Sumário: Introdução. 1 O princípio constitucional da isonomia. 1.1 Breve análise histórica. 1.2 A igualdade nas Constituições Brasileiras. 1.3 A igualdade na Constituição de 1988. 1.4 As discriminações na lei. 1.5 O tempo como critério distintivo. 2 O Direito Previdenciário e a isonomia. 2.1 As Leis nº 9.032/95 e nº 9.876/99. 2.2 A segurança jurídica. 2.3 A isonomia como argumento plausível. 2.4 A Súmula 339 do STF. Conclusão. Referências bibliográficas.
Introdução
Os profissionais do Direito que militam na seara previdenciária, notadamente os juízes, se deparam, não raras vezes, com o argumento de violação ao princípio constitucional da isonomia.
Por regra, o segurado da Previdência Social já aposentado – ou seu (sua) dependente pensionista – recorre ao princípio constitucional em referência como fundamento para a revisão de seu benefício, especialmente quando pretende a aplicação da legislação posterior mais favorável. A questão, pois, envolve todos os operadores jurídicos que militam na área.
O presente trabalho pretende estudar o tema posto em evidência, no intuito de buscar conclusões razoavelmente lógicas acerca da validade ou da invalidade, total ou parcial, do argumento proposto.
Para a tarefa que se propõe, o estudo do princípio da isonomia e a pesquisa da doutrina e da jurisprudência tornam-se indispensáveis, especialmente no que concerne à definição do princípio constitucional em referência e sua incidência no âmbito do Direito Previdenciário, em face de suas particularidades.
Evidentemente, não se buscarão soluções prontas para todos os casos concretos que a invenção humana faz surgir. Nem seria esta a seara própria para trabalho mais aprofundado. Entrementes, nada obsta que se busquem aqui diretrizes gerais que possam balizar e nortear os operadores do Direito.
1 O princípio constitucional da isonomia
O princípio da isonomia é uma das bases de sustentação do regime democrático. Não seria exagero afirmar que tal princípio e o do princípio da dignidade da pessoa humana constituem duas vigas-mestras da atual Constituição e da República Federativa do Brasil. Deles se pode dizer que decorrem quase todos os demais princípios. Não por acaso constam do texto constitucional entre os princípios, direitos e garantias fundamentais.
Em verdade, o desejo à igualdade é uma natural aspiração humana. Via de regra, os seres humanos não desejam ser melhores ou piores do que ninguém: querem simplesmente ser iguais.
Neste passo, recomendável que se faça uma análise histórica acerca do princípio em comento.
1.1 Breve análise histórica
FERREIRA(1) traça um breve escorço histórico acerca das declarações de direito, que constituem as origens do princípio da isonomia. Após conceituar as declarações de direito como "disposições declaratórias das principais liberdades humanas", o referido autor pontifica:
"Jellinek, na sua obra A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, enuncia a filiação dessas declarações à reforma religiosa de Lutero, atribuindo sua paternidade à Alemanha. Entretanto, é mais correto verificar a sua origem na Inglaterra, pois, na verdade, a Magna Carta de 1215, como o seu próprio nome indica, Magna Carta Libertatum, foi a primeira declaração histórica dos direitos, embora bastante incompleta. Mais tarde surgiram a ‘Petição de Direitos’, de 1629, e a "Lei de Habeas Corpus", de 1679, esta determinando a proteção contra as prisões arbitrárias e o direito de ser ouvido pelo juiz. Conquanto tais declarações não tivessem o brilho lógico e a sistemática vigorosa das declarações posteriores, enunciam o sentido dessa evolução histórica, sobretudo a Declaração de 1679, que estabeleceu a liberdade pessoal, a segurança pessoal e a propriedade privada.
A revolução norte-americana da independência acelerou essa marcha. A primeira declaração de direitos é a da Virgínia, de 12.06.1776, que se deve a Jefferson. Os outros Estados norte-americanos também assim procederam e só ratificaram a Constituição Federal mediante a inclusão de dez emendas votadas pelo Congresso Federal em 1789.
Em seguida vem a grande ‘Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão’, proveniente da Revolução Francesa, em 1789, e que teve uma grande influência no desenvolvimento histórico do mundo. Tais declarações francesas depois se incluem no próprio texto das Constituições. Segundo Duguit, elas ‘são a expressão muito nítida, muito exata, da doutrina individualista’.
As declarações de direitos do século XIX consagram sobretudo os direitos privados e políticos. Era uma primeira meta a ser atingida. O mundo ainda não havia amadurecido para as grandes declarações econômicas que surgiram no século XX."
Em face da importância histórica, conforme aponta o doutrinador em referência, transcreve-se aqui o art. 1º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: "Artigo l. Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. As distinções sociais não podem ser fundamentadas senão sobre a utilidade comum".
Recentemente (em termos de História), na seqüência dessa notável evolução, após as duas grandes guerras (1914-1918 e 1939-1945), a Assembléia Geral das Nações Unidas de 10 de dezembro de 1948 adotou e proclamou a resolução 217 A (III), nomeada com Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual se transcrevem os dois primeiros artigos:
"DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
Artigo I
Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.
Artigo II
Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição."
Em linhas gerais, temos aí a evolução mundial positivada da idéia natural de igualdade (suas raízes), valendo agora verificar a positivação do instituto na sucessão dos textos constitucionais pátrios.
1.2 A igualdade nas Constituições Brasileiras
Embora erigida sob as bases de uma sociedade escravocrata, a Constituição do Império de 1824 proclamava:
"Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.
XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.
XIV. Todo o cidadão pode ser admittido aos Cargos Publicos Civis, Politicos, ou Militares, sem outra differença, que não seja dos seus talentos, e virtudes.
XV. Ninguem será exempto de contribuir pera as despezas do Estado em proporção dos seus haveres.
XVI. Ficam abolidos todos os Privilegios, que não forem essencial, e inteiramente ligados aos Cargos, por utilidade publica.
XVII. A excepção das Causas, que por sua natureza pertencem a Juizos particulares, na conformidade das Leis, não haverá Foro privilegiado, nem Commissões especiaes nas Causas civeis, ou crimes."
Já a Constituição de 1891, a primeira republicana, enunciava:
"Art. 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º - Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
§ 2º - Todos são iguais perante a lei.
A República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho."
Na seqüência, as demais Constituições, todas elas (1934, 1937, 1946 e 1967), com pequenas variações na redação, consagram a assertiva de que todos são iguais perante a lei e que são vedadas distinções.
Por fim, temos a Constituição cidadã de 1988, que não apenas inovou, mas verdadeiramente revolucionou, buscando efetivamente concretizar o princípio da igualdade, conforme se verá a seguir.
1.3 A igualdade na Constituição de 1988
De fato, a igualdade não passava de mera promessa formalizada – e não cumprida – antes da Constituição de 1988. Ou ainda, em uma visão menos crítica, cuidava-se de garantia não satisfatoriamente assegurada. Não que atualmente já se tenha concretizado totalmente a igualdade, mas é impossível deixar de constatar que ocorreram avanços significativos.
A Constituição de 1988 já se diferenciou desde a localização "geográfica" do princípio em comento, agora alçado "ao caput" do art. 5º, no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais e no Capítulo dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos.
Por sua importância capital, cumpre transcrever o princípio objeto deste estudo:
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;"
Aliás – e nisso mais se diferencia o texto atual –, a igualdade é valor afirmado em vários outros dispositivos da Carta Magna. Pode-se citar, a partir do preâmbulo, o art. 3º, incisos III e IV, o art. 4º, incisos II e V, os incisos XXXVII, XLI e XLII do art. 5º, o art. 7º, caput e seus incisos IV, XXX, XXXI, XXXII e XXXIV, o art. 37, caput e inciso I, o art. 170, VII, e o art. 194, parágrafo único, I e II, dentre outros.
Bem se vê a importância dada ao princípio da isonomia pela Constituição de 1988 e isso se deu – e se dá – a partir da constatação de que formamos uma sociedade profundamente desigual. Temos em nosso país uma série de discriminações, de origem racial, sexual, regional, social etc. Partindo dessa premissa, o legislador constitucional originário não só tratou de reafirmar enfaticamente a proibição das discriminações desarrazoadas, como também consignou que a busca da igualdade material é obrigação de todos, Estado e cidadãos.
Em suma, a Constituição de 1988 busca a superação da mera afirmação formal de igualdade (verdadeiro avanço histórico, mas agora ultrapassado e insuficiente) para a busca da igualdade material, o que torna imprescindível uma postura ativa.
Já em 1996, a hoje Ministra do STF CARMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA redigiu primoroso artigo,(2) que muito inspira o presente trabalho, em que, depois de enumerar as inúmeras desigualdades históricas que assolam nosso país, assevera:
"Por essa constatação histórica irrefutável é que, desde a década de 60 especialmente, começou a se fazer patente, aos que tinham olhos com que ver claro, que o Direito Constitucional acanhava-se em sua concepção meramente formal do princípio denominado da isonomia, despojado de instrumentos de promoção da igualdade jurídica como vinha sendo até então cuidado. Concluiu-se, então, que proibir a discriminação não era bastante para se ter a efetividade do princípio da igualdade jurídica. O que naquele modelo se tinha e se tem é tão-somente o princípio da vedação da desigualdade, ou da invalidade do comportamento motivado por preconceito manifesto ou comprovado (ou comprovável), o que não pode ser considerado o mesmo que garantir a igualdade jurídica. [...] Urgia, pois, que se promovesse constitucionalmente, por uma remodelação da concepção adotada pelo sistema normativo democrático, a igualdade jurídica efetiva, a dizer, promotora da igualação. Os iguais mais iguais que os outros já tinham conquistado o ‘privilégio’ da igualdade. E os desiguais, ou aqueles histórica e culturalmente desigualados, sujeitos permanentes do Direito formal, mas párias do Direito aplicado, que não conseguiam ascender à igualdade jurídica desejada."
Como se percebe, não é por acaso, pois, que a Constituição Federal traça diretrizes ativas, estabelecendo o fundamento constitucional para as chamadas ações afirmativas.
Como bem lembra a Ministra Carmen Lúcia,(3) os incisos do art. 3º da CF utilizam verbos que dão a inequívoca idéia de ação (construir, erradicar, promover). De resto, ao longo do texto constitucional há normas que denotam o caráter material e ativo do princípio da isonomia por ele afirmado, sempre na busca da redução das desigualdades arbitrárias. Pode-se citar como exemplo: art. 7º, inciso XX, art. 37, VIII, art. 43, art. 145, § 1º, art. 146, III, c e d, art. 146-A e art. 170,VII e IX.
A partir daí, tem-se a base para que a legislação infraconstitucional avance na busca da isonomia material.
Por evidente, a isonomia que se busca é aquela que já considera as desigualdades naturais intrínsecas aos seres humanos, calcada na máxima aristotélica de que é preciso tratar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam, buscando a igualação material. Trata-se de expressão que já se tornou chavão no meio jurídico, mas nem por isso perde sua força como ideal a ser atingido.
Enfim, o que a Constituição veda com o princípio da isonomia é toda sorte de discriminação arbitrária, em total dissonância com os demais princípios por ela – CF – albergados. Na outra ponta, o que a Constituição manda é que se promova a igualdade quando não existir em razões – fundadas nela mesma (Constituição) – para as diferenciações havidas.
Avançando-se nessa direção, impõe-se a derrocada dos adeptos da chamada corrente nominalista,(4) para quem a igualdade não passa de um "nome sem significação real". SILVA,(5) citando a Ministra Carmen Lúcia, é quem arremata a questão:
"Uma posição, dita realista, reconhece que os homens são desiguais sob múltiplos aspectos, mas também entende ser supremamente exato descrevê-los como criaturas iguais, pois, em cada um deles, o mesmo sistema de características inteligíveis proporciona, à realidade individual, aptidão para existir. Em essência, como seres humanos, não se vê como deixar de reconhecer igualdade entre os homens. Não fosse assim, não seriam seres da mesma espécie. A igualdade aqui se revela na própria identidade de essência dos membros da espécie. Isso não exclui a possibilidade de inúmeras desigualdades entre eles. Mas são desigualdades fenomênicas: naturais, físicas, morais, políticas, sociais etc., e ‘não se aspira [lembra Carmen Lúcia Antunes Rocha] uma igualdade que frustre e desbaste as desigualdades que semeiam a riqueza humana da sociedade plural, nem se deseja uma desigualdade tão grande e injusta que impeça o homem de ser digno em sua existência e feliz no seu destino. O que se quer é a igualdade jurídica que embase a realização de todas as desigualdades humanas e as faça suprimento ético de valores poéticos que o homem possa desenvolver. As desigualdades naturais são saudáveis, como doentes aquelas sociais e econômicas, que não deixam alternativas de caminhos singulares a cada ser humano único."
A par das considerações supra, já se pode avançar para o estudo das discriminações efetuadas pelos textos legais.
1.4 As discriminações na lei
MORAES,(6) com base em Acórdão do STF relatado pelo Ministro Celso de Mello, lembra que o princípio da isonomia possui três destinatários: o legislador, o intérprete/autoridade pública e o particular. Nenhum deles, no exercício de suas funções públicas ou na vida privada, poderá atentar contra o princípio em estudo, por intermédio de condutas discriminatórias, preconceituosas ou racistas, sob pena de responsabilização civil e criminal, nos termos da legislação vigente. Dada essa tripla destinação, perde força entre nós a distinção entre "igualdade perante a lei" e "igualdade na lei", como adverte José Afonso da Silva,(7) eis que o princípio se dirige até precipuamente ao legislador, conforme assentam a doutrina e a jurisprudência pátrias.
Nada obstante o que se vem de afirmar, certo é que a lei discrimina. E isso quem sustenta é BANDEIRA DE MELLO:(8)
"Como as leis nada mais fazem senão discriminar situações para submetê-las à regência de tais ou quais regras – sendo essa mesma sua característica funcional – é preciso indagar quais as discriminações juridicamente intoleráveis."
Como se percebe, na esteira do que aqui já restou assentado, o que a lei não pode é instituir distinções calcadas em critérios arbitrários, que não encontram sustentação no texto constitucional, especialmente no que concerne ao próprio princípio da isonomia e outros princípios correlatos, tais como os princípios da dignidade da pessoa humana, da impessoalidade, da moralidade administrativa, do livre acesso aos cargos públicos (nos termos da lei), da proporcionalidade e da razoabilidade.
Assim, como exemplifica BANDEIRA DE MELLO,(9) a estatura corporal tanto pode ser considerada critério ilegítimo para diferenciação em determinados casos como legítimo em outros, a depender das razões que fundamentam tais discriminações. Nesse sentido, oportuna é a lição de San Tiago Dantas, citado por Alexandre de Moraes:(10)
"Quanto mais progridem e se organizam as coletividades, maior é o grau de diferenciação a que atinge seu sistema legislativo. A lei raramente colhe no mesmo comando todos os indivíduos, quase sempre atende a diferenças de sexo, de profissão, de atividade, de situação econômica, de posição jurídica, de direito anterior; raramente regula do mesmo modo a situação de todos os bens, quase sempre distingue conforme a natureza, a utilidade, a raridade, a intensidade de valia que ofereceu a todos; raramente qualifica de um modo único as múltiplas ocorrências de um mesmo fato, quase sempre os distingue conforme as circunstâncias em que se produzem, ou conforme a repercussão que têm no interesse geral. Todas essas situações, inspiradas no agrupamento natural e racional dos indivíduos e dos fatos, são essenciais ao processo legislativo e não ferem o princípio da igualdade. Servem, porém, para indicar a necessidade de uma construção teórica, que permita distinguir as leis arbitrárias das leis conforme o direito e eleve até esta alta triagem a tarefa do órgão do Poder Judiciário."
Postas tais considerações e tendo em vista o objeto do presente estudo, cumpre analisar se o fator "tempo" pode ser considerado como critério válido de discriminação ou, em outros termos, como condição válida para fundamentar regulamentação legal distinta.
1.5 O tempo como critério distintivo
Desde sua origem, o princípio da igualdade (isonomia) volta-se precipuamente contra discriminações em face da raça, do gênero, da religião e da origem social e geográfica. Não que outras espécies de discriminação inexistam.(11) Porém, sempre que existir a alegação de discriminação inconstitucional de natureza distinta, de pronto deve-se ter em mente que se trata de uma possível recente forma de discriminação, desprovida das raízes históricas daquelas outras, detalhe que deve ser observado pelo operador do Direito como norte interpretativo.
O "tempo" é largamente utilizado como critério de distinção. Mais que isso, constitui um importantíssimo marco distintivo, tanto assim que BANDEIRA DE MELLO dedica-lhe especial atenção em sua pequena e profunda obra.(12) Para o ilustre admistrativista, o tempo, por si só, não é critério válido de discriminação, mas somente os fatos que ocorrem no seu interior, ou seja, os fatos da vida existentes dentro de um determinado lapso temporal. Após discorrer brilhantemente sobre a matéria, conclui o mestre:(13)
"25. Em conclusão: tempo, só por só, é elemento neutro, condição do pensamento humano e por sua neutralidade absoluta, a dizer, porque em nada diferencia os seres ou situações, jamais pode ser tomado como o fator em que se assenta algum tratamento jurídico desuniforme, sob pena de violência à regra da isonomia. Já os fatos ou as situações que nele transcorreram e por ele se demarcam, estes sim, é que são e podem ser erigidos em fatores de discriminação, desde que, sobre diferirem entre si, haja correlação lógica entre o acontecimento, cronologicamente demarcado, e a disparidade de tratamento que em função disso se adota.
Sintetizando: aquilo que é, em absoluto rigor lógico, necessária e irrefragavelmente igual para todos não pode ser tomado como fator de diferenciação, pena de hostilizar o princípio isonômico. Diversamente, aquilo que é diferenciável, que é, por algum traço ou aspecto, desigual, pode ser diferençado, fazendo-se remissão à existência ou à sucessão daquilo que dessemelhou as situações.
Como a existência ou a sucessão de fatos só ocorre no tempo, a remissão a ele – com fixação de período, prazo, data – é inexorável. Mas daí não resulta que se haja emprestado ao tempo, em si mesmo, um valor de critério distintivo. Resulta, apenas, que este serviu – e não tinha como logicamente deixar de comparecer – como referência dos fatos ou sucessão de fatos tomados em conta, por si mesmos, no que possuíam de diferençados.
Tanto isso é verdade que não há como se conceber qualquer regulação normativa isenta de referência temporal, o que, aliás, serve para demonstrar sua absoluta neutralidade. Deveras: ou a lei fixa um tempo dado ao regular certa situação ou, inversamente, não fixa qualquer limite. Em ambos os casos há uma referência temporal. Numa é demarcada, noutra é ilimitada, mas ambas levam em conta o tempo, seja medido, seja continuado, indefinidamente. Pois, o tempo medido é tão-só uma referência a uma quantidade determinada de fatos e situações que nele tiveram ou terão lugar, ao passo que o tempo ilimitado é também referência a uma quantidade de fatos e situações por definição indeterminados.
26. O que se põe em pauta, nuclearmente, portanto, são sempre as pessoas, fatos ou situações, pois só neles podem residir diferenças. Uma destas diferenças é a reiteração maior ou menor. É a sucessão mais dilatada ou menos dilatada; é, em suma, a variação da persistência. Essa variação demarca-se por um período, por uma data, mas o que está sendo objeto de demarcação não é, obviamente, nem o período em abstrato nem a data em abstrato, mas os próprios fatos ou situações contemplados e demarcados."
E em arremate:
"Isto posto, procede concluir: a lei não pode tomar tempo ou data como fator de discriminação entre pessoas a fim de lhes dar tratamentos díspares, sem com isso pelejar à arca partida com o princípio da igualdade. O que pode tomar como elemento discriminador é o fato, é o acontecimento, transcorrido em certo tempo por ele delimitado.
Nem poderia ser de outro modo, pois as diferenças de tratamento só se justificam perante fatos e situações diferentes. Ora, o tempo não está nos fatos ou acontecimentos; logo, sob este ângulo, fatos e acontecimentos em nada se diferenciam. Deveras: são os fatos e acontecimentos que estão alojados no tempo, e não o inverso.
27. A distinção feita longe está de ser acadêmica e nem se procedeu a ela por amor a algum preciosismo cerebrino. Pelo contrário, apresenta-se sobremaneira fértil em repercussões práticas.
Com efeito, sendo procedente a distinção, ao se examinar algum discrímen legal, para fins de buscar-lhe afinamento ou desafinamento com o preceito isonômico, o que se tem de perquirir é se os fatos ou as situações alojados no tempo transacto são, eles mesmos, distintos, ao invés de se indagar pura e simplesmente se transcorreram em momentos passados diferentes.
Se são iguais, não há como diferençá-los, sem desatender à cláusula da isonomia. Portanto, se a lei confere benefício a alguns que exerceram tais ou quais cargos, funções, atos, comportamentos, em passado próximo e os nega aos que os exerceram em passado mais remoto (ou vice-versa) estará delirando do preceito isonômico, a menos que existam, nos próprios atos ou fatos, elementos, circunstâncias, aspectos relevantes em si mesmos, que os hajam tornado distintos quando sucedidos em momentos diferentes.
Com efeito: o que autoriza discriminar é a diferença que as coisas possuam em si e a correlação entre o tratamento desequiparador e os dados diferenciais radicados nas coisas.
28. As coisas é que residem no tempo. O tempo não se aloja nos fatos ou pessoas. Portanto, o tempo não é uma diferença que neles assiste. Desse ponto de vista, pessoas, fatos e situações são iguais. Por isso se disse que o tempo é neutro. Se o tempo não é uma inerência, uma qualidade, um atributo próprio das coisas (pois são elas que estão no tempo, e não o tempo nelas), resulta que em nada diferem pelo só fato de ocorrerem em ocasiões já ultrapassadas. Todas existiram. E se existiram do mesmo modo, sob igual feição, então, são iguais e devem receber tratamento paritário. Afinal: há de ser nos próprios acontecimentos tomados em conta que se buscarão diferenças justificadoras de direitos e deveres distintos, e não em fatores alheios a eles que em nada lhes agregam peculiaridades desuniformizadoras.
29. Em suma: é simplesmente ilógico, irracional, buscar em um elemento estranho a uma dada situação, alheio a ela, o fator de sua peculiarização. Se os fatores externos à sua fisionomia são diversos (quais os vários instantes temporais) então, percebe-se, a todas as luzes, que eles é que se distinguem, e não as situações propriamente ditas. Ora, o princípio da isonomia preceitua que sejam tratadas igualmente as situações iguais e desigualmente as desiguais. Donde não há como desequiparar pessoas e situações quando nelas não se encontram fatores desiguais. E, por fim, consoante averbado insistentemente, cumpre ademais que a diferenciação do regime legal esteja correlacionada com a diferença que se tomou em conta."
Registre-se que a doutrina ratifica o brilhante entendimento.(14)
A par de tais considerações, já se pode avançar para o estudo do princípio da igualdade no âmbito do Direito Previdenciário.
2 O Direito Previdenciário e a Isonomia
De início, há que se definir e distinguir o Direito Previdenciário da Previdência e da Seguridade Social. Para tanto, socorro-me da doutrina de CASTRO e LAZZARI:(15)
"Diferencia-se o Direito Previdenciário do que habitualmente se chama de Previdência Social, bem como do que se denomina Seguridade Social.
Previdência Social é o sistema pelo qual, mediante contribuição, as pessoas vinculadas a algum tipo de atividade laborativa e seus dependentes ficam resguardados quanto a eventos de infortunística (morte, invalidez, idade avançada, doença, acidente de trabalho, desemprego involuntário), ou outros que a lei considera que exijam um amparo financeiro ao indivíduo (maternidade, prole, reclusão), mediante prestações pecuniárias (benefícios previdenciários) ou serviços. Desde a inserção das normas relativas ao acidente de trabalho na CLPS/84 e, mais atualmente, com a isonomia de tratamento dos benefícios por incapacidade não decorrente de acidente em serviço ou doença ocupacional, entende-se incorporada à Previdência a questão acidentária. É, pois, uma política governamental.
A Seguridade Social abrange tanto a Previdência Social como a Assistência Social (prestações pecuniárias ou serviços prestados a pessoas alijadas de qualquer atividade laborativa) e a Saúde Pública (fornecimento de assistência médico-hospitalar, tratamento e medicação), estes dois últimos sendo prestações do Estado devidas independentemente de contribuições. […]O Direito Previdenciário, ramo do Direito Público, tem por objeto estudar, analisar e interpretar os princípios e as normas constitucionais, legais e regulamentares que se referem ao custeio da Previdência Social – que, no caso do ordenamento estatal vigente, também serve como financiamento das demais vertentes da Seguridade Social, ou seja, Assistência Social e Saúde – bem como os princípios e as normas que tratam das prestações previdenciárias devidas a seus beneficiários.
Fogem ao estudo do Direito Previdenciário as normas que tratam da atuação estatal, no campo da saúde e da assistência social, pois envolvem outros princípios e regras, guardando identidade apenas em relação às fontes de custeio."
Tenho por importante aprofundar o tema, trazendo à baila lição no notável doutrinador MARTINEZ:(16)
"Tecnicamente, a previdência social é resultado da solidariedade forçada das pessoas. Significa a participação de maioria contemporânea (contribuindo), a favor de minoria hodierna (inativos) e de futura (aposentandos). Partilha de recursos, atuarialmente, em dado momento, pressupõe o crescimento numérico dos contribuintes; ausente esse registro demográfico, ser o período dos aportes e seu nível suficientes para cobrir despesas correntes e acumular algumas reservas.
Cooperação mútua imposta pelo Estado, através da cogência da lei, contrariando a natureza individualista do homem de não se despojar em favor de terceiros. Corroborada, instintivamente, em virtude da possibilidade de o indivíduo precisar dos outros e reconhecer não poder viver isoladamente.
Quer dizer, principalmente, a cotização de certas pessoas com capacidade de vertê-la a bem dos econômica ou financeiramente incapazes de fazê-lo. Quando da realização da receita, toda a sociedade contribui; no instante da percepção da prestação, o cidadão dela usufrui. Inexistente, seria impossível a proteção dos beneficiários sem capacidade contributiva. Nesse sentido, não é previdência social a poupança, individual ou coletiva, submetida ao regime financeiro de capitalização, mesmo na hipótese de a rentabilidade provir do trabalho social.
É também expressão matemática determinada pelo cálculo atuarial, onde decantados os conceitos de risco, tábua de mortalidade, probabilidade, expectativa de vida etc., tendo em vista a diferença das pessoas (v.g., idade, tempo de serviço, salário e condições de trabalho).
Limitada à coletividade considerada (clientela de beneficiários), à base de cálculo fixada pela norma jurídica (alcance vertical da técnica) e com vários tipos: nacional, profissional, geracional, regional, urbano-rural, fiscal etc. José Manuel Almansa Pastor classifica-a segundo a interação, os sujeitos da relação, motivação, extensão material e âmbito (Derecho de la Seguridad Social, v. I, p. 161).
Princípio de Direito Previdenciário, a solidariedade pode ser conceituada como a transferência de meios de uma fração para outra, dentro de um conjunto de pessoas situadas com recursos desnivelados ou não. Reconhecimento das desigualdades no estrato da sociedade é deslocamento físico, espontâneo ou coagido pela norma jurídica, de rendas ou riquezas, criadas pela comunidade, para parcela de indivíduos previamente definidos (segurados e dependentes), com cidadãos aportadores e receptores, a uns se subtraindo o seu patrimônio e a outros se acrescendo, até a consecução de certo equilíbrio previdenciário."
Extraídos tais conceitos básicos, insta ressaltar o caráter de "acordo de gerações" ínsito à Previdência Social enquanto idéia. E essa natureza espontânea não é afetada por seu caráter obrigatório, na medida em que a voluntariedade se dá pela instituição e pela manutenção do sistema. No momento em que a sociedade não mais desejar a Previdência Social Pública, basta que as forças políticas sejam acionadas para extingui-la. Tal providência, porém, nesta quadra da História, afigura-se quase impensável.(17)
Para a Previdência – enquanto acordo de gerações e objeto de estudo do Direito Previdenciário – o fator "tempo" é essencial na regulação das relações jurídicas. Talvez em nenhum outro ramo do Direito o tempo se constitua em fator tão determinante.
No Direito Previdenciário há institutos como o tempo de contribuição, tempo de serviço, idade (que se adquire ao longo do tempo), carência (que não pode ser antecipada no tempo), preexistência (no tempo) à filiação de doença incapacitante etc. Bem por isso que um dos mais básicos princípios do Direito Previdenciário é aquele consagrado no brocardo tempus regit actum, ou seja, a lei em vigor no momento rege o ato.
E assim temos os seguintes exemplos: a) a lei que regulamenta a conversão de tempo laborado em condições especiais para comum é a lei vigente no momento em que prestado o trabalho; b) a lei que regula o cálculo da renda mensal inicial quando da concessão do benefício é aquela vigente no momento em que formulado o requerimento, ressalvados o direito adquirido e eventuais regras outras, como aquela referida na alínea imediatamente anterior.
Problemas surgem – e aí adentra-se especificamente no objeto deste estudo – quando, ao longo do tempo, a legislação é alterada favoravelmente – na visão dos segurados – e estes pedem a aplicação desta novel legislação em seu benefício, ao fundamento de isonomia (ou sua violação pela lei). Essa a hipótese mais corriqueira da prática judiciária, embora não se possa descartar a possibilidade de o referido princípio constitucional ser suscitado em atenção a fatos outros, embora mais raros.
Via de regra, a lei previdenciária não retroage. Exceções a essa regra temos, por exemplo, nos hoje revogados artigos 144 e 145 da Lei 8.213/91. Ocorre que, em alguns casos, efetivamente, a legislação avança, embora silencie sobre os fatos anteriores. E é aí que surge o interesse daqueles não contemplados pela nova lei.
De plano, não se pode afastar a aplicação da lei nova aos fatos anteriores, para tanto suscitando-se o princípio da irretroatividade das leis (CF, art. 5º, XXXVI), seja porque se trata de garantia exclusiva em favor do cidadão contra o Estado, seja porque o princípio da isonomia deve prevalecer nessa colisão de princípios constitucionais, seja porque o que se pleiteia – via de regra – é aplicação dos efeitos decorrentes da lei nova a partir de sua vigência.
Ainda assim, a análise e a aplicação do princípio da isonomia devem ser sopesadas com cautelas em casos que tais.
O primeiro óbice que se verifica diz respeito à certificação das situações fáticas idênticas: como afirmar que um segurado que se aposentou na década de 80 – tendo trabalhado nas décadas anteriores – esteve sujeito às mesmas circunstâncias fáticas do segurado que trabalha nas décadas seguintes??? Será que as regras de contagem de tempo são as mesmas??? Será que a possibilidade de contagem de tempo fictício, sem contribuição, conversão de tempo especial para comum, e vice-versa, foram as mesmas??? Não terá o segurado que postula a isonomia se beneficiado de regras amplamente favoráveis que não mais vigoram para a atual e as futuras gerações???
Não vejo como se aplicar a isonomia sem ter certeza quanto a tais fatos. E a mera alusão genérica à isonomia nas ações previdenciárias tem passado ao largo dessa questão.
Outro ponto importante diz respeito àquelas ocasiões em que a legislação posterior, ao invés de "melhorar", torna-se mais restritiva, sob qualquer aspecto.(18) Suponhamos que, efetivamente, o requisito idade mínima, venha no futuro a ser estabelecido no Regime Geral da Previdência Social,(19) para fins de aposentadoria por tempo de contribuição.
Se adotarmos a tese – um tanto simplista – da isonomia, nada impede que os segurados prejudicados venham a postular a inconstitucionalidade e, via de conseqüência, a não-incidência da lei, pois os segurados anteriores não estavam sujeitos a tal restrição. Ou ainda, o que seria pior, verificado o fato acima, parece que a isonomia defendida indica que aqueles eventualmente aposentados anteriormente ao estabelecimento da idade mínima deveriam ser desaposentados, até atingirem a idade.
Essa última hipótese, que parece absurda, já não o será se o que está em voga é a propalada isonomia previdenciária. Neste passo, um exemplo concreto aclarará tal situação.
2.1 As Leis n. 9.032/95 e n. 9.876/99
A Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, aumentou a renda inicial da aposentadoria especial e da pensão por morte(20) para 100% do salário-de-benefício,(21) sendo omissa com relação aos benefícios já concedidos anteriormente em patamares inferiores. Daí que todos os aposentados e pensionistas anteriores têm vindo a juízo requerer a aplicação dessa lei em seus benefícios, a partir de sua vigência, ao fundamento principal de isonomia. Atualmente, a questão pende de julgamento no STF,(22) sendo que, nas instâncias ordinárias, a jurisprudência praticamente dividiu-se. Há inclusive juízes que sustentam doutrinariamente a aplicação da lei em referência aos benefícios anteriores.(23)
Sem prejuízo, evidentemente, do que vier a ser decidido pela Suprema Corte, parece-me que o fundamento da isonomia, considerado de forma genérica, não se sustenta para o sucesso da pretensão deduzida. Veja-se que, alguns anos depois, veio a lume a Lei n. 9.876, de 26 de novembro de 1999, que instituiu no Regime Geral da Previdência Social o denominado fator previdenciário. Sem embargo das opiniões em contrário, se o que se busca é a isonomia entre as gerações, todas as aposentadorias por idade e tempo de contribuição (e pensões dela derivadas) concedidas antes dessa lei deverão então ser recalculadas conforme suas disposições, ou seja, para sofrer a incidência do fator previdenciário.
Poder-se-ia objetar tal proposição com os princípios constitucionais do ato jurídico perfeito e acabado, direito adquirido e irredutibilidade de proventos. Entendo porém, que o princípio da isonomia, por sua importância constitucional (não por acaso consta do preâmbulo e do caput do art. 5º da CF), prevalece sobre todos os princípios referidos.
O que se vem de afirmar imediatamente acima, longe de evidenciar uma proposta concreta, tem por finalidade demonstrar a fragilidade do argumento da isonomia como fundamento para aplicação da lei posterior "mais favorável". Em verdade, o que se postula não é a isonomia, mas sim a aplicação da legislação posterior mais favorável, a pretexto de isonomia. Com a devida vênia, o que se pretende é uma "meia isonomia", "isonomia relativa" ou "isonomia no que interessa". Ora, ou há isonomia, e toda a legislação "favorável ou desfavorável" deve ser aplicada a todos, ou há uma falsa isonomia, escudada em princípios constitucionais outros, quando se trata de aplicação de legislação posterior mais severa.
2.2 A segurança jurídica
Então, em matéria previdenciária, a verdadeira isonomia é aquela garantida pelo princípio tempus regit actum, em que todos os segurados, indistintamente, terão suas relações jurídicas previdenciárias reguladas pelas leis vigentes na data em que praticado o ato ou adquirido o direito. A lei do seu tempo e de sua geração.
Conforme visto acima, a pretensa utilização da isonomia como fundamento para aplicação da norma posterior mais favorável obriga a que se aplique também a legislação menos favorável. Ou então que se afaste esta do âmbito de incidência de alguns atingidos, normalmente integrantes das gerações seguintes, o que é insustentável em um sistema previdenciário (evitar que a lei mude).
Em suma, estaria instalado o caos jurídico. A segurança jurídica, outro valor assegurado na Constituição, seria mera ficção, pois simplesmente sempre haveria dúvidas quanto aos atingidos pela legislação. Aliás, pelos mesmos motivos, a própria alteração da legislação, para qualquer objetivo, seria deveras traumática, pelo que seu "engessamento" seria uma conseqüência bem previsível. Tudo isso sem considerar questões como precedência da fonte de custeio e equilíbrio atuarial, inerentes ao sistema previdenciário e que devem ser consideradas antes de se alterar a lei, mormente no que toca àqueles que serão abrangidos por ela.
Assim, como visto, por regra, deve-se prestigiar o princípio da lei vigente na data do ato como o verdadeiro garantidor da isonomia. Entrementes, tal não significa, de forma absoluta, o afastamento da aplicação do princípio da igualdade nas lides previdenciárias. Haverá casos em que a discriminação será flagrante, pelo que o restabelecimento da isonomia por decisão judicial se fará necessário. No tópico seguinte, a título ilustrativo, analisa-se caso em que se tem como válido o socorro do princípio em referência.
2.3 A isonomia como argumento plausível
Conforme dito acima, haverá casos, conquanto excepcionais, em que a aplicação da isonomia será inafastável. Uma hipótese concreta e específica ilustra tal afirmação.
Como é cediço, a Constituição de 1988 inaugurou uma nova era, expressão que também se aplica quanto ao Direito Previdenciário. Dentre vários dispositivos relevantes, destaca-se aquele que determina que todos os salários-de-contribuição que compõem o período básico cálculo do benefício sejam atualizados monetariamente. Anteriormente, no que concerne às aposentadorias por tempo de serviço (hoje tempo de contribuição), especial e por idade apenas os 24 primeiros salários eram corrigidos. Os 12 últimos salários eram considerados, no cálculo, em seus valores históricos. De outra parte, o art. 59 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determinou a elaboração dos projetos de lei relativos à organização, ao custeio e ao benefício da Seguridade Social, pelo que foram editadas as Leis 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, regulamentando as disposições constitucionais.
O art. 145 da Lei 8.213/91 determinou expressamente que os efeitos da referida lei retroagiriam até 05.04.1991. Já o art. 144 determinou a revisão de todos os benefícios concedidos entre 05.10.88 e 05.04.1991 de acordo com os critérios dessa nova lei. Como se percebe, a intenção explícita foi aplicar a nova legislação, visivelmente mais benéfica ao segurado, a todos os benefícios concedidos a partir da Constituição de 1988.
Disposição importante da Lei 8.213/91, vigente até hoje e já declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, é o § 2º do art. 29, que determina que "O valor do salário-de-benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição na data de início do benefício".
Aí temos o que se convencionou chamar de teto do salário-de-benefício.
Ocorre que, em seguida, foi promulgada a Lei 8.870, de 15.04.1994, cujo art. 26 assim dispôs:
"Art. 26. Os benefícios concedidos nos termos da Lei nº 8.213, de julho de 1991, com data de início entre 5 de abril de 1991 e 31 de dezembro de 1993, cuja renda mensal inicial tenha sido calculada sobre salário-de-benefício inferior à média dos 36 últimos salários-de-contribuição em decorrência do disposto no § 2º do art. 29 da referida lei, serão revistos a partir da competência abril de 1994, mediante a aplicação do percentual correspondente à diferença entre a média mencionada neste artigo e o salário-de-benefício considerado para a concessão."
Na seqüência legislativa, no mesmo sentido, dispôs o art. 21, § 3º, da Lei 8.880, de 27/05/1994:
"Art. 21. Os benefícios concedidos com base na Lei nº 8.213/91, com data de início a partir de 1º de março de 1994, o salário-de-benefício será calculado nos termos do artigo 29 da referida lei, tomando-se os salários-de-contribuição expressos em URV.
§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, os salários-de-contribuição referentes às competências anteriores a março de 1994 serão corrigidos monetariamente até o mês de fevereiro de 1994 pelos índices previstos no artigo 31 da Lei nº 8.218/91, com as alterações da Lei nº 8.542/92 o convertidos em URV, pelo valor em Cruzeiros Reais do equivalente em URV no dia 28 de fevereiro de 1994.
§ 2º A partir da primeira emissão do Real, os salários-de-contribuição computados no cálculo do salário-de-benefício, inclusive os convertidos nos termos do § 1º, serão corrigidos monetariamente mês a mês pela variação integral do IPC-r.
§ 3º Na hipótese de a média apurada nos termos deste artigo resultar superior ao limite máximo do salário-de-contribuição vigente no mês de início do benefício, a diferença percentual entre esta média e o referido limite será incorporada ao valor do benefício juntamente com o primeiro reajuste do mesmo após a concessão, observado que nenhum benefício assim reajustado poderá superar o limite máximo do salário-de-contribuição vigente na competência em que ocorrer o reajuste."
Percebe-se que as duas leis em referência instituíram um mesmo mecanismo de recuperação de perdas. Caso a média dos salários-de-contribuição fosse superior ao chamado "teto do salário-de-benefício" (art. 29, § 2º), ficando pois limitada a este teto, haveria a recuperação desse excedente na competência 04/94 (Lei 8.870) ou na competência relativa ao primeiro reajuste do benefício (Lei 8.880).
Contudo, quebrando a lógica instituída pelo art. 144 da Lei 8.213/91 e pela própria Constituição, já que a referida lei foi promulgada por força de determinação constitucional (art. 59 do ADCT), as duas leis em questão simplesmente deixam a descoberto (sem recuperação de teto) todos os benefícios que se encontrarem em tal situação de limitação, concedidos de 05.10.88 a 04.04.1991 e de 01.01.1994 a 28.02.1994.
E não há qualquer razão jurídica para a diferenciação. A nova ordem instaurada pela Constituição de 1988 impede um tratamento tão diferenciado e absolutamente sem fundamento lógico, daí porque, nesse caso concreto, a solução correta é declarar-se inconstitucional, por ofensa ao princípio da isonomia, a expressão "com data de início entre 5 de abril de 1991 e 31 de dezembro de 1993" contida no art. 26 da Lei 8.870/94, permitindo assim que todos os benefícios concedidos a partir de 05/10/88 e que tenham sofrido a limitação do teto sejam recuperados a partir de 04/94, ou quando do primeiro reajuste.
Aqui temos um exemplo claro de aplicação do princípio da isonomia em sede de Direito Previdenciário. Trata-se, como visto, de declaração de inconstitucionalidade parcial com redução de texto. A questão, porém, merece análise específica.
2.4 A Súmula 339 do STF Conforme observado, haverá casos, conquanto excepcionais, em que o princípio da isonomia deverá conduzir, necessariamente, os segurados da Previdência e seus respectivos benefícios a condições igualitárias, o que somente se assegurará com a revisão de seus benefícios. Diante de situações que tais, os advogados públicos sempre argumentam com o óbice previsto na Súmula 339 do Supremo Tribunal Federal, a qual enuncia que "não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia".
De início, necessário lembrar que, normalmente, não se pesquisam as premissas fáticas inerentes aos precedentes que deram origem à Sumula. Muito provavelmente, os fatos inerentes ao caso concreto em análise são distintos, o que mereceria uma análise menos superficial acerca da incidência, ou não, da Súmula.
De toda forma, a vetusta Súmula, aprovada na sessão plenária de 13 de dezembro de 1963, parece não prevalecer ao texto constitucional em vigor, tanto que o próprio STF não a considerou como óbice quando do julgamento do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 22.307-7/DF, quando estendeu aos servidores públicos federais civis os efeitos das Leis n. 8.622/93 e 8.627/93, que concediam reajuste somente aos militares.
Conforme se observa, diante de uma clara afronta ao princípio da isonomia, a solução mais adequada é estender os efeitos da lei àqueles por ela não contemplados, desde que se encontrem em situação fático/jurídica idêntica, em vez de simplesmente declarar-se inconstitucional a lei, providência esta que prejudicaria aqueles inicialmente beneficiados. Demais, tal solução encontra amparo na doutrina de José Afonso da Silva:(24)
"Há duas formas de cometer essa inconstitucionalidade. Uma consiste em outorgar benefício legítimo a pessoas ou grupos, discriminando-os favoravelmente em detrimento de outras pessoas ou grupos em igual situação. Neste caso, não se estendeu às pessoas ou grupos discriminados o mesmo tratamento dado aos outros. O ato é inconstitucional, sem dúvida, porque feriu o princípio da isonomia. O ato é, contudo, constitucional e legítimo, ao outorgar o benefício a quem o fez. Declará-lo inconstitucional, eliminando-o da ordem jurídica, seria retirar direitos legitimamente conferidos, o que não é função dos tribunais. Como, então, resolver a inconstitucionalidade da discriminação? Precisamente estendendo o benefício aos discriminados que o solicitarem perante o Poder Judiciário, caso por caso. Tal ato é insuscetível de declaração genérica de inconstitucionalidade por via de ação direta.40 Gilmar Ferreira Mendes, a esse propósito, opta também pelo reconhecimento do direito dos segmentos eventualmente discriminados, mas pondera que, na impossibilidade, se tem que suprimir o tratamento discriminatório incompatível com a ordem constitucional pela declaração da inconstitucionalidade. ‘Não se há de perder de vista, porém [conclui], que o desenvolvimento da declaração de inconstitucionalidade sem a conseqüência da nulidade tem por objetivo evitar, exatamente, a declaração de inconstitucionalidade total, deixando ao legislador a possibilidade de sanar eventuais defeitos. É que, como observado, tal solução (nulidade), como acentuado, além de traduzir possível injustiça com os beneficiados, pode levar a uma situação de ausência de normas, a um vácuo de direito (Rechtsvakuum), ou, até mesmo, ao chamado caos jurídico (Rechtschaos)’.41
A outra forma de inconstitucionalidade revela-se em se impor obrigação, dever, ônus, sanção ou qualquer sacrifício a pessoas ou grupos de pessoas, discriminando-as em face de outros na mesma situação que, assim, permaneceram em condições mais favoráveis. O ato é inconstitucional por fazer discriminação não autorizada entre pessoas em situação de igualdade. Mas aqui, ao contrário, a solução da desigualdade de tratamento não está em estender a situação jurídica detrimentosa a todos, pois não é constitucionalmente admissível impor constrangimentos por essa via. Aqui a solução está na declaração de inconstitucionalidade do ato discriminatório em relação a quantos o solicitarem ao Poder Judiciário, cabendo também a ação direta de inconstitucionalidade por qualquer das pessoas indicadas no art. 103."
CONCLUSÃO
De todo o exposto, pode-se concluir que o princípio constitucional da igualdade se constitui em um dos alicerces do Estado Democrático de Direito, como é o caso do Brasil. Idealizado inicialmente para obstar discriminações arbitrárias em razão da raça, do gênero, da religião, da origem social e geográfica, atualmente protege o cidadão contra toda e qualquer sorte de discriminação arbitrária. Para tanto, a Constituição Brasileira, além de vedar condutas discriminatórias desarrazoadas, determina que se adotem providências tendentes à redução e a eliminação das desigualdades históricas que assolam o país.
No âmbito do Direito Previdenciário, como em qualquer área que cuida das relações humanas, podem ocorrer discriminações não fundamentadas, fato que, se verificado, autoriza a correção da distorção pela via judicial, para fazer prevalecer o princípio em análise.
Nada obstante, por regra, a mera alteração posterior da legislação previdenciária para "melhor", sob a ótica do segurado da Previdência Social, não autoriza que se declare existir afronta à isonomia, caso não contemplados todos os segurados/beneficiários, notadamente os mais antigos. É da essência da legislação previdenciária mudar no decorrer do tempo, atendendo às necessidades do país. Da mesma forma, se a legislação posterior vier a mudar "para pior", sempre na visão do segurado, todos os anteriores beneficiários não serão atingidos, o mesmo já não se podendo dizer em relação aos futuros aposentados.
Aí reside a verdadeira isonomia previdenciária; cada geração vive conforme as contingências sociais e normas de seu tempo.
Parece óbvio, porém, que o discurso que ora se adota pode vir a servir de pretexto para toda sorte de discriminação arbitrária em sede previdenciária; discriminação calcada não nas necessidades do país e do próprio sistema previdenciário, mas em interesses políticos, econômicos e ideológicos escusos. Ou ainda, o que seria menos grave, mas também inconstitucional: apenas uma discriminação não fundamentada na Constituição.
Verificadas concretamente com pouca margem para dúvidas, a ocorrência das hipóteses supra-referidas, deve-se fazer prevalecer o princípio da igualdade, pela via judicial se necessário, seja estendendo-se os efeitos de uma lei a pessoas não inicialmente contempladas, seja declarando-se inconstitucional a lei discriminatória, conforme o caso concreto.
Enfim, o que se pretende afirmar é que, em se tratando de relação jurídica previdenciária, não se deve declarar afronta ao princípio da isonomia sem uma profunda análise de todos os fatos e as normas subjacentes ao longo do tempo, sem olvidar o caráter de acordo de gerações inerente à matéria. Cuida-se de questão deveras importante e que, por isso, não deve ser tratada de forma superficial.
Referências bibliográficas
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MORO, Sergio Fernando. Aplicação Retroativa da Lei Previdenciária Mais Benéfica. Revista da Previdência Social, São Paulo, n. 215, 1998, p. 821/828.
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Ação Afirmativa: O conteúdo Democrático da Igualdade Jurídica. Revista Trimestral de Direito Público, n. 15. São Paulo: Malheiros, 1996.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
Notas:
1. FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 129-130.
2. ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Ação Afirmativa: o Conteúdo Democrático do Princípio da Igualdade Jurídica. Revista Trimestral de Direito Público n. 15, p. 85-99, 1996.
3. Ob. cit., p. 92.
4. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 212.
5. Ob.cit., p. 213.
6. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 65.
7. Ob. cit., p. 215.
8. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3.ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 11.
9. Ob. cit, p. 11/12.
10. Ob. cit, p. 66.
11. O legislador constitucional sabiamente absteve-se de listar as discriminações arbitrárias no caput do art. 5º, já que a lista não teria como ser exaustiva. Optou, corretamente, pela expressão "sem distinção de qualquer natureza", com o que abrange toda sorte de discriminação arbitrária.
12. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3.ed. São Paulo, Malheiros, 2002.
13. Ob.cit., p. 32/35. A transcrição é longa, mas essencial.
14. Cf. André Ramos Tavares, Curso de Direito Constitucional, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 417.
15. CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. São Paulo: LTr, 2001. p. 58/59.
16. MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário. São Paulo: LTr. 1998. p. 101/102. t. 2.
17. A instituição de regimes de poupança individual forçada em determinados países – modalidade que, nos termos da doutrina, não caracteriza Previdência Social, por lhe faltar o caráter de solidariedade social – é relativamente recente, e não se pode ainda aquilatar tal experiência, já que tais sistemas estão ainda em fase de capitalização.
18. Conforme notícias veiculadas no site Terra em 22 e 28 de novembro de 2006, o Governo Federal estuda introduzir, no Regime Geral da Previdência Social, o requisito idade mínima, para as aposentadorias por tempo de contribuição, bem como aumentá-la para 67 anos – homens e mulheres – nas aposentadorias por idade. Acesso em: 22 nov. 2006.
19. Note-se que a instituição de idade mínima nada tem de retrocesso. Retrocesso é não termos esse requisito universal na legislação previdenciária, o que fez o Governo apelar para paliativo injusto e incompreensível para a sociedade, como é o fator previdenciário. Observo que a Lei Eloy Chaves, de 1923, marco inicial da Previdência Social no Brasil, já previa a idade mínima de 50 anos para a então denominada aposentadoria ordinária aos 30 anos de serviço. Passados mais de 80 anos, não temos idade mínima no RGPS, mas sim o denominado fator previdenciário feito para não ser compreendido pelos interessados...
20. Em relação à pensão, tal norma foi revogada em seguida por Medida Provisória, convertida na Lei nº 9.528/97, que estabeleceu o valor da pensão em 100% da renda da aposentadoria base.
21. Anteriormente, a aposentadoria especial correspondia a 85% do salário-de-benefício, acrescida de 1% para cada grupo de 12 contribuições até o limite de 100%; já a pensão previdenciária (não acidentária) era de 80% da aposentadoria, acrescida de 10% para cada dependente, até o limite de 2.
22. Recursos Extraordinários 416.827 e 415.454.
23. Cf. Sergio Fernando Moro, Aplicação Retroativa da Lei Previdenciária Mais Benéfica, Revista da Previdência Social, São Paulo, n. 215, 1998, p. 821/828.
24. Ob.cit., p. 228.
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