Resumo
Com o avanço da ciência, desenvolveu-se a engenharia genética, a qual, não obstante os inúmeros benefícios que proporciona, também representa grandes riscos para os seres humanos. Dentre os avanços trazidos pela engenharia genética, estão os organismos geneticamente modificados, muitas vezes tratados simplesmente como transgênicos. Questões de ordem econômica, social, ética, científica e ambiental criaram um grande debate em torno desses organismos, levando à formação de dois blocos de países, um favorável e outro contrário aos OGMs. Juridicamente também foram concebidos princípios para a sustentação do posicionamento dos referidos países. No que diz respeito aos direitos do consumidor, a maior polêmica na seara dos transgênicos é a obrigatoriedade de rastreamento e rotulação, o que garantiria ao consumidor o direito de escolher consumir ou não produtos transgênicos. Dessarte, diante das possibilidades e dos riscos trazidos pelos OGMs, vamos, no presente trabalho, tratar especificamente das relações existentes entre os direitos de informação e escolha do consumidor e o fornecimento de produtos geneticamente modificados.
Palavras-chave: Direito do Consumidor. Direito à informação. Organismos geneticamente modificados. Transgênicos. Princípio da precaução. Princípio da equivalência substancial. Rotulação.
Abatract
The science developed the genetic engineering, which provides numerous benefits, but also poses great risks to humans. Among the advances brought by the genetic engineering are the genetically modified organisms, which are often treated simply as transgenics. A great debate around these organisms was created by economic, social, ethical, scientific and environmental questions, which led to the formation of two blocs of countries, one favorable and one contrary to the genetically modified organisms. Legal principles are also designed to support the position of those countries. With regard to consumer rights, the most controversy is related to the tracking and labeling of GMOs, which would guarantee the consumers the right to choose or not to consume genetically modified products. Thus, given the opportunities and risks posed by GMOs, in the present work we will analyze the relationships between information rights and consumer choice, as well as the supply of genetically modified products.
Keywords:Consumer law. Right to information. Genetically modified organisms. Transgenics. Precautionary principle. Principle of substantial equivalence. Product labeling.
Sumário: Introdução. 1 Escorço histórico. 2 Organismos geneticamente modificados e transgênicos. 3 Argumentos favoráveis e contrários ao consumo de OGMs. 4 O princípio da precaução no Brasil e na União Europeia. 5 O princípio da precaução e da equivalência substancial: conflito ou complemento? 6 A necessidade de rotulação dos produtos transgênicos. 7 Propostas de alteração das regras de rotulação no Brasil. 8 A rotulação e o direito à informação na União Europeia. 9 A rotulação e o direito à informação na Alemanha. 10 O papel do Judiciário no cumprimento da legislação. Considerações finais. Bibliografia.
Introdução
As sociedades industrializadas contemporâneas são marcadas por uma grande mudança no que toca aos riscos produzidos pelas atividades humanas. Tal paradigma pode ser particularmente visualizado no âmbito dos produtos ligados à saúde e à alimentação, visto que eles, cada vez mais, passam a fazer uso da biotecnologia.
Todavia, não estamos aqui afirmando que a biotecnologia é uma novidade da modernidade, uma vez que desde a Antiguidade o homem já buscava misturar características de organismos diferentes para a obtenção de produtos úteis.(1)
De fato, a biotecnologia está presente em processos conhecidos há muito tempo, como é o caso da fermentação para fabricação de bebidas, entre elas a cerveja e o vinho, bem como na produção de pão e queijo.(2)
Outro exemplo de utilização da biotecnologia é a penicilina, que foi descoberta por Alexander Fleming em 1928 e passou a ser produzida em larga escala durante a Segunda Guerra Mundial.(3)
Na verdade, melhor esclarecendo, a grande inovação da biotecnologia a que estamos fazendo referência é a engenharia genética, cujo progressivo aperfeiçoamento criou possibilidades nunca antes imaginadas,(4) as quais, por outro lado, vieram acompanhadas de riscos também nunca previstos.
Dessa forma, diante das possibilidades e dos riscos trazidos pela engenharia genética, vamos, no presente trabalho, tratar das relações existentes entre o direito de informação e escolha do consumidor e o fornecimento de produtos geneticamente modificados, cuidando, mais especificamente, dos aspectos relacionados à rotulagem dos referidos produtos.
1 Escorço histórico
Como se sabe, a história da genética remonta aos experimentos com ervilhas desenvolvidos por Gregor Mendel, no século XIX. O passo seguinte foi dado em 1931 por Ernest Messeger, que expôs a ideia de que cada célula de um organismo vivo guardava a virtualidade da espécie e da raça. Porém, somente em 1953, com a descoberta da estrutura de dupla hélice do DNA por James Watson e Francis Crick, é que foi possibilitado aos cientistas o conhecimento acerca do processo pelo qual as informações genéticas armazenadas nas células eram duplicadas e transmitidas de geração para geração.(5) Foi essa descoberta que criou as condições necessárias para o surgimento e o desenvolvimento da engenharia genética.
Nessa linha, com a multiplicação, nos anos 70, dos estudos e das aplicações laboratoriais na seara da recombinação do patrimônio genético de organismos e micro-organismos, a engenharia genética começou a se desenvolver.(6) E, já no ano de 1970, pesquisadores norte-americanos conseguiram transferir partes de informações genéticas (genes) de um organismo (um sapo) para outro (uma bactéria), demonstrando que o código genético era universal.(7)
Na década de oitenta, a engenharia genética avançou ainda mais, com o aumento do número de países que iniciaram experimentação em organismos geneticamente modificados, objetivando, particularmente, o desenvolvimento dos setores farmacêutico e agrícola.(8)
Nessa década, em 1983, foi desenvolvida a primeira planta geneticamente modificada, uma espécie de tabaco resistente a antibióticos. Também no mesmo ano, foi permitida a liberação, no meio ambiente, de um organismo geneticamente modificado. Tratava-se de uma bactéria que impedia a formação de cristais de gelo na superfície das plantas, com evidente potencial de aplicação em regiões agrícolas vulneráveis a geadas.(9) Ademais, ainda em 1983, ocorreu a primeira aplicação comercial da engenharia genética, o que se deu por meio da transferência para uma bactéria do gene humano responsável pela produção de insulina.(10)
Todavia, não demorou muito para que os primeiros problemas com OGMs surgissem, valendo lembrar que em 1989, nos Estados Unidos, cinco mil pessoas ficaram doentes, trinta e sete morreram e mil e quinhentas ficaram inválidas após o consumo de um suplemento alimentar feito a partir de uma bactéria geneticamente modificada.(11)
A despeito disso, o avanço dos organismos geneticamente modificados foi ainda maior na década de noventa. Assim, em 1990 o governo dos Estados Unidos aprovou o primeiro produto alimentício geneticamente modificado (uma enzima para fazer queijo) e em 1994 chegou aos supermercados desse país o primeiro alimento transgênico (tomate Flav-Savr, que demora a amadurecer). Ademais, viu-se nessa década um aumento da área global das culturas geneticamente modificadas, bem como sua comercialização, o que também ocorreu no Brasil, com a aprovação, em 1998, do plantio experimental de transgênicos.(12)
A expansão dos transgênicos nos anos que se passaram suplantou aquela assistida na década de noventa, surgindo, consequentemente, considerações de ordem econômica, social, ética, científica e ambiental, as quais levaram, no cenário internacional, à identificação de dois eixos de países. De um lado encontramos os países “mais receptivos à liberação do uso de organismos geneticamente modificados”, enquanto do outro lado estão aqueles países que “veem com desconfiança a utilização de plantas e animais transgênicos para a alimentação humana e sua liberação no meio ambiente”.(13)
Pois bem, é a partir dessas considerações que os posicionamentos dos dois eixos de países vão entrar em choque, o que será explanado no decorrer deste trabalho. Porém, seja como for, é importante, até para a compreensão do debate acerca dos alimentos transgênicos, que não se descure da própria conceituação dos organismos geneticamente modificados, bem como de seus eventuais benefícios e riscos, o que passaremos a fazer em seguida.
2 Organismos geneticamente modificados e transgênicos
No Brasil a tarefa de definir o que é um organismo geneticamente modificado não foi deixada para a doutrina, já que o legislador nacional, desde a Lei 8.974/95, incumbiu-se de tal mister.
Na Lei 8.974/95, antiga Lei de Biossegurança, a definição de organismo geneticamente modificado estava expressa em seu art. 3º, inciso IV, que considerava como tal o “organismo cujo material genético (ADN/ARN) tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética”.
Ademais, o parágrafo único do artigo supramencionado não considerava como OGM aqueles resultantes de técnicas que implicassem a introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvessem a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, tais como: fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliploide e qualquer outro processo natural.
A Lei 11.105/2005, que revogou a Lei 8.974/95, também optou pela definição dos organismos geneticamente modificados, o que é feito em seu art. 3º, inciso V, que considera OGM como “o organismo cujo material genético – ADN/ARN – tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética”. E a referida lei, tal qual sua predecessora, excepcionou da categoria de OGM aqueles resultantes de técnicas que impliquem a introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, inclusive fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliploide e qualquer outro processo natural.
Outrossim, a Lei 11.105/2005 também excluiu da categoria de derivado de OGM, conforme disposição do art. 3º, § 2º, “a substância pura, quimicamente definida, obtida por meio de processos biológicos e que não contenha OGM, proteína heteróloga ou ADN recombinante”.
Pois bem, diante dos enunciados da Lei de Biossegurança, torna-se evidente que sua aplicação está restrita às modificações genéticas causadas pela intervenção humana em laboratório. Dessa forma, processos naturais de mutação, ou métodos tradicionais de cultivo, como os conhecidos “enxertos” no cultivo de vegetais, não podem ser tidos como OGM, exceto quando a transformação se der com o auxílio de um OGM.(14)
Seja como for, nossa legislação não foi além dos organismos geneticamente modificados, ou melhor, nada mencionou acerca dos transgênicos, que muitas vezes são tratados simplesmente como sinônimos de OGMs.
Os transgênicos, entretanto, não são sinônimos de OGMs, pois, em realidade, os transgênicos são espécies de OGMs, uma vez que, “além de serem organismos cujo material genético tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia, envolvem a transferência de material genético de uma espécie para outra”.(15) Assim sendo, quando utilizamos a expressão transgênicos, não podemos nos esquecer de que ela pressupõe a transferência de material genético de uma espécie para outra.
Da mesma forma, no âmbito da União Europeia, também encontramos uma definição da legislação. Realmente, a Diretiva 2001/18/CE entende como organismo geneticamente modificado, conforme dispõe seu art. 2º, “qualquer organismo, com exceção do ser humano, cujo material genético tenha sido modificado de uma forma que não ocorre naturalmente por meio de cruzamentos e/ou de recombinação natural”. E a definição de OGM trazida pela Diretiva 2001/18/CE também foi adotada pelo Regulamento 1829/2003, o qual trata dos gêneros alimentícios e dos alimentos para animais geneticamente modificados.(16)
Dessarte, da comparação entre as duas legislações, pode-se constatar a proximidade entre os conceitos adotados, bem como a ausência de uma definição ou de um tratamento específico para os transgênicos, valendo, por conseguinte, as disposições relativas aos OGMs. Porém, as semelhanças entre o tratamento brasileiro e o da União Europeia, como veremos mais adiante, vão muito além das definições.
3 Argumentos favoráveis e contrários ao consumo de OGMs
O tema do consumo de OGMs é bastante polêmico, existindo argumentos muito convincentes tanto a seu favor como contrários. De qualquer forma, o certo é que a engenharia genética ainda está dando seus primeiros passos, o que torna ainda mais difícil uma tomada de posição. Todavia, isso não impede a abertura de espaço para um amplo debate em relação às vantagens e aos riscos que envolvem os alimentos transgênicos.
De acordo com a indústria da biotecnologia, os OGMs representam uma segura e natural extensão dos métodos tradicionais de cruzamento para a obtenção de novas variedades de culturas e animais. Assim, como a humanidade selecionou e manipulou plantas e animais durante milênios, essa nova tecnologia seria simplesmente um estágio ulterior de tal processo.(17)
E, ao lado dessa forma natural de encarar a engenharia genética, seus defensores apresentam vários argumentos favoráveis à sua utilização. Iniciamos com aquele relacionado ao fim da fome no mundo, ou seja, os alimentos transgênicos seriam a solução para a fome do mundo, uma vez que sua produção é maior e mais barata que a dos alimentos convencionais, além de utilizarem menos defensivos agrícolas e serem dotados de maior resistência e durabilidade.(18) Todavia, parece-nos que o problema da fome está mais ligado à distribuição de renda e de alimentos, mesmo porque, como é sabido, uma grande quantidade de alimentos é desperdiçada diariamente por nações ricas e industrializadas.
No que toca aos riscos, asseveram os defensores dos transgênicos que, mesmo depois de vários anos de utilização, nada teria sido confirmado. Ponderam, ainda, que tais produtos já trazem grandes benefícios para a agricultura e para o meio ambiente, tomando como exemplo as plantas resistentes a pragas, que reduzem o uso de defensivos agrícolas e contribuem para a diminuição da poluição.(19)
Outra vantagem dos transgênicos seria a possibilidade de produzir alimentos mais nutritivos, mais saborosos e até alimentos que serviriam como remédio(20) ou vacina.(21) Ainda, a essa lista de vantagens, acrescentam Philippe Kourilsky e Geneviève Viney a possibilidade de a transgenia eliminar certas alergias alimentares, como a que ocorre em relação ao arroz(22).
Por outro lado, entre os argumentos contrários, encontramos os riscos econômico-sociais, os riscos ambientais e os riscos à saúde humana.
Há riscos econômico-sociais para os pequenos agricultores, que não terão acesso às vantagens proporcionadas pelas avançadas tecnologias desenvolvidas pelas empresas multinacionais e colocadas à disposição das grandes empresas rurais. Consequentemente, os pequenos agricultores seriam levados à ruína, o que geraria desemprego no campo.
Nesse ponto, é igualmente relevante o problema econômico gerado pelas patentes, já que, como é sabido, as linhagens transgênicas são protegidas por direitos intelectuais, sendo devido o pagamento de vultosas quantias pela sua utilização.
Outrossim, muitas vezes as grandes empresas produtoras de transgênicos acabam proibindo os agricultores de produzirem suas próprias sementes para o próximo plantio, obrigando-os a comprar novamente as sementes e pagar os direitos intelectuais relacionados ao seu uso.(23)
Tudo isso demonstra que a capacidade de modificar geneticamente as plantas pode ser utilizada como um instrumento de dominação econômica do mercado agrícola,(24) o que parece estar ocorrendo, por exemplo, no Brasil, onde a empresa Monsanto tem sido alvo de acusações e ações judiciais de produtores rurais, que alegam que a multinacional tem cobrado ilegalmente royalties e restringido a produção de sementes convencionais.
Outro problema econômico está ligado à impossibilidade de identificação de OGMs em produtos importados, o que impediria o consumidor de optar pelo consumo de produtos convencionais ou transgênicos.
Em relação ao meio ambiente, argumenta-se que as espécies transgênicas poderiam levar à redução da variabilidade genética. Realmente, devido à resistência dos transgênicos aos defensivos agrícolas, espécies nativas não resistentes aos poderosos agrotóxicos acabariam sendo destruídas.(25)
Ademais, o aumento na utilização de agrotóxicos poderia conduzir ao surgimento de pragas mais resistentes, ou mesmo a uma reviravolta ecológica, o que já ocorreu na China, onde a utilização de uma variedade de algodão transgênico permitiu o controle de lagartas que ameaçavam as plantações, mas um percevejo outrora inofensivo virou praga.(26)
Isso indica a existência de consideráveis riscos de alteração do ecossistema, já que não se sabe o que ocorrerá com a introdução de uma nova espécie no ecossistema, que certamente estabelecerá novas cadeias biológicas de sobrevivência e de multiplicação das espécies naturais.(27) Aliás, o problema é detectado não somente com espécies transgênicas, mas também nos casos de introdução de uma espécie proveniente de ecossistema diverso, como ocorreu com a introdução do coelho na Austrália, que se tornou uma verdadeira praga.
A polinização cruzada é outro ponto discutido, já que é possível a contaminação de espécies não transgênicas devido à proximidade de plantas transgênicas.(28) E a contaminação também poderia se dar em espécies animais.
No que diz respeito à saúde humana, não é possível determinar quais são os riscos exatos a que estarão sujeitos os consumidores de alimentos geneticamente modificados; no entanto, já foram detectados problemas relacionados ao aumento de alergias,(29) à resistência bacteriana a antibióticos, à potencialização dos efeitos de substâncias tóxicas,(30) ao aumento de resíduos de agrotóxicos nos alimentos, rios e solos.(31)
E todos esses problemas estão ligados ao fato de que os genes e as respectivas proteínas de um organismo evoluíram de modo a trabalhar, nesse organismo, em conjunto. Dessa forma, o gene e a respectiva proteína de um animal, quando introduzidos em outro organismo, como um vegetal, podem não trabalhar como no organismo original, ocasionando efeitos colaterais, tais como toxinas, alergias e alterações em valores nutricionais.(32)
Todavia, isso não significa que a engenharia genética deve ser considerada perigosa tão somente por se tratar de um método artificial. Na verdade, como mencionado, os potenciais riscos da engenharia genética, que devem ser muito bem ponderados, estão ligados ao fato de que não sabemos como um gene e uma proteína, que atuam há milhões de anos em conjunto em um organismo, se comportarão quando introduzidas em outro organismo.(33)
Por conseguinte, diante dos potenciais riscos apresentados pelos OGMs, muitas nações aplicam ao tema o princípio da precaução, pois, como muito bem pondera Teresa Ancona Lopez, “não há solução para esse debate e somente daqui a muitos anos é que saberemos quem estava com a razão”.(34)
4 O princípio da precaução no Brasil e na União Europeia
O princípio da precaução foi introduzido há muito pouco tempo no direito, encontrando espaço inicialmente no direito ambiental. Em debates internacionais, podemos constatar sua presença desde a “Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano”, realizada no ano de 1972, em Estocolmo.(35) A partir daí, muitos outros diplomas internacionais albergaram o princípio da precaução entre seus postulados.(36)
No que diz respeito mais especificamente aos organismos geneticamente modificados, é relevante lembrarmos que o princípio foi consagrado, em 1992, pela Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92), que dispõe em seu princípio 15:
“Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.”
Daí em diante o princípio começou a ser aplicado também em outros ramos do direito, buscando-se a proteção da incolumidade física e da saúde dos indivíduos, no que está compreendida a segurança alimentar.(37) Aliás, como advertem Philippe Kourilsky e Geneviève Viney, o campo de aplicação da precaução é extremamente vasto, ultrapassando os três setores normalmente identificados (saúde, alimentação e meio ambiente) para cobrir outros domínios, como aquele das liberdades públicas.(38)
De acordo com Teresa Ancona Lopes, o princípio da precaução
“é aquele que trata das diretrizes e dos valores do sistema de antecipação de riscos hipotéticos, coletivos ou individuais, que estão a ameaçar a sociedade ou seus membros com danos graves e irreversíveis e sobre os quais não há certeza científica; esse princípio exige a tomada de medidas drásticas e eficazes com o fito de antecipar o risco suposto e possível, mesmo diante da incerteza.”(39)
Assim, no princípio da precaução estamos diante de riscos potenciais, havendo incerteza quanto à superveniência de um prejuízo, justamente o caso dos alimentos geneticamente modificados, que representam forte probabilidade de prejuízos aos seus consumidores, bem como ao meio ambiente. E nesse ponto o princípio da precaução se diferencia do princípio da prevenção, já que neste os riscos não são potenciais, mas sim constatados.(40)
No Brasil, diante dos organismos geneticamente modificados, temos clara aplicação do princípio da precaução, seja sob a ótica do direito ambiental (de que faremos sucinta menção a seguir), seja sob a do direito do consumidor (que veremos mais adiante).
No que toca ao direito ambiental, o princípio da precaução encontra fundamento no art. 225 e parágrafos da Constituição Federal, merecendo destaque os incisos V e VII do § 1º.
A Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), por sua vez, na parte final do caput de seu art. 1º, também determinou expressamente a “observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente”.(41)
Outrossim, pelo fato de o Brasil ser país aderente do Protocolo de Cartagena, igualmente se comprometeu, no âmbito internacional, a cuidar das questões relativas aos OGMs com observância do princípio da precaução.(42)
Na União Europeia também se reconheceu a importância do princípio da precaução, tanto é que tal princípio figura nos tratados de Maastricht, Amsterdã e Nice.(43)
Realmente, o princípio é previsto pelo tratado da Comunidade Europeia como fundamento da política ambiental, tendo sido inserido por modificações trazidas pelo tratado de Maastricht. E, de acordo com a Corte de Justiça, as disposições do tratado que exprimem os objetivos fundamentais e princípios essenciais, como o princípio da precaução, têm valor constitucional.(44)
Além do valor constitucional, o princípio da precaução é visto como um princípio geral do direito comunitário, cuja aplicação não é limitada ao direito ambiental, espraiando seus efeitos a todas as matérias comunitárias de interesse, em particular à tutela da saúde e do consumo.(45)
Outrossim, ao lado das disposições dos tratados, o princípio também foi consagrado pelo art. 7º do Regulamento 178, de 28 de janeiro 2002, editado pela União Europeia como o regime de segurança alimentar a ser observado pelos países membros, senão vejamos:
“Princípio da precaução
1. Nos casos específicos em que, na sequência de uma avaliação das informações disponíveis, se identifique uma possibilidade de efeitos nocivos para a saúde, mas persistam incertezas no âmbito científico, podem ser adotadas as medidas provisórias de gestão dos riscos necessárias para assegurar o elevado nível de proteção da saúde por que se optou na Comunidade, enquanto se aguardam outras informações científicas que permitam uma avaliação mais exaustiva dos riscos.
2. As medidas adotadas com base no nº 1 devem ser proporcionais e não devem impor mais restrições ao comércio do que as necessárias para se alcançar o elevado nível de proteção por que se optou na Comunidade, tendo em conta a viabilidade técnica e econômica e outros fatores considerados legítimos na matéria em questão. Tais medidas devem ser reexaminadas dentro de um prazo razoável, consoante a natureza do risco para a vida ou a saúde e o tipo de informação científica necessária para clarificar a incerteza científica e proceder a uma avaliação mais exaustiva do risco.”
Ademais, também vamos encontrar o princípio da precaução nas disposições da Diretiva 2001/18/CE, o que, mais uma vez, mostra sua importância na legislação da União Europeia.
Porém, não se trata apenas de previsão normativa, a União Europeia, por diversas vezes, já colocou em prática o princípio em exame, bastando recordar a atuação da comunidade diante da encefalopatia espongiforme bovina, vulgarmente conhecida como doença da vaca louca; dos produtos cosméticos; e das carnes com hormônio.(46)
No caso da encefalopatia espongiforme bovina, por exemplo, a Decisão 96/239/CE determinou, como medida de urgência, que fosse proibido o envio de animais vivos e de carne bovina e seus derivados do Reino Unido para outro membro da União Europeia. O Reino Unido recorreu à Corte Europeia, a qual decidiu que, quando a existência e a extensão dos riscos para a saúde humana são incertos, as medidas protetivas não devem esperar pela existência e pela clara comprovação desses riscos.(47)
Portanto, a União Europeia, com base no princípio da precaução, a fim de garantir a proteção de bens fundamentais como a saúde ou o meio ambiente, tem adotado medidas de cautela, incluindo aí as situações de incerteza científica, em que o risco é apenas hipotético, não demonstrado cientificamente.(48)
Entretanto, o mesmo caminho trilhado pelo direito pátrio e pelo europeu não vem sendo seguido pelos Estados Unidos, onde foi adotado o princípio da equivalência substancial.
5 Os princípios da precaução e da equivalência substancial: conflito ou complemento?
Realmente, nos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA), em 1990, fixou, como sendo essencial na segurança de produtos transgênicos, o cotejo com produtos similares dotados de padrão de segurança aceitável.(49)
Esse também é o posicionamento da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), sendo certo que o conceito de equivalência substancial surgiu no ano de 1993, em uma publicação da OCDE.(50)
Pelo princípio da equivalência substancial, objetiva-se concluir que um alimento geneticamente modificado é tão seguro quanto seu análogo sem modificação genética, o qual já possui um histórico de uso seguro. A avaliação é comparativa, identificando-se, por conseguinte, as semelhanças e diferenças entre os alimentos convencionais e os geneticamente modificados.(51)
Dessa forma, após o estudo de equivalência substancial, o produtor pode obter permissão do FDA para liberar o alimento geneticamente modificado para consumo nos Estados Unidos, sem necessidade de rotulação. Considera-se a equivalência substancial suficiente, dada a incapacidade de se comprovarem os efeitos negativos do consumo de determinado produto para a saúde humana, favorecendo-se o produtor do “benefício da dúvida”.(52)
Ocorre que, em um primeiro momento, o termo sugeria que dois alimentos eram equivalentes em todas as características que revestiam interesse para o consumidor, ou seja, segurança, valor nutritivo e composição. Entretanto, hodiernamente, os pesquisadores comparam somente algumas características dos alimentos modificados com aquelas dos alimentos naturais.(53)
De tal arte, se as características levadas em consideração não resultarem muito diversas entre os dois tipos de alimentos, então simplesmente se conclui que o alimento geneticamente modificado é substancialmente equivalente ao correspondente não modificado.(54)
Sobre o tema, Nutti e Watanabe tecem críticas muito pertinentes:
“O fato de um alimento geneticamente modificado ser substancialmente equivalente ao análogo convencional não significa que seja seguro, nem elimina a necessidade de se conduzir uma avaliação rigorosa para garantir a segurança antes que sua comercialização seja permitida. Por outro lado, a não constatação da ES [equivalência substancial] não significa que o alimento geneticamente modificado não seja seguro, mas que há a necessidade de se proverem dados de maneira extensiva, que demonstrem sua segurança .”(55)
Daí, pode-se afirmar que a equivalência substancial não é a solução para o problema da detecção dos riscos dos OGMs, mas sim apenas mais um critério que pode auxiliar na identificação dos riscos relacionados ao consumo de referidos produtos,(56) mesmo porque, como visto, para a aferição da equivalência substancial podem ser levadas em conta apenas algumas características dos produtos.
Na verdade, o que há não é uma disputa entre princípios jurídicos, mas sim uma disputa entre interesses econômicos e políticos, a qual acaba refletindo na adoção dos princípios jurídicos relativos à produção e ao consumo de alimentos transgênicos.
Consequentemente, os países favoráveis aos transgênicos, guiados pelo interesse de transnacionais detentoras de tecnologia, como é o caso dos Estados Unidos, seguem o princípio da equivalência substancial, enquanto os países contrários à liberação, como aqueles pertencentes à União Europeia, adotam o princípio da precaução.
Seja como for, deixando-se de lado o conflito supramencionado, deve ficar claro que a aplicação do princípio da precaução aos OGMs “não significa que a indústria deva apresentar provas absolutas e incontestáveis de que os transgênicos são perfeitamente seguros”. Na verdade, o que deve ser demonstrado é que, “diante das pesquisas e dos testes possíveis de serem efetivados, dentro de prazo razoável e necessário para se ultimarem esses estudos científicos, os transgênicos se apresentam como”(57) não agressores do meio ambiente e seguros para o consumo humano.
Assim sendo, fica evidente que, na matéria em estudo, é fundamental o gerenciamento de riscos, mesmo porque o risco zero é uma utopia, “pois sempre haverá um risco residual, que ainda é risco, que deve ser suportado pela coletividade ou pelos indivíduos”.(58)
Em última instância, “deve haver uma ponderação entre a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de um lado, e o princípio da precaução, de outro”,(59) devendo prevalecer, a nosso ver, o que melhor preservar a dignidade da pessoa humana. Por conseguinte, concluímos que os princípios da precaução e da equivalência substancial deveriam ser vistos como complementares, já que tal posicionamento leva exatamente à melhor preservação da dignidade da pessoa humana.
6 A necessidade de rotulação dos produtos transgênicos
No Brasil, a Constituição Federal reconheceu a defesa do consumidor entre os direitos fundamentais (art. 5º, XXXII, CF), incluindo-a, igualmente, entre os princípios gerais a serem observados pela atividade econômica (art. 170, V, CF). Em cumprimento aos ditames constitucionais, foi editado o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), o qual definiu princípios e estabeleceu os direitos básicos dos consumidores.
No Código de Defesa do Consumidor, foram fixados os objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo. Entre eles, no tocante aos organismos geneticamente modificados, podemos relacionar o respeito à dignidade, à saúde e à segurança do consumidor, bem como a observância de transparência nas relações de consumo (art. 4º, caput, CDC).
Já entre os direitos básicos do consumidor, devemos aqui arrolar a proteção da vida, da saúde e da segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos, a educação e a divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, assegurada a liberdade de escolha, bem como o direito à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços (art. 6º, I, II e III, CDC).
Com isso, diante da legislação de proteção do consumidor, fica evidente que os alimentos que contenham ou sejam produzidos a partir de OGMs devem ser devidamente rotulados e rastreados, garantindo-se ao consumidor seu direito à informação,(60) à liberdade de escolha e à hipotética proteção de sua vida, sua saúde e sua segurança.
Ademais, a exigência de rotulação e rastreamento também está em consonância com o disposto nos artigos 8°, 9°, 10, 31 e 66 do Código de Defesa do Consumidor.
E, reforçando as disposições do Código de Defesa do Consumidor, a Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005) dispôs em seu art. 40 que os “alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter a informação nesse sentido em seus rótulos, conforme regulamento”.
Assim, para dar cumprimento ao disposto na Lei de Biossegurança, foi editado o Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003, o qual determinou, em seu artigo 2º, que, na
“comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, com a presença acima do limite de um por cento do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica desse produto.”
Além disso, tanto nos produtos embalados como nos vendidos a granel ou in natura, prevê o § 1º do artigo 2º do Decreto 4.680/03 que
“o rótulo da embalagem ou do recipiente em que estão contidos deverá constar, em destaque, no painel principal e em conjunto com o símbolo a ser definido mediante ato do Ministério da Justiça, uma das seguintes expressões, dependendo do caso: ‘(nome do produto) transgênico’, ‘contém (nome do ingrediente ou ingredientes) transgênico(s)’ ou ‘produto produzido a partir de (nome do produto) transgênico’.”
Também deverá ser informada ao consumidor, conforme o § 2º do mesmo artigo, a espécie doadora do gene, o que deverá ser feito no local reservado para identificação dos ingredientes.
Outrossim, pela regra, para facilitar a visualização do consumidor, o rótulo deve conter ainda o símbolo que indica a presença de transgênico. Em conformidade com o estabelecido pela Portaria 2.658, de 22 de dezembro de 2003, do Ministério da Justiça, o símbolo consiste em um triângulo com a letra “T” em seu interior, sendo suas bordas e a letra na cor preta e o seu fundo interno na cor amarela.
Em caso de animais alimentados com ração contendo ingredientes transgênicos, o artigo 3º do Decreto 4.680 dispõe que os alimentos e ingredientes produzidos a partir desses animais deverão “trazer no painel principal, em tamanho e destaque previstos no art. 2º, a seguinte expressão: ‘(nome do animal) alimentado com ração contendo ingrediente transgênico’ ou ‘(nome do ingrediente) produzido a partir de animal alimentado com ração contendo ingrediente transgênico’”.
Ainda, nossa legislação faculta a rotulagem indicativa da ausência de transgênicos para os alimentos e ingredientes que não contenham nem sejam produzidos a partir de OGMs,(61) desde que tenham similares transgênicos no mercado brasileiro.
Pois bem, dessas disposições fica claro que o Brasil adotou um sistema de rotulação bastante abrangente para os organismos geneticamente modificados, similar ao sistema europeu. E, para além da abrangência, poderíamos até falar em uma certa agressividade da rotulação, visto que o símbolo adotado pelo Ministério da Justiça, expressamente proibido na Europa, é capaz de induzir o consumidor leigo “a acreditar que se trata de algo venenoso ou extremamente prejudicial à sua saúde”.(62)
Exatamente por isso é que existem iniciativas de congressistas no sentido de se modificar a legislação que cuida da rotulagem, o que passaremos a ver no próximo tópico.
7 Propostas de alteração das regras de rotulação no Brasil
De fato, tanto na Câmara dos Deputados como no Senado tramitam projetos que objetivam alterar as regras da rotulação.
O Projeto de Decreto Legislativo 90/2007, de autoria da senadora Kátia Abreu, propõe a alteração do atual Decreto de Rotulagem para tornar inexigível a inserção do símbolo "T" e a rotulagem dos alimentos e ingredientes produzidos a partir de animais alimentados com rações contendo ingredientes transgênicos.(63)
Já o Projeto de Lei 4.148/2008, de autoria do deputado federal Luiz Carlos Heinze, pretende alterar o art. 40 da Lei de Biossegurança, propondo as mesmas alterações da senadora Kátia Abreu, bem como exigindo a rotulação de alimentos somente nos casos de presença superior a 1% de OGMs na composição final, a qual será detectada em análise específica.
Com isso, somente será necessária a rotulação quando for detectável a presença de OGM no produto final. Dessa forma, se eventualmente forem aprovados, em especial o segundo projeto, teremos como resultado a mudança de paradigma da legislação, que passará do critério da rastreabilidade, também adotado na União Europeia, para o critério da detectabilidade.
Por conseguinte, com a alteração do critério, ficará mais fácil a fuga da rotulagem, bastando aos fabricantes a destinação dos grãos transgênicos a alimentos altamente processados (como óleos) e a ração animal, impedindo a detecção de OGMs nos testes laboratoriais.
Por isso, muitos defensores dos consumidores entendem que essas propostas afrontam o interesse público, contrariando as disposições do Código de Defesa do Consumidor, do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança,(64) bem como as decisões judiciais reconhecendo e exigindo a informação nos rótulos, mesmo que abaixo de 1% de ingredientes transgênicos.(65)
Daí se percebe que atualmente o maior debate no que toca aos transgênicos está relacionado à delimitação do percentual de OGMs existente nos alimentos disponíveis aos consumidores.(66) E, não obstante o alinhamento de nossa legislação às disposições de muitas nações desenvolvidas, parece-nos que não se pode negar ao consumidor o direito de obter as informações sobre o produto que vai consumir, especialmente se estamos lidando com produtos que contenham elementos geneticamente modificados.
Portanto, sob pena de se estar desrespeitando direitos do consumidor, acreditamos que o correto é a rotulagem do produto transgênico, independentemente do percentual de transgenia nele encontrado, pois somente assim a escolha do consumidor irá refletir precisamente sua vontade, o que nos leva a concluir que não deveria existir o patamar de 1% previsto no Decreto 4.680/03.
8 A rotulação e o direito à informação na União Europeia
Apesar da inegável necessidade, já que o comércio internacional de transgênicos está em ampla expansão, ainda não há consenso internacional no que diz respeito às regras para rotulagem desses produtos. Seja como for, é certo que as normas de rotulagem são adotadas por uma ampla gama de países.(67)
A União Europeia, diferentemente do Estados Unidos, determina que os gêneros alimentícios transgênicos sejam rotulados, independentemente de sua equivalência substancial, aplicando, dessa forma, como já mencionado, o princípio da precaução.(68)
Na visão da União Europeia, a justificação para a rotulagem está não somente na gestão de riscos derivados da incerteza, mas também na observância dos direitos do consumidor à informação e à escolha.(69)
Esse posicionamento acabou sendo construído durante a crise gerada pela encefalopatia espongiforme bovina, quando os estados-membros e os cidadãos europeus colocaram em discussão a capacidade da União Europeia de proteger a saúde da população.(70)
Assim, diante da necessidade de restabelecer a confiança dos cidadãos nas instituições, partiu-se para um ambicioso projeto de regulamentação do sistema agroalimentar, de maneira que a segurança alimentar teve seu conteúdo alterado e os direitos dos consumidores se ampliaram.(71)
Foram garantidos, por conseguinte, ao lado do direito à saúde, os direitos à informação e à escolha, os quais não encontravam tutela em nível global (OMC) ou em algum acordo multilateral.(72)
Nesse contexto, encontrou espaço a Diretiva 2001/18/CE, que substituiu a Diretiva 90/220/CE e regulamentou a colocação de OGMs no mercado, impondo não só a autorização inicial, baseada na valoração dos riscos relacionados ao meio ambiente e à saúde do consumidor, mas também o monitoramento dos efeitos pós-introdução no mercado, a necessidade de rotulação e a aplicação de procedimentos para o rastreamento.(73)
Outrossim, a normatização europeia exige o amplo rastreamento e a rotulação do produto, ainda que em sua composição final não haja nenhum vestígio de OGM, o que certamente encarece os custos de sua produção.
E essas exigências ficam bem evidentes no Regulamento 1830/2003/CE,(74) que expressamente exige rastreamento e rotulagem de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM, demonstrando a preocupação da União Europeia com toda a cadeia produtiva.(75)
Na verdade, deve-se compreender a lógica do sistema europeu, uma vez que o rastreamento é uma condição para a correta rotulação, de maneira que uma confiável e correta etiquetagem somente será possível se existir um sistema que acompanhe toda a cadeia produtiva.(76)
Entretanto, a rotulagem não se aplica aos vestígios de OGM presentes em produtos numa proporção não superior a 0,9%, desde que a presença seja acidental ou tecnicamente inevitável.(77)
E o rigorismo da regulamentação da União Europeia levou os Estados Unidos, o Canadá e a Argentina a discutirem tais regras na OMC, onde foi alegado que as medidas da União Europeia constituíam barreira regulatória ao acesso ao mercado.
Todavia, o recurso à OMC direcionava-se basicamente às regras de rotulagem, visto que países como os Estados Unidos, que utilizam em larga escala as técnicas de engenharia genética, possuem sistemas de rotulação facultativa, a qual somente se torna necessária, no caso dos Estados Unidos, “quando não houver para o produto transgênico um convencional análogo que se ajuste ao princípio da equivalência substancial”.(78)
De qualquer forma, como assevera Teresa Ancona Lopes, “a formulação de consulta à OMC deixa claro que existe uma interface de conflito entre o desenvolvimento do comércio internacional e a efetivação de instrumentos internacionais de defesa do meio ambiente, mais especificamente o Protocolo de Cartagena sobre Biodiversidade”.(79) E acrescentaríamos também o conflito atinente aos direitos à saúde, à informação e à escolha do consumidor.
9 A rotulação e o direito à informação na Alemanha
Na Alemanha, a adequação da legislação de regulação da engenharia genética à Diretiva 2001/18/CE não se deu de uma só vez, mas sim de forma parcelada, com sucessivas alterações da legislação.(80)
As sucessivas alterações legislativas colocaram em evidência as medidas de proteção do ser humano e do meio ambiente, a liberdade de escolha dos agricultores e dos consumidores, bem como a garantia de coexistência de diferentes formas de administração no âmbito do desenvolvimento e utilização da engenharia genética.(81)
No âmbito da liberdade de escolha dos consumidores, a legislação alemã, além de consagrar a rotulagem dos transgênicos, também ofereceu a possibilidade de se indicar que um gênero alimentício foi produzido sem engenharia genética, o que é feito pela rotulagem “ohne Gentechnik”. Essa nova possibilidade está valendo desde maio de 2008, com a entrada em vigor de novas disposições legais.(82)
No que toca aos gêneros alimentícios como carne, leite e ovos, a rotulagem “sem engenharia genética” pode ser utilizada quando a alimentação do animal não inclui plantas geneticamente modificadas, porém, isso não vale para toda a vida do animal, mas somente para um determinado período antes do abate. Também são permitidas as rações produzidas com auxílio de OGMs. Já para os gêneros alimentícios chamados de BIO (“Bio-Lebensmitteln”), a utilização de OGMs é proibida.(83)
Ao contrário do que ocorre no Brasil, na Alemanha não é permitida a utilização de um logotipo ou símbolo chamativo sobre alimentos com OGMs. Assim, caso os alimentos contenham uma lista de ingredientes, o texto indicativo da transgenia deve complementar a lista de ingredientes, sendo certo que o § 17b da Lei para Regulação da Engenharia Genética (“Gesetz zur Regelung der Gentechnik – Gentechnikgesetz – GenTG”) traz a seguinte expressão indicativa: “este produto contém organismos geneticamente modificados” (“Dieses Produkt enthält genetisch veränderte Organismen”). Caso o produto não contenha uma lista de ingredientes, o texto de rotulagem deve ser indicado visivelmente.
Os produtos vendidos a granel ou sem embalagem também não escapam da legislação alemã, que determina a aposição de uma placa diretamente sobre a mercadoria. O mesmo vale para restaurantes e lanchonetes, com exceção dos “restaurantes comunitários”.
Por outro lado, considerando que muitos gêneros alimentícios são produzidos sem a exclusão de OGMs, prevê a legislação alemã que em certos produtos, como soja, possa existir uma determinada parte de OGMs. E isso ocorre normalmente em caso de importação de países como Estados Unidos, Argentina e, em parte, Brasil, onde os OGMs não são separados das plantas convencionais. Com isso, para derivados de soja e milho, é sempre obrigatório o indicativo, se for comprovada existência de OGMs como matéria-prima, independentemente do percentual.(84)
10 O papel do Judiciário no cumprimento da legislação
A legislação que estabelece a rotulagem dos produtos transgênicos demorou alguns anos para começar a ser cumprida, o que somente foi possível após decisões judiciais que obrigaram as empresas produtoras de transgênicos a respeitar o direito do consumidor à informação.
Assim sendo, considerando a importância das decisões judiciais no que toca ao cumprimento da legislação em questão, selecionamos alguns julgados, que passaremos a relatar brevemente.
O primeiro processo selecionado tramitou na 3ª Vara Federal de Teresina/PI. Trata-se da ação civil pública nº 2007.40.00.000471-6, proposta pelo Ministério Público Federal contra a União e a empresa Bunge Alimentos, objetivando assegurar ao consumidor seu direito à informação, consistente na rotulagem de produtos alimentícios transgênicos.
Na decisão sobre o pedido de antecipação de tutela, proferida em abril de 2007, o juiz federal Régis de Souza Araújo considerou ilegal o art. 2º do Decreto 4.680/2003, por limitar a obrigatoriedade da informação da presença de transgênicos nos rótulos dos produtos que tivessem até 1% de OGM em sua composição. Na ocasião, foi determinado que a União, por meio de seus órgãos de fiscalização e controle, passasse a exigir que, na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, conste informação clara ao consumidor no rótulo ou embalagem do produto, independentemente do percentual de organismos geneticamente modificados existente. Determinou-se, ainda, que a Bunge Alimentos S.A. adotasse os procedimentos necessários ao cumprimento da decisão.
O Ministério Público Federal argumentou que a Lei da Biossegurança (Lei 11.105/2005), que trata da segurança e da fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados, obriga a rotulagem de todos os produtos transgênicos e seus derivados. Assim, considerando a existência de lei, o disposto no art. 2º do Decreto 4.680/2003, que dispensou de tal obrigação os produtos que tivessem até 1% de OGM em sua composição, seria ilegal. O parquet aduziu ainda que tal limitação representa ofensa à Constituição Federal e ao Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a informação ao consumidor deve ser clara o suficiente para que possa decidir quanto à compra e à ingestão de produtos transgênicos.
A União contestou a ação, alegando vigência, no Brasil, do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, celebrado no ano 2000, que somente obriga a informação no rótulo de alimentos que tenham pelo menos 1% do seu conteúdo geneticamente alterado. Ainda, asseverou que os procedimentos em vigor no Brasil são equivalentes aos da União Europeia e mais rigorosos que os adotados no Japão e nos Estados Unidos.
A Bunge Alimentos, por sua vez, sustentou não ser exigível a rotulagem de advertência de alimentos que contenham apenas presença irrisória de organismos geneticamente modificados e não haver indícios científicos de que um alimento com percentual ínfimo de componente transgênico possa fazer mal à saúde.
Na sentença de mérito, que confirmou a tutela antecipada anteriormente deferida, o magistrado ressaltou que a ação não questionou os benefícios ou os riscos da comercialização de produtos com OGMs, nem os limites de sua tolerância à saúde humana, deixando claro que “a celeuma trata exclusivamente do direito de informação ao consumidor, que, inquestionavelmente, deve ser comunicado acerca do conteúdo dos produtos que adquire, para, a partir de então, individualmente, decidir se quer adquiri-lo ou não, independentemente dos percentuais de sua composição, ainda que seja ínfima a presença de OGMs”. Outrossim, lembrou que a Constituição Federal estabeleceu ser dever do Estado “promover, na forma da lei, a defesa do consumidor” e que o Código de Defesa do Consumidor arrolou como direito básico do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. Ademais, esclareceu que, “havendo a presença de organismo geneticamente modificado, tal informação não deve ser omitida ao consumidor, em obediência aos ditames constitucionais e à legislação consumerista, devendo ser afastada a aplicação do art. 2º, caput, do Decreto 4.680/03”. Por fim, afirmou que a Lei da Biossegurança não fez qualquer limitação à necessidade de rotulagem dos produtos que contenham OGM, tampouco abriu margem para que o regulamento o fizesse.
Em outra ação civil pública (583.00.2007.218.243-0), o Ministério Público de São Paulo questionou a conduta das empresas Bunge e Cargill, as duas maiores fabricantes de óleo de soja do país, que não estariam rotulando seus produtos.
O juiz da 3ª Vara Cível da Capital concedeu tutela antecipada para que as duas empresas rotulassem seus produtos, respectivamente, os óleos Soya e Liza, adequando-os à legislação federal no prazo de 30 dias.
As empresas agravaram da decisão que concedeu a tutela antecipada (646.799-4/0-00 e 646.797-4/1-00), sendo que o Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento aos recursos, reformando a decisão que concedeu a tutela antecipada. De acordo com o Tribunal de Justiça, o juiz concedeu tutela antecipada sem que fosse requerida pelo Ministério Público, bem como decidiu sem que fosse demonstrada a verossimilhança da alegação, indispensável à concessão de tutela antecipada.
Aliás, ações discutindo a rotulagem vêm sendo propostas no mundo inteiro, sendo certo que na Alemanha a Corte Constitucional (Bundesverfassungsgericht) também já se manifestou sobre o tema, estabelecendo que o leite de vacas que foram alimentadas com alimentos transgênicos deve ser denominado como “Gen-Milch”.(85)
Todavia, não obstante os esforços da sociedade e as decisões judiciais, parece-nos que a legislação não vem sendo devidamente respeitada no Brasil. E, para que se chegue a essa conclusão, não é necessário nenhum tipo de exame avançado em produtos supostamente transgênicos, basta uma mera análise dos rótulos dos produtos expostos nas prateleiras dos supermercados brasileiros, o que é suficiente para constatarmos que raríssimos são os casos de produtos em que há informação acerca da transgenia. Dessarte, ou as empresas vêm cumprindo à risca a legislação brasileira e tão somente não estão colocando à venda produtos transgênicos, ou os consumidores estão sendo desrespeitados.
Considerações finais
Diante do que foi exposto, entendemos que o mais importante no que diz respeito à questão dos produtos transgênicos não é nos postarmos a favor ou contra, mas sim, considerando os riscos que esses produtos podem representar ao consumidor e ao meio ambiente, devemos exigir o respeito à dignidade da pessoa humana, bem como o cumprimento e o aperfeiçoamento da legislação consumerista e ambiental, de maneira que:
1) a aplicação do princípio da precaução seja exigida, já que sabemos da existência de riscos, pelo menos hipotéticos, nas atividades que envolvem produtos transgênicos;
2) o direito do consumidor de ser informado amplamente acerca da existência de OGMs nos produtos colocados no mercado seja observado;
3) o direito de opção do consumidor em adquirir ou não produtos transgênicos seja garantido;
4) estudos antes, durante e depois da colocação do produto transgênico no mercado sejam realizados, pois só assim será assegurado o direito à segurança, à saúde e à vida do consumidor;
5) seja afastada a alegação, por parte dos produtores de OGMs, de risco do desenvolvimento, pois, se há dúvida quanto a esses produtos, quem deve assumir a responsabilidade é o gerenciador de riscos, ou seja, o fornecedor;
6) estudos consistentes antes da liberação de OGMs no meio ambiente sejam efetuados, especialmente o Estudo Prévio de Impacto Ambiental;
7) o princípio da equivalência substancial seja adotado apenas como mais um critério para a investigação da segurança dos produtos transgênicos, e não como o critério determinante;
8) a participação ampla da sociedade e dos órgãos do governo nos processos em que se autorize a experimentação ou a liberação de OGMs seja outorgada, especialmente dos Ministérios da Saúde, da Agricultura e do Meio Ambiente.
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Notas
1. A biotecnologia, como ensina Teresa Ancona Lopez, “consiste na utilização de materiais e processos biológicos para a obtenção de produtos úteis aos seres humanos” (LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 213).
2. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. Revista de Direito Privado, São Paulo, n. 38, abr.-jun. 2009, p. 121-122.
3. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 213.
4. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 214.
5. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 122.
6. RASPADORI, Fabio. OGM. Lineamenti della disciplina europea. Perugia: Morlacchi, 2007. p. 21.
7. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 122.
8. RASPADORI, Fabio. OGM. Lineamenti della disciplina europea. p. 21.
9. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 122.
10. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 214.
11. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 122.
12. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 122-123.
13. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 215.
14. SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira. Manual de biodireito. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 147.
15. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 213.
16. Art. 2º, 5, do Regulamento 1829/2003: “Entende-se por ‘organismo geneticamente modificado’ ou ‘OGM’ o organismo geneticamente modificado tal como definido no nº 2 do art 2º da Diretiva 2001/18/CE, excluindo os organismos obtidos por meio das técnicas de modificação genética enumeradas no anexo I B da Diretiva 2001/18/CE”.
17. MARIANI, Marina. Alimenti geneticamente modificati. Milano: Hoepli, 2001. p. 32.
18. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 126.
19. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 126-127.
20. Esse é o objetivo da Universidade de Fortaleza, que pretende, com o uso de linhagens transgênicas de caprinos, a produção de leite “fortificado” com proteínas humanas, o qual seria capaz de combater a diarreia infantil (RIGHETTI, Sabine. Ceará fará leite com proteína humana. Folha de São Paulo, São Paulo, 28.08.2010. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/790369-ceara-fara-leite-com-proteina-humana.shtml> Acesso em: 01 out. 2010).
21. Nesse sentido, José Geraldo Brito Filomeno cita a seguinte notícia, veiculada no jornal Estadão, em novembro de 2001: “Arroz com betacaroteno ou com ferro, e milho com mais proteína. Quem sabe até verduras, legumes e frutas personalizadas para quem tem alergia a um de seus componentes. Não se trata de ficção, mas das possibilidades de aplicação da tecnologia dos transgênicos para a criação de novos alimentos. Melhorar a produção agrícola foi o primeiro objetivo do desenvolvimento dos produtos transgênicos. A segunda fase, que já começou em laboratórios do exterior, vai criar alimentos transgênicos com benefícios nutricionais. A transgenia ainda promete uma terceira fase: a veiculação de vacinas por meio de frutas e vegetais modificados geneticamente” (FILOMENO, José Gerald Brito. Alimentos transgênicos: implicações consumeristas e ambientais. In: CORRÊA, Elidia Aparecida de Andrade; GIACOIA, Gilberto; CONRADO, Marcelo (coord.). Biodireito e dignidade da pessoa humana. Curitiba: Juruá, 2007. p. 172).
23. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 128-129.
24. PINTO, Oriana Piske de Azevedo Magalhães. Clonagem e transgênicos ante os princípios da dignidade da pessoa humana e da precaução no direito ambiental. p. 65.
25. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 130.
27. FILOMENO, José Geraldo Brito. Alimentos transgênicos: implicações consumeristas e ambientais. In: CORRÊA, Elidia Aparecida de Andrade; GIACOIA, Gilberto; CONRADO, Marcelo (coord.). Biodireito e dignidade da pessoa humana. Curitiba: Juruá, 2007. p. 173.
28. Justamente diante de tal problema é que a legislação alemã, em conformidade com as regras de coexistência, estabeleceu a distância mínima de 150 metros entre as margens das lavouras (GOEHL, Susanne Annelie. Gentechnik, Recht und Handel: Genmanipulierte landwirtschaftliche Produkte als Gegenstand des öffentlichen Wirtschaftsrechts. Hamburg: Diplomica, 2009. p. 43).
29. No que diz respeito a alergias, José Geraldo Brito Filomeno cita o seguinte estudo: “Geralmente um alergênico pode ser introduzido num alimento como resultado fortuito da engenharia genética aplicada por alguma outra razão. E um desses casos já foi observado. A empresa ‘Pioneer Seeds’ tem tentando modificar sementes de soja a fim de aumentar sua qualidade como alimento animal. Um dos problemas com a soja como fonte de proteína para animais é que sua casca contém fortes componentes aminoácidos sulfúricos. E, para demonstrar isso, os próprios cientistas da Pioneer transferiram um gene da castanha-do-pará para a soja. Embora a proteína da castanha-do-pará que foi transferida não seja conhecida (ou previamente identificada) como um alergênico, a Pioneer contratou o Dr. Steven Taylor, um especialista em alergias derivadas de alimentos da Universidade de Nebraska, para testar a soja geneticamente modificada. Usando soros de alguns de seus pacientes acometidos de alergia pela ingestão de castanha-do-pará, o Dr. Taylor demonstrou que os soros reagiram fortemente em face da soja modificada, demonstrando que esses pacientes poderiam ter uma reação alérgica à soja se a tivessem consumido. A indústria frequentemente afirma que as suscetibilidades a alergenicidades não constituem problema mais grave porque existem apenas alguns alergênicos. Mas a pesquisa tem demonstrado que, para qualquer alimento, sempre há um percentual da população que lhe é alérgica. Dessa forma, em adição a alergênicos comuns (em termos de número de pessoas que são suscetíveis à sua reação), tais como aqueles presentes em amendoins, sojas, leite, trigo, ostras e ovo, há alergênicos incomuns, como aqueles presentes no aipo, em cenouras, couves, bananas, melancia, morangos, laranjas, temperos etc. Além disso, novos alimentos podem causar alergias. O kiwi só recentemente foi acrescentado à dieta das pessoas nos Estados Unidos, e já se contam alguns casos de alergias pelo seu consumo” (FILOMENO, José Geraldo Brito. Alimentos transgênicos: implicações consumeristas e ambientais. p. 175).
30. E, no que toca às substâncias tóxicas, adverte José Geraldo Brito Filomeno que, da manipulação genética, podem surgir toxinas até mortais, ou então toxinas já existentes naturalmente nos produtos agrícolas podem ser potencializadas (FILOMENO, José Geraldo Brito. Alimentos transgênicos: implicações consumeristas e ambientais. p. 174).
31. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 131.
32. MARIANI, Marina. Alimenti geneticamente modificati. p. 39.
33. MARIANI, Marina. Alimenti geneticamente modificati. p. 38.
34.LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 212.
35. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 97.
36. PINTO, Oriana Piske de Azevedo Magalhães. Clonagem e transgênicos ante os princípios da dignidade da pessoa humana e da precaução no direito ambiental. Boletim Científico da Escola Superior do Ministério Público da União, Brasília, n. 14, jan.-mar. 2005, p. 60.
37. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 99.
39. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 101.
40.LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 101.
41. “Art. 1º Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente”.
42. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 218.
43. FROTA, Mário. Segurança alimentar – imperativo de cidadania. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 44, out.-dez. 2002, p. 73.
44. PRATI, Luca. Il danno ambientale e la bonifica dei siti inquinati. v. 3. Milano: Wolters Kluwer Italia, 2008. p. 61.
45. PRATI, Luca. Il danno ambientale e la bonifica dei siti inquinati. v. 3. p. 61.
46. RASPADORI, Fabio. OGM. Lineamenti della disciplina europea. p. 87-88.
47. GORNY, Dietrich. Grundlagen des europäischen Lebensmittelrechts: Kommentar zur Verordnung (EG) 178/2002. Hamburg: Behr's, 2003. p. 83.
48. PRATI, Luca. Il danno ambientale e la bonifica dei siti inquinati. v. 3. p. 62.
49. VIEIRA, David Laerte. Princípio da precaução versus princípio da equivalência substancial e a polêmica em torno da liberação dos transgênicos no Brasil. Interesse Público, Porto Alegre, v. 9, n. 41, jan.-fev. 2007, p. 112.
50. VIEIRA, David Laerte. Princípio da precaução versus princípio da equivalência substancial e a polêmica em torno da liberação dos transgênicos no Brasil. p. 112.
51. VIEIRA, David Laerte. Princípio da precaução versus princípio da equivalência substancial e a polêmica em torno da liberação dos transgênicos no Brasil. p. 113.
52. VIEIRA, David Laerte. Princípio da precaução versus princípio da equivalência substancial e a polêmica em torno da liberação dos transgênicos no Brasil. p. 113.
53. MARIANI, Marina. Alimenti geneticamente modificati. p. 40.
54. MARIANI, Marina. Alimenti geneticamente modificati. p. 40.
55. WATANABE, Edson; NUTTI, Marilia Regini. Alimentos geneticamente modificados: avaliação de segurança e melhorias de qualidade em desenvolvimento. Revista Brasileira de Milho e Sorgo, América do Norte, v. 1, n. 1, abr. 2010. p. 05. Disponível em: <http://rbms.cnpms.embrapa.br/index.php/ojs/article/view/3> Acesso em: 05 out. 2010.
56. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 127.
57. VIEIRA, David Laerte. Princípio da precaução versus princípio da equivalência substancial e a polêmica em torno da liberação dos transgênicos no Brasil. p. 115.
58. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 31.
59. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 219.
60. Aliás, no que toca à liberdade de escolha, da mesma forma que é garantido ao indivíduo o direito de adotar uma dieta vegetariana ou uma dieta ligada à sua religião, também deve ser outorgado o mesmo direito em relação aos OGMs, ou seja, o indivíduo tem direito a adotar uma dieta livre de OGMs, o que somente pode ser feito se for informado acerca da presença de OGMs nos alimentos que consome (KOURILSKY, Philippe; VINEY, Geneviève.Le principe de précaution: rapport au premier ministre. p. 112).
61.Art. 4º do Decreto 4.680/03: (...) “(nome do produto ou ingrediente) livre de transgênicos” (...).
62. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 221.
63. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 140.
64. O Protocolo de Cartagena está em vigor desde 22.02.2004, tendo sido incorporado ao nosso ordenamento jurídico pelo Decreto 5.705/2006.
65. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 140.
66. GASPARINI, Bruno. Transgenia na agricultura. Curitiba: Juruá, 2009. p. 257.
67. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 141.
68. VIEIRA, David Laerte. Princípio da precaução versus princípio da equivalência substancial e a polêmica em torno da liberação dos transgênicos no Brasil. p. 113.
69. FONTE, Maria. Organismi geneticamente modificati: monopolio e diritti. Milano: FrancoAngeli, 2004. p. 26.
70. FONTE, Maria. Organismi geneticamente modificati: monopolio e diritti. p. 29.
71. FONTE, Maria. Organismi geneticamente modificati: monopolio e diritti. p. 29.
72. FONTE, Maria. Organismi geneticamente modificati: monopolio e diritti. p. 29.
73. FONTE, Maria. Organismi geneticamente modificati: monopolio e diritti. p. 30.
74. Art. 2º do Regulamento 1830/2003/CE: “1. O presente regulamento é aplicável, em todas as fases da colocação no mercado, a: a) produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM, colocados no mercado em conformidade com a legislação comunitária; b) gêneros alimentícios produzidos a partir de OGM, colocados no mercado em conformidade com a legislação comunitária; c) alimentos para animais produzidos a partir de OGM, colocados no mercado em conformidade com a legislação comunitária”.
75. GOEHL, Susanne Annelie. Gentechnik, Recht und Handel: Genmanipulierte landwirtschaftliche Produkte als Gegenstand des öffentlichen Wirtschaftsrechts. p. 45-46.
76. GOEHL, Susanne Annelie. Gentechnik, Recht und Handel: Genmanipulierte landwirtschaftliche Produkte als Gegenstand des öffentlichen Wirtschaftsrechts. p. 46.
77. Art 21 da Diretiva 2001/18/CE: “1. Os Estados-Membros devem tomar todas as medidas necessárias para assegurar que, em todas as fases da colocação no mercado, a rotulagem e a embalagem dos produtos colocados no mercado que contenham ou sejam constituídos por OGM sejam conformes com os requisitos relevantes que constem da autorização por escrito a que é feita referência no nº 3 do artigo 15º, nos nos 5 e 8 do artigo 17º, no nº 2 do artigo 18º e no nº 3 do artigo 19º. 2. Relativamente aos produtos dos quais seja impossível excluir a existência de vestígios de OGM autorizados, fortuita ou tecnicamente inevitável, pode ser fixado um limiar mínimo abaixo do qual esses produtos não têm de ser rotulados em conformidade com o disposto no nº 1. Os limiares devem ser fixados consoante o produto em questão nos termos do nº 2 do artigo 30º. 3. No que respeita aos produtos destinados ao processamento direto, o disposto no nº 1 não é aplicável aos vestígios de OGM autorizados numa proporção não superior a 0,9% ou a limiares mais baixos estabelecidos ao abrigo do nº 2 do artigo 30º, desde que a presença desses vestígios seja acidental ou tecnicamente inevitável”.
78. VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos. p. 142.
79. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. p. 216.
80. GOEHL, Susanne Annelie. Gentechnik, Recht und Handel: Genmanipulierte landwirtschaftliche Produkte als Gegenstand des öffentlichen Wirtschaftsrechts. p. 41-42.
81. GOEHL, Susanne Annelie. Gentechnik, Recht und Handel: Genmanipulierte landwirtschaftliche Produkte als Gegenstand des öffentlichen Wirtschaftsrechts. p. 42.
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