A doutrina é uniforme no admitir que o poder de alteração e rescisão unilateral do contrato administrativo é inerente à Administração Pública, podendo ser exercido ainda que nenhuma cláusula expressa o consigne, porém, a alteração somente pode atingir as denominadas cláusulas regulamentares, isto é, aquelas que dispõem sobre o objeto do contrato e o modo de sua execução.
No que concerne às cláusulas econômicas, ou seja, aquelas que estabelecem a remuneração e os direitos do contratado perante a Administração e dispõem acerca da equação econômico-financeira do contrato administrativo, estas são inalteráveis, unilateralmente, pelo Poder Público sem que se proceda à devida compensação econômica do contratado, visando restabelecer o equilíbrio financeiro inicialmente ajustado entre as partes.
Esse o magistério do saudoso jurista Hely Lopes Meirelles, in Licitação e Contrato Administrativo, 9. ed., Revista dos Tribunais, 1990, p. 181-2.
É o que se encontra previsto nos arts. 37, XXI, e 175, III, da CF/88, bem como no art. 9º, § 4º, da Lei nº 8.987/95.
Tais princípios restaram definitivamente incorporados no Direito Administrativo, sobretudo após a publicação do famoso aresto do Conselho de Estado da França, no caso da Companhia de Gás de Bordeaux, proferido em 1916, onde destacou-se a notável contribuição de Chardenet, verbis:
“Mais tout service public doit être organisé dans des conditions qui permettent de compter sur son fonctionnement d'une manière régulière, sans interruption, même momentanée, sans à-coups, passez-nous l'expression, et qui, en même temps, seront de nature à donner pleine satisfaction à ceux ayant à faire appel au service public, qui a étécréé pour eux, fonctionne régulièrement à leur égard. Voyez Syndicat des Propriétaires et Contribuables du quartier de la Croix-de-Seguey-Tivoli, à Bordeaux, 21 décembre 1906. Il faut également, et cela dans l'intérêt général, que le service public soit à l'abri d'incessantes ou de trop fréquentes modifications qui, le plus souvent, apporteraient des troubles dans le fonctionnement ou la marche du service. Par suite, le service public doit être organisé pour un certain nombre d'années, réserve faite, bien entendu, des perfectionnements qui pourraient y être apportés. Mais, au cours d'une période de temps un peu longue, bien des événements peuvent se produire, notamment la situation économique peut changer ou tout au moins se modifier. D'autre part, pour la bonne organisation et l'heureux fonctionnement d'un service public important, des dépenses élevées doivent être engagées, de gros capitaux doivent être immobilisés pour longtemps. Si nous prenons l'exemple du service d'éclairage, au début on aura à construire des usines, à établir des canalisations, etc. Plus tard, on aura à faire face à des frais d'entretien, de reconstruction, etc., à procéder à des renouvellements de matériel, souvent rendus nécessaires par quelque découverte scientifique ou par des perfectionnements des moyens de fabrication, dont les bénéficiairesdu service public doivent profiter. Au cours de l'execution du service, il faudra passer, presque toujours longtemps à l'avance, des marchés importants pour s'assurer les matières premières nécessaires à la fabrication du gaz. Les dépenses que l'on aura ainsi engagées seront amorties peu à peu et elles ne le seront que sur une période de temps assez longue. Pour éviter d'exposer la personne publique à tous les risques auxquels nous venons de faire allusion, pour lui éviter d'engager ses ressources propres dans des opérations commerciales ou industrielles qu'impose le fonctionnement du service public, – pour lui éviter d'être obligée de recourir parfois à des emprunts plus ou moins onéreus, - on a songé à s'adresser à des tiers, particuliers ou sociétés, pour assurer le service public; on a songé à se décharger sur eux du soin d'assurer ce service. On est ainsi arrivé au contrat de concession.”(In Revue Du Droit Public Et De La Science Politique, Paris, M. Giard & E. Brière Editeurs, 1916, t. 33, p. 220-1)
É o magistério autorizado de Georges Péquignot, verbis:
"Le cocontractant a droit à la rémunération inscrite dans son contrat. C'est le principe de la fixité du prix du contrat. Il n'a consenti son concours que dans l'espoir d'un certain bénéfice. Il a accepté de prendre à sa charge des travaux et des aléas qui, s'il n'avait pas voulu contracter, auraient été supportés par l'Administration: il est normal qu'il en soi rémunéré.
Il serait, par ailleurs, contraire à la règle de bonne foi, contraire aussi à toute sécurité des affaires et, de ce fait, dangereux pour l'état social et économique, que l'Administration puisse modifier, spécialment réduire, cette rémunéiation."
E, mais adiante, conclui o mesmo autor, verbis:
"...l'Administration, lorsqu'elle modifie le contrat sur un point qui intéresse le service public, doit cependant maintenir son équation financière, c'està-dire, le bénéfice que le cocontractant espérait tirer de l'opération. A fortiori, toute autre modification étant mise à part, cette équation financière doit-elle être maintenue par l'impossibilité de réduire ou de supprimer directement la rémunération en vue de laquelle le cocontractant s'est engagé.
Ce principe est fondamental. Il doit être entendu très rigoureusement, car, application particulière de l'idée d'équation financière, il est la source de la sécurité juridique du cocontractant de l'Administration." (In Théorie Générale du Contrat Administratif, Paris, Éditions A. Pédone, 1945, p. 434-5)
Nesse sentido, recentes decisões do Eg. STJ, verbis:
"AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSÃO DE LIMINAR Nº 74 – PR (2004/0031293-3)
Relator: Ministro Edson Vidigal
Agravante: Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S/A – Econorte
Advogados: Romeu Felipe Bacellar Filho e outros
Agravado: Estado do Paraná
Procuradores: Sérgio Botto de Lacerda e outros
Requerido: Tribunal Regional Federal da 4ª Região
EMENTA
Suspensão de liminar. Tutela antecipada deferida para assegurar o reajuste de tarifas de pedágio pela empresa concessionária.
1. Não há como se concluir por ofensa à ordem ou à economia públicas em decisão concessiva de tutela antecipada que apenas assegurou o cumprimento de cláusula contratual livremente firmada entre as partes e não questionada administrativamente ou em juízo.
2. Perigo de dano inverso. O simples descumprimento de cláusulas contratuais por parte do governo local viola o princípio da segurança jurídica e inspira riscos nos contratos com a Administração.
3. Agravo regimental provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte Especial, do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do agravo regimental e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Barros Monteiro, Francisco Peçanha Martins, Humberto Gomes de Barros, Cesar Asfor Rocha, Ari Pargendler, José Arnaldo da Fonseca,Fernando Gonçalves, Carlos Alberto Menezes Direito, Felix Fischer, Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon, Paulo Gallotti, Franciulli Netto e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro-Relator. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, José Delgado, Gilson Dipp e Francisco Falcão, sendo os três últimos substituídos, respectivamente, pelos Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Hélio Quaglia Barbosa e Castro Meira.
Brasília (DF), 1º de julho de 2004 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Edson Vidigal, Relator"
(Publicado no DJ de 23.08.2004 – In RSTJ, 180/21)
Nessa mesma orientação, os julgados publicados na RSTJ, 181/31 e 182/49.
A respeito, deliberou o Eg. TRF/4ª Região, verbis:
"CONTRATO ADMINISTRATIVO. QUEBRA DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO – ÁLEA EXTRAORDINÁRIA SUPORTADA PELA ADMIISTRAÇÃO. RETARDAMENTO DA OBRA – PREÇO PAGO QUE NÃO CORRESPONDE AO VALOR DO EMPREENDIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA.
O pagamento de correção monetária em decorrência de valor pago que não se identifica com o verdadeiro empreendimento contratado e realizado é inarredável e traduz forma lícita e justa de alcançar o equilíbrio financeiro do contrato."
(TRF 4ª Região, 4ª Turma, AC nº 96.04.55368/2/PR, Rel. Des. Federal Amaury Chaves de Athayde, julg. 17.05.2006, DJ 26.07.2006)
Preciso o magistério de Hely Lopes Meirelles, in Estudos e Pareceres de Direito Público, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1991, v. 11, p. 120-1, verbis:
"O equilíbrio econômico-financeiro é a relação que as partes estabelecem inicialmente no contrato administrativo, entre os encargos do particular e a retribuição devida pela entidade ou órgão contratante, para a justa remuneração do seu objeto (cf. nosso Licitação e Contrato Administrativo, ob. cito, p. 184)
Essa correlação encargo-remuneração deve ser conservada durante toda a execução do contrato, mesmo que alteradas as cláusulas de serviço, modificados projetos e programas, liberados trabalhos em quantidades inferiores às previstas ou superados os prazos contratuais por mora da Administração, a fim de que se mantenha o equilíbrio econômico-financeiro, o qual, como bem observa Waline, é 'direito fundamental de quem contrata com a Administração' (Marcel Waline. Droit Administratif, Paris, 1959, p. 574). Para De Soto, citado por Laubadère, 'a manutenção desse equilíbrio constitui norma fundamental da teoria dos contratos administrativos. As obrigações das partes são tidas como calculadas de tal maneira que se equilibram do ponto de vista financeiro, e o responsável pelo contrato deverá esforçar-se para manter, a qualquer custo, esse equilíbrio' (André De Laubadère, Contrats Administratifs, Paris, 1956, II/35, nota 6) .
5. O reconhecimento do direito ao equilíbrio financeiro – o primeiro direito original do co-contratante com o Poder Público, segundo Péquignot (Théorie Générale du Contrat Administratif, Paris, 1945, p. 430) – surgiu como contra partida ao poder-dever de alteração unilateral do contrato administrativo, mas vale também para os casos em que, impedido de invocar a exceção de contrato não cumprido, o particular contratado se vê obrigado a suportar o cumprimento irregular do ajuste ou a mora da Administração contratante.
Com efeito, o contrato administrativo, por parte da Administração, destina-se ao atendimento das necessidades públicas, mas, por parte do contratado, objetiva um lucro, através da remuneração consubstanciada nas cláusulas econômicas e financeiras. Esse lucro há que ser assegurado nos termos iniciais do ajuste porque se, de um lado, a Administração tem o poder de modificar as condições de execução do contrato e de exigir a prestação da outra parte, ainda que ela mesma não tenha cumprido a sua, de outro lado, o particular contratado tem o direito de ver mantida a correlação encargo-remuneração estabelecida originariamente, uma vez que o seu objetivo ao participar da relação negocial foi – e continua sendo – o ganho pecuniário. Objetivo altamente lícito e respeitável, diga-se de passagem, que a Administração contratante não pode, va1idamente, restringir, exigindo que, a partir de um dado momento, a execução do contrato prossiga em condições menos lucrativas e até mesmo prejudiciais ao contratado, sem qualquer culpa deste.
6. Para a cabal satisfação desse direito, é forçoso se operem os necessários ajustes econômicos sempre que, por ato ou fato da Administração, for rompido o equilíbrio econômico-financeiro, em detrimento do particular contratado, independentemente de previsão contratual, como nos ensina Laubadère, nestes precisos termos: 'Cette règle d'equilibre est quelque fois considerée comme résultant de la commune intention des parties; elle s'applique, en tous cas, même lorsqu'el1e ne figure pas expressément dans le contrat' (André de Laubadère, Traité Élémentaire de Droit Administratif, Paris, 1957, p. 431. No mesmo sentido: Caio Tácito, Direito Administrativo, São Paulo, 1975, p. 293).
7. Por outro lado, se o respeito ao equilíbrio econômico-financeiro, na hipótese de alteração unilateral do ajuste, constitui dever da Administração contratante, com muito mais razão é direito daquele e dever desta, nos casos em que o órgão ou entidade contratante abusa de sua posição privilegiada para descumprir ou cumprir irregularmente suas prestações, ou ainda suspender os prazos contratuais, obrigando o particular a suportar encargos excessivos, os quais, por não terem sido cogitados quando da elaboração da proposta ou da celebração do contrato, representam insuportáveis prejuízos, mormente numa conjuntura em que o custo do dinheiro é altíssimo e a inflação avilta a moeda a cada dia."
Da mesma forma, a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, in Revista Trimestral de Direito Público, v. 38/143-4, verbis:
"6. A legislação brasileira, a começar da Constituição, proclama a intangibilidade do equilíbrio econômico-financeiro original do contrato. Deveras o art. 37, XXI, da Lei Magna dispõe que '(...) obras, serviços, compras e alienações serão contratados, mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento mantidas as condições efetivas da proposta (...)'.
O versículo em apreço, como consta de sua dicção, estabeleceu uma correspondência entre as obrigações de pagamento e as condições efetivas da proposta. Dado que as partes se obrigarão em face daquelas condições efetivas, os pagamentos devidos ao contratado haverão de correlacionar-se às bases do negócio, uma vez que presidiram a oferta e se substanciaram em sua real compostura. Assim, tais pagamentos, para atenderem à previsão constitucional, necessitam resguardar a correlação estratificada sobre as condições efetivas em vista das quais se assentaram as partes, o que equivale a dizer que terão que ser reequilibrados se houversupervenientes desconcertos.
É, dessarte, no próprio texto constitucional que se assenta o resguardo daquilo que, em direito administrativo, é denominado 'equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo', com os decorrentes reajustes e revisões.
7. A nível infraconstitucional, o equilíbrio econômico-financeiro também se encontra enfatizado pelo direito positivo. Desde logo, a Lei 8.666, de 21.06.1993, que veicula regras gerais sobre licitação e contratos, consagra sua incolumidade em numerosas passagens. Basta referir as disposições que se estampam no art. 5º, § 1º; no art. 7º, § 7º; no art. 40. XI e XIV, c; no art. 57, § 1º; no art. 58, §§ 1º e 2º; e no art. 65, II, d, assim como em seu § 5º.
É certo, além disto, que a Lei de Concessões, Lei 8.987, de 13.02.1995, também encarece a proteção à equação econômico-financeira e exige-lhe a persistência ao longo da relação instaurada. Com efeito, seu art. 9º estatui que a tarifa do serviço concedido 'será preservada pelas regras de revisão'.
O mesmo intuito de preservação do equilíbrio estipulado de início reaparece estampadamente nos §§ 2º, 3º e 4º do mesmo artigo, ao estabelecerem, respectivamente, que: 'Os contratos poderão estabelecer mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico e financeiro'; que: 'Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa para mais ou para menos, conforme o caso' e que: 'Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração'.
O art. 18 da mesma lei dispõe que: 'O edital de licitação será elaborado pelo poder concedente, observados, no que couber, os critérios e as normas gerais da legislação própria sobre licitações e contratos e conterá, especialmente: (...) VIII – os critérios de reajuste e revisão das tarifas'.
O art. 23, entre as cláusulas categorizadas como essenciais ao contrato de concessão, em seu inciso IV, inclui as relativas 'ao preço do serviço e aos critérios e procedimentos para o reajuste e a revisão das tarifas'.
É inquestionável, pois, que a legislação de concessão de serviços públicos, tanto como a de contratos administrativos em geral – e os princípios gerais destes se aplicam às licitações para concessão de serviços públicos, como o declara seu art. 18 – consagram insistentemente a garantia do equilíbrio econômico-financeiro, tanto pelo instituto da revisão quanto dos reajustes.
Tudo isso está a revelar, inobjetavelmente, a decidida orientação legislativa de assegurar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo."
No que concerne às limitações que sofre a Administração Pública para promover alterações unilaterais no contrato administrativo, notadamente o contrato de concessão do serviço público, averba André de Laubadère, em seu já clássico Traité des Contrats Administratifs, 2. ed., Paris, L.G.D.J., 1984, t. 2º, p. 406, nº 1177, verbis:
“D'une part, l'administration et son cocontractant ont conclu un certain contrat, ayant un certain objet: l'administration ne peut prétendre imposer une modification qui aboutirait à dénaturer le contrat, à lui donner en fait un objet nouveau, différent de celui qui a été envisagé dans la commune intention des parties; D'autre part, le cocontractant a conclu le contrat en considération de certaines conditions, notamment de ses possibilités techniques et financières. L'administration ne peut prétendre imposer des modifications qui aboutiraient par leur importance à un bouleversement du contrat et de son économie générale.”
Nesse sentido, ainda, os seguintes autores: Jean de Soto, in Droit Administratif – Theorie Generale du Service Public, Paris, Éditions Montchrestien, 1981, p. 339; Marcel Waline, in Traité Élémentaire de Droit Administratif, 6. ed., Paris, Libr. du Recueil Sirey, 1952, 392-3, § 3º; Jean Rivero, in Droit Administratif, 8. ed., Paris, Dalloz, 1977, p. 454-5, nº 481; Jacqueline Morand-Deviller, in Cours de Droit Administratif, 3. ed., Paris, Montchrestien, p. 362, 'C'; Georges Dupuis, Marie J. Guédon, Patrice Chrétien, in Droit Administratif, 7. ed., Paris, Armand Colin, p. 403, 'B'; Laurent Richer, in Droit des Contrats Administratifs, Paris, L.G.D.J., 1995, p. 198; Gaston Jèze, in Les Principes Généraux Du Droit Administratif – Théorie Générale Des Contrats De L'Administration, Paris, Troisième Partie, L.G.D.J., 1936, 1.142.
A respeito, a lição precisa de Laubadère, em artigo intitulado "Du pouvoir de l'administration d'imposer unilatéralement des changements aux dispositions des contrats administratifs", publicado na Revue du Droit Public, 1954, p. 40-1, verbis:
"Le pouvoir de modification unilatérale est considéré comme d'ordre public; l'administration ne peut renoncer à l'avance à l'exercer (Jèze, op. cit., p. 225; Bonnard, op. cit., p. 620).
Le pouvoir de modification existant en dehors des stipulations du contrat, lorsque celui-ci le prévoit il ne le crée pas mais ne fait que régler ses conditions d'exercice, en particulier ses limites et ses conséquences pécuniaires (Jèze, loc. cit.).
Par ailleurs un tel pouvoir a des limites et des contreparties; à cet égard la jurisprudence relative aux limites et contreparties des modifications prévues par le contrat lui-même est utilisable d'une manière générale et elle est très développée.
Les limites du pouvoir de modification sont de deux ordres:
D'une part les modifications unilatérales ne peuvent concerner que les clauses du contrat qui intéressent le service public et ses besoins (c'est-à-dire les prestations du cocontractant et leurs modalités d'exécution) à l'exclusion des clauses qui règlent les rapports d'intérêts entre les parties (notamment les clauses financières).
D'autre part l'administration ne peut pas utiliser son pouvoir de modification pour imposer au cocontractant des changements excessifs, dépassant une mesure raisonnable, c'est-à-dire ayant pour effet de transformer l'objet même du contrat (par exemple de transformer une concession de service public en une régie déguisée : C. E., 18 juillet 1930, Compagnie P.L.M. et autres, R.D.P., 1931, p. 142, concl. Josse) ou d'excéder les possibilités techniques ou économiques du cocontractant; ce dernier critère est très largement éclairé, par exemple, par l'abondante jurisprudence relative, en matière de marchés de travaux publics, aux notions d' « ouvrage nouveau » et de « bouleversement de l'économie générale du projet» (C. E., 23 juin 1920, Briançon, p. 626).
Quant à la contrepartie du pouvoir de modification elle se trouve dans le principe générale selon lequel toute modification imposée au cocontractant et lui causant un préjudice oblige l'administration à l'indemniser de manière à rétablir l'équilibre contractuel initialement envisagé dans la commune intention des parties."
Em palavras lapidares, a propósito do alcance da garantia do equilibrio econômico-financeiro do contrato administrativo, anotam Nicola Assini e Lucio Marotta, in La Concessione di Opere Pubbliche, CEDAM – PADOVA, 1981, p. 73-4, verbis:
“È un principio pacifico che la gestione sia svolta dal concessionario a suo rischio e periculo. Ma è altrettanto evidente che rischi e pericoli sono a carico del concessionario solo in condizioni di normale svolgimento del rapporto economico regolato fra le parti dalla convenzione accessiva all'atto di concessione.
Fra le obbligazioni de concedente e quelle des concessionario si stabilisce all'inizio un certo rapporto ed è questo rapporto che deve essere mantenuto nel tempo, anche se ciò dovesse richiedere un mutamento delle obbligazioni assunte originariamente dalle parti.
Interessato particolarmente al mantenimento di questo rapporto è naturalmente il concessionario, che eviterà cosí di doversi accollare i rischi di gestione dipendenti da avvenimenti eccezionali ed imprevedibili. Ma anche il concedente ha interesse che il concessionario non venga mai a trovarsi in crisi in dipendenza di fatti che non gli siano addebitabili, poiché altrimenti verrebbe pregiudicato il perseguimento del fine pubblico che l'atto di concessione si riprometteva.
È nella logica della concessione che gli interessi delle parti non debbano risentire di quella contrapposizione o antiteticità che normalmente si verifica in qualsiasi altro rapporto obbligatorio scaturente da contratto. Concedente e concessionario sono in effetti legati da un rapporto del tutto peculiare, per cui essi vengono a trovarsi, secondo una plastica espressione, nella stessa barca.”
Por ocasião do julgamento do RE nº 9.830, relator o eminente Min. Hahnemann Guimarães, deliberou o Eg. STF, verbis:
"CONTRATO ADMINISTRATIVO – REVOGAÇÃO.
– Não se admite a revogação unilateral de um contrato administrativo perfeito, por ato da administração. O poder que tem a autoridade administrativa de rever, por iniciativa própria, despacho contrário à Fazenda não abrange o ato jurídico perfeito." (In Revista Forense, v. 121, p. 81)
Em seu voto disse o ilustre Relator, verbis:
"O SR. MINISTRO HAHNEMANN GUIMARÃES (relator): A regra factum infectum fieri nequit é, sem dúvida, contrariada na revogação dos atos jurídicos. A revogação dos atos jurídicos, porém, é excluída sempre que, em virtude do ato, se constituiu definitivamente uma situação jurídica, ou por outras palavras, talvez menos claras, sempre que do ato resultou um direito subjetivo.
É, assim, revogável o testamento, e o contrato não pode ser revogado unilateralmente.
O que se diz a respeito dos atos jurídicos privados diz-se também dos atos administrativos.
Não se admite a revogação de um contrato administrativo perfeito. Afirma-se mesmo que, satisfeita a condição rebus sic stantibus, o ato administrativo acabado é irrevogável.
No acórdão de 19 de janeiro de 1943, o Sr. ministro OROZIMBO NONATO, relator, acolheu a doutrina de que os atos administrativos, particularmente aqueles de que resulta uma situação individual, não podem ser revogados pela própria Administração (Rev. de Dir. Administrativo, cit. p. 182).
É, pois, inaceitável a arguição de haver o acórdão de 4 de abril de 1945 discordado do Supremo Tribunal Federal.
A transação celebrada entre o Estado e seu credor não pode ser revogada por declaração unilateral do devedor. É ato jurídico irrevogável.
O poder que tem a autoridade administrativa de rever, por iniciativa própria, o despacho contrário à Fazenda Pública (Dec. nº 20.848, art. 1º, parág. único) não abrange o ato jurídico que se tornou perfeito pela constituição de um vínculo para a mesma Fazenda.
No caso, o Estado de Mato Grosso não podia, unilateralmente, desfazer o ato consumado em 9 de dezembro de 1936." (In op. cit., p. 82)
Por outro lado, ao proferir voto na AC nº 2006.70.00.012065-4/PR, anotei, verbis:
"Com efeito, em face do disposto no art. 5º, XXXVI, da CF/88, é indubitável que o contrato válido entre as partes constitui ato jurídico perfeito, protegido pelo texto constitucional, dele irradiando, para uma ou para ambas as partes, direitos adquiridos, não podendo ser alcançado por lei superveniente à data da celebração do contrato, mesmo quanto aos efeitos futuros decorrentes do ajuste negocial.
Nesse sentido, é de referir-se o ensinamento clássico de Julien Bonnecase, ao atualizar a obra de Baudry-Lacantinerie, verbis: ‘Les droits dérivant d'une convention expresse ou légalement présumée constituent, dans le sens de notre matière, des droits acquis à l'abri de l'atteinte de toute loi nouvelle, alors même qu'ils ont pour objet de paiements à faire à des époques successives, qui ne viendraient à échéance que postérieurement à la promulgation de cette loi’ (Baudry-Lacantinerie, in Traité Théorique et Pratique de Droit Civil -Supplément par Julien Bonnecase, Paris, Librairie Recueil Sirey, 1925, t. 2º, p. 123).
Nesse sentido, também, é a jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos ao julgar o 263 U.S. 125, verbis:
‘The integrity of contracts-matter of high public concern - is guaranteed against action like that here disclosed by section 10, art. 1, of the federal Constitution, ‘No state shall pass any law impairing the obligation of contracts.’ It was beyond the competency of the Legislature to substitute an ‘indeterminate permit’ of rights acquired under a very clear contract.’
(In The Supreme Court Reporter – November, 1923 – July, 1924, St. Paul, West Publishing Co., 1924, v. 44, p. 86)’
Essa, também, é a lição clara e precisa do saudoso jurista Francisco Campos, em seu Direito Administrativo, Rio, Livr. Freitas Bastos, 1958, v. II, p. 11, verbis:
‘O que a Constituição assegura, portanto, ao determinar que o ato jurídico perfeito continuará a ser regido pela lei do tempo em que se consumou, é, precisamente, o efeito jurídico daquele ato, isto é, as transformações por ele operadas nas relações jurídicas que constituem o seu conteúdo, seja criando, seja modificando, transferindo ou extinguindo direito.
O que resulta do ato jurídico perfeito é, precisamente, a aquisição de um direito – ou a pretensão fundada a uma prestação, ou a modificação ou a extinção de direito anterior a determinada prestação.
O ato jurídico perfeito é subtraído ao império da lei posterior precisamente para que não seja prejudicado pela sua aplicação o direito que emergiu daquele ato e que por seu intermédio se tornou adquirido ou se incorporou ao patrimônio do indivíduo.’
Ademais, a Lei Estadual nº 14.235/2003, que ‘revogou’ as cláusulas do contrato, teve a sua eficácia suspensa pelo Eg. STF quando do julgamento da ADIn nº 3.075-DF.
Em seu voto, o ilustre Ministro Gilmar Mendes, verbis:
‘De qualquer sorte, quanto às alegações de violação aos princípios de proteção ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido e do devido processo legal, penso, ao menos em um juízo cautelar, que a revogação contratual exigida pelo ato impugnado afigura-se ofensiva ao princípio da segurança jurídica. Meu voto, portanto, é no sentido de se deferir a liminar para que seja suspensa a vigência e a eficácia do ato impugnado.’
Descumprindo tal decisão, o Chefe do Poder Executivo do Estado do Paraná edita o Decreto nº 5.434/2005, que reproduz o comando do texto legal suspenso pelo Pretório Excelso, em clara violação ao princípio da Separação e Harmonia dos Poderes – art. 2º da CF/88 –, exorbitando o poder regulamentar que lhe confere a Lei Maior.
Pertinente, in casu, relembrar as sábias palavras proferidas pelo Justice Louis Brandeis no julgamento do caso Myers v. United States pela Suprema Corte Americana, verbis: ‘The doctrine of the separation of powers was adopted by convention of 1787 not to promote efficiency but to preclude the exercise of arbitrary power. The purpose was not to avoid friction, but, by means of the inevitable friction incident to the distribution of the governmental powers among three departments, to save the people from autocracy.’ (In The Supreme Court Reporter, St. Paul, West Publishing Co., 1928, v. 47, p. 85).
A propósito do poder regulamentar, é sempre atual o magistério de Pimenta Bueno, o mais autorizado intérprete da Carta Imperial de 1824, que o considera abusivo nos seguintes casos, verbis:
‘1º) em criar direitos, ou obrigações novas, não estabelecidos pela lei, porquanto seria uma inovação exorbitante de suas atribuições, uma usurpação do poder legislativo, que só poderá ser tolerada por câmaras desmoralizadas. Se assim não fora, poderia o governo criar impostos, penas ou deveres que a lei não estabeleceu, teríamos dois legisladores, e o sistema constitucional seria uma verdadeira ilusão;
2º) em ampliar, restringir ou modificar direitos ou obrigações, porquanto a faculdade lhe foi dada para que fizesse observar fielmente a lei, e não para introduzir mudança ou alteração alguma nela, para manter os direitos e obrigações como foram estabelecidos, e não para acrescentá-los ou diminuí-los, para obedecer ao legislador, e não para sobrepor-se a ele;
3º) em ordenar ou proibir o que ela não ordena ou não proíbe, porquanto dar-se-ia abuso igual ao que já notamos no antecedente número primeiro. E demais, o governo não tem autoridade alguma para suprir, por meio regulamentar, as lacunas da lei, e mormente do direito privado, pois que estas entidades não são simples detalhes, ou meios de execução. Se a matéria como princípio é objeto de lei, deve ser reservada ao legislador; se não é, então não há lacuna na lei, sim objeto de detalhe de execução;
4º) em facultar, ou proibir, diversamente do que a lei estabelece, porquanto deixaria esta de ser qual fora decretada, passaria a ser diferente, quando a obrigação do governo é de ser em tudo e por tudo fiel e submisso à lei;
5º) finalmente, em extinguir ou anular direitos ou obrigações, pois que um tal ato equivaleria à revogação da lei que os estabelecera ou reconhecera; seria um ato verdadeiramente atentatório.’
(In Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império, Rio de Janeiro, 1857, p. 237, nº 326)
E mais adiante, conclui o ilustre Mestre, verbis:
‘O governo não deve por título algum falsear a divisão dos poderes políticos, exceder suas próprias atribuições ou usurpar o poder legislativo.
Toda e qualquer irrupção fora destes limites é fatal tanto às liberdades públicas como ao próprio poder.’
(In op. cit., p. 237)
Realmente, o ordenamento jurídico brasileiro atribui ao regulamento unicamente o papel de regulamentar a lei, esclarecendo o seu comando normativo, porém, sempre observando-a, estritamente, não podendo inovar, ampliar ou restringir direitos, sob pena de ilegalidade.
Nesse sentido, orienta-se a melhor doutrina, verbis:
‘748. Le règlement de police, parce qu'il est un règlement, est hiérarchiquement inférieur à la loi. Il ne peut aller, dans ses dispositions, à l' encontre des prescriptions législatives, s'il en existe sur tel ou tel point perticulier.
(PAUL DUEZ et GUY DEBEYRE, in Traité de Droit Administratif, Paris, Librairie Dalloz, 1952, p. 514)
LES LIMITES DU POUVOIR RÉGLEMENTAIRE
Elles sont toutes l'expression de la subordination de l' autorité règlementaire au législateur. Ont peut les classer ainsi:
1º Obligation de respecter les lois dans leur lettre et dans leur esprit;
2º Impossibilité d'interpréter la loi: ce pouvoir n'appartient qu'au législateur et aux tribunnaux: CE (Sect.), 10 juin 1949, Baudouin.
3º Impossibilité pour l'autorité administrative de prende l'initiative de diminuer par um règlement la liberté des citoyens si le législateur n'a pas posé au mains le principe d'une telle limitation;
(...).’
(MARCEL WALINE, in Traité Élémentaire de Droit Administratif, 6. ed., Paris, Libr. Du Recueil Sirey, 1952, p. 41)
Essa é, igualmente, a jurisprudência da Suprema Corte, verbis:
‘Resolução n.º 194/1970 do CONFEA – Exercício da Profissão de Engenharia, Agronomia e Arquitetura – Exigências ilegais.
Dada a inferioridade constitucional do regulamento em confronto com a lei, é evidente que aquele não pode alterar, seja ampliando, seja restringindo os direitos e obrigações prescritos nesta.
(...).’
(RE nº 81.532/BA, Rel. Min. CUNHA PEIXOTO, in RTJ 81/494).
A respeito, leciona Bernard Schwartz, in Commentary on the Constitution of the United States – The Rights of Property, New York, the Macmillan Company, 1965, p. 2/3, verbis:
‘The Constitution has been construed as a living instrument intended to vest in the nation whatever authority may be appropriate to meet the exigencies of almost two centuries of existence.
To regard the Constitution solely as a grant of governmental authority is, nevertheless, to obtain but a partial and distorted view. Just as important is its function as a limitation upon such authority. As already emphasized in section 1, the American conception of a constitution is one which is not confined to viewing such instrument as a charter from which government derives the powers which enable it to function effectively. Instead, with us, the organic document is one under which governmental powers are both conferred and circumscribed.
The Constitution is thus more than a framework of government; it establishes and guarantees rights which it places beyond political abridgment. In this country, written constitutions were deemed essential to protect the rights and liberties of the people against the encroachments of governmental power.’
Da mesma forma, impõe-se recordar a velha mas sempre nova lição de John Randolph Tucker, em seu clássico comentário à Constituição norte-americana, verbis:
‘All acts of every department of government, within the constitutional bounds of powers, are valid; all beyond bounds are irritum et insane – null and void. Government, therefore, has no inherent authority, but only such as is delegated to it by its sovereign principal. Government may transcend the limits of this authority, but its act is none the less void. It cannot, by usurpation, jurally enlarge its powers, nor by construction stretch them beyond the prescribed limits.’
(In The Constitution of the United States, Chicago, Callaghan & Co., 1899, p. 66-7, § 54)
Outro não é o ensinamento de Daniel Webster, verbis:
‘The Constitution, again, is founded on compromise, and the most perfect and absolute good faith, in regard to every stipulation of this kind contained in it is indispensable to its preservation. Every attempt to grasp that which is regarded as an immediate good, in violation of these stipulations, is full of danger to the whole Constitution.’
(In The Works of Daniel Webster, Boston, Little, Brown and Company, 1853, v. I, p. 331)
É manifesta, pois, a ilegalidade do Decreto Estadual nº 5.434/2005, euma vez que descumpriu decisão proferida pelo Eg. STF e, a pretexto de revogar ato que entende ilegal, na forma da Súmula 473 daquela Corte, em realidade violou a letra e o espírito desse enunciado, invadindo, no caso, a seara do Poder Judiciário.
A respeito, preciso o magistério de Francisco Campos, em seu Direito Administrativo, Rio, Imprensa Nacional, 1943, ao assinalar os limites da Administração Pública acerca da revogação dos atos administrativos, verbis: ‘Em princípio, os atos administrativos, particularmente aqueles de que resulta uma situação individual, não podem ser revogados pela própria administração. Este princípio se funda no fato de que a atividade administrativa é, igualmente, uma atividade jurídica, de que os seus atos não são atos quaisquer, mas atos juridicamente qualificados ou de relevância jurídica, sendo, como é, a administração uma das formas de execução do direito. Quando, portanto, o ato administrativo se resume em uma individuação da norma, a decisão do poder administrativo é assimilável à decisão do Poder Judiciário, adquirindo, assim, a força de ligar a administração ao seu próprio ato, o qual, em relação a ela, constitui uma res judicata. (...) Ora, não é da natureza da administração resolver contestações entre interesses que se opõem, havendo, como há, um departamento do governo especialmente designado, pela sua competência, para o exercício de tais funções. À administração, nos regimes em que não lhe cabe exercer funções contenciosas, falece competência para decidir sobre contestações emergentes da sua atividade, que se tem por completa e acabada com a emanação dos atos administrativos compreendidos na sua competência própria e específica.’ (In op. cit., pp. 60/1).
Nesse sentido tem decidido a Suprema Corte dos Estados Unidos.
Em Stone v. United States, tratava-se da venda de terras de domínio público tendo o Secretário do Interior, que era a autoridade competente para expedir os títulos de propriedade, alienado terras não incluídas entre aquelas cuja venda a lei autorizava. O seu sucessor na Secretaria do Interior promoveu a anulação da venda assim realizada. Instada a se pronunciar, a Suprema Corte deliberou que, embora nulo o ato, não caberia à administração rescindi-lo, uma vez que a rescisão constitui ato de natureza jurisdicional, que se inclui na competência do Poder Judiciário.
O princípio firmado nesse julgamento foi mantido no caso Beley et al. v. Naphtaly, julgado em 28 de fevereiro de 1898, oportunidade em que o Justice Peckham afirmou, verbis: ‘The case of U.S. v. Stone, 2 Wall. 525, has no bearing adverse to this proposition. In that case it was stated that a patent is but evidence of a grant, and the officer who issues it acts ministerially, and not judicially; that, if he issues a patent for land reserved from sale for law, such patent is void for want of authority, but that one officer of the land office is not competent to cancel or annul the act of his predecessor; that is a judicial act, and requires the judgment of a Court.’ (In The Supreme Court Reporter, St. Paul, West Publishing Co., 1899, v. 18, p. 358).
Da mesma forma, decidiu aquela Alta Corte no caso Michigan Land & Lumber Co., Limited, v. Rust, julgado em 13 de dezembro de 1897 (In op. cit., p. 208).
A doutrina é uniforme no admitir que o poder de alteração e rescisão unilateral do contrato administrativo é inerente à Administração Pública, podendo ser exercido ainda que nenhuma cláusula expressa o consigne, porém, a alteração somente pode atingir as denominadas cláusulas regulamentares, isto é, aquelas que dispõem sobre o objeto do contrato e o modo de sua execução.
No que concerne às cláusulas econômicas, ou seja, aquelas que estabelecem a remuneração e os direitos do contratado perante a Administração e dispõem acerca da equação econômico-financeira do contrato administrativo, estas são inalteráveis, unilateralmente, pelo Poder Público sem que se proceda à devida compensação econômica do contratado, visando restabelecer o equilíbrio financeiro inicialmente ajustado entre as partes.
Esse o magistério do saudoso jurista Hely Lopes Meirelles, in Licitação e Contrato Administrativo, 9. ed., Revista dos Tribunais, 1990, p. 181-2.
É o que se encontra previsto nos arts. 37, XXI, e 175, III, da CF/88, bem como no art. 9º, § 4º, da Lei nº 8.987/95.
Tais princípios restaram definitivamente incorporados no Direito Administrativo, sobretudo após a publicação do famoso aresto do Conselho de Estado da França, no caso da Companhia de Gás de Bordeaux, proferido em 1916, onde destacou-se a notável contribuição de Chardenet, verbis:
'Mais tout service public doit être organisé dans des conditions qui permettent de compter sur son fonctionnement d'une manière régulière, sans interruption, même momentanée, sans à-coups, passez-nous l'expression, et qui, en même temps, seront de nature à donner pleine satisfaction à ceux ayant à faire appel au service public, qui a étécréé pour eux, fonctionne régulièrement à leur égard. Voyez Syndicat des Propriétaires et Contribuables du quartier de la Croix-de-Seguey-Tivoli, à Bordeaux, 21 décembre 1906. Il faut également, et cela dans l'intérêt général, que le service public soit à l'abri d'incessantes ou de trop fréquentes modifications qui, le plus souvent, apporteraient des troubles dans le fonctionnement ou la marche du service. Par suite, le service public doit être organisé pour un certain nombre d'années, réserve faite, bien entendu, des perfectionnements qui pourraient y être apportés. Mais, au cours d'une période de temps un peu longue, bien des événements peuvent se produire, notamment la situation économique peut changer ou tout au moins se modifier. D'autre part, pour la bonne organisation et l'heureux fonctionnement d'un service public important, des dépenses élevées doivent être engagées, de gros capitaux doivent être immobilisés pour longtemps. Si nous prenons l'exemple du service d'éclairage, au début on aura à construire des usines, à établir des canalisations, etc. Plus tard, on aura à faire face à des frais d'entretien, de reconstruction, etc., à procéder à des renouvellements de matériel, souvent rendus nécessaires par quelque découverte scientifique ou par des perfectionnements des moyens de fabrication, dont les bénéficiairesdu service public doivent profiter. Au cours de l'execution du service, il faudra passer, presque toujours longtemps à l'avance, des marchés importants pour s'assurer les matières premières nécessaires à la fabrication du gaz. Les dépenses que l'on aura ainsi engagées seront amorties peu à peu et elles ne le seront que sur une période de temps assez longue. Pour éviter d'exposer la personne publique à tous les risques auxquels nous venons de faire allusion, – pour lui éviter d'engager ses ressources propres dans des opérations commerciales ou industrielles qu'impose le fonctionnement du service public, – pour lui éviter d'être obligée de recourir parfois à des emprunts plus ou moins onéreus, – on a songé à s'adresser à des tiers, particuliers ou sociétés, pour assurer le service public; on a songé à se décharger sur eux du soin d'assurer ce service. On est ainsi arrivé au contrat de concession.' (In Revue Du Droit Public Et De La Science Politique, Paris, M. Giard & E. Brière Editeurs, 1916, t. 33, p. 220-1)
É o magistério autorizado de Georges Péquignot, verbis:
‘Le cocontractant a droit à la rémunération inscrite dans son contrat. C'est le principe de la fixité du prix du contrat. Il n'a consenti son concours que dans l'espoir d'un certain bénéfice. Il a accepté de prendre à sa charge des travaux et des aléas qui, s'il n'avait pas voulu contracter, auraient été supportés par l'Administration: il est normal qu'il en soi rémunéré.
Il serait, par ailleurs, contraire à la règle de bonne foi, contraire aussi à toute sécurité des affaires et, de ce fait, dangereux pour l'état social et économique, que l'Administration puisse modifier, spécialment réduire, cette rémunéiation.’
E, mais adiante, conclui o mesmo autor, verbis:
‘...l'Administration, lorsqu'elle modifie le contrat sur un point qui intéresse le service public, doit cependant maintenir son équation financière, c'està-dire, le bénéfice que le cocontractant espérait tirer de l'opération. A fortiori, toute autre modification étant mise à part, cette équation financière doit-elle être maintenue par l'impossibilité de réduire ou de supprimer directement la rémunération en vue de laquelle le cocontractant s'est engagé.
Ce principe est fondamental. Il doit être entendu très rigoureusement, car, application particulière de l'idée d'équation financière, il est la source de la sécurité juridique du cocontractant de l'Administration.’ (In Théorie Générale du Contrat Administratif, Paris, Éditions A. Pédone, 1945, p. 434-5)
Nesse sentido, recentes decisões do Eg. STJ, verbis:
‘AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSÃO DE LIMINAR Nº 74 – PR (2004/0031293-3)
Relator: Ministro Edson Vidigal
Agravante: Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S/A – Econorte
Advogados: Romeu Felipe Bacellar Filho e outros
Agravado: Estado do Paraná
Procuradores: Sérgio Botto de Lacerda e outros
Requerido: Tribunal Regional Federal da 4ª Região
EMENTA
Suspensão de liminar. Tutela antecipada deferida para assegurar o reajuste de tarifas de pedágio pela empresa concessionária.
1. Não há como se concluir por ofensa à ordem ou à economia públicas em decisão concessiva de tutela antecipada que apenas assegurou o cumprimento de cláusula contratual livremente firmada entre as partes e não questionada administrativamente ou em juízo.
2. Perigo de dano inverso. O simples descumprimento de cláusulas contratuais por parte do governo local viola o princípio da segurança jurídica e inspira riscos nos contratos com a Administração.
3. Agravo regimental provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do agravo regimental e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Barros Monteiro, Francisco Peçanha Martins, Humberto Gomes de Barros, Cesar Asfor Rocha, Ari Pargendler, José Arnaldo da Fonseca, Fernando Gonçalves, Carlos Alberto Menezes Direito, Felix Fischer, Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon, Paulo Gallotti, Franciulli Netto e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro-Relator. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, José Delgado, Gilson Dipp e Francisco Falcão, sendo os três últimos substituídos, respectivamente, pelos Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Hélio Quaglia Barbosa e Castro Meira.
Brasília (DF), 1º de julho de 2004 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Edson Vidigal, Relator’
(Publicado no DJ de 23.08.2004 – In RSTJ, 180/21)
Nessa mesma orientação, os julgados publicados na RSTJ, 181/31 e 182/49.
Preciso o magistério de Hely Lopes Meirelles, in Estudos e Pareceres de Direito Público, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1991, v. 11, p. 120-1, verbis:
‘O equilíbrio econômico-financeiro é a relação que as partes estabelecem inicialmente no contrato administrativo, entre os encargos do particular e a retribuição devida pela entidade ou órgão contratante, para a justa remuneração do seu objeto. (cf. nosso Licitação e Contrato Administrativo, ob. cit., p. 184)
Essa correlação encargo-remuneração deve ser conservada durante toda a execução do contrato, mesmo que alteradas as cláusulas de serviço, modificados projetos e programas, liberados trabalhos em quantidades inferiores às previstas ou superados os prazos contratuais por mora da Administração, a fim de que se mantenha o equilíbrio econômico-financeiro, o qual, como bem observa Waline, é 'direito fundamental de quem contrata com a Administração' (Marcel Waline. Paris, Droit Administratif, 1959, p. 574). Para De Soto, citado por Laubadère, 'a manutenção desse equilíbrio constitui norma fundamental da teoria dos contratos administrativos. As obrigações das partes são tidas como calculadas de tal maneira que se equilibram do ponto de vista financeiro, e o responsável pelo contrato deverá esforçar-se para manter, a qualquer custo, esse equilíbrio' (André De Laubadère, Contrats Administratifs, Paris, 1956, II/35, nota 6).
5. O reconhecimento do direito ao equilíbrio financeiro – o primeiro direito original do cocontratante com o Poder Público, segundo Péquignot (Théorie Générale du Contrat Administratif, Paris, 1945, p. 430) – surgiu como contrapartida ao poder-dever de alteração unilateral do contrato administrativo, mas vale também para os casos em que, impedido de invocar a exceção de contrato não cumprido, o particular contratado se vê obrigado a suportar o cumprimento irregular do ajuste ou a mora da Administração contratante.
Com efeito, o contrato administrativo, por parte da Administração, destina-se ao atendimento das necessidades públicas, mas, por parte do contratado, objetiva um lucro, através da remuneração consubstanciada nas cláusulas econômicas e financeiras. Esse lucro há que ser assegurado nos termos iniciais do ajuste, porque se de um lado a Administração tem o poder de modificar as condições de execução do contrato e de exigir a prestação da outra parte, ainda que ela mesma não tenha cumprido a sua, de outro lado, o particular contratado tem o direito de ver mantida a correlação encargo-remuneração estabelecida originariamente, uma vez que o seu objetivo ao participar da relação negocial foi – e continua sendo – o ganho pecuniário. Objetivo altamente lícito e respeitável, diga-se de passagem, que a Administração contratante não pode, va1idamente, restringir, exigindo que, a partir de um dado momento, a execução do contrato prossiga em condições menos lucrativas e até mesmo prejudiciais ao contratado, sem qualquer culpa deste.
6. Para a cabal satisfação desse direito, é forçoso se operem os necessários ajustes econômicos sempre que, por ato ou fato da Administração, for rompido o equilíbrio econômico-financeiro, em detrimento do particular contratado, independentemente de previsão contratual, como nos ensina Laubadère, nestes precisos termos: 'Cette règle d'equilibre est quelque fois considerée comme résultant de la commune intention des parties; elle s'applique, en tous cas, même lorsqu'el1e ne figure pas expressément dans le contrat' (André de Laubadère, Traité Élémentaire de Droit Administratif, Paris, 1957, p. 431). No mesmo sentido: Caio Tácito, Direito Administrativo, São Paulo, 1975, p. 293).
7. Por outro lado, se o respeito ao equilíbrio econômico-financeiro inicia1, na hipótese de alteração unilateral do ajuste, constitui dever da Administração contratante. com muito mais razão é direito daquele e dever desta, nos casos em que o órgão ou entidade contratante abusa de sua posição privilegiada para descumprir ou cumprir irregularmente suas prestações ou, ainda, suspender os prazos contratuais, obrigando o particular a suportar encargos excessivos, os quais, por não terem sido cogitados quando da elaboração da proposta ou da celebração do contrato, representam insuportáveis prejuízos, mormente numa conjuntura em que o custo do dinheiro é altíssimo e a inflação avilta a moeda a cada dia.’
Da mesma forma, a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, in Revista Trimestral de Direito Público, v. 38/143-4, verbis:
‘6. A legislação brasileira, a começar da Constituição, proclama a intangibilidade do equilíbrio econômico-financeiro original do contrato. Deveras o art. 37, XXI, da Lei Magna dispõe que '(...) obras, serviços, compras e alienações serão contratados, mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta (...)'.
O versículo em apreço, como consta de sua dicção, estabeleceu uma correspondência entre as obrigações de pagamento e as condições efetivas da proposta. Dado que as partes se obrigarão em face daquelas condições efetivas, os pagamentos devidos ao contratado haverão de correlacionar-se às bases do negócio, uma vez que presidiram a oferta e se substanciaram em sua real compostura. Assim, tais pagamentos, para atenderem à previsão constitucional, necessitam resguardar a correlação estratificada sobre as condições efetivas em vista das quais se assentaram as partes, o que equivale a dizer que terão que ser reequilibrados se houver supervenientes desconcertos.
É, dessarte, no próprio texto constitucional que se assenta o resguardo daquilo que, em direito administrativo, é denominado 'equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo', com os decorrentes reajustes e revisões.
7. A nível infraconstitucional, o equilíbrio econômico-financeiro também se encontra enfatizado pelo direito positivo. Desde logo, a Lei 8.666, de 21.06.1993, que veicula regras gerais sobre licitação e contratos, consagra sua incolumidade em numerosas passagens. Basta referir as disposições que se estampam no art. 5º, § 1º; no art. 7º, § 7º; no art. 40. XI e XIV, c; no art. 57, § 1º; no art. 58, §§ 1º e 2º; e no art. 65, II, d, assim como em seu § 5º.
É certo, além disto, que a Lei de Concessões, Lei 8.987, de 13.2.1995, também encarece a proteção à equação econômico-financeira e exige-lhe a persistência ao longo da relação instaurada. Com efeito, seu art. 9º estatui que a tarifa do serviço concedido 'será preservada pelas regras de revisão.'
O mesmo intuito de preservação do equilíbrio estipulado de início reaparece estampadamente nos §§ 2º, 3º e 4º do mesmo artigo, ao estabelecerem, respectivamente, que: 'Os contratos poderão estabelecer mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico e financeiro'; que: 'Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa para mais ou para menos, conforme o caso,' e que: 'Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração.'
O art. 18 da mesma lei dispõe que: 'O edital de licitação será elaborado pelo poder concedente, observados, no que couber, os critérios e as normas gerais da legislação própria sobre licitações e contratos e conterá, especialmente: (...) VIII - os critérios de reajuste e revisão das tarifas.'
O art. 23, entre as cláusulas categorizadas como essenciais ao contrato de concessão, em seu inciso IV, inclui as relativas, 'ao preço do serviço e aos critérios e procedimentos para o reajuste e a revisão das tarifas'.
É inquestionável, pois, que a legislação de concessão de serviços públicos, tanto como a de contratos administrativos em geral – e os princípios gerais destes se aplicam às licitações para concessão de serviços públicos, como o declara seu art. 18 – consagram insistentemente a garantia do equilíbrio econômico-financeiro, tanto pelo instituto da revisão, quanto dos reajustes.
Tudo isto está a revelar, inobjetavelmente, a decidida orientação legislativa de assegurar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo.’
No que concerne às limitações que sofre a Administração Pública para promover alterações unilaterais no contrato administrativo, notadamente o contrato de concessão do serviço público, averba André de Laubadère, em seu já clássico Traité des Contrats Administratifs, 2. ed., Paris, L.G.D.J., 1984, t. 2º, p. 406, nº 1177, verbis:
'D'une part, l'administration et son cocontractant ont conclu un certain contrat, ayant un certain objet: l'administration ne peut prétendre imposer une modification qui aboutirait à dénaturer le contrat, à lui donner en fait un objet nouveau, différent de celui qui a été envisagé dans la commune intention des parties; D'autre part, le cocontractant a conclu le contrat en considération de certaines conditions, notamment de ses possibilités techniques et financières. L'administration ne peut prétendre imposer des modifications qui aboutiraient par leur importance à un bouleversement du contrat et de son économie générale.'
Nesse sentido, ainda, os seguintes autores: Jean de Soto, in Droit Administratif – Theorie Generale du Service Public, Paris, Éditions Montchrestien, 1981, p. 339; Marcel Waline, in Traité Élémentaire de Droit Administratif, 6. ed., Paris, Libr. du Recueil Sirey, 1952, 392-3, § 3º; Jean Rivero, in Droit Administratif, 8. ed., Paris, Dalloz, 1977, p. 454-5, nº 481; Jacqueline Morand-Deviller, in Cours de Droit Administratif, 3. ed., Paris, Montchrestien, p. 362, 'C'; Georges Dupuis, Marie J. Guédon, Patrice Chrétien, in Droit Administratif, 7. ed., Paris, Armand Colin, p. 403, 'B'; Laurent Richer, in Droit des Contrats Administratifs, Paris, L.G.D.J., 1995, p. 198; Gaston Jèze, in Les Principes Généraux Du Droit Administratif – Théorie Générale Des Contrats De L'Administration, Troisième Partie, Paris, L.G.D.J., 1936, 1.142.
A respeito, a lição precisa de Laubadère, em artigo intitulado ‘Du pouvoir de l'administration d'imposer unilatéralement des changements aux dispositions des contrats administratifs,’ publicado na Revue du Droit Public, 1954, p. 40-1, verbis:
‘Le pouvoir de modification unilatérale est considéré comme d'ordre public; l'administration ne peut renoncer à l'avance à l'exercer (Jèze, op. cit., p. 225; Bonnard, op. cit., p. 620).
Le pouvoir de modification existant en dehors des stipulations du contrat, lorsque celui-ci le prévoit il ne le crée pas mais ne fait que régler ses conditions d'exercice, en particulier ses limites et ses conséquences pécuniaires (Jèze, loc. cit.).
Par ailleurs un tel pouvoir a des limites et des contreparties; à cet égard la jurisprudence relative aux limites et contreparties des modifications prévues par le contrat lui-même est utilisable d'une manière générale et elle est très développée.
Les limites du pouvoir de modification sont de deux ordres:
D'une part les modifications unilatérales ne peuvent concerner que les clauses du contrat qui intéressent le service public et ses besoins (c'est-à-dire les prestations du cocontractant et leurs modalités d'exécution) à l'exclusion des clauses qui règlent les rapports d'intérêts entre les parties (notamment les clauses financières).
D'autre part l'administration ne peut pas utiliser son pouvoir de modification pour imposer au cocontractant des changements excessifs, dépassant une mesure raisonnable, c'est-à-dire ayant pour effet de transformer l'objet même du contrat (par exemple de transformer une concession de service public en une régie déguisée : C. E., 18 juillet 1930, Compagnie P.L.M. et autres, R.D.P., 1931, p. 142, concl. Josse) ou d'excéder les possibilités techniques ou économiques du cocontractant; ce dernier critère est très largement éclairé, par exemple, par l'abondante jurisprudence relative, en matière de marchés de travaux publics, aux notions d' « ouvrage nouveau » et de « bouleversement de l'économie générale du projet» (C. E., 23 juin 1920, Briançon, p. 626).
Quant à la contrepartie du pouvoir de modification elle se trouve dans le principe générale selon lequel toute modification imposée au cocontractant et lui causant un préjudice oblige l'administration à l'indemniser de manière à rétablir l'équilibre contractuel initialement envisagé dans la commune intention des parties.’
Em palavras lapidares, a propósito do alcance da garantia do equilibrio econômico-financeiro do contrato administrativo, anotam Nicola Assini e Lucio Marotta, in La Concessione di Opere Pubbliche, CEDAM-PADOVA, 1981, p. 73-4, verbis:
'È un principio pacifico che la gestione sia svolta dal concessionario a suo rischio e periculo. Ma è altrettanto evidente che rischi e pericoli sono a carico del concessionario solo in condizioni di normale svolgimento del rapporto economico regolato fra le parti dalla convenzione accessiva all'atto di concessione.
Fra le obbligazioni de concedente e quelle des concessionario si stabilisce all'inizio un certo rapporto ed è questo rapporto che deve essere mantenuto nel tempo, anche se ciò dovesse richiedere un mutamento delle obbligazioni assunte originariamente dalle parti.
Interessato particolarmente al mantenimento di questo rapporto è naturalmente il concessionario, che eviterà cosí di doversi accollare i rischi di gestione dipendenti da avvenimenti eccezionali ed imprevedibili. Ma anche il concedente ha interesse che il concessionario non venga mai a trovarsi in crisi in dipendenza di fatti che non gli siano addebitabili, poiché altrimenti verrebbe pregiudicato il perseguimento del fine pubblico che l'atto di concessione si riprometteva.
È nella logica della concessione che gli interessi delle parti non debbano risentire di quella contrapposizione o antiteticità che normalmente si verifica in qualsiasi altro rapporto obbligatorio scaturente da contratto. Concedente e concessionario sono in effetti legati da un rapporto del tutto peculiare, per cui essi vengono a trovarsi, secondo una plastica espressione, nella stessa barca.'
Ademais, como sabido, os atos e contratos praticados pelo Poder Público, sua validade, extensão e eficácia, somente poderão ser apreciados à luz das regras de direito público, notadamente do princípio da legalidade, hoje insculpido no art. 37 da CF/88.
A respeito, bem lembrou Hartmut Maurer, verbis:
'Le problème principal du contrat administratif, du point de vue juridique, est le principe de la soumission de l'administration à la loi et au droit (Gesetzmässigkeit der Verwaltung). Alors que le droit civil est marqué par le principe d'autonomie des relations entre personnes privées (Privatautonomie) et que, par suite, il est axé précisément sur le contrat, considéré comme moyen d'aménagement des rapports entre individus (Gestaltungsmittel), le droit administratif est dominé par le principe de légalité. Les règles juridiques s'imposant à l'administration régissent de plus en plus étroitement les rapports qu'elle a avec le citoyen, comme le montre l'extension du domaine réservé à la loi, la soumission croissante du pouvoir discrétionnaire à des règles de droit, la reconnaissance de droits subjectifs et le développment de la protection juridictionelle.'
(In Droit Administratif Allemand, traduit par M. Fromont, Paris, L.G.D.J., 1994, p. 378/9, nº 25, c).
Ora, no caso dos autos não há sequer falar na imprevisão contratual, pois a teoria da imprevisão consiste no reconhecimento de que eventos novos, imprevistos e imprevisíveis pelas partes, e a elas não imputáveis, refletindo sobre a economia ou a execução do contrato, autorizam a sua revisão, para ajustá-lo às circunstâncias supervenientes. Trata-se da aplicação da cláusula rebus sic stantibus, elaborada pelos pós-glosadores, que esposa a ideia de que todos os contratos dependentes de prestações futuras incluíam cláusula tácita de resolução, se as condições vigentes se alterassem profundamente.
Tal ideia se inspirava num princípio de equidade, pois se o futuro trouxesse um agravamento excessivo da prestação de uma das partes, estabelecendo profunda desproporção com a prestação da outra parte, seria injusto manter-se a convenção, já que haveria indevido enriquecimento de um e consequente empobrecimento do outro (Cf. sobre o tema os seguintes autores: ANDREA TORRENTE, Manuale Di Diritto Privato. 6. ed., Giuffrè Editore, 1965, p. 447-50, § 311; GILBERT MADRAY, Des Contrats D'après la Récent Codification Privée Faite aux États-Unis – Étude Comparée de Droit Américain et de Droit Français, Paris, Libr. Générale, 1936, p. 194; GEORGES RIPERT, La Règle Morale dans les Obligations Civiles, 4. ed., Paris, Libr. Générale, 1949, p. 143 e ss.; PAUL DURAND, Le Droit des Obligations dans les Jurisprudences Française et Belge, Paris, Libr. Du Recueil Sirey, 1929, p. 134 e ss; VIRGILE VENIAMIN, Essais sur les Donnes Economiques dans L'Obligation Civile, Paris, Libr. Générale, 1931, p. 373 e ss.; MARCEL PLANIOL, Traité Élémentaire de Droit Civil, 10. ed., Libr. Générale, Paris, 1926, t. II, nº 1.168, p. 414; OTHON SIDOU, A Revisão Judicial dos Contratos, 2. ed., Forense, 1984, p. 95; PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado, 3. ed., RT, 1984, t. XXV, § 3.060, p. 218-20 e, do mesmo autor, Dez Anos de Pareceres, Livr. Francisco Alves, Rio, 1976, vs. 7/36-9 e 10/197-9; ARNOLDO MEDEIROS DA FONSECA, Caso Fortuito e Teoria da Imprevisão, 3. ed., Forense, Rio, 1958, p. 345-6, nº 242; FRANCISCO CAMPOS, Direito Civil – Pareceres, Livr. Freitas Bastos, 1956, p. 05-11).
Todos os autores acima referidos admitem, sob os mais variados fundamentos doutrinários, a aplicação da teoria da imprevisão, mas apenas em circunstâncias excepcionais, ou seja, somente a álea econômica extraordinária e extracontratual, desequilibrando totalmente a equação econômica estabelecida pelos contraentes, justifica a revisão do contrato com base na cláusula rebus sic stantibus.
Outro não é o entendimento adotado pela jurisprudência uniforme da Suprema Corte, em todas as oportunidades em que se manifestou sobre a tormentosa questão, como reflete o aresto relatado pelo eminente e saudoso Ministro ALIOMAR BALEEIRO, cuja cultura jurídica é por todos reconhecida, ao votar no RE nº 71.443-RJ, verbis: ‘Rebus sic stantibus – Pagamento total prévio. 1. A cláusula rebus sic stantibus tem sido admitida como implícita somente em contratos com pagamentos periódicos sucessivos de ambas as partes ao longo de prazo dilatado, se ocorreu alteração profunda inteiramente imprevisível das circunstâncias existentes ao tempo da celebração do negócio...’ (in RTJ 68/95. No mesmo sentido RTJ: 35/597; 44/341; 46/133; 51/187; 55/92; 57/44; 60/774; 61/682; 63/551; 66/561; 96/667; 100/140; 109/153; 110/328 e 117/323).
No caso concreto, contudo, é de todo estranho aos princípios de justiça a aplicação da teoria da imprevisão, que deve ser aplicada com cautela pelo magistrado, evitando que este interfira diretamente nos contratos celebrados, substituindo a vontade das partes, livremente pactuada, pela sua. A respeito, doutrina VIRGILE VENIAMIN, em clássica monografia, verbis: ‘En limitand ainsi l'application de la théorie de l'imprévision au cas où elle apparait comme une exigence, de l'harmonieux développement de l'organisation économique, on restreint par Là même consideráblement son étendue. En offrant au juge un critérium objectif, fondé sur les donnés concrètes dégagées grâce à une méthode d'observation directe, à l'aide du matériel préparé par des experts idoines, on évite l'arbitraite auquel la recherche d'une intention malveillante, toujours devinatoire peut fournir l'occasion. En outre, le rapprochement que nous venons de faire dans le présent chapitre, entre la lésion et l'imprévision – toutes les deux ayant le même caractère et répondant aux mêmes nécessités de l'ordre économique – nous indique une limitation technique du pouvoir de juge. Dans les deux cas, ce n'est pas à la révision du contrat qu'on doit aboutir, mais simplement à sa rescision (1). Il n'appartient point au juge d'orienter l'activité humaine en s'immiscant dans la teneur du contrat. Sa mission est terminée, dès qu'en obéissant aux directives économiques, il empêche la ruine de l'individu et lui assure en même temps que sa sauvegarde personnelle, une participation efficace à la collaboration générale’ (In Essais sur les Données Economiques dans L'Obligation Civile, Paris, Libr. Générale, 1931, p. 393-4).”
Ademais, como sabido, os atos e contratos praticados pelo Poder Público, sua validade, extensão e eficácia, somente poderão ser apreciados à luz das regras de direito público, notadamente do princípio da legalidade, hoje insculpido no art. 37 da CF/88.
A respeito, bem lembrou Hartmut Maurer, verbis:
“Le problème principal du contrat administratif, du point de vue juridique, est le principe de la soumission de l'administration à la loi et au droit (Gesetzmässigkeit der Verwaltung). Alors que le droit civil est marqué par le principe d'autonomie des relations entre personnes privées (Privatautonomie) et que, par suite, il est axé précisément sur le contrat, considéré comme moyen d'aménagement des rapports entre individus (Gestaltungsmittel), le droit administratif est dominé par le principe de légalité. Les règles juridiques s'imposant à l'administration régissent de plus en plus étroitement les rapports qu'elle a avec le citoyen, comme le montre l'extension du domaine réservé à la loi, la soumission croissante du pouvoir discrétionnaire à des règles de droit, la reconnaissance de droits subjectifs et le développment de la protection juridictionelle.”
(In Droit Administratif Allemand, traduit par M. Fromont, Paris, L.G.D.J., 1994, p. 378/9, nº 25, c).
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