Metamorfoses nos conceitos de Direito e de Soberania. O princípio da complementaridade. O Tribunal Penal Internacional e a Constituição


Autor: Carlos Alberto Simões de Tomaz
(Juiz Federal e Professor em Belo Horizonte. Pós-graduado em Direito Público pela PUC/MG. Mestrando em Direito das Relações Internacionais pelo UniCEUB/DF)

| Artigo publicado em 25.10.2004 |


Sumário
1. Introdução. 2. Uma nova compreensão do direito: a teoria da alopoiese jurídica. 3. A concepção clássica da soberania e a soberania compreendida como qualidade do poder do Estado entrelaçada em relações de inter-referências partindo do sistema jurídico para o sistema social, político e econômico. 4. O exercício da soberania em rede. A atuação de novos agentes. Uma nova constelação: a imprimida pela jurisdição complementar do Tribunal Penal Internacional – TPI, produto da atuação inter-referente da soberania, criando um sistema normativo garantidor heteroprodutivo. 5. Conformação do novo sistema normativo de garantia com o sistema interno brasileiro: o TPI e a Constituição. O princípio da complementaridade. 6. Bibliografia.

1. Introdução

Em recente entrevista, o Juiz da Corte Internacional de Justiça, FRANCISCO REZEK (2003, pp. 13 – 14), afirmou que os Estados responsáveis pelo ataque ao Iraque

“estão sujeitos à reprovação de outros tantos países, mais atentos ao Direito e à competência das Nações Unidas. À reprovação da opinião pública internacional, a começar pela opinião, em alguns casos largamente majoritária, de seus próprios povos. E a todas as conseqüências daquilo que, mesmo sob uma ótica estritamente militar, está sendo um desastre. Um desastre sangrento, desumano, e agravado a cada dia, como tudo aquilo que se empreende sem um mínimo de inteligência e de decência. Mas não há outras conseqüências, do gênero de uma pronta repressão da aventura internacionalmente ilícita. Esse é o grande drama do Direito Internacional do nosso tempo: a sanção só se materializa, no sistema das Nações Unidas, por obra do Conselho de Segurança, e este não tem, tecnicamente, como decidir contra o voto de qualquer dos cinco países detentores de assento permanente.”

A opinião do insigne jurista brasileiro expõe a fragilidade do sistema garantidor dos direitos humanos no terceiro milênio. Não faltam, efetivamente, agressões à dignidade da pessoa humana, sob as mais variadas formas de violação aos direitos humanos, desde guerras deflagradas sob o pálio de legítimo exercício de defesa à injusta agressão, a condutas omissivas, que igualmente conduzem a situações desastrosas, até mesmo catastróficas com perecimento de milhares de vidas em decorrência da miserabilidade de assola o eixo sul.

O princípio da dignidade da pessoa humana segundo BARROSO:

“identifica um espaço de integridade moral a ser assegurado a todas as pessoas por sua só existência no mundo. É um respeito à criação, independentemente de crença que se professe quanto à sua origem. A dignidade relaciona-se tanto com a liberdade e valores do espírito como com as condições materiais de subsistência. O desrespeito a este princípio terá sido um dos estigmas do século que se encerrou e a luta por sua afirmação um símbolo do novo tempo. Ele representa a superação da intolerância, da discriminação, da exclusão social, da violência, da incapacidade de aceitar o outro, o diferente, na plenitude de sua liberdade de ser, pensar e criar.” (2001, p. 31 – 32)

Nesse contexto, surge o Tribunal Penal Internacional – TPI, como proposta de sistema adicional garantidor dos direitos humanos, voltado para repelir a impunidade dos autores de crimes de maior gravidade de que têm sido vítimas milhões de crianças, homens e mulheres, que revelam atrocidades inimagináveis que chocam profundamente a consciência humana e constituem ameaça à paz, à segurança e ao bem-estar da humanidade, conforme disposto no preâmbulo do Estatuto de Roma que o criou.

Neste trabalho, será analisada a conformação do Estatuto do TPI com a Constituição brasileira à luz do princípio da complementaridade. Para tanto, serão enfrentados os conhecidos núcleos de conflitos entre a normatividade do sistema garantidor internacional e o direito brasileiro que residem na prisão perpétua, imprescritibilidade de crimes, entrega de nacionais e imunidades e prerrogativas de foro de agentes políticos.

As disposições do Estatuto sobre tais matérias, que num primeiro exame chocar-se-iam com comandos constitucionais, revelar-se-ão compatíveis dentro de uma análise voltada para imprimir densidade normativa ao princípio da dignidade da pessoa humana amparada em ponderação de valores e interesses. Essa ponderação principiológica afasta a aporia entre soberania e direito, desde que se abandone as concepções clássicas e se opere com uma moderna concepção de direito havida dentro do âmbito da alopoiese jurídica e, decorrente dela, uma nova concepção de soberania igualmente inter-referente e heteroprodutiva, que enseja a criação do TPI como novo sistema internacional garantidor e guarnece a compatibilidade de seu Estatuto com a Carta.


2. Uma nova concepção do direito: a teoria da alopoiese jurídica


A tradicional idéia de reduzir o direito à norma expressa ainda goza de foros de exclusividade dentre os cientistas do direito. Poucos se aventuram a admitir a ordem de raciocínio que aqui se vai deduzir, não obstante a expansão do pensamento seja crescente. SOBOTA (1995, p. 251) divisa este fenômeno, quando registra que “A maioria das pessoas, nas democracias modernas, parece estar convencida de que o direito é um sistema constituído de normas explícitas... Essa fachada normativa é a versão popular de uma concepção teórica que se desenvolveu a partir do espírito do iluminismo e da admiração pelos sucessos da ciência, refletidos no movimento positivista do fim do século XIX e começo do século XX...”

Por esse caminho, o direito fica reduzido a um sistema fechado com a pretensão de dispor sobre a conduta humana através de um ordenamento hermético, auto-suficiente e autoprodutivo.

Porém, o fenômeno jurídico pode ser enfrentado sob outro prisma. Desta feita, relacionando-o a outros sistemas como o social, o político e o econômico, numa relação de heteroreferência. MAIA (1999, pp. 42 - 44) faz ver que este veio partiu da “teoria biológica da autopoiesis, criada pelos biólogos Maturana e Varela e implantada nas ciências sociais por Niklas Luhmann, assentando que:

“Os chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela buscaram, através da teoria da autopoiesis, resolver uma das questões que mais intrigam o ser humano desde tempos imemoriais: a da vida. Como determinar que certo sistema biológico possa ser considerado um sistema vivo? O que caracteriza um sistema vivo, independentemente das contingências de tempo e espaço que o meio circundante oferece? (Antunes in Teuber, 1993, II-III) Para solucionar esse complexo e gigantesco impasse, tais cientistas biológicos propuseram a seguinte idéia: o que caracteriza um sistema vivo – animal ou vegetal – é a sua autonomia, ou seja, cada sistema vivo possuiria uma forma de produção própria, fechada, circular e auto-referencial de constituir as relações dos elementos que compõem aquele sistema.

A auto-referência biológica estaria no fato de que a interação entre os próprios elementos componentes do sistema é o que caracterizaria a sua própria ordem interna. Não haveria, por conseguinte, elementos externos que pudessem influenciar de maneira direta aquele sistema, pois os seus próprios componentes já bastam de per si para que as relações, sempre sistemáticas, se dêem de uma maneira a diferenciar aquele sistema, agora dito “vivo”, dos demais que lhe são distintos. Tal afirmativa é defendida com tal veemência que os autores defendem que a autopoiese é, em síntese, a “condição última, necessária e suficiente, para a própria vida” (Maturana e Varela, 1981: XVII). Essa ordem, além de auto-referente, é também auto-reprodutiva, pois os elementos dos sistemas vivos são produzidos pelo próprio mecanismo autopoiético de relações.

O organismo vivo também seria dotado, como um corolário da idéia da autopoiese, de uma clausura organizacional (organizational closure), que consistiria na auto-observação sistemática, pois os elementos desse sistema se referem sempre a si mesmos, como um grande conjunto de relações internas, e não aos meios circundantes. Todavia, essa idéia de clausura organizacional traz à luz um posicionamento epistemológico interessante: a afirmativa de que as observações efetuadas pelos organismos vivos ao mundo exterior não passam, na verdade, de uma observação de si próprios, pois a clausura pressupõe a observância de relação entre observador-observado, visto que o observado seria a visão obtida pelo observador da realidade que o cerca. Logo, o observador não pode realmente explicar o objeto observado, mas tão-somente obter a sua impressão de como o objeto observado lhe parece. Seriam discrições que o próprio observador faria, não conseguindo perceber a essência ontológica do observado (Mutana e Varela, 1981:39). Em síntese, pode-se dizer que a teoria da autopoiese se resume a três fatores que são característicos desses sistemas: são fechados, circulares e auto-referentes, como já explicado acima.
A autopoiese do sistema biológico deu origem a uma verdadeira avalanche de estudos nas mais diversas áreas do conhecimento. Essa interdisciplinariedade também atingiu a Sociologia e o Direito, com várias formas de teorização.”

Sob o prisma deste entendimento, o fundamento do direito estaria nele próprio e o fenômeno jurídico com a experiência jurídica a ele inerente, ocorria num sistema fechado, autoprodutivo e auto-referente. A visão oposta coloca o direito num sistema aberto, inter ou hetero-referencial (alopoiese), onde até mesmo sua legitimidade encontraria espaço também em elementos externos, circundantes, ou como se queira, nos sistemas político, social e econômico e não apenas no próprio direito. Por esse caminho busca-se trazer o direito dogmático para um contato aberto com a vida, e a experiência jurídica se completa com elementos externos trazidos de outros sistemas, que em completude vão imprimir o passo para compreensão do fenômeno jurídico que não deixa de ter como referência primeira a norma, mas não apenas ela.

Para encetar melhor a compreensão do tema, toma-se a liberdade de remeter a teoria da autopoiese à química. Tome-se por exemplo um composto químico simples: a água. Ora, em laboratório, para se obter água bastará que se junte dois átomos de hidrogênio na presença de um átomo de oxigênio (2H + O = H2O) não é preciso nenhum elemento externo. É dizer, o sistema se autoproduz. Coisa diversa se tem quando para produção de um composto químico a presença dos elementos, per si, não se avulta suficiente para tanto, porque o sistema não é autoprodutivo, necessitando, desde aí, de um elemento externo chamado naquela ciência de reagente. Assim, quando a polícia se utiliza de bafômetro para verificar o nível de álcool em um indivíduo, é preciso um reagente, o dicromato de potássio (K2Cr2O7) sem o qual não ocorre oxidação orgânica, que indica a existência de etanol no organismo. A experiência química, na hipótese, processou-se por meio de heterointerferência, mercê da qual se trouxe um elemento externo, sem o qual o resultado não seria alcançado, revelando tratar-se de um sistema não autoprodutivo, portanto, alopoiese: de al, állos, do grego, elemento de composição significando “outro”, “um outro” ou “diferente” e poíesis: do grego, elemento de composição significando “formação”, “criação”, segundo FERREIRA (1986, pp. 90 e 1352).

Pois bem. Quem ainda não rompeu o paradigma liberal-legal do Estado, quando indagado se o direito penal constitui um sistema aberto ou fechado, não hesitará um só instante em responder que o direito penal é um sistema fechado, ou como se queira, autopoiético, porque, na definição dos tipos penais, ou os elementos normativos se encontram presentes ou não existe o tipo, porque naquele campo do direito se diz que vigora o princípio da estrita legalidade (Nullum crimen, nulla poena sine praevia lege). Ou a tipologia se diz presente, delineando, gizando a conduta típica ou o espaço é de liberdade. Ora, não se pode olvidar, todavia, que até mesmo no direito penal, onde estão em causa valores maiores da essencialidade humana como a vida, a liberdade e a integridade física e moral, existem normas que conduzem, isto sim, a uma experiência jurídica pelo campo da alopoiese. De fato, que dizer das conhecidas normas penais em branco? Como pode o cientista do direito aplicar a norma penal em branco sem se valer de elementos externos a ela? Aonde estão, por exemplo, as doenças cuja notificação é compulsória a fim de ensejar a tipicidade prevista no art. 269 do CP? Quais as mercadorias cuja internação ou exportação são defesas e quais as alíquotas de imposto devidas a ponto de se poder configurar os crimes de contrabando e descaminho na forma do art. 334 do CP? Em ambas as hipóteses, a heteroreferência aponta para outras normas que ,se não existirem, não haverá como aplicar o referido dispositivo.

Porém, às vezes, o elemento externo à norma, para ensejar sua eficácia, não se encontra em outra norma. Para alcançá-lo, o intérprete terá que se socorrer dos sistemas social, econômico ou político. Que dizer, por exemplo, da qualificadora do homicídio prevista no art. 121, § 2º, III, do CP? Por ali, vê-se que, se o homicídio é cometido “com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum,” poderá ter a pena exacerbada. Não há no sistema jurídico brasileiro nenhuma norma que estabeleça quais os outros meios insidiosos ou cruéis ou quais as situações que possam resultar perigo comum a ponto de qualificar o homicídio. O sistema jurídico não se autoproduz! Que dizer, ainda, do tipo previsto no art. 219 do CP: “Raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou fraude, para fim libidinoso...” O que é ou deve se entender pela expressão etimológica mulher honesta?!! Qual ou quais os paradigmas de que se valerá o cientista do direito para imprimir eficácia ao dispositivo? Aqui, sem dúvida, haverá elementos externos que vão influenciar de maneira direta no sistema, pois os seus próprios componentes não bastam de per si para ensejar o seu processamento a ponto de produzir efeitos.

Acredita-se que, a essa altura, já se possa compreender e aceitar que direito não é exclusivamente norma! Que está correta a visão de João Maurício Adeodato na esteira do pensamento de Niklas Luhmann, muito bem dissecada por MAIA (1999, p. 55), quando entende que é preciso bem caracterizar procedimentos extradogmáticos voltados para estabelecer na realidade a estrutura do Estado.

A caracterização de tais procedimentos extradogmáticos revelará o conteúdo alopoiético do direito e colocará o seu cientista diante de duas grandes funções: 1ª) divisar o direito como um sistema aberto que se integra com elementos inter-referenciais provenientes dos sistemas social, econômico e político; e 2ª) expungir desta abertura os procedimentos extradogmáticos ou elementos inter-referenciais nocivos porque não legitimadores do direito, não se encontram voltados para a plenificação e a eficácia do fundamento da dignidade da pessoa humana.

É sob o pálio desta compreensão que a soberania deve ser enfrentada, quando se deparará com procedimentos extradogmáticos, que, inelutavelmente, integram o sistema jurídico concebido em sua inteireza como essencialmente aberto, seja no âmbito interno, seja no âmbito das relações internacionais.

3. A concepção clássica da soberania e a soberania compreendida como qualidade do poder do Estado entrelaçada em relações de inter-referências partindo do sistema jurídico para o sistema social, político e econômico

O homem, quando nasce, já se encontra mergulhado na estrutura de poder do grupo primário: o poder de família, segundo a nova nomenclatura do novo Código Civil, que permite a tomada de decisões em relação a pessoa dos incapazes e de seus bens. Mas o homem começa a participar de grupos sociais secundários, onde são deflagradas novas relações de poder, como por exemplo, igreja, escola, associações econômicas, culturais, recreativas, de classe, sindicatos, partidos políticos, etc. Então, existe, dentro do Estado, o poder da família, da igreja, das universidades, das corporações econômicas, dos times de futebol, da OAB, do CREA, dos sindicatos dos trabalhadores e da representação patronal, das várias opções políticas organizadas em partido, das federações, confederações, etc., etc. Mas há de haver um poder que se sobreponha a todas estas esferas de poder. Um poder que decida o conflito de interesse deflagrado entre o indivíduo e quaisquer grupos, dos indivíduos entre si e das próprias esferas de poder entre si. Desse poder se diz ser o poder de decisão em última instância dentro do âmbito do Estado, que não admite poder maior nem igual a ele (suprema potestas superiorem non recognoscens). Essa qualidade do poder do Estado é a soberania. (1)

A soberania, todavia, se projeta no plano externo. E aqui, ela pode ser encarada como a qualidade do poder do Estado de não admitir, no plano internacional, a existência de poder maior do que o poder estatal. Admite, tão apenas, poderes iguais.

Nessa perspectiva, vê-se que a soberania foi tomada como uma qualidade do poder, não como um elemento constitutivo, como defendem alguns, o que permite admitir a existência de Estados que conseguem expressar essa qualidade do poder em grau maior do que outros no plano internacional. Com efeito, do ponto de vista jurídico a norma de Direito Internacional Público vazada no princípio da igualdade entre os Estados propugna por que, repita-se, do ponto de vista exclusivamente jurídico, todos os Estados sejam igualmente soberanos porque gozam da mesma personalidade jurídica internacional, encontrando-se, portanto, igualmente capacitados para adquirir direitos e contrair obrigações. Por outro lado, enfrentada a questão sob o prisma político, militar, econômico, científico ou tecnológico, não há como não admitir que existam Estados que conseguem expressar em maior grau essa qualidade de seu poder ou, como se queira, Estados mais soberanos que outros.

O conceito de soberania tem, todavia, sofrido o impacto das mudanças que o mundo tem enfrentado nas últimas décadas do século passado e no início deste século. Deveras, não se pode mais concebê-la, como fez KELSEN (1992, p. 161), “apenas dentro do domínio do normativo”. Com efeito, a projeção desta qualidade do poder do Estado encontra-se entrelaçada num amálgama de relações que não se projetam exclusivamente no campo normativo. Atento a este aspecto FERRAJOLI (2002, p.1), de início, já chama a atenção para que a “Soberania é o conceito ao mesmo tempo jurídico e político, em torno do qual se adensam todos os problemas e aporias da teoria juspositivista do direito e do Estado.”

Deveras, assim como próprio direito não pode mais ser compreendido sob uma visão exclusivamente normativista, porque legitimado e operado, como acima se viu, num sistema aberto, mercê de um complexo de relações de inter-referências, a soberania, igualmente, não pode ser mais concebida, legitimada e operada num sistema hermeticamente fechado que seria o sistema jurídico do Estado concebido como fonte exclusiva de criação e aplicação normativa.

A partir daí, divisa-se uma concepção aberta da soberania para havê-la mesclada em redes de relações de heteroreferências partindo do sistema jurídico para o sistema social, político e econômico.

De fato, a influência de impérios e estados hegemônicos hodiernamente cada vez mais se faz sentir não apenas através de seu hard power (poderio econômico, militar, científico- tecnológico, etc). A atuação indireta da soberania através de um círculo de inter-referências socio-culturais aponta para um exercício do poder em rede, como adiante se verá, e sem dúvida é de um peso muito maior na exata medida em que, como percebeu com argúcia CHACON (2003, p. 52), “O poder mais psicológico, porque o mais amplo, é o cultural, capaz até de comandar sem ‘co-mando’, mantido, com freqüência só nas aparências disfarçantes da conquista por corações e mentes”. Essa atuação da soberania tem recebido o nome de soft power(2) e revela-se na difusão e infusão de hábitos, modismos, consumismos, música, esportes, etc... no mundo globalizado. Desconsiderar ou não dar a devida importância a esse fenômeno é olvidar a realidade dos fatos que revelam os novos caminhos pelos quais o Estado palmilha no plano interno e externo.

Efetivamente, é preciso se ter presente que não apenas o capital e a tecnologia romperam as fronteiras do Estado nacional, mas com mesma amplitude o crime organizado. Segundo CASTELLS (2002, P. 40) “as atividades criminosas e organizações ao estilo da máfia de todo o mundo também se tornaram globais e informacionais, propiciando meios para o encorajamento de hiperatividade mental e desejo proibido, juntamente com toda e qualquer forma de negócio ilícito procurado por nossas sociedades, de armas sofisticadas à carne humana.”. Efetivamente, hoje divisa-se a existência de redes criminosas internacionais para tráfico de entorpecentes, órgãos, crianças, mulheres, armas, capital ilícito, etc. Para fazer face a esse fenômeno, igualmente vicejam redes de proteção cuja atuação se expressa sob as mais variadas organizações não-governamentais.

Esse amálgama de inter-referências, nessa conformidade, ora se desenvolve em amparo ao processo democrático buscando a inserção e a integração de comunidades ao escopo de tutelar e ensejar a eficácia dos direitos humanos, ora se desenvolve exatamente ao fito contrário. Aqui, vê-se travada verdadeira batalha. Essa luta, no plano interno, tem propiciado a consolidação do Estado constitucional de direito, que submete o exercício da soberania aos limites normativos, mas a norma, sendo produto da vontade popular, avulta-se soberana, de tal sorte que esse círculo garante a legitimidade e resolveria uma possível antinomia entre a soberania, como poder supremo que não reconhece outro acima de si, e sua limitação jurídica. FERRAJOLI (2002, p. 44) reproduz esse fenômeno com clareza lapidar afirmando que

“Essa antinomia, como já se viu, resolveu-se no plano do direito interno com o nascimento do estado constitucional de direito, em virtude do qual o direito regula a si próprio, impondo à sua produção vínculos não mais apenas formais, ou seja, relativos às suas formas, mas também substanciais, ou seja, relativos aos seus conteúdos, e assim condicionando não mais apenas o vigor das normas produzidas, mediante normas sobre os procedimentos, mas também sua validade substancial, mediante normas sobre os direitos fundamentais. No estado de direito, portanto, não existe nenhum soberano, a menos que não se entenda como “soberana”, como puro artifício retórico, a própria constituição, ou melhor, o sistema de limites e de vínculos jurídicos por ela impostos aos poderes públicos já não mais soberanos.”

O problema, todavia, assume conotação diferente quando enfrentado em face da soberania externa. Deveras, a ausência no âmbito internacional de uma norma legitimadora que igualmente imponha ao Estado vínculos formais e materiais sempre ensejou o exercício da soberania de forma absoluta e unilateral. De tal sorte, quando hoje se cuida de estabelecer no plano externo um quadro formal e material legitimador e garantidor (ius cogens), que implicaria evidenciar a antinomia entre soberania e direito, o que obviamente apenas se processará como ressalta FERRAJOLI parodiando DWORKIN, se se “ ‘levar a sério’ o direito internacional: e, portanto, assumir seus princípios como vinculadores e seu projeto normativo como perspectiva alternativa àquilo que de fato acontece; validá-los como chaves de interpretação e fontes de crítica e deslegitimação do existente; enfim, planejar as formas institucionais, as garantias jurídicas e as estratégicas políticas para realizá-los” (2002, p. 46).

Enquanto isso não se efetiva, multiplicam-se as violações aos direitos fundamentais, à paz e à segurança, e outro caminho não se avulta senão divisar e operar a soberania sobre outro paradigma de modo a acompanhar o que acontece, o que existe: o desenvolvimento de núcleos de poder (não apenas estatal) hegemônicos e voltados para atuação em rede de modo a infundir, difundir e perpetrar as mais atrozes violações ao princípio da dignidade da pessoa humana.

4. O exercício da soberania em rede. A atuação de novos agentes. Uma nova constelação: a imprimida pela jurisdição complementar do Tribunal Penal Internacional – TPI, produto da atuação inter-referente da soberania, criando um sistema normativo garantidor heteroprodutivo

A clássica idéia de soberania como poder supremo, absoluto, que não admite nenhum outro maior que si, não mais se sustenta diante da realidade das relações internacionais. A idéia de um poder soberano, cuja legitimação e limites encontram-se exclusivamente na norma por ele criada e aplicada, entra em confronto com a convivência internacional das últimas décadas e o irrompimento do fenômeno da globalização.

De fato, a relação de dominação tem encontrado hodiernamente enfrentamento como se percebe das idéias de BOBBIO (2002, p. 67) para quem o poder tem se estendido da esfera das relações políticas para as relações em que o indivíduo aparece como centro de irradiação de vontade, naquilo que se tem chamado fenômeno da expansão ascendente do poder voltado para alterar o sentido do vetor.

A idéia, a bem da verdade, já se encontra esboçada em FOUCAULT (2002, p. 184) quando assevera que:

“... o importante não é fazer uma espécie de dedução do poder que, partindo do centro, procuraria ver até onde se prolonga para baixo, em que medida se reproduz, até chegar aos elementos moleculares da sociedade. Deve-se, antes, fazer uma análise ascendente do poder: partir dos mecanismos infinitesimais que têm uma história, um caminho, técnicas e táticas e depois examinar como estes mecanismos de poder foram e ainda são investidos, colonizados, utilizados, subjugados, transformados, deslocados, desdobrados, etc, por mecanismos cada vez mais gerais e por formas de dominação global.”

Para o renomado autor, a microfísica do poder implicaria numa opção metodológica onde
“O poder deve ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca é apropriado como uma riqueza ou um bem. O poder funciona e se exerce em rede. Nas suas malhas os indivíduos não só circulam mas estão sempre em posição de exercer este poder e de sofrer sua ação; nunca são o alvo inerte ou consentido do poder, são sempre centros de transmissão. Em outros termos, o poder não se aplica aos indivíduos, passa por eles.” (FOUCAULT, 2002, p. 193) (o destaque não está no original)

Dentro dessa linha de argumentação é possível afirmar que o fenômeno da expansão ascendente do poder, guarnecido sob o manto da subsidiariedade, propicia o exercício do poder em rede e tem se erigido em tendência para fortalecimento da democracia, ao passo que, ao mesmo tempo, impinge gravitação, que a depender da intensidade com que o fenômeno se desenvolva nas próximas décadas, terá o condão de, senão desviar, ao menos suportar em melhores condições os efeitos irradiantes de núcleos hegemônicos de poder, sobretudo do Estado líder mundial. Com isso, não se pretende defenestrar a globalização, bandeira sob a qual se irradia a expansão da cultura ocidental, untada pelo fortalecimento de um capitalismo atroz, tendente a aniquilar o equilíbrio que deve haver no binômio capital X trabalho. Definitivamente não! A globalização é inevitável.

Todavia, ajustar os Estados periféricos à globalização tem conduzido a uma situação de exclusão, onde a soberania popular e o princípio da dignidade da pessoa humana têm sido postos de lado em face da sobrepujança de um unilateralismo massificante. Em nome da globalização tem-se levado à falência pequenas e médias empresas nacionais a fim de propiciar a entrada de produtos dos países do primeiro mundo. Tem-se assistido a privatizações, entregando-se, sem controles, o poder e a riqueza de empresas estatais, o que tem acarretado conseqüências desastrosas para as relações de consumo. Tem-se reduzido os direitos sociais, especialmente os dos trabalhadores, aniquilando-se com a proteção à despedida arbitrária, reduzindo-se salários, amesquinhando-se aposentadorias, tudo em nome de uma reforma social. Assiste-se, ainda, a uma redução significativa de aporte de recursos do governo central aos governos locais, desfigurando-se federações e fazendo-se tábula rasa do princípio da subsidiariedade, prejudicando o desenvolvimento das regiões mais pobres. Os sistemas de saúde e de educação têm cada vez mais sua responsabilidade imputada aos governos locais ou à própria comunidade. Com isso, sucateiam-se escolas e hospitais. A carga tributária aumenta em nome de um pacto fiscal. Tudo, enfim, em defesa do que se preconizou chamar de “Reforma do Estado” ou “Modernização do Estado”, ao escopo de preparar o Estado para enfrentar o terceiro milênio com um mundo globalizado. Neste contexto, algumas perguntas se impõem: a que propósito tais medidas? Mascarariam objetivos outros? Avultam-se como o caminho adequado a ser palmilhado? O pesado sacrifício que se tem imposto aos povos periféricos pelos Estados-núcleos justifica-se em nome de uma globalização que propiciará a integração desses povos a um contexto comunitário internacional apto a garantir a dignidade da pessoa humana, a plenificação dos direitos fundamentais e o fortalecimento da democracia?

Há, sem dúvida, caminhos para a globalização ensejar desenvolvimento, bem-estar social, fortalecimento da vontade popular e, via de conseqüência, da democracia e em decorrência viabilizar a paz entre os povos, assegurar, enfim, em uma palavra, por mais paradoxal que possa parecer, inclusão. Sim, uma globalização de inclusão, com base teorética lastreada, entre tantos outros caminhos, pelos percorridos nesta monografia, onde os benefícios de acesso ao desenvolvimento, à tecnologia, aos bens e aos serviços, possam ser estendidos aos povos dos Estados periféricos e experimentados por todos os indivíduos. Uma globalização que respeite as identidades multicivilizacionais, não partindo, portanto, do falso suposto de hegemonia de uma cultura.

Enfrentando a globalização, HABERMAS (2001, p. 84) utiliza o conceito “para a descrição de um processo, não de um estado final. Ele caracteriza a quantidade cada vez maior e a intensificação das relações de troca, de comunicação e de trânsito para além das fronteiras nacionais.”

Esse processo enseja o que o autor alemão convencionou denominar de nova constelação pós-nacional, que revelaria o ambiente de mudanças onde o Estado nacional atuará neste novo milênio. Esse ambiente impõe uma agenda de políticas públicas onde o Estado aparece tomando ciência que não mais detém o monopólio do direito, ante a atuação de antigos e novos atores num ambiente muito mais complexo e denso.

Divisando a atuação da sociedade em rede, prossegue HABERMAS (2001, p. 84) afirmando que:

“Assim como no século XIX o trem, o barco a vapor e o telégrafo intensificaram o trânsito de bens e das pessoas bem como a troca de informações, assim hoje em dia a tecnologia dos satélites, a navegação aérea e a comunicação digital criam novamente redes mais amplas e densas. “Rede” [Netzwerk] tornou-se uma palavra-chave, e tanto faz se se trata das vias de transporte para bens e pessoas, de correntes de mercadorias, capital e dinheiro, de transmissão e processamento eletrônicos de informações ou de circulações de pessoas, técnicas e natureza. Cadeias temporais comprovam as tendências globalizantes em muitas dimensões. O termo encontra igualmente aplicação na expansão intercontinental da telecomunicação, do turismo de massa ou da cultura de massa, bem como nos riscos transnacionais da técnica de ponta e do comércio de armas, nos efeitos colaterais mundiais do ecossistema explorado ou no trabalho conjunto internacional de organizações governamentais e não-governamentais”.

Todavia, a globalização tem imprimido uma legitimação do poder através de uma identidade imposta, padronizada e não-diferenciada como aponta CASTELLS (2001, p. 25). Nesse quadro, os indivíduos têm buscado se organizar sob o manto de fatores de identidade individual ou coletiva e, a partir daí, imprimido uma nova significação à globalização. O poder dessa identidade tem despertado a cada dia e tem se contraposto a uma identidade, como se disse, padronizada, imposta e não-diferenciada. O ambiente propício para o florescimento dessa identidade é o multiculturalismo, que se avulta como antídoto ao nivelamento de uma cultura dita ocidental. CASTELLS, na série aqui já referenciada, tem se preocupado com a legitimação dessa identidade imposta pela globalização em descompasso com a identidade voltada para preservação de valores e crenças de movimentos em defesa de governos locais, comunidades indígenas, mulheres, homossexuais, meio-ambiente, etc. Semelhante trabalho tem sido desenvolvido por Boaventura de Souza Santos.(3)

O fato é que o poder dessa identidade vem sendo cultivado pelos novos atores como associações ou organismos não-governamentais os mais variados, que da mesma forma que as redes criminosas, desviam o poder do eixo vetorial vertical para imprimir uma atuação em rede. Essa atuação tem ensejado um rompimento dos limites entre o direito constitucional, o direito internacional e as relações internacionais na medida em que desviado o poder do eixo vetorial vertical, com a atuação em rede dos novos agentes, a soberania, conquanto ainda haja uma profunda assimetria em razão do poder econômico e do poder do próprio Estado, vê-se erigida em outras bases, quiçá legitimadas não pelo exercício de um poder hegemônico, mas pelo exercício de um poder em rede com maior participação da comunidade em defesa de interesses e valores.

É nesse contexto que a soberania tem que ser reexaminada e operada, porque, inequivocamente, a presença e a atuação de novos atores no cenário internacional vem se erigindo a ponto de romper o monopólio estatal da criação a aplicação do direito e isso se percebe facilmente, quando se depara com esferas “cada vez menos naturais e cada vez mais artificiais [normativas] e heterodeterminadas as condições econômicas, ambientais, tecnológicas, políticas e culturais do mundo em que vivemos.” (FERRAJOLI, 2002, pp. 51-52), como acontece com a ONU, a OTAN, a OMC, comissões de arbitragens, etc.

Isso significa dizer que da mesma forma que o direito vem sendo objeto de uma nova concepção para compreendê-lo como um sistema aberto, a soberania também passa a ser exercida num ambiente em rede onde a presença destes novos agentes, muitos dos quais não-governamentais, destilam um feixe de relações de inter-referências a ponto de ensejar a heteroprodutividade normativa do sistema.

Nesse ambiente, ou seja, na ordem internacional caracterizada, sem dúvida, por uma interação dos elementos componentes do sistema (antes dominado pela atuação absolutamente soberana dos Estados nacionais), a soberania apresenta-se compartilhada, sem que isso represente o seu desaparecimento e, via de conseqüência, do modelo de Estado amparado nela sob a forma absoluta, que se projeta sob novo paradigma. Trata-se, enfim, “de uma limitação efetiva da soberania dos Estados por meio da introdução de garantias jurisdicionais contra violações da paz, externamente, e dos direitos humanos, internamente”, como assevera FERRAJOLI (2002, p. 54) parodiando KELSEN.

É nesse espaço que surge uma nova constelação: a imprimida pela jurisdição complementar do Tribunal Penal Internacional – TPI, produto da atuação inter-referente da soberania, criando um sistema normativo garantidor totalmente heteroprodutivo, vale dizer, um sistema normativo criado em decorrência exclusivamente do compartilhamento da soberania de cada Estado, que ao invés de a amesquinhar, a efetiva na medida que expunge a antinomia porque o direito que a limita é por ela produzido, na exata medida em que o Estado participa do tratado que criou o novo agente.

5. Conformação do novo sistema normativo de garantia com o sistema interno brasileiro: O TPI e a Constituição. O princípio da Complementaridade

Impende assentar que o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional foi aprovado pelo Congresso Nacional pelo Decreto Legislativo nº 112, de 06.6.2002, ratificado em 14.06.2002, e incorporado definitivamente ao direito brasileiro pelo Decreto nº 4.388, publicado em 26.9.2002. Antes da incorporação e ainda hoje, após ela, muito se discute sobre a compatibilidade do Estatuto com o direito interno, não faltando vozes pela sua inconstitucionalidade, seja em razão da previsão de entrega de nacionais para serem submetidos à jurisdição da Corte, seja em decorrência da adoção de pena de caráter perpétuo, seja porque expunge foros privilegiados de agentes políticos, ou ainda em face da imprescritibilidade dos crimes.

Primeiramente, é preciso afastar a idéia de que a incorporação do tratado implica uma intervenção indevida na soberania brasileira como alguns ainda sustentam. Com efeito, o abandono da concepção clássica de soberania (suprema potestas superiorem non recognoscens), para concebê-la como uma qualidade do poder do Estado alçada em relações de inter-referências partindo do sistema jurídico para o sistema social, político e econômico, permite, sem dúvida, como neste trabalho se demonstrou, afastando a aporia entre soberania e direito, divisar o TPI como um sistema normativo garantidor heteroprodutivo dentro de uma visão alopoiética do direito – que expunge a exclusividade do Estado na criação e aplicação normativa –, criado pela atuação inter-referente da soberania.

O abandono do dogma da soberania absoluta, para enfrentá-la sob esse novo paradigma em face das transformações por que passa a comunidade internacional, sobretudo do fenômeno da globalização, permite, como se viu, a criação e existência de sistemas normativos garantidores aos quais o Estado se submete ao escopo de cooperar para a definição de certas condições sejam econômicas, ambientais, tecnológicas, políticas, jurídicas e culturais, tudo em defesa de assegurar efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana. Outro não é o afã do TPI como sistema normativo penal internacional senão atuar com o propósito de “ampliar, fortalecer a proteção dos direitos humanos, adotando sempre, como lógica e princípio, a primazia da pessoa humana, ou seja, é dessa maneira que esse todo normativo forma essa unidade de sentido, e é dessa maneira que esse todo interage com o Direito brasileiro. O impacto sobre o Direito brasileiro há de ser esse, uma garantia a mais.” (PIOVESAN, 2000, p. 71).

Com efeito, é preciso se ter presente que a dignidade da pessoa humana foi alçada a fundamento do Estado pela Constituição brasileira (art. 1º, III). Além do mais, o art. 7º do ADCT da Carta Política de 1988 proclama que “O Brasil propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos”. Mais ainda, o § 2º do art. 5º da Carta prescreve que “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.” Ora, é esse contexto normativo que vai imprimir fundamento de validade ao Estatuto de Roma.

Numa primeira análise, portanto, se o objetivo do Estatuto volta-se para imprimir efetividade à dignidade da pessoa humana, reprimindo violações que constituem crimes graves contra a humanidade, preservando, com isso a vivência dos direitos humanos, não há dúvida de que está em perfeita consonância com a Carta Política.

Ademais, a soberania em nada resta arranhada, quando se percebe que o Estatuto do TPI adotou o princípio da complementaridade, vale dizer, sua jurisdição é complementar à jurisdição penal nacional (artigo 1º).

Deveras, a complementaridade da jurisdição do TPI fica facilmente percebível, quando se vê no artigo 17 que a admissibilidade do processo fica condicionada: 1º) a falta de vontade de o Estado levar a cabo o inquérito ou o procedimento ou não tenha capacidade de fazê-lo; e 2º) a decisão do Estado de não dar seguimento ao procedimento criminal.

Note-se que o Estatuto estabelece as circunstâncias em que se poderá concluir se há ou não vontade do Estado agir em determinado caso. São elas: o propósito revelado de instaurar processo para subtrair a jurisdição do TPI de pessoa que se apresente como responsável por crimes de sua competência; a demora injustificada no procedimento permitindo a conclusão de que se mostra incompatível com a intenção de fazer responder a pessoa perante a justiça; e o processo não ter sido ou não estar sendo conduzido de maneira independente ou imparcial.

A complementaridade da jurisdição, portanto, se projeta dentro do campo da cooperação. Em decorrência dela, sem dúvida, “o TPI poderá, a longo prazo, dar sua mais importante contribuição, ao incentivar os Estados a dotar seus sistemas judiciais dos instrumentos normativos e processuais capazes de aplicar a justiça de forma eficaz e equânime, nos casos dos crimes previstos no Estatuto.” (SABOIA, 2000, p. 7)

Assim, divisa-se que a jurisdição do Estado não está sendo suprimida pela jurisdição do TPI. Contrariamente, é preciso se ter em mente que o Estado está, no exercício de sua soberania, compartilhando-a com outros Estados, submetendo-se à jurisdição complementar, no caso brasileiro, porque assim sua Constituição quis (arts. 7º - ADCT; 1º, III, 4º, II, VI, VIII e IX; e 5º, § 2º).

Nessa conformidade, sob a ótica dos pressupostos teoréticos deduzidos neste trabalho, a conclusão que de plano se impõe é admitir, desde logo, a completa integração do Estatuto ao direito pátrio, na exata medida em que o sistema jurídico brasileiro, numa concepção alopoiética, abre-se para inter-referências supranacionais por ele próprio concebidas, mercê de utilização de uma nova concepção de soberania, necessariamente também produto de inter-refererências. O resultado disso é a criação de um sistema de garantia internacional heteroprodutivo, porque produto da cooperação de várias soberanias, voltado para tutela da dignidade da pessoa humana. Assim concebido, significando expressão da soberania brasileira, não há espaço para conceber-se conflitos com a normatividade interna na exata medida em que essa cede espaço para o tratamento impingido pelo Estatuto num âmbito de complementaridade inter-referente.

Esse raciocínio permite concluir pela integração da imprescritibilibidade de determinados tipos penais, da pena de caráter perpétuo também especificamente em relação a eles, da entrega até de nacionais e da supressão de foros privilegiados, sem que, com isso tenha-se que cogitar de qualquer lesão à Constituição, na exata medida em que, concebida como sistema aberto de normas e princípios, numa visão própria da alopoiese jurídica, abre-se para recepção e conformação com um direito inter-referente por ela própria concebido.

Assim, o sistema heteroprodutivo que revela o TPI, encontra validade numa concepção principiológica da Constituição, como se viu, em defesa de princípios voltados para ensejar a plenificação dos direitos inerentes a personalidade humana. Isso afastaria, em relação ao sistema normativo do TPI, a incidência dos comandos normativos da Carta que repudiam a extradição de nacionais, a pena de caráter perpétuo, a imprescritibilidade de crimes e estabelecem imunidades e prerrogativas de foro.

No entanto, é forçoso reconhecer que vivemos ainda sob o império de direito escrito. “Como operadores do direito, acabamos criando o hábito de buscar respostas nas normas, muito mais do que nos valores que lhes dão sustentação.” (STEINER, 2000, p. 36). Daí as dificuldades enfrentadas por muitos juristas de conceber a recepção do Estatuto por uma via principiológica, o que afastaria a incidência de regras específicas expressas, ainda que constitucionais, porque, sem dúvida, os princípios, em razão de sua natureza, gozam de maior densidade normativa de que regras específicas, porquanto estas voltadas para aspectos particulares e aqueles, enquanto informativos do sistema, pairam como causa constitucional justa e apta a guarnecer qualquer norma que se volte a lhe imprimir eficácia, possuindo, portanto, o condão, em razão da maior densidade que ostentam, de afastar em situações específicas a incidência de normas de menor densidade, quando tal situação se volta para imprimir-lhes conteúdo material.

Dentro desta compreensão, no âmbito do denominado pós-positivismo, a normatividade dos princípios e das regras foi muito bem decantada por BARROSO (2001, p.26):

“Regras são proposições normativas aplicáveis sob a forma de tudo ou nada (all or nothing). Se os fatos nela previstos ocorrerem, a regra deve incidir, de modo direto e automático, produzindo seus efeitos. Por exemplo: a cláusula constitucional que estabelece a aposentadoria compulsória por idade é uma regra. Quando o servidor completa setenta anos, deve passar à inatividade, sem que a aplicação do preceito comporte maior especulação. O mesmo se passa com a norma constitucional que prevê que a criação de uma autarquia depende de lei específica. O comando é objetivo e não dá margem a elaborações mais sofisticadas acerca de sua incidência. Uma regra somente deixará de incidir sobre a hipótese de fato que contempla se for inválida, se houver outra mais específica ou se não estiver em vigor. Sua aplicação se dá, predominantemente, mediante subsunção.
Princípios contêm, normalmente, uma maior carga valorativa, um fundamento ético, uma decisão política relevante, e indicam uma determinada direção a seguir. Ocorre que, em uma ordem pluralista, existem outros princípios que abrigam decisões, valores ou fundamentos diversos, por vezes contrapostos. A colisão de princípios, portanto, não só é possível, como faz parte da lógica do sistema, que é dialético. Por isso, a sua incidência não pode ser posta em termos de tudo ou nada, de validade ou invalidade. Deve-se reconhecer aos princípios uma dimensão de peso ou importância. À vista dos elementos do caso concreto, o intérprete deverá fazer escolhas fundamentadas, quando se defronte com antagonismos inevitáveis, como os que existem entre a liberdade de expressão e o direito de privacidade, a livre iniciativa e a intervenção estatal, o direito de propriedade e a sua função social. A aplicação dos princípios se dá, predominantemente, mediante ponderação.”

Assim, não se trata de uma relação de contraposição (Constituição x Estatuto de Roma), mas de inter-referência, de adequação, onde a aporia entre soberania e direito cede espaço para que, mediante ponderação de valores e interesses, possa-se aferir a densidade dos princípios que envolvem a colisão e permita ao intérprete uma solução que, segundo BARROSO (2001, p. 27), não desconsidere cada princípio, mas imprima maior densidade àquele que em maior grau expresse o ideário da Constituição.(4)

Sob os auspícios deste entendimento não se avulta necessária qualquer modificação escrita na Carta para ensejar a recepção e conformação do TPI. Palmilhando pelo outro caminho, todavia, tem-se defendido reforma constitucional para guarnecer cada hipótese do avultado dissenso entre o Estatuto e a Carta.

Os chamados núcleos de conflitos entre a normatividade do sistema garantidor internacional e o direito brasileiro residem na prisão perpétua, imprescritibilidade de crimes, entrega de nacionais e imunidades e prerrogativas de foro de agentes políticos. De fato, o Estatuto prescreve: a pena perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições pessoais do condenado o justificarem (artigo 77, 1.b); que os crimes de competência do Tribunal não prescrevem (artigo 29); a possibilidade de entrega de pessoas ao Tribunal (artigo 89); e que as imunidades ou normas de procedimento especiais decorrentes da qualidade oficial de uma pessoa, nos termos do direito interno ou do direito internacional, não deverão obstar a que o Tribunal exerça a sua jurisdição sobre essa pessoa (artigo 27, 2). Por outro lado, a Constituição brasileira proclama: que não haverá pena de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, b); que são imprescritíveis a prática de racismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democráticos (art. 5º, XLII e XLIV); que nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei, não sendo admitida a extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião (art. 5º, LI e LII); em vários dispositivos a prerrogativa de foro em razão da função, bem como a imunidade de determinados agentes, como os parlamentares (conferir, inter plures, os arts. 53, 102, I, b e c)

Primeiramente, tenha-se presente que os critérios tradicionais para solução de conflitos de normas não se avultam adequados para solucionar colisão principiológica. Com efeito, não se pode conceber uma solução simplista amparada no princípio da hierarquia para entender que os tratados tradicionalmente são incorporados ao direito pátrio com força de lei ordinária em total desprestígio ao comando emergente do § 2º do art. 5º da Constituição. Também não se pode admitir que a validade do Estatuto fique condicionada, no cotejo com a Carta, pela incidência do critério da especialidade, segundo o qual a norma especial afasta a incidência da norma geral, e enfim, muito menos, pela aplicação do critério cronológico (a lei posterior revoga a anterior). Tais critérios, de fácil e corriqueira aplicação ao conflito de leis, não conduzem a lugar seguro para solução dos conflitos de normas constitucionais, sobretudo as principiológicas, que devem ser, isso sim, ponderadas (BARROSO, 2001, p. 27).

Em sua Constituição, o Estado brasileiro fez uma opção ideológica pela dignidade da pessoa humana (arts. 1º, III; 4º, II, VI, VIII e IX; e 5º, § 2º), não hesitando, neste desiderato, de se submeter a um tribunal internacional de direitos humanos (ADCT: art. 7º), expressão máxima deste ideário. Resulta, desde aí, que a aporia entre o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da soberania, ambos alçados a fundamentos do Estado (art. 1º, I e III), há de ser solucionada pelo intérprete da Carta, mercê de ponderação principiológica, tomando-se o cuidado de eleger interpretações que sufraguem a densidade normativa dos princípios diante das regras estabelecidas na Carta. Não pode é o conflito ser solucionado à base de simples subsunção emprestando força de tudo ou nada a princípios, como se regras fossem. Esse, é bem verdade, é um trabalho difícil para quem ainda caminha sob os trilhos da dogmática jurídica tradicional. Não o é, todavia, para quem se deu conta de que direito não é exclusivamente norma jurídica expressa e que os princípios são dotados de maior densidade em relação as regras.

Assim, se o sistema normativo internacional de garantia erigido pela vontade do Estado brasileiro, que tem como ideário a dignidade da pessoa humana, estabelece a prisão de caráter perpétuo, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições pessoais do condenado o justificarem, essa regra teria a mesma densidade daquela outra adotada pela Carta que defenestra a pena de caráter perpétuo. Uma e outra são regras. E como tal devem ser aplicadas voltadas para a satisfação material do ideário da Carta, que não é outro senão assegurar a dignidade da pessoa humana no Brasil e alhures. Então, não se trata de afirmar que o comando do art. art. 5º, XLVII, b, estaria derrogado pelo artigo 77, 1.b, do Estatuto, o que encontraria óbice na soberania, como fundamento do Estado (aplicação dos critérios cronológicos e da especialização para solução de conflitos normativos). Trata-se, isso sim, de, à base de ponderação principiológica, verificar a adequabilidade da norma do sistema garantidor internacional à ordem interna. O trabalho do intérprete, para solucionar o conflito de princípios, deve levar em conta, nesta hipótese, o ideário maior que impregna toda a Carta e que ditou a vontade do Estado brasileiro de ser co-partícipe, cooperar e se submeter a um sistema internacional garantidor dos direitos humanos e isso, inquestionavelmente, expressa a vontade soberana que, ao invés de se enfraquecer, fortalece-se, porque a Constituição está sendo cumprida. Daí porque não posso, de minha parte, concordar com a conclusão de CERNICCHIARO (2000, p. 38) vazada no sentido de que “...ao aceitar o Estatuto, o Brasil, sem dúvida, por via oblíqua, está renunciando à própria soberania. É certo que no momento em que a política entra na sala, o Direito sai pela janela. Por razões de política internacional, poderá o Brasil querer subscrever sem reserva esse Estatuto. Estará, ao meu aviso, afrontando a nossa Constituição.”

O mesmo caminho poderá ser palmilhado para se alcançar a adequação das regras do Estatuto referentes a imprescritibilidade de crimes, entrega de nacionais e imunidades e prerrogativas de foro de agentes políticos, em face das correspondentes regras insculpidas na Carta. É dizer, em outras palavras, a adequabilidade volta-se para imprimir maior densidade normativa ao princípio da dignidade da pessoa humana no conflito com o princípio da soberania, e assim o é porque a Constituição, que expressa a soberania popular, o quis.

Nesse sentido, com certeza porque atento à ponderação principiológica que imprime o norte de adequabilidade de tais regras, conquanto sem adentrar nos suportes jus-filosóficos ora traçados, CASSALI BAHIA (2003, p. 100), em relação à imprescritibilidade de crimes, registra:

“Dever-se considerar que a previsão restrita quanto à imprescritibilidade não pode significar que este rol não possa ser alargado, seja por lei ordinária seja por tratado internacional, pois tanto garante os direitos fundamentais individuais a previsão de prescritibilidade (em relação ao autor do delito) quanto a de imprescritibilidade (em relação à vítima e à sociedade).
A figuração de imprescritibilidade apenas para os crimes de racismo e os relativos à ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático, parece significar apenas mais uma daquelas normas formalmente constitucionais mas que materialmente não são.”

Sobre a entrega de nacionais, precisa é a lição de REZEK (2000, p. 67):

“...Parece-me óbvio a distinção entre a entrega de um nacional a uma jurisdição internacional, da qual o Brasil faz parte, e a entrega de um nacional – esta sim proibida pela Constituição – a um tribunal estrangeiro, que exerce sua autoridade sob um outro pavilhão que não o nosso, e não, portanto, a uma jurisdição de cuja construção participamos, e que é produto de nossa vontade, conjugada com a outras nações.”

Aí está, sem dúvida, a distinção que deve ser feita entre entrega de nacionais e extradição. Aquela, em momento algum macula a soberania brasileira, quando se concebe o TPI como produto da inter-referência da soberania de estados distintos, portanto, um sistema normativo heteroprodutivo, para o qual o Brasil concorreu. Coisa diversa é a entrega de nacionais para se submeterem a um sistema legitimado a partir de inter-referências alheias a vontade soberana brasileira, cuja produção e aplicação normativas não se erigem sob a concorrência da soberania brasileira. Aí reside, inquestionavelmente, a causa constitucional justa, que adjuntada à ponderação de valores em defesa do princípio humanitário, impõe adequabilidade a entrega de nacionais ao TPI. Nessa mesma linha de entendimento registra CACHAPUZ (2000, p. 14) que é “Importante sublinhar que o Tribunal Penal Internacional não será uma jurisdição estrangeira, mas uma jurisdição internacional, de cuja construção o Brasil participa, e terá, portanto, um vínculo mais estreito com a Justiça nacional.” (destaques no original).

No mais, quanto ao rompimento do regime de imunidades e prerrogativas de foro, pontifica REZEK (2000, p. 66):

“A ideologia do Tribunal Penal Internacional tem a ver com a idéia de evitar a impunidade mais grosseira e chocante de todas as possíveis: a impunidade de crimes que se cometem contra direitos humanos elementares; contra a paz dos povos; contra nações; contra comunidades raciais; ou por algum outro móvel reunidas. Essa ideologia leva em consideração a circunstância particular de que esses crimes, em larga medida, são cometidos à sombra da autoridade do Estado, ao benefício temporário da função pública, às vezes no mais alto nível.”

Aí reside a causa justa que coloca luz no caminho que conduz à compatibilidade da exclusão das imunidades e prerrogativas de foro por exercício de função. Crimes de guerra, contra a humanidade, genocídio, agressão constituem, segundo CACHAPUZ (2000, p. 15), delitos quase sempre praticados à sombra de autoridades que segundo o ordenamento jurídico de seus países desfrutam de prerrogativa de foro ou de imunidades.

A preocupação, em defesa do princípio humanitário, volta-se, aqui, contra a impunidade dos agentes políticos que têm em suas mãos o poder de agir, atuar e contrariamente assumem condutas omissivas ou positivas violadoras da dignidade humana.

Outros vários motivos podem ser somados à guisa de guarnecer adequabilidade do Estatuto à Constituição. Muitos no plano da subsunção, como por exemplo, demonstrar que a prisão perpétua é compatível com a Constituição, porque esta admite pena mais grave, como a de morte como exceção (art. 5º, XLVII), o que validaria as disposições do Código Penal Militar sobre a pena de morte (Decreto-lei nº 1.001/69, arts. 55 a 67). Esse raciocínio, conquanto válido, revela inequívoca subsunção de regras (legal para constitucional), e poderia facilmente ser desmontado num caso em concreto, quando as circunstâncias revelassem que determinado homicídio, mesmo em guerra, avultasse lesivo ao princípio da dignidade da pessoa humana pelo emprego de meios cruéis, tortura, etc. Aí, sem dúvida, o caminho seria recorrer à ponderação de valores e eleger o princípio constitucional em detrimento da regra, o que conduziria, em última análise, ao caminho aqui palmilhado.

Enfim, é preciso se ter presente que “Existe uma estratégia da paz, não só da guerra...” (CHACON, 2002, p. 76). O Tribunal Penal Internacional se tornará, sem dúvida, um caminho propício ao declarado escopo. Quem viver, verá!

6. Bibliografia

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STEINER, Sylvia Helena F. O Tribunal Penal Internacional, a pena de prisão perpétua e a Constituição brasileira. In: O que é o Tribunal Penal Internacional. Câmara dos Deputados. Série ação parlamentar, n. 110. Brasília, 2000.

NOTAS DE RODAPÉ

1. Kelsen divisava a soberania como qualidade de uma ordem normativa (conferir sua Teoria Geral do Direito e do Estado, na edição da Martins Fontes, 1992, pp. 371 – 374). Não obstante ter concebido a soberania sob uma visão exclusivamente normativa, já abria espaço para uma concepção aberta quando afastava o solipsismo de Estado, o que pressupõe, obviamente, inter-referência, todavia, tomada apenas no campo da normatividade do Direito Internacional.
2. A influência soberana dos Estados sob os enfoques do hard power e do soft power é analisada pelo norteamericano Joseph Nye no livro Bound to Lead ainda sem edição em língua portuguesa. Desse mesmo autor, já em edição vernacular pela UNESP, vale a pena verificar O Paradoxo do Poder Americano, onde propõe a redefinição do interesse nacional dos USA à guisa de afastar o isolacionismo.
3. Consultar a série Reinventar a Emancipação Social para novos Manifestos, sobretudo o 3º volume intitulado Reconhecer para Libertar. Os caminhos do Cosmopolitismo Multicultural editado pela Civilização Brasileira, Rio de Janeiro.
4. Sobre o tema Luís Roberto Barroso indica o pensamento de Robert Alexy exposto em palestra proferida na fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro, em 11.12.98, intitulada Colisão e ponderação como problema fundamental da dogmática dos direitos fundamentais.



REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS