiblásticos, de diferentes classes farmacológicas e diferentes mecanismos de ação e em diversas combinações e doses possíveis e também depende do tipo histopatológico da neoplasia maligna e da linha terapêutica em questão. E, não obstante tudo isso, não se altera a finalidade terapêutica para a qual podem ser utilizados.

A Tabela 3 (clique aqui para acessar o ANEXO)mostra os gastos federais exclusivamente com os procedimentos de cirurgia oncológica, radioterapia, quimioterapia e iodoterapia do carcinoma diferenciado da tireóide realizados, em 1999, 2009 e 2011, cuja evolução progressivamente crescente demonstra o quanto o SUS tem provido a população brasileira de serviços oncológicos.

A Política Nacional de Atenção Oncológica encontra-se em revisão, e a atualização dos procedimentos de cirurgia oncológica, a expansão da radioterapia e a implantação de um novo modelo de assistência farmacêutica em oncologia conjugam-se com a organização de redes para a melhoria do acesso à prevenção, ao diagnóstico e ao cuidado integral e dos sistemas de informação e vigilância em saúde, educação e pesquisa, buscando que a atenção e os serviços especializados se integrem verdadeiramente em uma linha de cuidados devidamente regulados.

Breves comentários sobre a incorporação de novas tecnologias no SUS

Em qualquer sistema de saúde, mormente o de financiamento inteiramente público e de cobertura universal, como o SUS, a incorporação de tecnologias segue, para a sua avaliação, premissas básicas, relacionadas com as suas evidências científicas e os custos.

Assim, três questões básicas se impõem na análise de uma tecnologia: qual a sua eficácia (funciona)? Qual a sua efetividade (o quão bem funciona)? E qual a sua eficiência (a que custo)? Essas respondidas, ainda há de se considerar o quanto se despenderá para atender aos que necessitam da tecnologia em pauta.

Note-se, que, quando se avalia uma tecnologia, não se pode quantificar o benefício, sem o comparador e a quais tipos de medida (dias, semanas, meses, anos, taxas, doentes) e valores absolutos ou relativos os percentuais se aplicam, para que se possa aferir a que correspondem, em termos de resultados reais, pois alterar-se, o que seja, de 100 para 50 e de 100 para 70 ou de 1 para 0,5 e de 1 para 0,7 tem a mesma expressão percentual, respectivamente, de 50% ou de 30%. Muitas publicações sumarizam os resultados das experimentações clínicas em termos de odds ratios (OR) e hazard ratios (HR), medidas de estimativas do efeito terapêutico, obtidas por modelos matemáticos de regressão usados para a análise de dados. Porém, essas medidas são muitas vezes mal interpretadas (como se fossem fenômenos reais e não probabilidades), uma vez que não são familiares à maioria dos leitores, inclusive aos médicos. Além do mais, um equívoco muito cometido é tomar os OR e HR como riscos relativos (RR), o que pode levar a uma interpretação incorreta do impacto de um tratamento sobre a resposta tumoral e a sobrevida global dos doentes. Ainda, um estudo randomizado que compare duas curvas de sobrevida de doentes incuráveis pode ser corretamente relatado como que, por exemplo, “o risco de morrer foi reduzido em 20%”; porém muitos médicos e os leigos podem interpretar, erroneamente, que morrerão menos 20% dos doentes (ao contrário, todos morrerão) e que esses doentes foram curados, quando, na realidade, significa que, em um dado momento do experimento, o RR de morrer foi reduzido, em média, em 20% no braço do tratamento experimental (mesmo assim, esse percentual só terá significância estatística se o estudo foi bem desenhado, com critérios de inclusão bem definidos, hipótese estabelecida sem viés metodológicos – inclusive quanto ao comparador – e números de doentes estatisticamente adequados nos dois ou mais braços comparados). Há ainda de se ressaltar inconsistências no processo de inferência estatística a partir de estudos fase III, que sequer são lembradas por autoridades reguladoras ou pela “comunidade científica", como, por exemplo, na aceitação da taxa de erro tipo I (alfa) definida para um estudo em particular como um valor absoluto, válido para repetições (extrapolação) do mesmo experimento. Recorde-se que, com um número suficiente de pacientes, a comparação entre dois grupos quaisquer de tratamentos resultará em diferença estatisticamente significativa, ainda que ínfima. E que muitos estudos mais servem para relembrar que a atividade antitumoral observada em estudos pré-clínicos e em estudos clínicos de métodos pouco rigorosos pode não se comprovar.

Vale salientar queos requisitos para registro de medicamentos são estudos randomizados, que comprovem uma eficácia mínima e segurança biológica – características que podem ou não se confirmar quando mais pacientes utilizam a medicação em questão. Quando esses critérios não são atingidos, o registro do medicamento pode ser até suspenso e este retirado do mercado. São necessários estudos clínicos bem desenhados, com material e métodos bem definidos e resultados comprováveis e repetíveis, para que se garanta a validade do seu uso fora das condições de pesquisa (conceito conhecido como validade externa). Por isso, toda nova tecnologia em saúde, inclusive medicamentos, deve ser analisada com base em estudos não aleatórios, ou seja, no âmbito de protocolos de pesquisa adequadamente delineados, com número de pacientes adequado, hipóteses a serem testadas bem definidas, desfechos e objetivos finais compatíveis com as hipóteses iniciais.

Para a grande maioria dos novos antineoplásicos dados como o tratamento ideal para um determinado tipo de câncer, faltam estudos de fase III adequadamente desenvolvidos e resultados consistentes. O delineamento de pesquisa adequado é fundamental para que dados encontrados em um âmbito experimental possam se confirmar no campo da assistência ao paciente.

Ressalte-se que o registro de um produto farmacêutico pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) significa apenas que aquele medicamento atende os requisitos mínimos de segurança biológica e eficácia terapêutica estabelecidos pela agência reguladora, representando tão somente que seu fabricante tem, a partir de então, o direito de comercializá-lo. Esse fato, por si só, não implica obrigatoriamente sua incorporação e seu fornecimento no âmbito do sistema público de saúde, inclusive porque o processo de registro não considera a comparação entre as alternativas terapêuticas disponíveis.

Os preços dos antineoplásicos no Brasil, todos isentos de PIS e Cofins, são variáveis. Quando um medicamento tem a comercialização autorizada pela Anvisa, ele recebe um valor referente ao chamado “preço de fábrica”, que varia, também, conforme o ICMS de cada região. O preço de fábrica pode chegar a ser até 40% maior do que o preço de venda para os estabelecimentos de saúde, inclusive os credenciados no SUS, públicos e não públicos.

Toda compra pública deve respeitar um teto de preço. A maioria dos medicamentos tem como teto o preço fábrica, que é o maior preço que pode ser praticado pela indústria e também por atacadistas (não confundir com preço comercial, ao consumidor de produto ou medicamento que pode ser vendido em farmácia ou drogaria, o que não é o caso dos antineoplásicos).

No caso de produtos excepcionais, de alto custo, antineoplásicos ou qualquer medicamento adquirido por força de decisão judicial, foi estabelecido como teto o Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG). O PMVG, obtido pela aplicação do CAP (coeficiente de adequação de preço) sobre o preço de fábrica, é o teto de preço permitido para venda desses medicamentos a entes da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal. Qualquer aquisição realizada por entes públicos que descumpra esses limites configura-se em infração e está sujeita às penalidades legalmente previstas. O CAP é um desconto mínimo obrigatório anualmente estabelecido pela CMED e, hoje, em 24,38%.

Os custos de aquisição de medicamentos antineoplásicos e as formas de financiamento dependem da natureza jurídica do estabelecimento de saúde credenciado: estabelecimentos públicos possuem dotação orçamentária própria e observam a Lei 8.666/1993 e os dispositivos relacionados; estabelecimentos filantrópicos são financiados pela Tabela SUS, redução de custos por vantagens tributárias (Decreto nº 5.895/2006 e dispositivos sucedâneos) e receita advinda do atendimento privado. Não há possibilidade legal de cobrança extra (coparticipação, solicitação de medicamentos a terceiros) para atendimentos realizados no SUS.

Assim, a compra por hospital ou clínica é sempre feita a um preço menor do que aquele que seria pago em uma compra isolada, feita por uma secretaria de saúde ou o Ministério da Saúde.

Resumindo, a questão dos antineoplásicos, além de técnica, não se esgota nos limites de um processo judicial, e a vertente econômica e financeira da assistência à saúde também implica, além de preços, gastos e custos, questões morais e de gestão de sistema, especialmente no que diz respeito à alocação dos recursos disponíveis em função de efetivos resultados finais.

Atente-se para que a transferência de responsabilidade para os gestores do SUS por atendimento realizado fora de suas normas operacionais ou de sua rede de estabelecimentos credenciados e habilitados (conforme parâmetros de necessidade e critérios de qualidade e sustentabilidade devidamente estabelecidos) gera distorções e problemas para esse Sistema (que não pode ser tomado como um mero fornecedor de medicamentos), como: desregulação do acesso assistencial com justiça e equidade; perda da integralidade assistencial; ausência do controle e da avaliação da assistência prestada; quebra das prioridades definidas para a saúde pública; financiamento público da assistência privada sem o devido contrato para utilização de recursos, que são orçamentados e de aplicação planejada conforme as políticas públicas definidas.

Assim, cumpre mais uma vez ressaltar que, para que uma nova tecnologia seja incorporada, não bastam estudos de eficácia somente. São imprescindíveis avaliações de efetividade (aplicação dos resultados de estudos na vida real), custo/efetividade, custo/benefício e segurança em longo prazo. Quando se trata de saúde pública e utilização de medicamentos em larga escala – mesmo que sejam antineoplásicos aplicáveis a doenças ou doentes incuráveis –, é importante que todo o cuidado seja empregado para que situações de alta morbidade ou letalidade não ocorram. Por isso, os países mais desenvolvidos adotam mecanismos de avaliação de incorporação de novas tecnologias em saúde e, no Brasil, essa instância é, hoje, a Comissão Nacional para Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), estabelecida pela Lei 12.401, de 28.04.2011.

Registre-se que essa lei define um trâmite para incorporação de nova tecnologia, com prazo definido, e, portanto, não deveria haver pedido judicial nesse sentido, sem avaliação administrativa da questão.

Bibliografia

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Notas

1. Segunda parte do texto elaborado a partir da apresentação ao II Seminário de Direito à Saúde/Emagis, Poro Alegre, em 28 de setembro de 2009.

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., fev. 2012. Disponível em:
<>
Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS