Direito Penal e outros ramos do Direito. Interdependência, comunicação, encontros e desencontros. Uma visita holística aos diversos planos do Direito a partir do Direito Penal


Autor: Roberto Luis Luchi Demo
(Procurador Federal. Especialista em Direito Penal. Especialista em Processo Civil. Procurador-Chefe Substituto do Contencioso Judicial da Procuradoria Federal Especializada no INSS em Curitiba/PR)

| Artigo publicado em 17.12.2004 |


1. Prolegômenos; 2. Ilícito civil, ilícito administrativo, ilícito político e ilícito penal; 3. Cumulação de sanções de naturezas diversas; 4. Os crimes fiscais; 5. As questões prejudiciais; 6. A ação civil de reparação de dano e a ação executiva da sentença penal condenatória; 6.1. A absolvição penal; 6.2. A condenação penal; 7. Os planos do Direito e as normas de organização judiciária; 8. A responsabilidade funcional do servidor público e nas profissões regulamentadas; 9. A responsabilidade política e o processo de impeachment; 10. O controle externo exercido pelo Tribunal de Contas e pelas Casas Legislativas; 11. As Comissões Parlamentares de Inquérito; 12. Prova emprestada entre as diversas instâncias do Direito; 13. Prisão de natureza penal decretada por juiz cível; 14. Efeitos extrapenais da condenação; 14.1. Efeitos extrapenais genéricos; 14.2. Efeitos extrapenais específicos; 15. Epílogo

1. Prolegômenos

O propósito deste trabalho é trazer à ribalta um tema constante na vida prática do foro, embora (ou talvez por isso mesmo) artigo raro e lacônico na historiografia jurídica: o diálogo jurídico, a comunicação entre os diversos ramos do Direito. Para ficar num único exemplo paradigmático, de se citar o “Manual de Direito Penal Brasileiro. Parte Geral”, escrito em co-autoria por Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli, que trata da questão, no último subitem do último capítulo do último título, em apenas 4 páginas!

E a doutrina tem afastado esse cálice por dois motivos bastante singelos. Primeiro, quase tautológico, porque o Direito é uno: sua divisão em ramos autônomos (mas não estanques ou sectários) tem finalidade apenas didática, ao passo que sua positivação em códigos e leis especializadas se arrima em conveniências de ordem prática. Desse modo, o foco na zona de transição mesma entre os diversos ramos fica deferido de um a outro ramo: o penalista o defere ao administrativista ou ao civilista, que, por sua vez, o transferem ao penalista... Segundo, porque neste tema prevalecem as chamadas opções de política legislativa, dificultando e até mesmo inviabilizando a formação de uma ontologia pertinente, máxime quando certas escolhas políticas em muito se afastam do chamado “espírito do Direito”, como se verá adiante.

Como proposta metodológica, toma-se o Direito Penal à montante, percorrendo os diversos rincões do sistema de normas postas no nosso ordenamento jurídico, pontuando aqui e acolá algumas situações emblemáticas desse diálogo jurídico, tão rico e com tantas nuances que não se esgota nas poucas considerações seguintes, especialmente alvissareiras e benfazejas.

2. Ilícito civil, ilícito administrativo, ilícito político e ilícito penal

Para tornar a vida em sociedade possível, o Estado regula a conduta dos cidadãos por meio de normas objetivas, que visam a proteger determinados bens jurídicos cuja tutela seja importante em um determinado momento histórico. O direito objetivo (norma agendi) determina o que pode ser feito e o que é proibido. Esse direito objetivo bitola, nessa compreensão, as ações das pessoas em um maniqueísmo: atividades lícitas, consoante o direito objetivo, e atividades ilícitas, que agridem o ordenamento jurídico.

À conduta ilícita corresponde uma sanção. Aqui cabe ponderar que uma conduta pode ser qualificada, num só tempo, como ilícito civil, ilícito administrativo ou político e ilícito penal, implicando responsabilidades civil, administrativa ou política e penal, respectivamente. Neste caso, serão impostas sanções civil, administrativa ou política e penal, sem ofensa a qualquer princípio que veda a punição do mesmo fato mais de uma vez (bis in idem), que tem seu âmbito de incidência restrito a cada esfera determinada. Trata-se de sanções de natureza diversa e, por isso mesmo, não se compensam.

Nessa toada, surge a questão: qual a diferença entre ilícito civil, administrativo, político e penal?

O ato ilícito é uma conduta contrária ao Direito que traz para o seu agente uma determinada sanção jurídica, necessariamente institucionalizada. Especifica-se o ilícito conforme a natureza do interesse lesado, que, por sua vez, é determinada pela natureza da respectiva sanção abstratamente prevista no ordenamento jurídico. O ilícito civil viola interesses particulares de particulares ou do Estado, que estão legitimados a agir para que a sanção civil seja realizada, amigável ou litigiosamente (hipótese que não prescinde da atuação do Poder Judiciário). O ilícito administrativo viola regras de Direito Administrativo e legitima o Estado a impor sanções administrativas pelo poder de polícia (ao extraneus) ou pelo poder disciplinar (ao servidor público), independe de atuação do poder judiciário (auto-executoriedade). O ilícito político viola o dever de realizar o bem comum. O ilícito penal é o mais grave, porque viola regras de comportamento de transcedência social e até política, sendo a última ratio, por que, exemplificadamente, o crime de desobediência não se configura quando a lei cominar penalidade civil ou administrativa, sem ressalvar expressamente a aplicação da pena prevista no art. 330, CP.

É certo que há algumas zonas cinzentas e que nem Freud explica. É o caso da Lei 9.605/98, que reprime as infrações ao meio-ambiente. Depois de estadear que “as pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei” (art. 3º), prevê como sanção penal à pessoa jurídica a suspensão parcial ou total de atividades (art. 22, I), que também é prevista ipsis litteris como sanção administrativa (art. 72, IX). Nessa ordem de considerações e como a sanção penal somente pode ser aplicada após o trânsito em julgado da condenação penal, essa espécie de pena restritiva de direitos mostra-se ineficiente, deixando lugar para sua aplicação enquanto sanção administrativa, dotada de auto-executoriedade que é. Para não ficar num único exemplo, cite-se também a Lei 8.429/92, que regula materialmente a improbidade administrativa e, após registrar no seu art. 12, caput, que “independente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações”, arrola como uma das sanções o ressarcimento integral do dano, nos incs. I e III do mesmo artigo, sanção esta de caráter nitidamente civil, mas que está destacada como sanção por ato de improbidade administrativa, por força de expressa norma constitucional nesse sentido (art. 37, §4o, CF).

3. Cumulação de sanções de naturezas diversas

Em linha de princípio, que decorre naturalmente da independência das diversas instâncias do Direito, vedada é a compensação das sanções na perspectiva da intervenção do Estado sancionador em relação ao particular, agente do ilícito, por isso que não se pode considerar o Estado, nos diferentes planos jurídicos em que atua, como idêntico beneficiário da sanção. Isto é, não há compensar eventual sanção política ou administrativa com a sanção penal, salvo regra expressa nesse sentido, a exemplo do art. 9o, Lei 10.684/03, que instituiu o REFIS II ou PAES, adiante analisado.

Ou seja, de regra há independência entre as esferas penal, cível, política e administrativa, como dito anteriormente, por isso que o objeto de cada esfera está no equacionamento de infringências a regras ontologicamente diversas: penal, civil, política e administrativa. É dizer, as finalidades de cada esfera são disformes, de modo que a valoração da conduta em uma órbita sustenta-se em pilares muitas vezes próprios e dicótomos. Esse o sentido do art. 1.525, CC/16, primeira parte, e do atual art. 935, primeira parte, Lei 10.406/02 - novo Código Civil: “A responsabilidade civil é independente da criminal”.

Mas essa independência não é absoluta, por isso que relativa no tocante à atuação das respectivas esferas, bem assim ao resultado obtido em cada uma. Nem poderia ser de outra forma, na compreensão de que o Direito é uno, considerado um sistema de prescrições jurídicas interligadas e harmônicas, e seria um contra-senso que a realidade material não repercutisse juridicamente de maneira uniforme. Mas, urge enfatizar: o diálogo jurídico entre uma instância e outra é bitolado pelo ordenamento jurídico, “by the law of the land”, e obedece às formalidades nesse positivadas.

Estabelecidas estas premissas metodológicas, na relação do sancionado com eventual beneficiário da sanção, quando diversas sanções tiverem o mesmo beneficiário e forem da mesma espécie na perspectiva deste, cabível a compensação das sanções. É o caso da indenização paga à vítima em virtude de condenação penal a pena restritiva de direitos de prestação pecuniária (art. 43, I, CP, redação da Lei 9.714/98) e a indenização decorrente de condenação em ação de reparação civil pelo mesmo fato, por isso que a indenização penal necessariamente há de ser diminuída do montante de eventual indenização civil, nos termos do art. 45, § 2o, segunda parte, CP, redação da Lei 9.714/98: “O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários”. Nesse mesmo sentido, o art. 297, Lei 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro: “A penalidade de multa reparatória consiste no pagamento, mediante depósito judicial em favor da vítima, ou seus sucessores, de quantia calculada com base no disposto no § 1o do Código Penal, sempre que houver prejuízo material resultante do crime. § 3º Na indenização civil do dano, o valor da multa reparatória será descontado”.

É bom lembrar que a conduta do particular (extraneus) que agride um determinado bem jurídico tutelado pelo direito posto, não pode ser, concomitante, ilícito penal e ilícito administrativo, é dizer, o Estado não pode sancionar duplamente o extraneus no exercício do jus puniendi e do poder de polícia, pena de bis in idem, por isso que o particular está nessa mesma qualidade, tanto na relação de direito administrativo assim na relação de direito penal, ambas com uma finalidade retributiva (de acordo com a conhecida distinção aristotélica).

E, neste passo, registro que não é menos verdadeira essa premissa, quando se lembra que o não-recolhimento de tributo é ilícito tributário sempre, implicando juros de mora e multa (punitiva ou moratória), e às vezes é também ilícito penal. E não é menos verdadeira, porque o bem protegido pela norma penal não é o recolhimento em si mesmo (tutelado pela norma tributária e que é irrelevante de per si para o direito penal, tanto assim que há crimes formais, a exemplo do art. 2o, Lei 8.137/90), mas a regular administração tributária.

Outro exemplo de um mesmo fato singular repercutindo em mais de uma órbita do Direito, dá-se na perspectiva da pena de perdimento de veículo apreendido com mercadoria irregularmente importada, prevista no Regulamento Aduaneiro: a aplicação desta sanção administrativa não elide nem condiciona eventual sanção penal por crime de contrabando. E na perspectiva dos atos ao meio-ambiente, por isso que “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados” (CF, art. 225, §3o)

Nessa mesma compreensão é de ser interpretado, exemplificadamente, o art. 19, Lei 8.884/90, que dispõe sobre o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e as infrações contra a ordem econômica: “A repressão das infrações da ordem econômica não exclui a punição de outros ilícitos previstos em lei”. Assim, a caracterização de infração à ordem econômica (arts. 20 e 21, Lei 8.884/94) dá ensejo à repressão de natureza administrativa, para a qual é competente o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça. Já na órbita penal, além da Lei 8.137/90, que tipifica crimes contra a ordem econômica, há repressão penal também prevista no art. 195 da Lei 9.279/96 (Lei da Propriedade Industrial), que tipifica os “crimes de concorrência desleal”. Há também a responsabilidade civil do concorrente desleal, que deve indenizar o comerciante prejudicado, ainda que o ato não esteja tipificado como crime de concorrência desleal (art. 209, Lei 9.279/96), e com maior razão se o estiver.

Também há de ser assim interpretado o art. 15 da Lei 4.717/65, que regula a ação popular: “Se, no curso da ação, ficar provada a infringência da lei penal, ou a prática de falta disciplinar a que a lei comine a pena de demissão ou a de rescisão do contrato de trabalho, o juiz, ex officio, determinará a remessa de cópia autenticada das peças necessárias às autoridades ou aos administradores a quem competir aplicar a sanção”.

Já com relação ao servidor público e equiparados (art. 327, CP), o raciocínio é diverso: sua conduta pode ser caracterizada, concomitantemente, como ilícito penal e ilícito administrativo, por isso que, mesmo quando cometem um dos crimes contra a própria Administração (arts. 312 a 326, do CP), os servidores públicos são tidos como indivíduos comuns que infringem a norma penal. Concomitantemente, porém, estarão infringindo também uma norma administrativa e, aqui sim, a apenação tem caráter tipicamente funcional, implicando sanções penais e administrativas. E pode caracterizar também ilícito civil e responsabilidade civil, a exemplo do peculato (art. 312, CP), em que o agente deve indenizar o Estado-Administração pelo prejuízo material causado. O mesmo se diga em relação à conduta de congressista, que pode ser caracterizada, concomitantemente, como ilícito penal e ilícito político (art. 55, II, CF). Exemplo derradeiro está no art. 37, § 4o, CF: “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

4. Os crimes fiscais

Em relação aos crimes fiscais, o STF entendia que a interposição de recursos administrativos ou judiciais na esfera cível não tinha o condão de impedir a regular tramitação da ação penal, seja porque não havia obrigação de esgotamento da via administrativa para o exercício do jus puniendi, bem assim porque a ação penal nesses crimes era pública e incondicionada.

Entendia-se, nesse contexto kafkiano, que havendo condenação penal definitiva por crime de sonegação fiscal, a posterior conclusão do processo administrativo-fiscal pela inexistência do débito implicava a extinção da punibilidade, a ser pleiteada mediante revisão criminal. Se o processo-crime ainda se encontrava em curso, a subseqüente decisão administrativa, de caráter definitivo, que julgava improcedente o lançamento, fazia desaparecer a justa causa para o curso da ação, questão que podia ser agitada em sede de habeas corpus. Mas o processo administrativo-fiscal havia de ter decisão definitiva, cuja ausência (o processo administrativo, apesar de conter decisão favorável ao contribuinte, não foi encerrado) não justificaria a comunicação das instâncias.

Mas aqui o STF mudou (para melhor) e, no julgamento do HC 81.611, o Plenário decidiu que, nos crimes do art. 1º, Lei 8.137/90, considerados crimes materiais ou de resultado, a decisão definitiva do processo administrativo-tributário, figurando como elemento essencial da exigibilidade da obrigação tributária, consubstancia uma condição objetiva de punibilidade, até porque esses crimes tributários materiais somente se consideram consumados com a constituição definitiva do lançamento, ficando por isso mesmo suspensa a prescrição penal nesse interregno. E, quando do julgamento da ADI 1.571, que versava a constitucionalidade do art. 83, Lei 9.430/96, o STF, ao julgar improcedente o pedido dando pela legitimidade da norma, registrou que essa decisão não era incompatível com a decisão tomada no HC 81.611, na medida em que o Ministério Público pode denunciar, se tomar conhecimento do fim do processo administrativo-tributário por outros meios, mesmo sem a comunicação da autoridade fazendária (que tem, outrossim, o dever de fazê-lo).

Convém trazer à ribalta que, esporadicamente, são editadas leis de índole tributária, por isso que arrecadatórias, que suspendem a pretensão penal punitiva do Estado ou até extinguem a punibilidade, o que mostra às escâncaras a utilização do Direito Penal como um instrumento de arrecadação tributária, em seu desaforado desvirtuamento. Pode-se citar o art. 34, Lei 9.249/95, por que se extingue a punibilidade do agente de crime fiscal se houver o pagamento antes do recebimento da denúncia(10) (e pagamento não é sinônimo de parcelamento, por isso que o Plenário do STF, a 4.10.1995, ao julgar a Questão de Ordem no Inquérito nº 1028-6/RS, assentou que o simples parcelamento do débito não significava o pagamento do tributo, para efeito de extinção da punibilidade). Posteriormente veio à lume a Lei 9.964/00, que instituiu o REFIS e permitiu aos agentes do crime, cuja pessoa jurídica optasse pelo parcelamento antes do recebimento da denúncia, ter a pretensão punitiva do Estado suspensa (art. 15).

De mais a mais, se não bastassem essas leis, atualmente vigora a Lei 10.684/03, que instituiu o REFIS II ou PAES e determina no seu art. 9º, caput, que “é suspensa a pretensão punitiva do Estado, referentes aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei 8.137/90, e nos arts. 168-A e 337 do Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento”, sem exigir que o parcelamento seja efetuado antes do recebimento da denúncia, de modo que o parcelamento efetuado após o recebimento da denúncia implica a suspensão da ação penal. É de bom alvitre registrar que a suspensão do processo relativa ao crime de sonegação fiscal não implica ausência de justa causa para a persecução penal quanto a outros delitos não compreendidos no rol taxativo do art. 9o, Lei 10.684/03, a exemplo de formação de quadrilha ou bando(11).

Outrossim, a Lei 10.684/03 não se aplica ao crime de apropriação indébita de contribuições descontadas dos segurados e não repassadas ao INSS (apropriação indébita previdenciária – art. 168-A, CP), porquanto o dispositivo que previa o parcelamento desses débitos fora objeto de veto presidencial (art. 5º, § 2º), de modo que a referência que o art. 9º da mencionada lei faz ao art. 168-A teria se tornado inócua(12). Nessa ordem de idéia, a regra do art. 9o, § 2o, Lei 10.684/03, segundo a qual o pagamento a qualquer tempo extingue a punibilidade, não se aplica aos crimes de apropriação indébita previdenciária, cujo agente só pode ter extinta sua punibilidade pela regra especial do art. 168-A, § 2o, CP, é dizer, pagamento antes da ação fiscal.

A suspensão da pretensão punitiva pelo parcelamento ou a extinção da punibilidade pelo pagamento não têm cabimento, quando já existente condenação definitiva, que representa um óbice instransponível à retroatividade penal destas espécies normativas(13).

Finalmente, de se enfatizar que somente a extinção do crédito tributário pelo pagamento (art. 156, I, CTN) implica a extinção da punibilidade (art. 34, Lei 9.249/95 e art. 9o, § 2o, Lei 10.684/03). Noutra banda, a extinção do crédito pela prescrição (art. 156, V, CTN) não implica a extinção da punibilidade, por isso que as normas mencionadas são restritas à extinção do crédito pelo pagamento.

5. As questões prejudiciais

Atinente às questões prejudiciais (aquelas logicamente anteriores ao mérito da ação penal e ligadas ao crime – e nisso se diferenciam das preliminares), “se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente” (art. 92, caput, CPP): trata-se de suspensão obrigatória da ação penal, ocorrendo, exemplificadamente, no crime de bigamia.

Mas, “se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão diversa da prevista no artigo anterior, da competência do juízo cível, e se neste houver sido proposta ação para resolvê-la, o juiz criminal poderá, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender o curso do processo, após a inquirição das testemunhas e realização das outras provas de natureza urgente” (art. 93, caput, CPP): trata-se de suspensão facultativa da ação penal. Neste caso, “o juiz marcará o prazo da suspensão, que poderá ser razoavelmente prorrogado, se a demora não for imputável à parte. Expirado o prazo, sem que o juiz cível tenha proferido decisão, o juiz criminal fará prosseguir o processo, retomando sua competência para resolver, de fato e de direito, toda a matéria da acusação ou da defesa” (art. 93, § 1o, CPP). Não havendo a suspensão do processo penal e ocorrendo sentença condenatória no juízo criminal, a posterior sentença no cível favorável ao réu, tratando-se de questão prejudicial facultativa, dá ensejo a habeas corpus ou revisão criminal (se já houver trânsito em julgado da condenação).

“A suspensão do curso da ação penal, nos casos dos artigos anteriores, será decretada pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes” (art. 94, CPP). Em ambas as situações, a prescrição fica suspensa (art. 116, I, CP).

Por outro lado, também a ação penal pode funcionar como prejudicial nas ações cíveis, a exemplo da ação para responsabilização dos administradores de sociedades anônimas que prescreve em 3 anos, contados da data da publicação da ata da assembléia geral que votar o balanço (art. 287, II, b, 2, Lei 6.404/76, que regula a sociedade por ações), mas, se se tratar de fato criminoso, o termo inicial dessa prescrição dá-se com a prescrição da ação penal ou da sentença definitiva (art. 288, Lei 6.404/76). O mesmo raciocínio é válido, considerada a prescrição qüinqüenal para a responsabilidade objetiva do Estado oriunda de ato ilícito:

RECURSO ESPECIAL. ALÍNEAS “A” E “C”. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CRIMINAL. ART. 1o DO DL 20.910/32. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA.
O prazo prescricional da ação de indenização proposta contra pessoa jurídica de direito público é de cinco anos (art. 1o, Decreto 20.910/32). O termo inicial do quinquênio, na hipótese de ajuizamento de ação penal, será o trânsito em julgado da sentença nesta ação, e não a data do evento danoso, já que seu resultado poderá interferir na reparação civil do dano, caso constatada a inexistência do fato ou a negativa de sua autoria.
É curial observar que se mostra indiferente a circunstância de que a sentença criminal transitada em julgado seja condenatória ou absolutória, para fins de contagem do prazo.
Não faria o menor sentido defender que, após o curso da ação penal, se a conclusão for pela absolvição do servidor público, não seria esse o termo a quo do lapso qüinqüenal(14).


Aliás, essa orientação jurisprudencial específica foi positivada como regra geral no art. 200 do novo Código Civil, mostrando mais uma vez o que sói acontecer: a legislação vem à reboque da boa jurisprudência.

6. A ação civil de reparação de dano e a ação executiva da sentença penal condenatória

No tocante à ação civil de reparação do dano (actio civillis ex delicto), esta pode ser proposta antes, durante ou depois da ação penal pelo mesmo fato (art. 64, CPP)(15) . Neste caso de ações paralelas, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta até o julgamento definitivo da ação penal (art. 64, p.u., CP), sendo que essa suspensão não pode exceder o prazo de um ano (art. 265, IV, a e § 5o, CPC). Trata-se de mera faculdade do juiz, sem que exista uma obrigatoriedade de suspensão da ação civil, salvo, no entanto, se presente a possibilidade de decisões contraditórias(16). De se registrar que a simples existência de inquérito policial não autoriza a suspensão da ação civil ex delicto, porquanto a investigação criminal não tem potencialidade alguma de gerar decisões contraditórias.

6.1. A absolvição penal

A absolvição criminal faz coisa julgada na perspectiva da ação civil ex delicto, quando a sentença penal reconhece ter sido o ato praticado em estado de necessidade, legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito (art. 65, CPP), até porque os atos praticados nessas situações não se qualificam como ilícitos civis (art. 160, I, CC; art. 188, Lei 10.406/02 - novo Código Civil). Duas observações inarredáveis aqui. Uma: só a legítima defesa real, que exclui a antijuridicidade, faz coisa julgada no cível, de modo que a legítima defesa putativa, ao operar no campo da culpabilidade, excluindo-a, não repercute e não exclui a responsabilidade civil nem a ação civil ex delicto. Outra: em dois casos a absolvição criminal em face da exclusão da antijuridicidade não exclui a ação civil ex delicto: no estado de necessidade em que o agente sacrifica bem de terceiro inocente (art. 1.519, CC; art. 929, Lei 10.406/02 - novo Código Civil), tendo o agente ação regressiva contra quem causou a situação de perigo, e na legítima defesa em que é atingido terceiro inocente, tendo o agente ação regressiva contra seu agressor (art. 1.520, CC; art. 930, Lei 10.406/02 - novo Código Civil).

Não é sempre, portanto, que a absolvição no juízo criminal repercute obrigatoriamente na perspectiva da ação civil ex delicto. Com efeito. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta, quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato (art. 66, CPP), nem negada a autoria do réu. É a regra posta na parte final do art. 1.525, CC/16 e do atual art. 935, Lei 10.406/02 - novo Código Civil: “não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”. Assim, a absolvição com base no art. 386, I, CPP (estar provada a inexistência do fato) impede a ação civil reparatória. Nessa toada, se na sentença criminal restar afirmada a culpa concorrente do autor e da vítima pelo fato ilícito, tal conclusão deve ser transportada para o cível.(18) Mas, não impede a ação civil reparatória a absolvição por não haver prova da existência do fato (art. 386, II, CPP), não constituir o fato ilícito penal (art. 386, III, e art. 67, III, CPP – até porque residualmente o fato mesmo pode constituir ilícito civil, que tem um conceito mais amplo), não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal (art. 386, IV), existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena (art. 386, V, CPP) e não existir prova suficiente para a condenação (art. 386, VI, CPP). Igualmente, o despacho de arquivamento do inquérito policial e a decisão que julgar extinta a punibilidade não impedem a ação civil (art. 67, I e II, CPP).

Desse contexto surge uma questão interessante: pode o réu absolvido com base num dos incisos do art. 386, CPP, que não impedem a ação civil reparatória, apelar para alterar o fundamento da absolvição tão-somente para impedir essa ação civil? A jurisprudência tem entendido que não, ao fundamento de que carece o réu de interesse recursal diante de sentença absolutória, à míngua de sucumbência (art. 577, p.u., CPP).(19)

6.2. A condenação penal

Em caso de condenação penal, o Código Penal capitula, como efeito extrapenal genérico “tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime” (art. 91, I). Nessa alcatifa, a condenação penal faz coisa julgada no cível em relação ao an debeatur, prevalecendo sobre eventual decisão em contrário nesta instância mesma, em sede de ação civil ex delicto (art. 64, CPP), até porque a condenação penal, enquanto projeção da verdade real que, por definição, sempre é, repercute de modo absoluto na esfera cível quando reconhece o fato e a autoria. Desse modo, se a ação civil, não suspensa ou mandada prosseguir depois de escoado o prazo legal de um ano, for julgada improcedente e a sentença transitar em julgado, a posterior condenação criminal poderá funcionar sim como título executivo judicial na esfera cível(20).

Nessa mesma toada, se a ação civil estiver em andamento e sobrevier sentença criminal condenatória com trânsito em julgado, nenhum interesse processual haverá em dar continuidade ao processo de conhecimento, que deve ser extinto por carência de ação superveniente (art. 267, VI, CPC), pois o ofendido já passou a dispor de título executivo judicial. Outrossim, a sentença de pronúncia do réu não obsta a referida ação civil ex delicto, por isso que não há ainda condenação criminal.

A sentença penal condenatória funciona, portanto, como título executivo judicial na esfera cível (art. 63, CPP e art. 584, II, CPC), legitimando a ação executiva nominada actio judicati. Eventual liquidação da sentença penal no juízo cível (liquidação essa necessária, pois a condenação penal determina o an debeatur, embora sem estabelecer o quantum debeatur) faz-se na modalidade de liquidação por artigos (arts. 608 e 609, CPC). Esse processo de liquidação e posterior execução não ficam obstados por eventual prescrição da pretensão penal executória ou outras hipóteses de extinção da punibilidade (que são irrelevantes na esfera civil), tampouco pela revisão criminal posteriormente ajuizada, se e enquanto não houver decisão definitiva do Tribunal absolvendo o réu ou anulando o processo (art. 626, caput, CPP), que implica então a retirada do título executivo do mundo jurídico. Nesse último caso, importa registrar que a revisão criminal somente retira a força executiva da condenação penal, se ajuizada em dois anos a contar do seu trânsito em julgado, de modo a tratar igualmente o ofendido que optou por ajuizar ação civil de reparação do dano e o que, diversamente, preferiu esperar a sentença penal condenatória para posteriormente executá-la(21).

Aqui, cinco observações.

Uma, que a sentença concessiva de perdão judicial não pode embasar a actio judicati, por isso que “a sentença concessiva de perdão judicial é declaratória da extinção de punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório” (Súmula 18/STJ).

Outra, que a sentença penal só pode ser executada em relação a quem figurou e foi condenado no processo penal, alcançando, se for o caso, seu espólio ou herdeiros até o limite da herança, mas não açambarcando o responsável civil pelo dano que não participou daquela relação processual, ou mesmo co-autor que foi excluído da denúncia ou queixa. Nessa compreensão e exemplificadamente, a sentença penal condenatória do empregado não pode ser executada contra o patrão. Em relação a este patrão, que não figura no título como devedor (art. 568, I, CPC), deverá ser proposta ação civil de reparação do dano (actio civillis ex delicto), na qual pode ser rediscutido amplamente o fato e o seu autor, a ilicitude da conduta, bem assim a culpa concorrente da vítima com vistas a reduzir o valor da indenização.

Terceira, que o ofendido pode habilitar-se como assistente do Ministério Público na ação penal, não só a fim de defender um seu interesse na reparação do dano, com a condenação e conseqüente formação do título executivo judicial, mas também e consoante o entendimento do STF, como auxiliar da acusação na exata aplicação da justiça penal, por isso que pode o assistente recorrer, na ausência de recurso do Ministério Público, visando aumentar a pena aplicada ao réu.

Quarta, a liquidação e execução do título executivo penal ou a actio civillis ex delicto podem ser propostas no juízo cível do domicílio do autor ou do local do fato (art. 100, p.u., CPC) ou, ainda e pela regra geral, do domicílio do réu (art. 94, CPC).

Última, a sentença penal condenatória estrangeira também pode ser executada no Brasil, depois de homologada pelo STF. Outrossim, para efeitos civis da sentença condenatória, o STF não pode atuar de ofício, precisando de requerimento do interessado (art. 9o, p.u., a, CP e art. 790, CPP). A execução civil far-se-á por carta de sentença extraída dos autos da homologação, que obedecerá às regras do CPC, sendo de competência dos juízes federais processá-la (art. 109, X, CF).

7. Os planos do Direito e as normas de organização judiciária

Outra conseqüência da interdependência entre as esferas civil e penal está no desenho da competência funcional, com vistas a otimizar a eficiência da prestação jurisdicional e a credibilidade do Poder Judiciário. Exemplo disso é o deslocamento de competência no juízo penal para processar e julgar demanda cível que tenha potencialidade para resultar em ação penal. Nesse sentido, o art. 61, Lei 5.010/66 (que organiza a Justiça Federal de primeria instância): “na Seção em que houver Varas da Justiça Federal especializada em matéria criminal, a estas caberá o processo e julgamento dos mandados de segurança e de quaisquer ações ou incidentes relativos a apreensão de mercadorias entradas ou saídas irregularmente do país, ficando o Juiz prevento para o procedimento penal do crime de contrabando ou descaminho”. A respeito:

‘PROCESSUAL CIVIL E PENAL - COMPETÊNCIA - CAUTELAR INOMINADA E AÇÃO PRINCIPAL DE REPARAÇÃO DE DANOS - APREENSÃO DE MERCADORIAS ESTRANGEIRAS - EXISTÊNCIA DE INQUÉRITO POLICIAL OU AÇÃO PENAL - CONFLITO IMPROCEDENTE.
1 - Por força do disposto no art. 61 da Lei nº 5010/66, qualquer ação civil que decorra de apreensão de mercadorias entradas ou saídas irregularmente do país deverá ser processada e julgada no juízo criminal por onde tramitam os autos do inquérito ou processo penal.
2 - Ratio legis que objetiva evitar decisões conflitantes, não importando a espécie de ação civil, porquanto a lei não distingue nem restringe.
3 - Tanto a ação cautelar inominada para restituição das mercadorias estrangeiras, como a ação principal de reparação de danos contra a União, devem ser julgadas perante a vara criminal onde tramitam os autos da persecução penal.
4 - Considerando o princípio da perpetuatio jurisdictionis, consagrado no art. 87 do CPC, eventual arquivamento do inquérito ou término da ação penal não retiram a competência da vara criminal para apreciar a ação civil relacionada com o fato.
5 - Conflito negativo de competência improcedente(23).

Cai a talho, neste passo, o magistério de JOSÉ FREDERICO MARQUES:

Não conhece e decide a jurisdição penal apenas de causas penais. Assuntos que, por sua natureza, caberiam à jurisdição civil caem na esfera da atividade funcional da jurisdição penal, por força da conexão com a matéria estritamente penal.
Em alguns códigos, as atribuições do juiz penal possuem tal amplitude, que este processa todas as pretensões civis derivadas das infrações penais, tais como as restituições e os pedidos de indenização ex delicto. É o que se verifica com “o instituto da parte civil no processo penal, isto é, o exercício da ação civil em conjunto com a ação penal”, que nosso código não adotou.
Na legislação brasileira, o que se atribui ao juízo penal é o conhecimento e julgamento de medidas cautelares tendentes a garantir a indenização, como o seqüestro de bens adquiridos com proventos da infração (arts. 125 e 132), e a hipoteca legal sobre imóveis do indiciado (art. 134), e também a decisão sobre a restituição de coisas apreendidas que não envolva questões de alta indagação sobre o jus in re (art. 120).
Além disso, a jurisdição penal tem atribuições jurisdicionais civis, contidas implicitamente na função de apreciar e julgar o conflito entre o jus puniendi e os direitos de liberdade. É o que se deduz do disposto nos arts. 63 usque 68, do Código de Processo Penal, e da própria natureza do litígio que o juiz penal decide. Daí ser assegurado, por via de conseqüência, no processo penal, “o direito de indenização do dano ex delicto”, com a participação do ofendido como assistente, para auxiliar a acusação ou pleitear a condenação(24).

O inverso também se dá. No Tribunal de Justiça do Paraná, o habeas corpus tirado contra ordem de prisão civil (de depositário infiel ou de devedor de alimentos), muito embora consubstancie verdadeira ação penal ainda quando, como na hipótese, a questão subjacente é cível, não vai para uma das Câmaras Penais, e sim para um das Câmaras Cíveis (art. 87, I, Regimento Interno do TJPR).

Por fim, cabe mencionar, em relação à restituição de bens, que em se tratando de coisas apreendidas em poder de terceiro de boa-fé, a decisão cabe ao juiz criminal (art. 120, § 2o, CPP). Mas, se houver dúvida sobre quem seja o verdadeiro dono, por versar questão de alta indagação em matéria cível, o juiz criminal remeterá as partes ao juízo cível (art. 120, § 4o, CPP).

8. A responsabilidade funcional do servidor público e nas profissões regulamentadas

No que respeita aos procedimentos administrativos para apurar falta funcional de servidor público, a existência de investigação policial ou de ação penal não condiciona a instauração de sindicância ou processo administrativo disciplinar, bem assim a sua continuidade. Por identidade de razões, o inverso também é verdadeiro: a sindicância ou processo administrativo disciplinar não condicionam a investigação policial ou a ação penal.

Quanto à interdependência dos resultados das esferas criminal e administrativa, particularmente em relação ao servidor público, se houver condenação na esfera criminal por crime funcional (arts. 312 a 326, CP), haverá repercussão obrigatória na esfera administrativa:

“Se o juiz reconheceu que o servidor praticou crime e este é conexo à função pública, a Administração não tem outra alternativa senão a de considerar a conduta como ilícito também administrativo. Exemplo: se o servidor é condenado pelo crime de corrupção passiva (art. 317, CP), terá implicitamente praticado um ilícito administrativo. No caso da Lei 8.112/90, o servidor terá violado o art. 117, XII, que o proíbe de receber propina ou vantagem de qualquer espécie em razão de suas atribuições. A instância penal, então, obriga a administrativa.” (25)

Essa repercussão da condenação criminal na esfera administrativa pode ocorrer, ainda, através do efeito extrapenal da condenação posto no art. 92, I, a, CP, que determina a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública (crimes funcionais). Mas, se a condenação penal for por crime diverso (leia-se: não-funcional, exemplo, tráfico ilícito de entorpecentes), a repercussão da esfera penal na administrativa se dá, eventualmente, por intermédio do efeito extrapenal específico da condenação posto no art. 92, I, “b”, CP, que veicula a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo, quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a quatro anos.

Se a decisão penal for absolutória, de se distinguir três situações. A primeira cuida da absolvição que reconhece categoricamente a inexistência material do fato (arts. 66 e 386, I, CPP) ou nega a autoria do réu. Neste caso, a decisão impede a responsabilização funcional do servidor público, a exemplo do disposto no art. 126, Lei 8.112/90.(26) Mas, se a absolvição for pelas alíneas II, IV, V e VI do art. 386, CPP, tal circunstância não impede a posterior responsabilização funcional do servidor. Finalmente, se a absolvição for com arrimo no inc. III do art. 386, deve-se então e novamente observar duas hipóteses: se o crime constitui ou não infração administrativa. Se não constituir, a absolvição criminal repercute na esfera administrativa, de modo que não poderá o servidor ser punido administrativamente por aquele fato. Mas, se o crime constitui infração administrativa, de se observar que a instância penal não repercute na administrativa em relação à falta administrativa residual: “Pela falta residual, não compreendida na absolvição pelo juízo criminal, é admissível a punição administrativa do servidor público” (Súmula 18/STF).(27)

Nos raciocínios acima deduzidos, partiu-se da decisão penal para se concluir sobre a esfera administrativa. Isso não quer dizer, entretanto, que se deva aguardar a decisão penal:

“O exercício do poder disciplinar pelo Estado não está sujeito ao prévio encerramento da persecutio criminis que venha a ser instaurada perante órgão competente do Poder Judiciário. As sanções penais e administrativas, qualificando-se como respostas autônomas do Estado à prática de atos ilícitos cometidos pelos servidores públicos, não se condicionam reciprocamente, tornando-se possível, em conseqüência, a imposição da punição disciplinar independentemente de prévia decisão na instância penal.” (28)

De se observar, outrossim, que a esfera administrativa não tem força de coisa julgada: não se tratando de atividade jurisdicional, a absolvição em processo administrativo disciplinar não impede a apuração dos mesmos fatos em processo criminal, uma vez que as instâncias penal e administrativa são independentes. Com esse entendimento, o STF já indeferiu habeas corpus na parte em se que pleiteava a nulidade do recebimento da denúncia oferecida contra juiz de direito sob a alegação de que o paciente não poderia ser novamente julgado com base nas mesmas provas já apreciadas no procedimento administrativo disciplinar.(29)

Outro exemplo que guarda pertinência: a jurisdição disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil não exclui a jurisdição comum, quando o fato constituir crime ou contravenção,(30) valendo o mesmo raciocínio para a jurisdição disciplinar dos demais conselhos de fiscalização e disciplina das profissões liberais regulamentadas (Conselho Regional de Medicina, Conselho Regional de Química e outros).

9. A responsabilidade política e o processo de impeachment

Em relação às investigações promovidas pelas Comissões de Sindicância ou Comissões de Ética das Casas Legislativas, tendo por objeto a conduta dos parlamentares para apurar-lhe a falta de decoro parlamentar,(31) com vistas à sua desqualificação (perda do mandato – art. 55, II, CF), não são condicionadas à existência de investigação policial ou de ação penal. Importa ressaltar que esse procedimento disciplinar para apurar a responsabilidade política do congressista não é extinto com a eventual renúncia deste ao cargo (art. 55, § 4o, CF). Andante, se houver renúncia antes da instauração do processo disciplinar, entende-se que este fica prejudicado (é lembrar o caso do Senador Antônio Carlos Magalhães quando da violação do painel do Senado em 2001), o que não impede, outrossim, a investigação policial nem a ação penal.

Não se pode esquecer que a desqualificação do parlamentar posta no art. 55, II, CF, tem natureza política, implicando uma interdependência entre as esferas política e criminal. A qualificação do ato praticado pelo parlamentar como falta de decoro parlamentar é deliberação interna corporis da Casa Legislativa, não podendo ser sindicada pelo Poder Judiciário.(32) Assim, só haverá repercussão da esfera criminal na esfera política, se naquela ficar comprovada a inexistência material do fato, ou que o parlamentar não foi o seu autor. Eventual reconhecimento de causas de justificação penal (ex: legítima defesa) não interfere necessariamente no juízo político. A seu turno, a condenação penal não implica necessariamente a falta de decoro parlamentar.

Também urge estadear que o conteúdo desta sanção, a par de guardar ligeira semelhança com aquele posto no art. 52, p.u., CF, é ontologicamente diverso, por isso que o previsto no art. 52, p.u., CF tem natureza de sanção penal e o previsto no art. 55, II, CF, de sanção política.(33)

O processo de impeachment é meio de responsabilização do agente por crime de responsabilidade (Lei 1.079/50 e DL 201/67), cuja sanção tem conteúdo penal, na esteira do atual entendimento do STF.(34) De se registrar, neste passo, que não se admite a responsabilização penal do Presidente da República por atos estranhos ao exercício de sua função, enquanto ele estiver no exercício do mandato, cf. art. 86, § 4o, CF. Mas essa imunidade temporária não abrange a responsabilidade cível (é lembrar o caso do ex-Presidente Fernando Collor de Mello, contra quem foi ajuizado execução fiscal pela Fazenda Nacional).

Finalmente, a circunstância de ter sido julgada improcedente ação de impugnação de mandato eletivo, não constitui obstáculo à condenação criminal acerca dos mesmos fatos, desde que fundada no que apurado no curso da instrução do processo crime.(35)

10. O controle externo exercido pelo Tribunal de Contas e pelas Casas Legislativas

O controle externo exercido pelo Tribunal de Contas e pelas Casas Legislativas (arts. 31, §§ 1o e 2o, 49, IX, e 71, CF) não é condicionado pela existência de investigação policial ou de ação penal. A recíproca é verdadeira: a investigação policial ou a ação penal não são condicionadas à prévia deflagração do controle externo no Tribunal de Contas. Aqui, não é demais ressaltar, para evitar equívocos, o Ministério Público que atua perante o Tribunal de Contas (art. 130, CF) forma um quadro especial, diverso do Ministério Público comum(36) e sem atribuição de dominus litis de ação penal, por isso que, encontrados indícios de crimes nos processos daquele tribunal, há de se extraírem cópias e remetê-las ao Ministério Público comum, como notitia criminis. Nessa compreensão, se o Tribunal de Contas realiza procedimento administrativo apuratório e verifica indícios de crime, encaminhando o procedimento ao Ministério Público, válida é a denúncia baseada tão-somente nesta auditoria do Tribunal de Contas(37), sendo prescindível o inquérito policial (que, assim como a auditoria técnica, tem natureza eminentemente inquisitiva).

O resultado do controle externo exercido pelo Tribunal de Contas (órgão auxiliar do Poder Legislativo) não repercute necessariamente na esfera penal, por isso que as decisões do Tribunal de Contas, quando julgam “as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público” (art. 71, I, CF) não são de natureza jurisdicional, mas meramente administrativa. O mesmo se diga quando o Tribunal de Contas “apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento” (art. 71, II, CF), sendo esse parecer prévio julgado pela respectiva Casa Legislativa(38). Assim, e, por exemplo, a procedência de denúncia no Tribunal de Contas, resultando a imputação de débito e multa a administrador público e o encaminhamento de cópias do processo administrativo apuratório ao Ministério Público, como notitia criminis, não implica a necessária procedência da ação penal respectiva, que pode ser julgada improcedente ainda que a Casa Legislativa respectiva aprove o parecer contrário ao administrador. Essa improcedência da ação penal, entretanto, não repercute automaticamente para tirar a liquidez e exigibilidade do título executivo produzido pela decisão do Tribunal de Contas (art. 71, § 3o, CF). Também, a aprovação das contas do Prefeito pela Câmara Municipal não impede por si só a ação penal, até porque a atuação do Poder Judiciário não fica cerceada pela do Poder Legislativo, que só opera no plano político-administrativo, e não no plano penal.(39)

O reconhecimento de causas de justificação penal ou a condenação penal não repercutem no controle do Tribunal de Contas. A decisão penal somente repercute na decisão do Tribunal de Contas, se ficar comprovada a inexistência material do fato, ou que o administrador público não foi o seu autor:

“A rejeição de denúncia por insuficiência de provas não impede a responsabilização pelos mesmos fatos em instância administrativa, uma vez que as instâncias penal e administrativa são independentes. Com esse entendimento, o Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado por ex-prefeito, que teve rejeitada a denúncia contra ele apresentada por crime de peculato, mediante o qual se pretendia o arquivamento da tomada de contas especial do TCU sobre os mesmos fatos.”(40)


11. As Comissões Parlamentares de Inquérito

Quanto à investigação procedida pelas Comissões Parlamentares de Inquérito - CPI das Casas Legislativas, que é um dos instrumentos de controle político-administrativo de que dispõe o Poder Legislativo (art. 58, § 3o, CF), o inquérito parlamentar, dotado de finalidade própria, permite à Comissão legislativa - sempre respeitados os limites inerentes à competência material do Poder Legislativo e observados os fatos determinados que ditaram a sua constituição - promover a pertinente investigação, ainda que os atos investigatórios possam incidir, eventualmente, sobre aspectos referentes a acontecimentos sujeitos a inquéritos policiais ou a processos judiciais que guardem conexão com o evento principal objeto da apuração congressual.(41)

O relatório final da CPI, se for o caso, é encaminhado ao Ministério Público para promover a responsabilidade civil e penal referente ao fato que determinou a sua criação, bem assim aos fatos conexos a esse. Para se legitimar a extensão do relatório final a outros fatos, inicialmente desconhecidos e que surgiram durante a investigação parlamentar, basta que haja um aditamento ao objeto inicial da CPI. Outrossim, de se mencionar que as CPIs estaduais não têm competência para investigar autoridades que estão submetidas a foro privilegiado federal.(42)

12. Prova emprestada entre as diversas instâncias do Direito

Questão interessante está em saber se as provas obtidas em investigação criminal ou instrução processual penal podem ser emprestadas às searas cível e administrativa, e vice-versa. Aqui e por pertinência, enfatizo o que disse anteriormente: a comunicação de uma instância a outra é bitolada pelo ordenamento jurídico. Assim e de regra, em se tratando de prova técnica (exames, avaliações e perícias), prova material, pode-se responder à questão no sentido afirmativo(43), mas a prova testemunhal há de sempre ser repetida na nova instância, não podendo ser aproveitada.

Nessa compreensão, as provas contábeis produzidas em processos administrativos fiscais apuratórios podem servir de base ao oferecimento da denúncia (art. 12, CPP, a contrario sensu, por isso que o inquérito policial não é imprescindível)(44), bem assim e na perspectiva das infrações ao meio ambiente, “a perícia produzida no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-se o contraditório” (art. 10, p.u., Lei 9.605/98). Noutra banda e sem entrar na polêmica questão se o Ministério Público pode proceder à investigação criminal, ele pode definitivamente promover o inquérito civil público (art. 129, III, CF) que, por sua vez e sendo o caso, é bastante para embasar uma persecução penal em juízo.

Mas, se se tratar de prova coligida mediante quebra de sigilo (bancário, fiscal ou telefônico), a resposta é negativa: a prova assim produzida, por seu caráter excepcional na perspectiva do direito à privacidade (art. 5o, X, CF), fica com sua legitimidade relativizada e vinculada ao inquérito, procedimento administrativo apuratório, processo penal ou processo civil em que foi produzida, por força do ordenamento jurídico posto: art. 5o, XII, CF. Desse modo, a prova obtida em procedimento criminal referente à interceptação telefônica, envolvendo servidores públicos, não pode ser utilizada para instrução de processo cível ou administrativo/disciplinar(45), e os dados obtidos por quebra de sigilo bancário em inquérito policial que investiga possível ocorrência de crimes tipificados na Lei 9.613/98 não podem ser utilizados em processo administrativo-tributário para sustentar eventual lançamento.(46)

Do mesmo modo, a prova produzida por Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, que tem poderes investigatórios próprios das autoridades judiciais, ainda que oriunda de quebra de sigilo (bancário, fiscal ou telefônico), pode ser utilizada pelo Ministério Público em ação penal ou ação de improbidade administrativa relacionada com o fato mesmo que motivou a criação da CPI, por expressa autorização finalística posta no art. 58, §3º, CF, mas não poderia como não pode realmente ser utilizada pela Fazenda Pública para cobrança de tributos eventualmente devidos.(47)

Outrossim, havendo procedimento cautelar em que fora autorizada interceptação telefônica para investigar eventual crime de tráfico internacional de drogas no Juízo Federal, descaracterizada a internacionalidade, o procedimento cautelar pode ser encaminhado ao Juízo Estadual (então competente para julgamento da ação principal), para persecução penal em relação ao tráfico interno de drogas.(48)

13. Prisão de natureza penal decretada por juiz cível

Outra questão corriqueira: o juiz cível só pode decretar a prisão de natureza civil(49), ou seja, nas hipóteses de depositário infiel (ex: devedor em alienação fiduciária, que é considerado assim por ficção legal, tida como legítima pelo STF(50); ação de depósito de tributos, prevista na Lei 8.866/94 e bastante utilizada pelo INSS para coagir o empregador a repassar contribuições sociais retidas do empregado; e a prisão do sacado ou aceitante de título de crédito que o retém indevidamente, cf. previsto no art. 885, CPC) ou de devedor de alimentos (ex: art. 733, § 1º, CPC - valendo aqui ressaltar que a pensão decorrente de ato ilícito não permite a prisão civil, pois não tem natureza eminentemente alimentar). Desse modo, o juiz cível, que não tem jurisdição criminal, não tem competência para decretar prisão penal, ainda que por desobediência a ordem sua.(51)

A diferença entre prisão penal e prisão civil está em que a primeira consubstancia um meio de expiação ou repressão do ilícito (prisão penal stricto sensu, que ocorre após o trânsito em julgado da condenação), bem assim um meio de prevenção (prisão processual, cautelar ou provisória, que inclui a prisão em flagrante, cf. arts. 301 a 310, CPP, a prisão preventiva, cf. arts. 311 a 316, CPP, a prisão resultante de pronúncia, cf. arts. 282 e 408, § 1o, CPP, a prisão resultante de sentença penal condenatória não transitada em julgado, cf. art. 393, I, CPP, e a prisão temporária, cf. Lei 7.960/89), enquanto a segunda é um meio de coação, por isso que não admite a concessão de fiança (art. 324, II, CPP), bem assim “o cumprimento da pena não exime o devedor do pagamento das prestações vencidas e vincendas” (art. 733, § 2º, CPC), é dizer, o seu cumprimento não extingue a obrigação nem a responsabilidade.

Neste passo importa destacar, novamente invocando a Lei 8.866/94, que em virtude de sua natureza civil mesma, essa lei não implicou a revogação do tipo penal então previsto no art. 95, a, Lei 8.212/91 e, a partir da Lei 9.983/00, no art. 168-A, CP, por isso a diversidade de natureza das sanções impede a repercussão e a compensação entre elas.(52)

Se o juiz criminal competente rejeita a denúncia pelo crime de desobediência, é desarrazoado que o juiz do cível, aquele que emitiu a ordem descumprida, determine a prisão do insubmisso, porque inconciliáveis as idéias de que o juiz natural declare a inexistência do crime e de que outro reconheça sua prática em flagrante, prevalecendo o ato judicial exarado no âmbito da competência própria.(53)

Nessa senda, registre-se ainda que:

“Não há prisão em flagrante por meio de mandado judicial. Soma-se a isso o fato do mandado de prisão ter sido expedido por um Juízo Cível e, ainda mais, sem o devido processo legal. A desobediência a ordem judicial, mesmo que importe na submissão do agente a processo criminal, antecedido inclusive de prisão em flagrante, não comporta prisão por mandado, expedido pela própria autoridade judiciária que expediu a ordem”. (54)


Enfim, também é conveniente registrar que o Juiz do Trabalho pode decretar a prisão civil de depositário infiel, ex: empregado que assume a responsabilidade por um bem no processo de execução de sentença proferida em reclamação trabalhista. E, nesses casos, o habeas corpus tirado contra essa ordem de prisão compete ao Tribunal Regional Federal, e não ao Tribunal Regional do Trabalho.(55) É que o habeas corpus é sempre ação de natureza penal, ainda que versando uma questão cível, é dizer, utilizada no curso de um processo cível (em contrapartida, o mandado de segurança é sempre uma ação de natureza cível, ainda que versando uma questão penal ou utilizada no curso de um processo-crime(56) ), e a Justiça do Trabalho não tem jurisdição penal, subsumindo por isso mesmo a espécie ao art. 108, I, d, CF.

14. Efeitos extrapenais da condenação

Oportuno, neste passo, analisar os efeitos extrapenais da condenação penal, por isso que, consoante a nomenclatura mesma deste instituto sugere, tem-se aqui a repercussão da esfera penal em outras esferas que dividem ontologicamente o ordenamento jurídico.

14.1. Efeitos extrapenais genéricos

Os efeitos extrapenais genéricos da condenação estão positivados no art. 91, CP, art. 15, III, CF e legislação não-penal. O que os caracteriza e distingue dos efeitos extrapenais específicos é o fato de não precisarem ser expressamente declarados na sentença penal.

O primeiro é tornar certa a obrigação de reparar o dano causado pelo crime (art. 91, I, CP), por isso que, em caso de condenação, os autos de eventual procedimento incidental de seqüestro, arresto e especialização em hipoteca legal são encaminhados ao juiz cível, para os fins do art. 63, CPP. A esse respeito já se falou no item 6: “A ação civil de reparação de dano e a ação executiva da sentença penal condenatória”.

Confisco pela União dos instrumentos do crime, desde que seu uso, porte, detenção, alienação ou fabrico constituam fato ilícito (art. 91, II, a, CP). No caso de crime da Lei de Tóxicos, Lei 6.368/76, a condenação provoca a perda em favor da União de qualquer meio de transporte, maquinismo ou instrumento para a prática do crime, ainda que seu porte, alienação ou fabrico não constituam fato ilícito (art. 34, § 2º). Serão confiscadas todas as glebas utilizadas para cultura ilegal de plantas psicotrópicas (art. 243, caput, CF) e todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico (art. 243, p.u., CF). De se ressaltar que o confisco somente atinge os bens do autor do ilícito, não podendo terceiro, estranho à lide, ser prejudicado pela medida.

Confisco pela União do produto e do proveito do crime (art. 91, II, b, CP). Produto é a vantagem direta auferida pela prática do crime (ex: relógio furtado); proveito é a vantagem decorrente do produto (ex: dinheiro obtido com a venda do relógio furtado). Na realidade, o produto do crime deverá ser restituído ao lesado ou ao terceiro de boa-fé, somente se realizando o confisco pela União se permanecer ignorada a identidade do dono ou não for reclamado o bem. No crime tentado de evasão de divisas, o produto da ação delitiva - a quantia apreendida – confunde-se com o seu próprio objeto e, por isso, deve-se aplicar às importâncias retidas a pena de perdimento.(57)

Importa aqui registrar que a perda dos instrumentos do crime e a formação do título executivo é automática, decorrendo do trânsito em julgado da sentença condenatória (= efeito da condenação criminal), disso resultando que é incabível no caso de transação penal (art. 76, § 6º, Lei 9.099/95) ou extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória.

Outro efeito extrapenal genérico da condenação criminal transitada em julgado é a suspensão dos direitos políticos, enquanto durar a execução da pena (art. 15, III, CF). Importante registrar, aqui e agora, que os presos provisórios têm assegurados seus direitos políticos, muito embora pouquíssimos estabelecimentos prisionais viabilizem, por exemplo, o exercício do direito de voto a eles. A suspensão dos direitos políticos não se limita às hipóteses em que o cumprimento da sanção definitiva torne inviável o seu exercício ou quando houver limitações que impliquem horários de recolhimento ao cárcere. Portanto, se aplica ao sursis e ao livramento condicional, de modo que só há o restabelecimento dos direitos políticos depois de extinta a pena ou terminar sua execução, computando-se o período de prova do sursis e do livramento condicional.(58)

A suspensão dos direitos políticos engloba a perda do mandato eletivo, implicando a imediata cessação do seu exercício (ex: cargo de Governador, Prefeito, Vereador), exceto em se tratando de parlamentar federal, por isso que, nessa hipótese, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta (art. 55, § 2o, CF), ou seja, depende de um plus que consubstancia um juízo político, estendido também aos parlamentares estaduais (art. 27, §1o, CF).

Além desses efeitos extrapenais genéricos da condenação criminal transitada em julgado, de tradicional citação, ainda que en passant, nos manuais de Direito Penal, há outros positivados na legislação não-penal, valendo citar alguns.

O primeiro exemplo está no art. 8º, I, Lei 9.961/00, que cria a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e dá outras providências: “Após os primeiros quatro meses de exercício, os dirigentes da ANS somente perderão o mandato em virtude de: I – condenação penal transitada em julgado”.

Outro exemplo é dado pelo art. 38, § 1o, VII, Lei 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão no serviço público: “A caducidade da concessão poderá ser declarada pelo poder concedente quando: VII – a concessionária for condenada em sentença transitada em julgado por sonegação de tributos, inclusive contribuições sociais”.

Finalmente, é também efeito extrapenal genérico da condenação criminal a pena privativa de liberdade superior a 2 anos, em relação ao oficial militar das Forças Armadas, ser submetido a julgamento perante tribunal militar permanente para que se verifique se sua conduta é indigna do oficialato ou com ele incompatível, hipótese em que perderá o posto e a patente (art. 142, § 3o, VI e VII, CF).

14.2. Efeitos extrapenais específicos

Os efeitos extrapenais específicos da sentença penal condenatória estão no art. 92, CP. “Os efeitos de que tratam este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença” (art. 92, p.u., CP).

O primeiro é a perda do cargo ou função pública (art. 92, I, CP). Decorre da prática de crimes funcionais, desde que seja imposta pena igual ou superior a um ano (art. 92, I, a, CP). Mas, não se justifica a decretação da perda de cargo público por condenação a pena inferior a quatro anos, de servidor que por toda sua vida funcional teve conduta irrepreensível e, que, em incidente isolado, vem a cometer crime que por suas características não revela incompatibilidade com a função pública.(59) Decorre também da prática de qualquer crime (ainda que não seja funcional), se a pena imposta for superior a quatro anos (art. 92, I, b, CP). No caso de crime de preconceito de raça ou cor praticado por servidor público, também ocorrerá esse efeito, se o juiz o declarar na sentença (art. 18, Lei 7.716/89). A condenação do agente pela prática de crime de tortura igualmente enseja a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada, independente da sua quantidade (art. 1o, § 5o, Lei 9.455/97).

Outro efeito é a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos a pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado (art. 92, II, CP).

Por último, é também efeito extrapenal específico a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso (art. 92, III, CP).

Aqui, importa enfatizar que a reabilitação implica a suspensão dos efeitos extrapenais específicos, vedando, contudo, o CP a recondução ao cargo anterior e a recuperação do poder familiar em relação ao filho, tutelado ou curatelado ofendido pelo crime anterior, ficando a conseqüência na reabilitação limitada à volta da habilitação para dirigir veículo (art. 93, p.u).

15. Epílogo

O alcance deste trabalho devia ser e realmente foi glosar uma ciência e uma consciência do intercâmbio entre os diversos ramos do Direito, fato este que, em boa verdade, é visceral e telúrico aos operadores do Direito. Assim, definem-se os contornos positivados desse diálogo jurídico, enfatizando uma visão holística (contrapondo-se a uma visão cartesiana) desse fenômeno cultural e locus artificiallis apodíctico que é o Direito. E nesse diálogo entre mundos (pode-se chamar assim os diversos ramos do Direito, com sua legislação, jurisprudência, doutrina, prática forense, atualidades, tendências e outras idiossincrasias) de um mesmo mundo, promove-se o encontro do Direito consigo mesmo, estreitando ainda mais os lindes dos diversos ramos do Direito, o que convém na medida em que o Direito é uno.

Longe de pretender sintetizar uma ontologia sobre o diálogo jurídico entre os ramos do Direito, mesmo porque inexistente, esse trabalho simplesmente traz algumas respostas (nem sempre tautológicas em face da legislação vigente, e às vezes até pitorescas ou desaforadas, se comparadas aos princípios mais comezinhos do Direito) a questões diuturnas da realidade, onde e quando se faz necessário esse conhecimento casuístico e tópico. É que, como ficou registrado logo no início, esse é um tema em que prevalecem, antes de uma lógica jurídica pura com critérios científicos, as opções de política legislativa (à semelhança da romântica e bizantina questão do cabimento das leis complementares na Constituição). Mas, nem por isso, passa a ser um tema inefável, como se vê neste trabalho, que não pretende ter a gordura literária de um baile da Ilha Fiscal, e o que tem está aí: prêt-à-porter.

NOTAS DE RODAPÉ


1. vide páginas 858 a 861 da 2ª edição, publicada pela Editora RT em 1999
2. A regra não é absoluta, podendo-se citar como exceções a desapropriação e a cobrança de multa, que hão de ser realizadas, necessariamente, por meio de processo judicial.
3. STJ, RHC 12.321, FERNANDO GONÇALVES, 6ª T, DJ 29.9.03; TRF4, HC 2002.04.01.044900-8, ANTONIO BONAT, 7ª T, J 19.11.02.
4. Súmula 138/ex-TFR: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito”
5. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 8a edição, 2001, p. 47
6. Exemplo paradigmático desse entendimento, seguido por todos os tribunais pátrios, está na STF, HC 7.771 MC, CELSO DE MELLO, DECISÃO MONOCRÁTICA, DJ 17.8.98.
7. STJ, RHC 8.335, VICENTE LEAL, 6ªT, DJ 14.6.99
8. TRF2, HC 2000.02.01.066483-6, ANDRE FONTES, 6ª T, DJ 24.7.01.
9. em 10.12.03, relatado por SEPÚLVEDA PERTENCE
10. Desvirtuamento também presente na Lei 9.099/95, que versa os juizados especiais cíveis e criminais: “Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente. Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.” (g.n.). E vale registrar esse vezo patológico também em outros artigos do próprio Código Penal, o mais novo deles o § 4o do art. 33, incluído pela Lei 10.763/03: “O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais”. (g.n.)
11. Impõe-se o registro de que essa norma, por ser especial, não se aplica ao descaminho/contrabando, como já tive a oportunidade de escrever: “Descaminho. Pagamento posterior do tributo. Extinção da punibilidade. Analogia in bonan partem de norma penal especial”, in Revista Jurídica Consulex nº 158, de agosto de 2003, pp. 24/30
12. STF, HC 84.223, EROS GRAU, 1A T, DJ 27.8.04
13. STF, HC 81134 QO, SEPÚLVEDA PERTENCE, PLENO, J 3.8.04
14. à semelhança do que ocorreu com o art. 89 da Lei 9.099: vide STF, HC 74.305, MOREIRA ALVES, PLENO, DJ 5.5.00.
15. STJ, RESP 442285, FRANCIULLI NETTO, 2ª T, DJ 13.5.03
16. Está no art. 68, CPP: “Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, §§ 1º e 2º), a execução da sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público”. No atual ordenamento jurídico, essa atribuição está com a Defensoria Pública (art. 134, CF). Mas o art. 68, CPP continua válido, como já tive a oportunidade de manifestar: “a precariedade na implantação do órgão (Defensoria Pública) não justifica o descumprimento de suas funções instituicionais. Também, não há possibilidade jurídica de contratação temporária de Defensores Públicos, em caráter emergencial, posto que viola a CF/88, arts. 37, II e IX e 134, consoante entendimento do STF. Essa situação de precariedade operacional - espera-se transitória - justifica o entendimento do STF, interpretando o texto constitucional e acolhendo a tese de inconstitucionalidade progressiva, de subsistir a legitimidade do Ministério Público onde ainda não instituída a Defensoria Pública para propor a ação civil ex delicto (art. 68, CPP)” (in “Assistência Judiciária Gratuita”, RT 797/733-4).
17. STJ, RESP 216.657, SALVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, 4ª T, DJ 16.11.99
18. TRF4, AC 96.04.636265-5, SERGIO TEJADA GARCIA, 3ª T, DJ 3.11.99
19. STJ, RESP 294.696, VICENTE LEAL, 6ª T, DJ 6.5.02; TRF4, ACRIM 2002.04.01.024945-7, FÁBIO ROSA, 7ª T, J 29.10.02; “A extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva prejudica o exame do mérito da apelação criminal” (Súmula 241/ex-TFR).
20. Nesse sentido: ZAVASCKI, Teori Albino, ‘Comentários ao Código de Processo Civil’, coord: Ovídio Baptista da Silva, São Paulo: RT, 2000, v. 8, p. 194, citando Humberto Theodoro Júnior.
21. Nesse sentido: CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, v II, 2001, 5ª edição, p. 151.
22. STF, RE 92.648, DJACI FALCÃO, 2ª T, DJ 13.3.81 e HC 71.453, PAULO BROSSARD, 2ª T, DJ 6.9.94
23. TRF3, CC 97.03.0476503, CASEM MAZLOUM, 1ª SEÇÃO, DJ 5.5.98
24. in Elementos de Direito Processual Penal, v. I, Campinas: Bookseller, 1997, 1a edição p. 185.
25. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 8a edição, 2001, p. 549
26. ‘RMS. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. FATO INEXISTENTE. SENTENÇA CRIMINAL. ART. 386, I - CPP. 1 - A absolvição na forma do art. 386, I, do Código de Processo Penal, através de sentença criminal transitada em julgado, impede tome a instância administrativa por base aqueles mesmos fatos, reputados inexistentes, para sancionar pretensa falta residual, ainda que estejam eles tipificados na legislação local como aptos a ensejar a pena de demissão. Incide a letra do art. 1.525 do Código Civil. 2 - RMS provido.’ (STJ, RMS 10.654, FERNANDO GONÇALVES, 6A T, DJ 15.10.01)
27. ‘MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO DEMITIDO POR ILÍCITO ADMINISTRATIVO. SIMULTANEIDADE DE PROCESSOS ADMINISTRATIVO E PENAL. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. PRECEDENTES. Esta Corte tem reconhecido a autonomia das instâncias penal e administrativa, ressalvando as hipóteses de inexistência material do fato, de negativa de sua autoria e de fundamento lançado na instância administrativa referente a crime contra a administração pública. Precedentes: MS 21.029, CELSO DE MELLO, DJ 23.9.94; MS 21.332, NERI DA SILVEIRA, DJ 7.5.93; e MS 21.294, SEPÚVEDA PERTENCE , J 23.10.91. Segurança denegada’ (STF, MS 21.708, MARCO AURÉLIO, PLENO, DJ 18.5.01)
28. STF, MS 21.029, CELSO DE MELLO, PLENO, DJ 23.9.94.
29. STF, HC 77.784, ILMAR GALVÃO, J. 10.11.98, INFORMATIVO STF 131
30. STF, RHC 49.630, HELOY DA ROCHA, 2ª T, DJ 31.5.72
31. E aqui importa dizer que a ética na política toma cores mais forte, em termos de controle social, após o impeachment do Presidente da República Collor de Melo.
32. STF, MS 23.388, NERI DA SILVEIRA, PLENO, DJ 20.4.01
sobre a natureza política desse tipo de sanção do congressista por falta contra a ética e o decoro parlamentar, bem assim um estudo sobre esse tipo de sanção no direito comparado, vide PINTO FERREIRA, Comentários à Constituição Brasileira, São Paulo: Saraiva, 1992, v. III, p. 28
33. “CRIME DE RESPONSABILIDADE. DEFINIÇÃO. RESERVA DE LEI. Entenda-se que a definição de crimes de responsabilidade, imputáveis embora a autoridades estaduais, é matéria de Direito Penal, da competência privativa da União – como tem prevalecido no Tribunal – ou, ao contrário, que sendo matéria de responsabilidade política de mandatários locais, sobre ela possa legislar o Estado-membro – como sustentam autores de tomo – o certo é que estão todos acordes em tratar-se de questão submetida à reserva de lei formal, não podendo ser versada em decreto-legislativo da Assembléia Legislativa.” (STF, ADI 834, SEPÚLVEDA PERTENCE, PLENO, DJ 9.4.99)
35. TSE, AG 2577, FERNANDO NEVES DA SILVA, PLENO, DJ 16.3.01.
36. STF, ADI 2068, SIDNEY SANCHES, J. 3.4.03, INFORMATIVO STF 304
37. STF, RHC 49.204, AMARAL SANTOS, 1ª T, DJ 10.3.72
38. De regra, os Tribunais de Contas aprovam as contas dos Chefes do Executivo. O Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, em iniciativa inédita, recusou as contas de 2002 do então Governador Anthony Garotinho e da então Prefeita Benedita da Silva, que foram responsabilizados por um deficit de R$ 2 bilhões. Entretanto, a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, cedendo a pressões políticas, aprovou as contas dos dois (contra o parecer do Tribunal de Contas), livrando-os de sanções pertinentes (que poderiam levar à inelegibilidade).
39. STF, RHC 49.204, AMARAL SANTOS, 1ª T, DJ 10.3.72; STJ, HC 1.583, EDSON VIDIGAL, 5ª T, DJ 1.3.93
40. STF, MS 23.625, MAURÍCIO CORREA, J. 8.11.01
41. STF, MS 24.458, CELSO DE MELLO, DECISÃO MONOCRÁTICA, DJ 18.2.03
42. STJ, AGRG NA PETIÇÃO 1.611, JOSÉ DELGADO, CORTE ESPECIAL, DJ 22.4.03
43. “A prova emprestada tem existência reconhecida na doutrina e na jurisprudência pátrias, valendo como tal a que foi produzida no processo-crime a que responde o servidor, e que foi juntada nos autos do processo administrativo disciplinar” (STJ, ROMS 7.685, HAMILTON CARVALHIDO, 6ª T, DJ 4.8.03)
44. STJ, HC 14.274, VICENTE LEAL, 6A T, DJ 4.6.01
45. TRF4, MS 2003.04.01.020230-5, ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO, DECISÃO LIMINAR, J 21.5.03
46. TRF4, MS 2002.04.01.023849-6, VLADIMIR FREITAS, 4ª SEÇÃO, J. 16.6.03, INFORMATIVO TRF4 161.
47. Nessa compreensão, o STF indeferiu pedido de autoridade fiscal formulado em inquérito policial em que se apuravam fatos relacionados com o chamado “Escândalo do Orçamento”, no sentido de que fosse autorizada a extração de cópia de documentos que chegaram aos autos em virtude de quebra de sigilo bancário do indiciado e que poderiam ser úteis à fiscalização tributária (INQ 923, MOREIRA ALVES, PLENO, J 18.4.96). Outrossim, embora essa decisão tenha sido tomada sob a égide do art. 38, §1º, Lei 4.595/64, esse entendimento deve prevalecer sob a égide da atual LC 105/01, por isso que o caput do seu art. 3º repete aquela norma.
48. Em sentido contrário: “4. Mostra-se regular o arquivamento dos autos de procedimento cautelar em que autorizada interceptação telefônica, diante da não-confirmação dos indícios referentes ao tráfico internacional de drogas, os quais – a princípio – observado o critério da competência – motivaram a persecutio criminis no âmbito federal. 5. Observados os princípios da necessidade e da proporcionalidade, à míngua de prova contrária, descabe impor reparos ao Juízo Federal que indeferiu a remessa dos autos da medida arquivada à órbita Estadual, mormente quando autorizou a manutenção dos dados obtidos para eventual aproveitamento nas investigações. 6. Em obediência à mencionada regra contida na 2a parte do inc. XII do art. 5o da CF/88, a prova sigilosa, mantida no âmbito da Polícia Federal, deverá ficar formalmente vinculada a procedimento criminal, sob controle do Juízo apelado” (TRF4, CORREIÇÃO PARCIAL 2002.04.01.047768-5, LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, 8ª T, DJ 7.5.03)
49. STJ, HC 18.610, GILSON DIPP, 5ª T, DJ 4.11.02.
50. vide STF, RE 265.223, CELSO DE MELLO, DECISÃO MONOCRÁTICA, DJ 15.5.00
51. TRF4, RHC 1998.04.01.026511-1, ANTONIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA, 1ª T, DJ 22.7.98.
52. STJ, RHC 14.691, FRANCIULLI NETTO, 2ª T, DJ 24.11.03
53. TRF4, HC 920410058-3, ARI PARGENDLER, 1ª T, DJ 20.5.92.
54. TRF4, HC 2000.04.01.139688-0, AMIR SARTI, 1ª T, DJ 18.4.01.
55. STF, CC 6.979, ILMAR GALVÃO, PLENO, DJ 4.10.91
56. neste passo interessante notar a correta utilização do mandado de segurança, e não do hábeas corpus, para trancar ação penal contra a pessoa jurídica por crimes ambientais (TRF4, MS 2002.04.01.013843-0, FÁBIO BITTENCOURT DA ROSA, 7ª T, DJ 10.12.02)
57. TRF4, Embargos Infringentes e de Nulidade em Apelação Criminal nº 2000.04.01.027653-1/PR, JOSÉ GERMANO DA SILVA, 4ª SEÇÃO, J. 18.12.02.
58. Nesse sentido: “RECURSO ESPECIAL. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. SURSIS. CF, ART. 15, III. AUTO-APLICABILIDADE. INELEGIBILIDADE. 1. A CF, art. 15, III, possui eficácia plena (STF, RE 179.502, MOREIRA ALVES, DE 08.09.95). 2. Deve-se cassar o diploma de candidato condenado por sentença transitada em julgado, independentemente da natureza do crime e mesmo que esteja em curso a suspensão condicional da pena. Precedentes” (TSE, RESPE 15.338, EDSON CARVALHO VIDIGAL, DJ 13.8.99). Também: TSE, RESPE 15.726, EDUARDO ANDRADE RIBEIRO DE OLIVEIRA, DJ 23.4.99
59. TRF4, ACRIM 2001.04.01.064921-2, VLADIMIR FREITAS, 7A T, DJ 26.2.03

 
REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS