Resumo
O presente estudo pretende inovar na análise do sistema de processo eletrônico de primeiro e segundo graus da Justiça Federal da 4ª Região, denominado e-Proc, procurando lançar novas luzes sobre o enfoque da sustentabilidade, esta vista sob a ótica multidimensional, e não apenas sob o viés ambiental.
O estudo inicia-se demonstrando a firme vocação do TRF-4ª Região para a responsabilidade socioambiental, apresentando um pequeno resumo dos projetos e das ações direcionados à sustentabilidade, assim como o reconhecimento institucional já alcançado.
A seguir o trabalho resume o conceito atual de sustentabilidade a partir de sua matriz constitucional, cuja eficácia decorre diretamente da Lei Maior, o que justifica a implantação de projetos de desenvolvimento sustentável no âmbito do Tribunal, ainda que sem legislação ordinária específica e, em algumas situações, podendo inclusive contrariar a interpretação formal da legislação infraconstitucional.
Resolvido isso, o estudo avança para explicar as justificativas da configuração do “projeto e-Proc” e das opções jurídico-políticas escolhidas, fazendo um breve resumo das principais funcionalidades do sistema.
O artigo conclui procurando demonstrar a adesão do e-Proc ao princípio constitucional da sustentabilidade e os respectivos benefícios para a efetividade da jurisdição intra e intergeracional.
Palavras-chave: Tribunal Regional Federal da 4ª Região – TRF-4ª Região. E-Proc. Desenvolvimento sustentável. Constituição Federal. Caráter multidimensional. Opção política e técnico-jurídica. Sustentabilidade intra e intergeracional. Funcionalidades. Modernização. Sociedade do conhecimento. Presente e futuro.
Sumário: Introdução. 1 Desenvolvimento sustentável no Tribunal Regional Federal da 4ª Região. 2 A Constituição Federal de 1988 e a sustentabilidade. 3 O caráter multidimensional da sustentabilidade. 4 A sustentabilidade como princípio constitucional. 5 E-Proc: processo judicial eletrônico calcado na sustentabilidade. 6 E-Proc: uma opção política e técnico-jurídica. Vencendo barreiras. 7 Principais funcionalidades do e-Proc. 8 Usabilidade do e-Proc: escritórios digitais e mesas virtuais. 9 E-Proc: presente e futuro – sustentabilidade intra e intergeracional. 10 Alguns resultados alcançados. Conclusão. Bibliografia consultada.
Introdução
O processo eletrônico no Brasil surgiu conectado aos juizados especiais por força do parágrafo 2º do art. 8º da Lei nº 10.259/2001, que instituiu os juizados especiais cíveis e criminais no âmbito da Justiça Federal, o qual recomenda a organização de um serviço de intimações e de recepção de petições por meio eletrônico.
Tinha o legislador em mente sugerir o uso de uma forma de desburocratizar a prestação jurisdicional nas causas afetas ao novel ramo do Judiciário Federal de modo a, principalmente, impedir que as causas mais simplificadas viessem também a sofrer do mesmo mal que até então afetava todo o Poder Judiciário nacional: a morosidade da Justiça.
De pronto os tribunais regionais federais passaram a atuar no desenvolvimento de sistemas eletrônicos para atender a tal desiderato, de modo que, em pouco espaço de tempo, os cinco regionais já possuíam seus processos eletrônicos nos juizados especiais, com resultados sempre positivos no tocante à agilização processual.
Contudo, havia um limitador mais político que jurídico a impedir o espraiamento do processo eletrônico para todos os demais ramos da Justiça, qual seja, a ausência de lei formal autorizando o processamento de ações comuns por meio do processo eletrônico, o que restou definitivamente superado com a promulgação da Lei nº 11.419/2006.
No Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o escopo do desenvolvimento do processo eletrônico, aqui denominado e-Proc, foi alargado para, além de ser instrumento de simplificação processual e de combate à morosidade da prestação jurisdicional, atentar para o desenvolvimento sustentável, com observação ao princípio da dignidade da pessoa humana, com valorização das pessoas dos operadores internos e externos, respeito primordial ao meio ambiente, economia e, sobretudo, preparação da Justiça Federal para as novas gerações de magistrados, servidores, advogados e demais atores do teatro operacional da Justiça.
Este artigo pretende, pois, em breves linhas, demonstrar a conexão do e-Proc com a modernização da Justiça e com a sustentabilidade, estando longe de pretender esgotar o tema, pelo contrário, serve apenas de ponto de partida para reflexões aprofundadas.
1 Desenvolvimento sustentável no Tribunal Regional Federal da 4ª Região
Há quase duas décadas o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por seus juízes, servidores e demais operadores de Justiça, notadamente advogados públicos e privados e membros do Ministério Público da União, vem atuando pioneiramente de forma concentrada e firme na modernização da prestação jurisdicional, buscando consolidar sua liderança nacional (quiçá mundial) na efetividade da prestação jurisdicional atual e preparando-se para entregar à próxima geração de jurisdicionados e operadores de Justiça um novo formato de Poder Judiciário, eficaz e eficiente, capaz de atender às crescentes demandas da sociedade na solução de conflitos individuais e coletivos, no qual é buscada, além de justiça e equidade, a capacidade de dar respostas tempestivas e adequadas a um mundo cada vez mais globalizado e acelerado e que evolui quase na velocidade da luz.
A população ainda acredita no Poder Judiciário, até porque movimentos alternativos têm se mostrado ineficientes e até piores que a Justiça tradicional. As câmaras de conciliação e arbitragem (Lei 9.307/96) atendem um número muito reduzido de situações, de modo que não têm capacidade e capilaridade suficientes para causar um impacto significativo na demanda processual judicial, estando reservado às grandes demandas corporativas que estão, e já estavam, distantes da Justiça ordinária. E tanto assim é que algumas câmaras de conciliação e arbitragem, de modo irregular, tentaram se passar por “tribunais de conciliação”, o que foi de pronto coibido pelo Conselho Nacional de Justiça. Outro exemplo decorre da Lei nº 11.441/2007, que possibilitou a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por via administrativa, ou seja, diretamente nos cartórios extrajudiciais, o que não causou nenhum impacto significativo na redução de demandas dirigidas ao Poder Judiciário, talvez porque as escrivanias extrajudiciais são tão, ou mais, conservadoras e burocráticas que os próprios órgãos jurisdicionais.
Presentemente discute-se a possibilidade de transformar a execução fiscal em extrajudicial, atribuindo competência para os órgãos da própria Administração, os credores, que já têm o poder de constituir unilateralmente o título executivo e ainda de fazer exigir a satisfação da dívida, com ferramentas aptas a constranger o devedor na sua satisfação, sem que a causa (ou execução) passe pelo crivo do Poder Judiciário. Sobre o tema, as opiniões dos juristas estão divididas, e seria interessante que fosse encontrada uma solução coerente, uma vez que, na Justiça Federal, o grande volume de execuções fiscais tem sido um fator altamente negativo na taxa de congestionamento, pois representou quase 15% de todos os novos processos distribuídos nesse ramo da Justiça em 2015 e tem, segundo o CNJ, uma taxa de congestionamento de 91%, enquanto, se for desconsiderado esse tipo de processo, a taxa de congestionamento da Justiça Federal cairia para 70,5% (Justiça em Números/2015, p. 288).(1)
Contudo, o incremento de demandas no Poder Judiciário não para de crescer. Segundo o relatório Justiça em Números 2015, recentemente divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça, no ano-base de 2014 houve um incremento de quase 28,9 milhões de novos casos distribuídos para a Justiça brasileira, o que representa um acréscimo de 1,1% em relação à distribuição do ano anterior e, descontando-se o número de processos definitivamente baixados (arquivados), restou um estoque total de mais de 71 milhões de processos em andamento para 2015. Quer dizer, em que pese todo esforço, o passivo judicial continua crescendo, assim como a taxa de congestionamento, que aumentou 0,8% em relação a 2013, atingindo o índice efetivo de 71,4% em 2014.
Por isso, impõe-se um novo olhar sobre a administração da Justiça com a busca de novas estratégias de planejamento e a adoção de ferramentas de gestão e modernização condizentes com a realidade contemporânea.
A Constituição Federal brasileira recomenda a efetividade da jurisdição, principalmente por meio do comando que determina que os processos devem ter duração razoável, assim como devem ser disponibilizados meios que garantam sua célere tramitação (art. 5º, LXXVIII) e, mais, que essas soluções sejam calcadas no princípio do desenvolvimento sustentável.
Quer dizer, a política do mais do mesmo (mais prédios, mais servidores e magistrados, mais papel, mais tinta, mais insumos físicos, maior consumo de energia, etc.) deve ceder à política do baixo carbono, não só porque colide com o mandamento constitucional de preservação do meio ambiente, como também porque tem se mostrado ineficiente para combater a morosidade processual.
Nesse desafio é que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu adotar sua política de gestão calcada na “modernização sustentável”, visando a melhorar o IAD/CNJ (índice de atendimento de demandas), reduzir o congestionamento judicial, aumentar a efetividade das jurisdições de 1º e 2º graus, aperfeiçoar o meio ambiente de trabalho, reduzir custos e melhorar a saúde física e mental dos operadores judiciais, internos e externos, tudo sem perder de vista uma política administrativa e judicial ecologicamente correta.
São inúmeras as providências e projetos implementados no TRF-4ª Região desde longa data, políticas essas iniciadas muito antes das recomendações do Conselho Nacional de Justiça, tendo sido criada uma competente diretoria de planejamento estratégico antes mesmo de a Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, instituir o CNJ.
O norte de todos os projetos sempre apontou para uma gestão judicial e administrativa sustentável na sua feição multidisciplinar. Projetos de gestão documental e arquivística voltados para um melhor controle ambiental. Criação de varas especializadas em meio ambiente para poder dar um tratamento jurisdicional qualificado a esse tipo de demanda judicial. Licitações com premissas voltadas para a sustentabilidade. Coleta seletiva de lixo. Ações de economia de energia e água, entre elas a substituição de lâmpadas halógenas, eletrônicas e fluorescentes por lâmpadas LED, infinitamente mais econômicas e de descarte não poluente. Outro projeto de grande sucesso foi o “protocolo descentralizado” para todas as unidades da 4ª Região, a fim de dar maior agilidade e evitar deslocamentos inúteis e despesas extras para os advogados.
O TRF-4ª Região foi pioneiro, também, na utilização da rede mundial de computadores para o desenvolvimento de projetos da chamada “justiça sem papel”. Entre eles, a criação, no ano de 2002, do Siscon (Sistema de Comunicações), tendo por objeto viabilizar intimações judiciais e administrativas sem a utilização de papel. Foi um dos primeiros tribunais a implantar o diário oficial eletrônico, no ano de 2007.
Nessa mesma linha, foram criados os sistemas SEI (Sistema Eletrônico de Informações) e o e-Proc. O primeiro consiste em um sistema de processo administrativo eletrônico via web, totalmente sem papel, e, dada sua grande aceitação em virtude de suas inegáveis qualidades, transformou-se no sistema administrativo oficial do Poder Judiciário, estando instalado, entre outros, no Supremo Tribunal Federal, no Superior Tribunal de Justiça, no Tribunal Superior Eleitoral, nos Tribunais Regionais Federais das 1ª e 3ª Regiões, em vários Tribunais Estaduais, entre outros. Via Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, está instalado em vários órgãos do Poder Executivo, bem como em municípios e outros órgãos, como a Ordem dos Advogados do Brasil. O e-Proc será objeto de estudo mais detalhado adiante.
Toda essa política foi-se encaminhando para uma gestão socioambiental de aproveitamento máximo da economia de baixo carbono, o que mudou completamente a matriz ecológica da Corte e a levou a receber do Ministério do Meio Ambiente (MMA) o Selo A3P de Sustentabilidade na Administração Pública, reconhecimento esse que coroa de êxito um trabalho profícuo e incessante, bem como aponta que o TRF-4ª Região está trilhando o caminho certo do desenvolvimento sustentável.
2 A Constituição Federal de 1988 e a sustentabilidade
A sustentabilidade é vista hoje como um novo valor, qual seja, o direito ao futuro. Muito embora o tema não seja novo, foi a partir das Conferências das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, em especial Estocolmo 1972 e Rio 1992, que a questão passou a ter atenção internacional.
De outro lado, o Relatório Brundtland, de 1987, foi tido como marco inicial, um verdadeiro “conceito político” do desenvolvimento sustentável, qual seja, “aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas necessidades”.(2) De lá para cá, entretanto, como era de se esperar, o conceito de sustentabilidade evoluiu muito, inclusive no Brasil.
Hodiernamente, a sustentabilidade geralmente é vista como o equilíbrio entre a sociedade, o ambiente e a economia, os quais se permeiam e agem entre si reciprocamente, e até se sobrepõem.
Segundo ensina o Professor Juarez Freitas em sua festejada obra Sustentabilidade: direito ao futuro,(3)
“Sustentabilidade, em síntese conclusiva, é princípio constitucional que incide, de maneira vinculante, em todas as províncias do sistema jurídico-político (não apenas na seara ambiental). Mercê acolhido, antes de mais, como novo paradigma, a serviço deliberado da homeostase social, entendida como a capacidade biológica e institucional de promover o multifacetado reequilíbrio propício ao bem-estar duradouro.”
Depreende-se daí que sustentabilidade vai muito além do equilíbrio ecológico e, ainda nas palavras de Juarez,
“é o princípio constitucional que determina, independentemente de regulamentação legal, com eficácia direta e imediata, a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretização solidária do desenvolvimento material e imaterial, socialmente inclusivo, durável e equânime, ambientalmente limpo, inovador, ético e eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente de modo preventivo e precavido, no presente e no futuro, o direito ao bem-estar.”
Impõe, portanto, que se tenha uma visão multidimensional de sustentabilidade, sendo dever do Estado principalmente, e também de toda a sociedade, a responsabilidade pelo bem-estar geral no presente e no futuro. E não se trata de um princípio abstrato, mas um mandamento constitucional vinculante, inclusive no que toca aos bens e serviços disponibilizados aos cidadãos em geral, necessariamente em observância a outro princípio constitucional, o da dignidade da pessoa humana.
Sustentabilidade é um valor que se preocupa com a manutenção e a melhoria da qualidade de vida intra e intergeracional, quer dizer, no presente e no futuro, a geração atual e a que virá, não só para o ser humano, mas para todos os seres vivos, cujo fundamento ético é encontrado na equidade, na solidariedade e na democracia.
Com efeito, a Constituição Federal elegeu a sustentabilidade como um de seus valores supremos, já no seu preâmbulo, ao afirmar a instituição de um “Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social”, o que vem reforçado por diversos artigos constitucionais, como o art. 3º da Lei Maior, que estabelece que um dos objetivos fundamentais é a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, visando a erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais, assim como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Assim também o inciso VI do artigo 170, que estimula o desenvolvimento sustentável, o qual, combinado com o art. 225 da mesma Carta, assegura a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
É por isso que a sustentabilidade tem sido vista como um novo valor, um verdadeiro “direito ao futuro”, que vai muito além do chamado desenvolvimento sustentável, o que inclui um equilíbrio entre a sociedade, o ambiente, a economia e a dimensão jurídico-política. E, por ser um valor/conceito ainda em aberto, nada impede que outras dimensões venham ser incluídas na medida da evolução da sociedade presente ou futura.
Diante disso, impõe-se concluir que os velhos conceitos de “crescimento”, tão em voga nos anos 60, estão totalmente superados e substituídos pelo conceito de “desenvolvimento sustentável”, uma vez que aquele só diz com o desenvolvimento material no presente, e este fomenta a chegada de um estado mais completo e melhor do ponto de vista qualitativo, não só para a geração atual, mas também para as que virão.
E, se é assim, não há mais lugar para dissociar desenvolvimento de sustentabilidade. Daí porque são pertinentes as observações de Juarez Freitas(4):
“Como se percebe, assim formulado, o desenvolvimento sustentável não é uma contradição em termos, tampouco se confunde com o delírio do crescimento econômico como fim em si. Estão reunidos os elementos indispensáveis para um conceito operacional de sustentabilidade eficaz, a saber: (1) a natureza de princípio constitucional diretamente aplicável, (2) a eficácia (encontro de resultados justos, não mera aptidão para produzir efeitos jurídicos), (3) a eficiência (o uso de meios idôneos), (4) o ambiente limpo (descontaminado e saudável), (5) a probidade (inclusão explícita da dimensão ética), (6) a prevenção (dever de evitar danos certos), (7) a precaução (dever de evitar danos altamente prováveis), (8) a solidariedade intergeracional, com o reconhecimento dos direitos das gerações presentes e futuras, (9) a responsabilidade do Estado e da sociedade e (10) o bem-estar (acima das necessidades materiais). Nenhum desses elementos pode faltar ao conceito, sob pena de reducionismo indesejável.”
Concludentemente, a sustentabilidade consiste em assegurar, hoje, o bem-estar material e imaterial, sem inviabilizar o bem-estar, próprio e alheio, no futuro. Então, o alcance da sustentabilidade ultrapassa a mera preservação e conservação de bens ambientais e a análise técnico-jurídica dos dilemas ambientais da humanidade. Requer a promoção da qualidade de vida em toda sua amplitude, que inclui geração de emprego e renda, acesso à educação e à informação, possibilidade de exercício da cidadania e da democratização dos processos decisórios, da promoção do multiculturalismo, da superação da desigualdade, da exclusão social e ambiental, bem como o respeito a todas as etnias. Tem como meta a integração entre as questões ambiental stricto sensu, social, econômica, política e cultural na análise e no tratamento dos dilemas de sustentabilidade enfrentados pela sociedade contemporânea.(5)
3 O caráter multidimensional da sustentabilidade
Do que foi dito acima, conclui-se que a sustentabilidade pode/deve ser vista sobre diversas dimensões. Os estudiosos convergem no sentido de que o princípio jurídico da sustentabilidade é caracterizado pelas dimensões social, ambiental e econômica. Estudos mais evoluídos advogam que existem, pelo menos, cinco dimensões. Juarez Freitas,(6) por exemplo, cita, além das três mencionadas, também a dimensão ética e a dimensão jurídico-política.
A (1) dimensão social diz respeito ao incremento da equidade intra e intergeracional; uma gestão aperfeiçoada de processos, que garanta condições propícias ao florescimento virtuoso das potencialidades humanas, especialmente no atinente à educação exitosa e de qualidade, que permita, na aprendizagem formal e informal, aproximações sucessivas de concepções universalizáveis de maior empatia e responsabilidade solidária pelo ciclo completo de produtos e serviços, que produza expressivas transformações na relação com o ambiente, de modo a desmanchar, progressivamente, o paradigma da insaciabilidade patológica e que estimule o ser humano, não para a socialização presa à irrefletida manutenção do status quo, mas para rejeitar toda e qualquer postura nociva ao equilíbrio dinâmico da vida.
Na (2) dimensão ambiental, a sustentabilidade infere que não pode haver qualidade de vida e longevidade digna em ambiente degradado; o hiperconsumismo deverá ser enfrentado, sem prejuízo da modernização ambiental; ou se protege a qualidade de vida ou simplesmente não haverá futuro para nossa espécie, pois, no limite, sem o zeloso resguardo da sustentabilidade ambiental, em tempo útil, não pode haver sequer vida humana.
Na (3) dimensão econômica, a sustentabilidade reforça que é indispensável lidar adequadamente com os custos e benefícios, diretos e indiretos, assim como superar constantemente o conflito na opção entre eficiência e equidade intra e intergeracional; combate ao desperdício; incremento da poupança pública; da responsabilidade fiscal e do limite regulatório do poder público e privado; toda e qualquer propriedade deve cumprir sua função social, econômica, ética e de equilíbrio ecológico; e, ainda, regulação eficiente do mercado, de modo que guarde comprovada e mensurável subordinação à eficácia.
Por (4) dimensão ética tem a consciência de que há ligação entre todos os seres, havendo de ser superado o antropocentrismo estrito; que há impacto retroalimentador para todas as ações ou omissões, bem como que há exigência moral e universalizante de que o bem-estar deve ser duradouro.
Por fim, em sua (5) dimensão jurídico-política, a sustentabilidade assume feições de (a) princípio constitucional, imediata e diretamente vinculante, servindo de norte hermenêutico de toda e qualquer interpretação jurídica; (b) norma que determina, a partir da revisão de titularidade dos direitos das gerações futuras, a eficácia intertemporal dos direitos fundamentais de todas as dimensões, e (c) critério que permite afirmar a antijuridicidade das condutas causadoras de danos intrageracionais e intergeracionais, tais como prática do patrimonialismo, tráfico de influências, omissivismos e mercenarismo.
4 A sustentabilidade como princípio constitucional
A sustentabilidade, vista como princípio permeado em nossa Lei Maior, traduz-se em um novo marco interpretativo do sistema jurídico pátrio e, em face de sua natureza multidimensional, é verdadeiro paradigma hermenêutico, impondo o descarte de pré-compreensões equivocadas que prejudicam a convivência intergeracional solidária.
E, por ser princípio de estatura constitucional, é vinculante, em sentido forte, a exigir eficácia direta e imediata dos imperativos do desenvolvimento, reconfigurado em todas as áreas, de forma generalizada, e não apenas no Direito Ambiental.
A sustentabilidade não se coaduna com a crença do desenvolvimento econômico como um fim em si mesmo para atender necessidades imediatas da sociedade, impondo que seja preservado o legado da biodiversidade, preservando o direito das gerações futuras e visando ao bem-estar duradouro. O progresso material não pode sonegar o imaterial, sendo recomendada uma educação multidimensional balanceada, a fim de orientar a tomada de decisões estratégicas rumo à economia do baixo carbono, criando novo padrão de responsabilidades.
A sustentabilidade também implica praticar equidade com as gerações futuras, sem prejuízo de assegurar a equidade no presente, impondo uma maneira de agir intertemporalmente integrada, a fim de erradicar as discriminações, promover a reeducação alimentar, universalizar o consumo consciente, regularizar a ocupação segura do solo e garantir acesso ao trabalho decente. Requer, assim, ousadia crítica na proposição e implementação de uma agenda pública de Estado, eficaz e eficiente, capaz de reciclar o modo de compreender e de tomar decisões que envolvem a governança baseada em metas compartilhadas, a energia, a precificação ambiental, a valorização dos serviços ecossistêmicos, os negócios decentes, tanto públicos como privados, a regulação idônea para corrigir fissuras de mercado, a transição para a produção saudável, a medição de consequências e riscos sistêmicos dos empreendimentos e a esfera da política em conexão com a ciência.
Como bem encerra Juarez Freitas,(7)
“intenta-se, em última análise, promover o desenvolvimento de cores limpas, condição-chave para a melhor sorte da humanidade, acima do antropocentrismo estrito. Sim, para além dos determinismos, o destino da espécie humana, em larga medida, remanesce em nossas mãos. Eis o motivo pelo qual importa realizar a escolha pela sustentabilidade, antes de tudo, como oportunidade de assegurar, para todas as gerações, o direito fundamental ao futuro.”
5 E-Proc: processo judicial eletrônico calcado na sustentabilidade
O processo eletrônico da Justiça Federal da 4ª Região deu seus primeiros passos no ano de 2003, em um tempo em que a Internet, com linhas discadas e sem cogitar que um dia haveria banda larga, ainda era incipiente no Brasil. Começou nos juizados especiais previdenciários, em processos que versavam exclusivamente sobre matéria de direito (naqueles em que não havia necessidade de produção de provas em audiência), caminhou rapidamente para os juizados especiais federais cíveis, avançou para todas as causas procedimentais da Lei 10.259/2001 e, já em meados de 2006, estava processando 100% das ações ingressadas em todos juizados especiais federais e turmas recursais dos Estados do Paraná, do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, tendo admitido e processado na sua versão originária (e-Proc v1) mais de dois milhões de processos.
O sucesso do sistema foi de tal monta que, em meados do ano de 2009, o Tribunal Regional Federal decidiu ampliar o projeto “justiça sem papel” também para a Justiça Comum Federal, nos dois graus de jurisdição. Fez-se necessária a recriação do e-Proc para atender não só o novo tipo de causas que haveria de processar, como também seu volume, resultando daí uma segunda versão do sistema, inicialmente denominado e-Proc v2, tendo em vista a necessidade de coexistência das duas versões para dar conta do período de transição.
Em meados de 2010, o e-Proc já contemplava todas as unidades da Justiça Federal da 4ª Região, inclusive o Tribunal Regional Federal. No primeiro grau, por decisão regulamentar do TRF-4ª Região, desde logo não foi mais permitido o ingresso de causas novas em meio físico, quer dizer, 100% dos novos processos distribuídos desde então são totalmente eletrônicos. No Tribunal, por conta de que havia ainda uma grande massa de autos de papel que haveriam de ascender ao 2º grau, o período de transição foi um pouco mais lento e dolorido, especialmente para aqueles que resistiam às novas tecnologias. No TRF ainda hoje são recebidos autos processuais em meio físico, muito embora em pequeno percentual, mas isso se deve quase que exclusivamente à chamada jurisdição delegada, quer dizer, as causas envolvendo o INSS processadas nas comarcas estaduais onde não está instalada a Justiça Federal, cujas apelações são dirigidas diretamente ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Isso se dá porque as Justiças Estaduais da Região Sul do Brasil estão com seus projetos de informatização bem mais lentos, mas, mesmo nessas situações, exige-se que os agravos de instrumento tirados contra decisões de juízes de direito no exercício da jurisdição federal delegada sejam aforados em meio eletrônico diretamente no TRF.
Em razão desse trabalho, o “processômetro” constante do site do Tribunal(8) já acusa o recebimento de mais de 3,6 milhões de processos totalmente eletrônicos, tão somente na versão 2 do e-Proc.
Evidentemente que a opção pelo processo eletrônico adotada pelo TRF-4ª Região não teve o objetivo simples de mudar o suporte de processamento das causas judiciais do papel para a tela do computador, como apressadamente pode-se concluir. Os tribunais que assim pensaram e os projetos de processo eletrônico baseados nesse escopo, ainda que tenham dado um passo notável para a modernização da justiça brasileira, ainda hoje não conseguem explorar com plenitude as ferramentas tecnológicas que o mundo globalizado oferece.
O projeto e-Proc sempre visou ao desenvolvimento sustentável, tendo sido a mudança do paradigma do papel para o eletrônico uma mera consequência do uso da mais moderna tecnologia, e não um fim em si mesmo.
A sociedade brasileira elegeu como maior problema do Poder Judiciário brasileiro a morosidade. E muitas ações foram intentadas com o objetivo de debelar esse carcinoma que corrói a eficácia e a efetividade da Justiça e, por outro lado, tem inviabilizado a prestação de um serviço público tempestivo e com a qualidade de que os jurisdicionados necessitam, indo de encontro ao princípio da sustentabilidade e aos direitos constitucionais da razoável duração do processo e dos meios que garantam a celeridade de tramitação processual (CF, art. 5º, LXXVIII). Dentre as ações que visam a debelar esse grande problema, estão a criação do Conselho Nacional de Justiça, a obrigatoriedade do planejamento estratégico, muitas e muitas reformas processuais e, também, a modernização tecnológica, entre outras. De um modo geral, os resultados não são dos mais animadores.
Por certo que a morosidade da justiça não é nenhuma novidade, mas o que chama a atenção é o fato de que as medidas administrativas e legislativas tradicionais não têm se mostrado eficazes para resolver de vez a questão. Em uma análise empírica do problema, é possível concluir pela existência de duas causas significativas: a um, o volume crescente de demandas e, a dois, o completo descompasso da justiça tradicional com o mundo globalizado e com o modo de vida da sociedade contemporânea do conhecimento, interligada “em rede”, em que as coisas se passam cada vez mais depressa, o que faz com que a política simples do “mais do mesmo” esteja longe de ser suficiente para resolver o problema.
Dados estatísticos comprovaram que, em 70% do tempo consumido, os processos ficam circulando nos cartórios e nas escrivanias, tão somente para a prática de atos meramente burocráticos, tais como protocolamentos, furação de folhas, aposição de carimbos, lançamento de certidões, carga de autos, transporte interno e externo, etc., transcurso esse que acabou levando a alcunha de “tempo morto”, uma vez que em nada ajuda na efetividade da prestação jurisdicional. Aliás, só atrapalha. Em contrapartida, o chamado “tempo nobre”, vale dizer, aquele que efetivamente encaminha o processo para seu desiderato, que diz com a atuação do magistrado e demais operadores de Justiça, é de apenas 30%.
Daí que combater a burocracia processual, seja evitando retrabalho, seja abandonando a prática de atos inúteis, seja automatizando os indispensáveis, é a atitude mais lógica e prioritária, complementando-a com a disponibilização de ferramentas que facilitem e otimizem a atividade operacional de servidores, oficiais de justiça, magistrados, advogados, defensores públicos, procuradores, peritos e demais operadores de justiça, os quais, em que pese estarem na outra ponta da morosidade processual e responderem por apenas 30% desse problema, podem também ter sua intervenção otimizada.
Outra constatação da pesquisa do TRF-4ª Região foi a de que o papel, quando utilizado como meio e suporte para registro e perenização de peticionamentos, andamentos e decisões judiciais, por si só consiste em uma das fontes de morosidade processual, por ser intrinsecamente burocrático.
A ferramenta encontrada pelo TRF-4ª Região para otimizar a prestação jurisdicional foi o processo eletrônico sediado na Internet, uma vez que elimina, de vez, uma das fontes da morosidade, o papel. Elimina também um sem número de atos burocráticos que existiam apenas para controle e localização de autos físicos e automatiza aqueles registros que são indispensáveis. De seu turno, a rede mundial de computadores simplesmente torna inexistentes as barreiras geográficas e temporais, bem como permite a completa integração entre todos os operadores judiciais.
É evidente que o processo eletrônico não resolve tudo sozinho e não é a solução para todos os males da Justiça, uma vez que, tal qual se diz da sustentabilidade, o problema exige uma ação multidimensional.
Assim, mesmo que o escopo principal do e-Proc seja o combate à morosidade processual, ainda flerta muito de perto com o princípio constitucional da sustentabilidade, como adiante se verá. Aliás, o simples fato de o e-Proc ser uma ferramenta tendente à efetividade da jurisdição já o autoriza a receber o carimbo da sustentabilidade, como também acontece com todos os sistemas de processo eletrônico desenvolvidos pelos tribunais e que tenham conseguido reduzir a morosidade processual.
Ora, se a morosidade da prestação jurisdicional tem como uma de suas fontes a burocracia do papel, o que acaba envolvendo todos os operadores judiciais, de servidores e demais auxiliares a magistrados, dos ocupantes de cargos essenciais à função jurisdicional do Estado (CF, art. 127) até aqueles considerados indispensáveis à administração da Justiça (CF, arts. 133 e 134), é condição indispensável, então, a adesão e a participação de todos esses atores no projeto de modernização da prestação jurisdicional, de modo que agiu com acerto o TRF-4ª Região ao incentivar todos os envolvidos na prestação jurisdicional a opinar e participar do projeto, bem como agiu com acerto ao proporcionar o desenvolvimento de facilidades operacionais para todos os operadores internos e externos indistintamente.
6 E-Proc: uma opção política e técnico-jurídica. Vencendo barreiras
O projeto do e-Proc desde o início estabeleceu algumas premissas políticas e técnico-jurídicas que orientaram todo o desenvolvimento do software do processo eletrônico, já desde a primeira versão do sistema, no ano de 2003. Tais premissas foram reavivadas para o desenvolvimento da segunda versão, a fim de permitir o avanço do e-Proc para a totalidade dos processos da Justiça Federal da 4ª Região, premissas essas que continuam sendo o indicador para a evolução do sistema, em que pese a versão v2 já contar com mais de cinco anos de implantação e já ter contabilizado mais de 3,6 milhões de causas no formato totalmente eletrônico.
Eis algumas dessas premissas, não em ordem de importância, porquanto, tal qual uma engrenagem, qualquer delas que falhar pode comprometer todo o sistema:
a) Criação de uma comissão interna do Tribunal, tendo como membros magistrados e servidores de todas as áreas afins, desde a judiciária até a de tecnologia da informação, de primeiro e segundo graus, para tomada de decisões de especificação do sistema, do desenvolvimento, da implantação, da regulamentação, das relações com o público usuário interno e externo, atendimento às demandas do Comitê de Informática do Tribunal e da Diretoria de Planejamento Estratégico, etc.
b) O processo deve ser totalmente eletrônico desde seu nascedouro. A opção de o advogado entregar a petição inicial e documentos no protocolo da Justiça para serem digitalizados só aumenta a burocracia e induz mais morosidade processual.
c) O processo eletrônico não pode ser opcional porque há absoluta incompatibilidade entre o papel, do mundo do átomo, com o digital, do mundo dos bytes.
d) O processo eletrônico deve estar, necessariamente, hospedado na rede mundial de computadores, única forma que permite a integração de todos os usuários, internos e externos, e viabiliza a prática de atos processuais diretamente pelo operador judicial de onde quer que ele esteja. E é só a Internet que elimina fronteiras e o espaço geográfico, bem como liberta o homem da escravidão do tempo e do relógio. Só assim os atos processuais podem ser praticados em qualquer dia e horário, e não apenas durante o expediente em dias úteis, e de qualquer lugar do mundo, bastando que o usuário tenha acesso à rede.
e) A especificação das soluções jurídicas deve ser coordenada pela área judiciária e não pela área de tecnologia da informação.
f) As ferramentas tecnológicas devem ser validadas pelos usuários internos e externos.
g) A equipe de tecnologia da informação responsável pelo desenvolvimento do software deve ser formada por analistas do próprio quadro do Tribunal, a fim de que as informações estratégicas não saiam do âmbito do serviço público.
h) Deve ser dada preferência na utilização de software livre, em relação tanto à linguagem de desenvolvimento quanto aos bancos de dados, não só para reduzir custos, mas também para viabilizar a cedência do sistema para outros tribunais interessados.
i) Necessidade de treinamentos para usuários internos e externos.
j) Investimento em infraestrutura tecnológica, tal como banco de dados com alta capacidade de armazenagem de dados, rede de Internet de alta velocidade, computadores pessoais para magistrados e servidores de alto desempenho, etc.
k) Preocupação constante com a saúde física e mental dos usuários internos e externos. Todo o projeto foi acompanhado por uma comissão de saúde no e-Proc, presidida por um desembargador federal não participante da comissão de desenvolvimento do sistema, apoiada por médicos do trabalho, psicólogos e especialistas em usabilidade e ergonomia, para acompanhamento, sugestão e correção de todo trabalho.
Atento a esses princípios, o TRF-4ª Região criou uma comissão de magistrados e servidores, tanto da área judiciária quanto da área de tecnologia da informação, a fim de acompanhar todo o trabalho sob a coordenação de um juiz federal. Com base na experiência positiva da primeira versão do sistema (e-Proc v1), foi desenvolvida a nova versão (e-Proc v2), agora tendo por escopo não só os juizados especiais, mas também toda a Justiça Federal comum, no primeiro grau e no Tribunal Regional Federal. Constitui-se no único sistema de processo eletrônico em produção para ações penais de todos os tipos e inquéritos da Polícia Federal, estando preparado, ainda, para o processamento de incidentes criminais de alto grau de sigilo.
O e-Proc atende integralmente ao regramento da Lei nº 11.419/2006, a Lei do Processo Eletrônico, tendo sido elaborado por uma regulamentação mais detalhada e submetida a consulta pública, em que surgiram muitas sugestões de melhorias que foram acolhidas, o que resultou na Resolução nº 17, de 26 de março de 2010,(9) aprovada pelo Pleno do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
7 Principais funcionalidades do e-Proc
O e-Proc é bem mais do que um software para processamento de ações judiciais. Na verdade, é um grande sistema composto de ferramentas tecnológicas para armazenagem de autos judiciais em meio totalmente digital, possui fluxos de trabalho (framework), módulo de distribuição de processos, módulo de citações e intimações, módulo de audiências, ambientes virtuais para usuários internos e externos, módulo de geração de documentos, módulo de produção de mandados para oficiais de justiça e de expedição de cartas, etc.
O e-Proc também possui uma configuração denominada web service, rigorosamente dentro dos padrões do MNI/CNJ (Modelo Nacional de Interoperabilidade do Conselho Nacional de Justiça), que permite sua integração computador a computador (máquina-máquina) com outros órgãos, tais como o STF e o STJ, Tribunais de Justiça, AGU, PGFN, Procuradoria da República, entre outros.
A autenticação dos usuários, tanto internos quanto externos, e a assinatura de documentos podem ser feitas alternativamente (a critério do interessado) por certificado digital A1 emitido no âmbito do ICP-Brasil, ou por meio do sistema de “usuário-senha”, rigorosamente da forma como permite o art. 1º, parágrafo 2º, III, a e b, da Lei 11.419/2006, que trata da informatização do processo.
O programa informático utiliza integralmente software livre. A linguagem é PHP (“orientado a objeto” e framework próprio do Tribunal), sistema operacional Linux e banco de dados MySQL. A aplicação utiliza arquitetura em camadas (apresentação, autenticação de usuários, camadas de regras de negócios e camada de banco de dados), tendo como objetivo, além da facilidade de manutenção e a integração com sistemas internos, tornar o e-Proc totalmente portável para poder ser cedido para outras unidades interessadas e que utilizam outro tipo de infraestrutura tecnológica, como outros modelos de bancos de dados, por exemplo, como já aconteceu com o Tribunal de Justiça de Tocantins, que hoje também só utiliza processo eletrônico para suas ações judiciais.
No e-Proc, as petições iniciais são protocoladas e disponibilizados recibos para as partes sem qualquer tipo de intervenção humana. A autuação do processo e sua distribuição para o juízo competente é feita automaticamente pelo sistema, que pode ser configurado para que o processo seja “enviado” diretamente para o servidor ou para o magistrado que deverá proceder à análise inicial e dar o primeiro impulso processual, tal como exame de pedido liminar, citação da parte contrária, intimação para cumprimento ou o que mais for necessário, tudo de forma eletrônica. Com apenas um clique, o servidor intimará as partes (se esse ato não estiver automatizado, como se verá adiante) da concessão, ou não, da liminar e, se for o caso, do prazo para cumprimento da decisão.
As intimações e citações em geral são expedidas eletronicamente online e, no mesmo segundo em que expedidas, já estarão no “escritório virtual” do citando/intimando. Caso seja necessária a expedição de mandado físico a ser cumprido por oficial de justiça, nas situações em que o intimando ou citando não é usuário do e-Proc, o módulo denominado SMWeb, mediante apenas alguns cliques, se encarrega dessa parte. A propósito disso, os mandados e ofícios, mesmo no caso em que devem ser cumpridos por oficiais de justiça de outras subseções judiciárias integrantes de um dos três estados que compõem a 4ª Região, serão expedidos diretamente para a central de mandados correspondente, cujo oficial de justiça cumprirá o ato em sua área de atribuições e certificará o ocorrido diretamente nos autos eletrônicos, sem necessidade de qualquer outro tipo de comunicação. Em razão dessas funcionalidades, a expedição de carta precatória no âmbito da 4ª Região é uma raríssima exceção. Nos demais casos, as cartas precatórias também são eletrônicas, com a utilização do “malote digital”(10) do Conselho Nacional de Justiça. As citações por carta em execução fiscal e demais cartas e ofícios que são encaminhados pelos Correios são expedidos pelo módulo denominado V-Post, que prevê a remessa eletrônica do arquivo para os Correios, que faz a impressão, a entrega ao destinatário e a certificação, diretamente nos autos do processo eletrônico, do resultado do cumprimento da diligência pelo carteiro.
Nos pedidos de informações e nas ordens mandamentais, como, por exemplo, informações e liminares em mandados de segurança, mais recorrentes, as autoridades são cadastradas no e-Proc para receberem eletronicamente as comunicações dos juízos. Nos demais casos, os ofícios são expedidos via SMweb diretamente para a central de mandados e são cumpridas as ordens pelos oficiais de justiça.
Todo o controle de prazos também é automatizado pelo e-Proc, que certifica automaticamente o encerramento com ou sem cumprimento da prática do ato processual “esperado” para a situação, que também é automaticamente anexado ao processo.
Encerrada a fase de “comunicação” às partes e aos interessados das providências processuais, os autos eletrônicos são “localizados” em uma espécie de armário eletrônico para a tomada das providencias cartorárias seguintes, sempre em meio eletrônico, repete-se. Nesse momento são aferidos, se for o caso, o cumprimento/descumprimento da liminar, os termos da contestação, a revelia e os demais atos saneadores do processo, com encaminhamento para instrução ou conclusão para sentença.
Os profissionais peritos são previamente cadastrados no e-Proc e, nos casos em que é deferida a produção desse tipo de prova pericial, o expert será notificado eletronicamente de sua designação, inclusive dos quesitos, quando houver, e informará eletronicamente nos autos a data designada para a providência e também juntará o laudo no formato digital, diretamente no processo.
O sistema possui unidades virtuais de contadoria capacitadas para elaboração de cálculos de maior complexidade, de modo que, sendo necessária elaboração de contas em um determinado processo, o magistrado poderá acometer o cálculo para a contadoria de outra subseção judiciária que tenha maior “expertise” na questão do processo, ou que esteja menos congestionada, a fim de dar maior segurança e rapidez nessa fase processual.
Há uma agenda eletrônica no e-Proc para designação de audiências de instrução e julgamento, sendo que os advogados são intimados da respectiva data em meio totalmente eletrônico. Por regulamentação da Corregedoria Regional, os advogados devem “trazer” para o ato as testemunhas que arrolaram. O cartório só providencia a intimação de testemunhas arroladas em processos criminais e, nesses casos, os mandados são também expedidos por meio do SMWeb, acima referido. As audiências de instrução e julgamento são totalmente gravadas em sistema de áudio-vídeo, não existindo mais termo de audiência ditado pelo juiz, cujos arquivos são anexados aos autos correspondentes para consulta e para revisão a qualquer momento.
Aqui abrem-se parênteses para dar breves pinceladas sobre a audiência por videoconferência, módulo que foi denominado de “Projeto XXI” e, dadas suas grandes virtudes, acabou se tornando nacional por obra do Conselho Nacional de Justiça. Por meio dessa ferramenta, as partes, os procuradores, as testemunhas e até os peritos que não se encontram na localidade sede do processamento poderão comparecer em outra unidade judiciária, inclusive de outros ramos do Poder Judiciário, e de lá participar da audiência como se presencial fosse. O e-Proc possui um módulo para o agendamento eletrônico da sala de videoconferência remotamente e as intimações necessárias, quando não realizadas eletronicamente pelo módulo de intimações do e-Proc, que podem ser feitas por mandados expedidos diretamente para a central de mandados da localidade onde se encontra o participante da audiência por meio do SMWeb. O e-Proc está preparado para anexar automaticamente no processo os áudios, os vídeos e os termos da audiência.
Proferida sentença, seja em razão da conclusão da instrução, seja em face do julgamento antecipado da lide, eventuais recursos serão processados nos próprios autos eletrônicos, cujas petições serão protocoladas (anexadas) pelos recorrentes/recorridos eletrônica e diretamente no e-Proc pela Internet. Após o devido processamento do recurso, a remessa será feita ao Tribunal também mediante um simples “clique”, momento em que o sistema fará uma série de consistências a fim de evitar, ao máximo, quaisquer tipos de erros nessa fase.
O agravo de instrumento ficou muito simplificado e reduzido a alguns “cliques” do recorrente diretamente na tela dos autos eletrônicos do processo no qual foi proferida a decisão agravada, bastando anexar uma petição com as razões de seu inconformismo. As providências dos artigos 526 e 527 do CPC restaram totalmente dispensadas, uma vez que as partes envolvidas têm acesso integral tanto aos autos eletrônicos do processo originário, quanto ao incidente no segundo grau, via rede mundial de computadores, de qualquer parte do mundo em que se encontre.
A distribuição dos recursos no TRF-4ª Região é feita automaticamente para o relator indicado por meio de sorteio, sem qualquer tipo de intervenção humana, e observará sempre a competência das seções especializadas de julgamento da Corte (atualmente tributária, administrativa, previdenciária e criminal).
O processamento dos recursos no Tribunal é totalmente automatizado (exceto das apelações originárias da Justiça Estadual delegada) e bastante semelhante ao dos processos em primeiro grau. Os incidentes e recursos internos – agravo legal, agravo regimental, embargos infringentes, embargos de declaração, conflitos de competência, incidente de inconstitucionalidade, etc. – também têm andamento automatizado e em forma eletrônica, totalmente sem papel. Os recursos externos – especial, extraordinário e agravos – são processados eletronicamente na Vice-Presidência do Tribunal e, nos casos em que admitido o recurso, a remessa para o STJ ou para o STF também é feita no formato eletrônico e com um simples “clique”. Há ainda um módulo no e-Proc para controle dos recursos extraordinários suspensos em razão da admissão de repercussão geral pelo STF.
A pauta das sessões de julgamento é elaborada e publicada eletronicamente, inclusive para os casos em que remanescem autos físicos, como mencionado anteriormente. Releva observar que os advogados interessados em fazer sustentação oral e que se encontram fora de Porto Alegre, município sede do TRF-4ª Região, podem fazê-la por videoconferência, bastando que compareçam em uma unidade da Justiça Federal da subseção judiciária indicada no momento de sua inscrição para o ato, que é feita previamente pela Internet. A sustentação oral por videoconferência é gravada em vídeo, o qual é anexado eletronicamente aos autos do processo correspondente, podendo ser vista/revista por todos que tiverem acesso à integra dos autos. Mais recentemente foi inaugurado o módulo denominado “Tela TRF”, que procede a gravação digital de todas as sessões de julgamento do TRF, seja sessão de turma, sessão de seção, da Corte Especial ou do Plenário, procedendo-se a juntada aos autos da íntegra de cada julgamento. Por meio de uma rede interna de vídeo, os servidores dos gabinetes dos desembargadores federais presentes à sessão podem acompanhar em tempo real os julgamentos, sem necessidade de comparecimento à sala de sessões, e um “chat” interno denominado “psi” permite contato em tempo real do julgador com sua assessoria de apoio no gabinete para auxiliar nas pendências surgidas de última hora.
Para encerrar este breve resumo sobre o funcionamento do processo eletrônico, duas questões ainda devem ser frisadas.
Uma diz respeito aos vários mecanismos de consistência constantes do e-Proc com o objetivo de evitar erro humano. Praticamente não existe mais a possibilidade de fazer intimação de advogado que não esteja atuando no processo, uma vez que esse controle é feito diretamente pelo próprio interessado. O sistema não permite o envio de processo eletrônico para o Tribunal se não tiverem sido cumpridas todas as etapas de admissibilidade do recurso. Qualquer tentativa de arquivamento/baixa do processo é automaticamente bloqueada caso ainda exista alguma pendência processual, como destino de bens apreendidos, depósito judicial pendente de levantamento, etc. O e-Proc não permite lançamento de despachos ou sentenças se o processo não estiver concluso para tal finalidade, tudo com o objetivo de não mascarar a estatística. Esses são apenas alguns exemplos, pois há muitas outras configurações do sistema para tornar o procedimento do processo eletrônico o mais seguro e eficaz possível.
E não poderia ser encerrado este tópico sem mencionar as estatísticas e as ferramentas de governança processual, que fornecem dados automaticamente para gerenciamento da unidade, para o planejamento estratégico do Tribunal, para a Corregedoria, para outros órgãos, como o Conselho Nacional de Justiça e a Justiça Eleitoral, certidões negativas e positivas, etc.
8 Usabilidade do e-Proc: escritórios digitais e mesas virtuais
Tanto os usuários internos quanto os externos acessam o e-Proc por meio da Internet, pois, como já informado antes, o sistema está hospedado na rede mundial de computadores (https://e-Proc.trf4.jus.br). Isso viabiliza a qualquer tipo de usuário acessar o e-Proc de qualquer lugar do mundo e em qualquer horário ou dia da semana.
Essa característica tem permitido ao Tribunal, inclusive, estabelecer uma política de “teletrabalho” que vem apresentando ótimos resultados, tendo ocorrido situações em que foi possível a servidores e a magistrados empreenderem viagem de estudos e aperfeiçoamento sem necessidade de afastamento do trabalho. Há situações outras de servidores que puderam acompanhar cônjuges em função de representação no exterior, sem necessidade de afastamento, e, em países como Estados Unidos, Espanha e Itália, cumpriram normalmente as rotinas de trabalho de seus cargos públicos até com ganhos de produtividade.
Para tanto, o e-Proc possui consoles operacionais, acessíveis por meio de qualquer navegador de Internet, próprios para cada tipo de usuário, que podem ainda ser configurados conforme as rotinas mais utilizadas pelo operador.
Assim há, por exemplo, o “painel do magistrado”, que é uma espécie de mesa virtual em que estão reunidas todas as funcionalidades necessárias ao trabalho do juiz, tais como a produção e a assinatura de despachos e sentenças, plantonista, governança total da vara, entre outros, o que pode ser feito da sede da Justiça, de casa, em qualquer dia e horário ou até do exterior, como foi referido acima.
Do mesmo modo, existe o “painel do diretor”, o “painel do servidor”, da Corregedoria, da Central de Mandados (para os oficiais de justiça), da Contadoria, etc.
Há também consoles próprios para usuários externos, como advogados, defensores públicos, advogados públicos, Ministério Público, etc., que também poderiam ser chamados de escritórios virtuais.
É o caso, por exemplo, do escritório virtual do advogado, cujo painel permite a distribuição de novos processos para qualquer unidade da Justiça Federal da 4ª Região, inclusive o Tribunal, a qualquer hora, em qualquer dia e de qualquer lugar, desde que o causídico tenha acesso a um computador com acesso à Internet. O escritório virtual permite ainda a juntada de contestações, o recebimento de intimações, o controle de prazos, a consulta à íntegra de qualquer processo, mesmo sem procuração nos autos, o substabelecimento de processos, a distribuição de processos urgentes para o plantão, etc.
Em razão de todas essas funcionalidades, tem sido observada intensa movimentação processual em dias e horários alternativos, como finais de semanas, feriados e à noite, sendo de se concluir que, com o processo eletrônico, não há limites físicos de espécie alguma para o acesso à Justiça.
Outro módulo interessante existente no sistema é o gestor de documentos denominado Gproc, que é o “ged” do e-Proc.
Trata-se de um editor de texto construído totalmente em software livre que, não obstante seja uma ferramenta potente para produzir sentenças, decisões e despachos, continua em constante aperfeiçoamento liderado por servidores das áreas judiciária e de informática e magistrados.
Esse editor identifica automaticamente na peça processual o feito ao qual é destinada, podendo ser produzido unitariamente (a partir do acesso direto aos autos eletrônicos) ou em lote de documentos com o mesmo conteúdo, sem prejuízo da identificação do respectivo processo em cada documento.
De acordo com a espécie de documento e a configuração do editor, com a assinatura digital do juiz, o documento é automaticamente anexado ao processo, com a identificação específica para fins estatísticos, e a intimação eletrônica da parte é automaticamente disparada pelo e-Proc, sem qualquer outro tipo de intervenção humana no sistema.
Atualmente está em fase adiantada de desenvolvimento o módulo “sessão de julgamento”, que consiste em funcionalidades que permitirão ao Gproc ser a ferramenta principal de apoio às sessões de julgamento do Tribunal e das turmas recursais, em substituição ao sistema atualmente em uso.
Também está no escopo do projeto a liberação do Gproc para manejo por usuários externos, notadamente advogados.
Há um infinito número de funcionalidades no sistema, cuja descrição refoge ao escopo deste trabalho. Porém, merece registro que o Gproc é uma notável ferramenta de desburocratização e agilização dos processos, cujos efeitos serão cada vez mais percebidos à medida que novas funcionalidades forem colocadas em produção.
9 E-Proc: presente e futuro – sustentabilidade intra e intergeracional
Muito embora o processo eletrônico seja, a partir de uma visão superficial, somente um programa de computador, na prática provocou uma mudança profunda na prestação jurisdicional, podendo ser considerado uma revolução sem precedentes no âmbito da administração da Justiça e da governança do Poder Judiciário. Com o processo eletrônico, o “serviço público justiça” nunca mais será o mesmo. Talvez no futuro seja possível fazer uma divisão imaginária entre antes e depois do e-Proc.
E mais: os efeitos do e-Proc não estão limitados à esfera interna corporis da instituição judicial ou daquela de seus operadores, pois espraiou seus efeitos para toda a sociedade, diretamente para os jurisdicionados e indiretamente para a cidadania de um modo geral.
Daí que o e-Proc apresenta um caráter multidimensional, impregnando seus efeitos em todos os recantos da vida social, podendo ser visto, no mínimo, sob os mesmos cinco enfoques que qualificam a sustentabilidade, ou seja, a partir de sua (1) dimensão social; da (2) dimensão ambiental; da (3) dimensão econômica; da (4) dimensão ética; e da (5) dimensão jurídico-política.
Iluminado sob o prisma da (1) dimensão social, observa-se que o e-Proc, a partir de seu objetivo inicial de atuar sobre a efetividade da justiça, passa a atender, de plano, a uma das mais veementes queixas da sociedade, qual seja, a morosidade da prestação jurisdicional, e apresenta-se como o instrumento mais adequado para cumprir o princípio constitucional do direito fundamental à razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII).
Sob a ótica do jurisdicionado, ou seja, do destinatário do serviço público judicial, há uma nova motivação e esperança na atuação do Poder Judiciário, porquanto a tão sonhada justiça deixa de ser uma quimera e se transforma em uma verdadeira efetivação dos direitos, uma vez que, comprovadamente, as demandas chegam ao seu final em até cinco vezes menos tempo.
O jurisdicionado passou, com o e-Proc, a ter possibilidade de acompanhar o andamento de seu processo por meio da Internet, inclusive da íntegra das decisões judiciais e em tempo real. A partir dessa consulta, o jurisdicionado, por si, por um parente próximo ou pessoa de sua confiança, pode saber se “ganhou” ou se “perdeu” a ação judicial, em que termos foi sua vitória ou sua derrota e, se for o caso, ter conhecimento do valor do alvará de levantamento de dinheiro em seu favor, coibindo os casos, felizmente raros, de desvios de créditos dos vencedores em demandas judiciais, notadamente de segurados da Previdência Social e de classes menos favorecidas da população.
No mais, é razoável a conclusão de que uma justiça mais ágil e efetiva beneficia toda a sociedade, pois não é possível segregar o indivíduo de sua dimensão social.
De outra banda, constata-se que o processo eletrônico está muito bem afeiçoado à atual sociedade do conhecimento, totalmente interligada em rede, e de modo muito especial por meio das denominadas redes sociais, sendo de compreensão muito mais fácil, inclusive na sua linguagem, pelas gerações atuais – geração “X” e geração “Y”, a grande maioria dos operadores do Sistema de Justiça, que já estão chegando ao comando do Poder Judiciário. Sem dúvida que o processo eletrônico, com toda sua plêiade de ferramentas, é, hoje, a única forma que tem o Poder Judiciário de acompanhar pari passu a vertiginosa re/evolução social. E poderá ser o modelo de transição para uma forma de prestação jurisdicional ainda mais avançada, capaz de atender às demandas da geração “Z” e posteriores, que já começam a chegar ao mercado de trabalho.
Daí ser evidente o caráter intergeracional dos benefícios alcançados pelo e-Proc, na medida em que as gerações futuras receberão um Poder Judiciário saneado e capacitado para oferecer seus serviços com qualidade e em tempo justo.
A (2) dimensão ambiental do e-Proc apresenta-se com soberana vantagem sobre a sistemática tradicional do processo físico, constituindo-se em verdadeiro parceiro do meio ambiente.
A ausência de autos físicos faz simplesmente desaparecerem diversos impactos ambientais danosos que, com o uso do papel, de regra, passam despercebidos, tais como corte de árvores, consumo de água, uso de produtos químicos, gasto de energia, entre outros insumos necessários para a produção do papel.
Os autos físicos necessitam ser transportados, seja quando o advogado “faz carga”, seja para transitar entre os diversos graus de jurisdição, não raro tendo que “viajar” até o Planalto Central para exame de recurso extraordinário, especial ou revista pelas Cortes Superiores e retornar, depois de julgado, às instâncias originárias. E registre-se, por oportuno, que a matriz de transporte brasileira ainda está embasada em combustíveis de origem fóssil, do que decorrem os milhares de litros de diesel, gasolina, lubrificantes, pneus, estradas asfaltadas que são utilizadas anualmente só com o transporte de malotes e mais malotes de processos físicos.
De outro lado, o processo físico, enquanto em andamento, ocupa significativo espaço dos cartórios, com mesas, escaninhos e armários, o que faz demandar, dado o grande volume de processos, também, prédios grandes, com reflexos imediatos no consumo de energia elétrica, entre outros impactos ao meio ambiente. E, depois de findo, o processo físico, verdadeiro “resíduo” do sistema judiciário, necessita ser arquivado em depósitos – os chamados arquivos-gerais, que demandam grandes prédios, verdadeiros armazéns, causando renovado e permanente impacto ambiental de diversas ordens na sua manutenção.
E, como observado linhas acima, o processo físico se caracteriza por ser extremamente burocrático, o que faz aumentar a necessidade de mais mão de obra para seu processamento e seu andamento, caracterizando mais uma forma de impacto ambiental traduzida na necessidade de prédios e no consumo de energia.
O e-Proc, em razão de os autos judiciais serem totalmente eletrônicos, faz desaparecer ou reduz drasticamente todos os impactos do processo físico no meio ambiente.
Deixando de existir papel, muitos e muitos hectares de reflorestamento são poupados e podem ter um destino mais nobre, como a produção de alimentos. Em um Brasil em que os recursos hídricos dos grandes centros urbanos e industriais estão cada vez mais escassos, toda economia de água será bem-vinda. O processo eletrônico não consome uma gota sequer de produtos químicos.
Em razão de o e-Proc estar hospedado na rede mundial de computadores e transitar integralmente pela Internet, podendo ser acessado de qualquer lugar do mundo pela rede, em tempo real, e “viajar” entre os diversos graus de jurisdição de forma totalmente eletrônica, não consome um litro sequer de combustíveis fósseis.
Todos os processos eletrônicos da Justiça Federal podem ser armazenados em um banco de dados do tamanho de um único armário, minimizando significativamente a necessidade de espaços físicos e reduzindo drasticamente o impacto ambiental.
E, considerando que, no processo eletrônico, a burocracia fica totalmente eliminada, diminui a necessidade de servidores, e os cartórios passam a exigir menor espaço físico, o que também se transforma em vantagem para o meio ambiente.
É verdade que o processo eletrônico consome energia elétrica, mas a economia que é feita com a iluminação e o condicionamento de ar de cartórios menores já é suficiente para cobrir totalmente o consumo de energia do processo eletrônico.
Ademais, considerando que o Brasil caminha, cada vez mais, para a conversão da matriz de produção de energia elétrica para o baixo carbono e fontes renováveis, pode se concluir que, em um futuro muito próximo, o e-Proc não causará nenhum tipo de impacto ambiental, podendo tranquilamente receber o selo ISO 14000.
Na (3) dimensão econômica, os benefícios do e-Proc saltam aos olhos, pois consegue obter muito mais eficiência como instrumento de administração da justiça, cumprindo sua função social, ética e de equilíbrio ecológico e ainda provocando uma redução de custos sem precedentes.
O e-Proc permite à Justiça Federal fazer muito mais com o mesmo orçamento de custeio público, de investimentos e de pessoal.
Com a redução da burocracia processual causada pelo e-Proc, tem sido possível o redirecionamento de servidores, que até então atuavam em serviços meramente repetitivos, para atividades muito mais nobres, reduzindo a constante pressão pelo aumento de funcionários e valorizando ética e moralmente o quadro de pessoal, tanto do primeiro grau quanto do TRF.
A economia com os recursos orçamentários anteriormente utilizados para cobrir os custos com os insumos dos autos físicos, as despesas com malotes e transportes, manutenção predial e de mobiliário, entre outros, possibilitou a ampliação da rede de atendimento da justiça, como, por exemplo, a instalação de Unidades Avançadas de Atendimento (UAA) em pequenos municípios que até então não eram atendidos pela Justiça Federal.
Tendo em vista que todo o processamento das ações é feito à distância pelo e-Proc na “vara mãe”, as UAAs exigem uma estrutura predial e de servidores mínima para funcionamento, mas conseguem prestar todos os serviços que uma unidade completa prestaria, porém com custo “n” vezes menor.
O e-Proc também tem permitido que servidores de unidades ocasionalmente com menor volume de trabalho possam ser “lotados” remotamente em outras varas mais congestionadas, otimizando o serviço sem necessidade de remoções ou pagamento de diárias. Os chamados mutirões de sentença, que são situações em que juízes federais se oferecem para auxiliar colegas com um volume muito grande de processos que aguardam sentença, também são feitos pelo e-Proc, sem necessidade de qualquer deslocamento, seja do magistrado, seja do processo. Já há um movimento no sentido da criação de secretarias centralizadas para atender simultaneamente diversos gabinetes de magistrados, otimizando os recursos humanos e reduzindo custos.
Com o e-Proc os prédios da justiça já podem ser menores e mais eficientes, pois não necessitam mais suportar toneladas e toneladas de papel e armários para seu armazenamento. E, com isso, os móveis podem ser mais ergonômicos, melhorando as condições de saúde dos operadores.
Esses são apenas alguns exemplos dos benefícios econômicos proporcionados pelo e-Proc, mas com certeza muitos outros custos, diretos e indiretos, advindos da justiça tradicional, foram extintos, ou reduzidos, com a introdução do processo eletrônico.
Os advogados também são beneficiários diretos da economia proporcionada pelo e-Proc, pois não necessitam comparecer à sede da justiça para protocolar novos processos e petições, para tomar conhecimento da íntegra de sentença ou despachos, para examinar laudos periciais, etc., pois podem fazer tudo isso pela Internet, sem sair do escritório, direcionando o tempo inútil e, muitas vezes, arriscado “perdido” com deslocamentos para atividades mais eficientes e produtivas.
E o advogado economiza mesmo nas situações em que o deslocamento se faz necessário para comparecimento a audiências ou à sustentação oral no Tribunal, pois pode praticar tais atos em qualquer unidade da Justiça Federal por videoconferência. No futuro, esses atos poderão ser praticados, inclusive, do escritório do advogado.
Reduzindo o custo para o advogado, naturalmente reduz-se o custo para o jurisdicionado.
Como se pode concluir, a relação custo-benefício do e-Proc é muito superavitária, atacando diretamente no combate às despesas inúteis e ao desperdício, totalmente afeiçoado à responsabilidade fiscal, sem se descurar de sua função social, ética e de equilíbrio ecológico.
Examinado à luz da (4) dimensão ética, o e-Proc elevou a Justiça Federal da 4ª Região à realidade republicana e democrática nos padrões que a coletividade tanto reclama das instituições públicas.
Sendo conquista do e-Proc o oferecimento de uma Justiça rápida, efetiva e transparente na proteção de direitos individuais e coletivos, ganham luzes os primados da cidadania e da dignidade da pessoa humana, matrizes maiores da Carta Política brasileira (art. 1º, II e III).
Ademais, e dito antes, o jurisdicionado agora pode ter acesso à integra do “seu processo”, passando a ter controle não só da atividade jurisdicional, como também de seu próprio procurador ou representante, mediante uma breve pesquisa na Internet e com a “chave de acesso” fornecida por seu advogado ou pela Justiça Federal.
De outro lado, o interesse público à informação assegurado pelo art. 93, IX, da Constituição Federal passou a ter atenção toda especial, pois o e-Proc permitiu que todos julgamentos e atividades judiciais sejam publicados em tempo real na íntegra e automaticamente na Internet, exceto nos casos em que a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo assim o determine. O mesmo deve ser dito em relação às sessões de julgamento do Tribunal, desde a sustentação oral dos advogados até a leitura de votos dos julgadores, que podem ser acompanhadas em tempo real pelo sistema de “streaming” de multimídia (som, imagem e dados) via Internet, acessível a partir de qualquer computador ligado à rede desde qualquer lugar do mundo.
Por fim, a total transparência das informações e dos julgamentos tem potencializado os órgãos de defesa da sociedade, como o Ministério Público, a Defensoria Pública, os sindicatos, as associações e até os organismos internacionais, entre outros, a exercitarem com mais eficácia suas prerrogativas na defesa de liberdades públicas e privadas, direitos sociais e laborais, tanto individuais como coletivos, constituindo-se o e-Proc, também, em uma ferramenta de resguardo dos direitos previstos nos artigos 5º, 6º e 7º da Constituição Federal.
Em sua (5) dimensão jurídico-política, o e-Proc, aliado a outros projetos institucionais já mencionados, revela-se como opção do TRF-4ª Região para, contemporaneamente, democratizar o serviço público da Justiça por meio do combate à morosidade processual e garantir efetividade, transparência, ampliação dos serviços, redução de custos, adesão social e benefícios diretos e indiretos ao meio ambiente. O e-Proc revela-se, ainda, como opção jurídico-política para o futuro, não só para entregar o Tribunal para as próximas gerações livre das mazelas que por mais de dois séculos vêm atormentando o jurisdicionado, mas também apto para enfrentar as mudanças e os desafios que a evolução da sociedade deverá impor.
10 Alguns resultados alcançados
Embora o processo eletrônico da Justiça Federal da 4ª Região já tenha completado mais de uma década,(11) o e-Proc ganhou atenção nacional ao ser estendido para todos os ramos e graus de abrangência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região a partir de meados do ano de 2010, quando atingiu a plenitude de sua implantação.
Por evidente que os resultados não são imediatos, não só em razão da fase de transição, sempre lenta e dolorosa, mas principalmente devido ao impacto inercial sobre o natural e humano conservadorismo de magistrados, advogados, Ministério Público, defensores, servidores e até dos jurisdicionados.
Na aqui chamada fase de transição, o volume imenso de autos físicos então existentes, morosos e burocráticos, passou a conviver com o célere processo eletrônico, impondo um esforço quase desproporcional aos juízes e servidores, que precisaram atuar em dois sistemas totalmente incompatíveis entre si, o que, nessa fase inicial, acabava criando embaraços e dificuldades que exigiam trabalho adicional para todos.
Daí a opção jurídico-política do Tribunal em vedar, a partir da implantação total do processo eletrônico, a distribuição de novas causas no formato papel como meio de fazer superar no menor tempo possível a fase de transição, o que foi objeto de muita contestação de parte da Ordem dos Advogados do Brasil. Tinha o Tribunal a compreensão de que, permitindo a convivência do processo físico com o eletrônico, o conflito entre os dois sistemas seria permanente, e o e-Proc, em vez de gerar benefícios, criaria mais demandas à atividade jurisdicional.
Essa convivência desarmoniosa de dois métodos opostos de processamento de ações judiciais certamente foi uma das causas primordiais do embaçamento da visão dos operadores na percepção de que, superada a fase inicial, o e-Proc substituiria a sistemática velha com vantagens incomensuráveis, inclusive no que toca ao conforto e à produtividade de todos os envolvidos no serviço judicial.
O ápice de todo esse trabalho veio com o reconhecimento pelo Conselho Nacional de Justiça, ao publicar o Relatório Justiça em Números de 2015, ano-base 2014, que destacou o TRF-4ª Região como o tribunal federal mais eficiente e virtual do país, com a menor taxa de congestionamento.
Eis a íntegra da notícia(12):
“CNJ destaca TRF4 como o tribunal federal mais eficiente e virtual do país, com a menor taxa de congestionamento
Os desembargadores mais produtivos e, consequentemente, o tribunal federal menos congestionado do país, mesmo com alta demanda. Além disso, três entre quatro casos novos chegam por meio eletrônico para julgamento. Com esses dados, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) foi anunciado hoje (15.9), pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como o tribunal federal mais eficiente do país.
As informações referentes a 2014 foram reveladas nesta tarde em Brasília, como resultado da pesquisa Justiça em Números, que completa 10 anos em 2015. O relatório foi divulgado na abertura da 2ª Reunião Preparatória para o 9º Encontro do Poder Judiciário.
Produtividade e menor taxa de congestionamento
Os 27 desembargadores federais do TRF4 obtiveram o melhor índice de produtividade por magistrado (IPM): durante o ano passado, cada um deles baixou 4.809 processos na segunda instância, ou seja, julgaram recursos e encaminharam para análise da primeira instância.
Esse resultado garantiu também outro destaque para o TRF4: o tribunal federal do país com a menor taxa de congestionamento, com um índice de 42%, seguido pelo TRF5, que contabilizou 52%. Esse percentual é calculado pelo número de processos novos em relação aos julgados e aos que estão tramitando e mede a agilidade do tribunal, a capacidade da instituição de dar conta dos processos que entram e dos processos em andamento.
TRF4 com 100% de eficiência
O tribunal, como segundo grau da Justiça Federal da 4ª Região, obteve o índice de 100% em eficiência, juntamente com o TRF1. O número é resultado do Índice de Produtividade Comparada da Justiça (IPC-Jus), um indicador criado pelo CNJ que resume os dados recebidos pelo Sistema de Estatística do Poder Judiciário (SIESPJ) em uma única medida, de modo a refletir a produtividade ou a eficiência relativa dos tribunais.
4ª Região eletrônica
Com a implantação do e-Proc, o processo eletrônico utilizado há cinco anos em todos os graus e matérias de jurisdição, a Justiça Federal da 4ª Região foi considerada a mais virtual, com um índice de 96%. Em segundo lugar ficou o TRF2, com 91%. No primeiro grau, 100% dos casos novos ingressam de forma eletrônica no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná. Já no tribunal, o índice é de 74%: três entre quatro novas ações entram eletronicamente.
O TRF da 4ª Região tem sede em Porto Alegre e jurisdição sobre os estados do Paraná, do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.”
Como se denota da reportagem supra, no primeiro grau da Justiça Federal da 4ª Região, 100% dos processos ingressados são totalmente eletrônicos, sendo que esse índice cai para 74% quando se examina os ingressos de recursos no 2º grau de jurisdição. Esses 26% de processos não eletrônicos são decorrentes das apelações egressas da Justiça Estadual operando na chamada jurisdição delegada, que, como dito alhures, está com um grau de informatização muito aquém daquele obtido pelo TRF-4ª Região. E, mesmo assim, o CNJ concedeu ao TRF-4ª Região o título de tribunal mais eficiente entre os TRFs.
Estatísticas internas, entretanto, revelam uma diferença abissal na eficiência do TRF-4ª Região quando se compara o desempenho do processo eletrônico com o processo físico (oriundo da Justiça Estadual).
Com efeito, no cumprimento da meta 01 do CNJ,(13) os processos eletrônicos atingiram, na média geral, um percentual de 108,53%, quer dizer, foram julgados quase 10% a mais do que o número de causas ingressadas no ano de 2014, enquanto no processo físico esse desempenho baixa para 59,08%, ou seja, quase 40% dos novos processos físicos ficam acumulados para o ano seguinte, o que denota a necessidade de que novas medidas saneadoras sejam implementadas na jurisdição delegada.
Essa estatística também revela que, em relação aos processos totalmente digitais, o passivo processual do Tribunal está totalmente controlado.
Em uma comparação do tempo médio de tramitação entre processos físicos e eletrônicos, observa-se uma redução média que vai de 50% a até 80%, dependendo da classe da ação, tanto no primeiro quanto no segundo grau de jurisdição.
Em medição realizada, constatou-se que, em média, cada 1.000 (um mil) processos consomem 252 kg de papel e ocupam 12 metros lineares de estantes de arquivos próprios para armazenar processos findos. Considerando que a Justiça Federal da 4ª Região já tramitou, só nos últimos 5 anos, mais de 3,6 milhões de processos eletrônicos, conclui-se que mais de 900 toneladas de papel já foram poupadas e quase 45 quilômetros lineares de estantes puderam ser dispensados nessa meia década, o que pode ser traduzido para, além de uma redução vertiginosa de custos com a economia de insumos, mobiliário, salas e até prédios de arquivos, pessoal e materiais para sua manutenção, gastos com energia, higienização de autos findos, transporte de processos (malotes), etc., efetivos benefícios diretos para o meio ambiente, poupando-se todos os insumos do papel (árvores, químicos, água, tintas, etc.) e de construção e manutenção de móveis e prédios (energia, cerâmica, madeira, plástico, cimento, etc.).
Quanto aos recursos humanos, o processo eletrônico já permitiu o remanejamento de mais de 100 servidores que antes se ocupavam com atividades meramente burocráticas para a atividade-fim, somente no Tribunal, o que se traduz em melhoria dos serviços prestados aos usuários e também em valorização das pessoas envolvidas, um passo vigoroso em favor da dignidade da pessoa humana.
Há outra conta, muito simples de ser feita, relativamente aos gastos realizados com transporte pelos advogados de autores e de demandados, sob a égide de processos de papel, para comparecimento aos fóruns e ao Tribunal para exame de autos, retirada em carga, devolução de carga, protocolo de petições, recursos e contrarrazões, etc.: estimando-se o consumo médio de 10 litros de combustível por processo (dois advogados, um de cada parte, e quatro comparecimentos durante a vida do processo), chega-se à cifra de 36.000.000 de litros de combustíveis economizados em razão do e-Proc nos últimos cinco anos, encontrando-se, aqui, não só economia para o bolso dos advogados e partes, mas também benefícios diretos para o meio ambiente.
Em relação ao orçamento público e a partir da premissa de que cada processo eletrônico tem uma redução média de custo em torno de R$ 200,00, com a economia de insumos, malotes, correio, pessoal, transporte interno, armários, intimações e citações por oficiais de justiça, etc., os 3,6 milhões de processos que foram distribuídos no e-Proc nos últimos cinco anos já causaram um impacto de mais de R$ 720 milhões.
Esses recursos, entretanto, não significaram redução do orçamento, e sim redirecionamento para a melhoria dos serviços de prestação de justiça, daí o reconhecimento pelo Conselho Nacional de Justiça de que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região é o tribunal federal mais eficiente do Brasil.
Conclusão
Quase que simultaneamente, o mundo foi alertado pelo Relatório Brundtland da grave situação dos danos ao meio ambiente, e o Brasil, da crise da Justiça, decorrente, principalmente, da morosidade processual.
O Tribunal Regional Federal, surgido em 1989, por obra da chamada Constituição Cidadã de 1988, já veio inoculado com o gérmen da modernização e de uma prestação de jurisdição ambiental de qualidade, tendo participado ativamente da “Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável”, a Rio+20, em junho de 2012, na cidade do Rio de Janeiro.
Entre outros projetos e ações, o e-Proc pode ser considerado um dos instrumentos de desenvolvimento sustentável da Jurisdição Federal do Sul do Brasil (Estados do Paraná, do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina), atingindo, simultaneamente, os dois objetivos: (1) de avançar na qualidade e na eficiência da prestação jurisdicional e (2) de redução dos impactos negativos que a jurisdição tradicional causa ao meio ambiente, tanto para o presente quanto para o futuro.
Em um mundo globalizado e interligado em rede, em que vivemos na denominada sociedade da informação e que se transforma dia a dia, os impactos à prestação jurisdicional são também impressionantes, e o Poder Judiciário precisa estar preparado para essa revolução.
No mundo ocidental, a segunda onda de riqueza (o industrialismo, que deu origem à produção, à educação e à cultura em massa) está cedendo seu lugar preponderante, de forma cada vez mais acelerada, para a terceira onda de riqueza (sistema voltado para o pensar, o conhecer, o saber e o experimentar os frutos do conhecimento), na qual as necessidades das pessoas são praticamente iguais (tirante os países extremamente pobres), inexistindo diferenças sequer entre o interiorano e aquele que vive em grandes centros urbanos, o que reforça a ideia de que a revolução social está apenas começando.
Daí que o TRF-4ª Região não pode se conformar com os louros e os aplausos do sucesso até agora alcançado, devendo estar permanentemente evoluindo o e-Proc no mesmo compasso do avanço da demanda de jurisdição e de desenvolvimento sustentável, pois, como alerta Hobsbawm,(14) “não sabemos o que virá a seguir, nem como será o segundo milênio, embora possamos ter certeza de que ele terá sido moldado pelo Breve Século XX”.
Bibliografia consultada
ALEXADRINO, Marcelo. Direito administrativo descomplicado. 22. ed. São Paulo: Método, 2011.
BARROSO, Luis Roberto. Constituição da República Federativa do Brasil anotada. 5. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2006.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do direito. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
______. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
FREITAS, Thiago Pereira de. Sustentabilidade e as contratações públicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014.
HIROSE, Tadaaqui; GEBRAN NETO, João Pedro (orgs.). Curso Modular de Direito Constitucional. São Paulo: Conceito, 2010.
HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século XX. Traduzido por Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
PAULO, Vicente. Direito Constitucional descomplicado. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.
SANTOS, Murillo Giordan et al. (coords.). Licitações e contratações públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2013.
SEIFFERT, Mari Elizabete Bernardini. Gestão ambiental: instrumentos, esferas de ação e educação ambiental. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
______. ISO 14001 – sistemas de gestão ambiental: implantação objetiva e econômica. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
SIRVINKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
TOFLER, Alvin. A riqueza revolucionária. Traduzido por Maiza Prande Bernardello e Luiz Fernando Martins Esteves. São Paulo: Futura, 2007.
VILLAC, Teresa et al. (coords.). Panorama de licitações sustentáveis: direito e gestão pública. Belo Horizonte: Fórum, 2014.
Notas
1. <http://cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros>.
2. FREITAS, Thiago Pereira de. Sustentabilidade e as contratações públicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 11.
3. FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 303.
5. Cfe. Ricardo Stanziola, citado por Thiago Pereira de Freitas, op. cit., p. 13.
9. Disponível em: <http://www2.trf4.jus.br/trf4/diario/visualiza_documento_
adm.php?orgao=1&id_materia=202&reload=false>.
10. Resolução nº 100, de 24.11.2009, do CNJ.
11. O primeiro juizado especial federal totalmente eletrônico começou a funcionar em meados do ano de 2003.
12. <http://www2.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?
acao=noticia_visualizar&id_noticia=11301>.
13. Julgar quantidade maior de processos de conhecimento do que os distribuídos no ano corrente.
14. HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
|