Apropriação indébita previdenciária: a inconstitucionalidade do crime estabelecido no art. 168-A, parágrafo 1º, inciso II, do Código Penal


Autor: Eduardo Gomes Philippsen

Juiz Federal

 publicado em 16.12.2009

Sumário: Introdução. 1 A apropriação indébita no Código Penal. 2 O não recolhimento das contribuições previdenciárias recolhidas dos empregados, mas não repassadas à autarquia previdenciária. 3 Distinção entre as diferentes hipóteses do art. 168-A. 4 O art. 168-A, parágrafo 1º, inciso II. 4.1 O objeto material do delito. 4.2 O elemento do tipo “ter integrado despesas contábeis”. 4.3 O elemento do tipo “ter integrado custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços”. 5 Crítica doutrinária ao art. 168-A, parágrafo 1º, inciso II. 6 Precedentes jurisprudenciais. 7 A incompatibilidade do tipo penal com o art. 5º, LXVII, da Constituição. 8 A incompatibilidade do tipo penal com o Pacto de São José da Costa Rica. Conclusões.

Introdução

Busca-se, com o presente trabalho, analisar o crime estabelecido no art. 168-A, parágrafo 1º, inciso II, do Código Penal, introduzido pela Lei nº 9.983/2000. Trata-se de uma das modalidades do delito de apropriação indébita previdenciária, a qual, porém, conta com um traço distintivo extremamente relevante: diferentemente das demais condutas tipificadas sob a mesma denominação, o objeto material, aqui, são as contribuições devidas pela própria empresa(1) – e não valores descontados, retidos ou recebidos de terceiras pessoas e que permaneceram na posse da empresa para posterior recolhimento.

A especificidade do tipo em questão parece não ter sido ainda bem percebida por parte da doutrina e da jurisprudência, que, quando o analisam, recorrem às mesmas conclusões – muitas delas já pacificadas nos tribunais – a respeito das demais modalidades delitivas, em especial as previstas no caput e no parágrafo 1º, inciso I, do art. 168-A. De outra banda, alguns precedentes simplesmente afastam o caráter delitivo do inadimplemento das “contribuições patronais” sem uma devida justificação, limitando-se a afirmar que tal fato não caracteriza o crime em análise. Ao nosso ver, a questão relevante não é a subsunção, ou não, do inadimplemento das contribuições “patronais” à conduta descrita no art. 168-A, § 1º, inc. II – o que é induvidoso. A não configuração de crime decorre, sim, das garantias estabelecidas em nosso ordenamento jurídico vedando a prisão por simples dívida.

1 A apropriação indébita no Código Penal

É significativo o fato de o crime em questão ter sido denominado de “apropriação indébita previdenciária”. Buscou o legislador, de forma inequívoca, por meio da nomenclatura do delito, vinculá-lo a um crime já tradicionalmente previsto em nossa legislação e suficientemente estudado e compreendido pela doutrina e pela jurisprudência. Essa vinculação se deve ainda ao fato de que, no período precedente ao da tipificação específica – anterior, portanto, à vigência das Leis nº 8.137/90 e 8.212/91 –, era no crime de apropriação indébita que se buscava a punição daquele que, a despeito de descontar as contribuições previdenciárias dos salários dos empregados, não as repassava aos cofres da previdência.

Vejamos, de forma rápida, algumas questões básicas do tipo originário, assim descrito no art. 168 do Código Penal: “apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou detenção”.

A doutrina indica que o crime de apropriação indébita deita suas raízes do crime de furto; sua instituição como delito autônomo teria ocorrido a partir do Código Penal Francês de 1791, sob a denominação de “abuso de confiança”. No Brasil, os Códigos de 1830 e 1890 continuavam a tratá-lo como uma modalidade do crime de furto, só vindo a receber configuração autônoma no Código Penal de 1940, cuja parte especial ainda vige.(2) Segundo Magalhães Noronha,

“é a apropriação indébita ponto de transição entre os delitos patrimoniais violentos – furto, roubo, extorsão, usurpação e dano, em que a violência à coisa ou à pessoa se apresenta – e os praticados mediante fraude – estelionato e seguintes –, apresentando pontos de contacto e diferenças com os crimes extremos dos arts. 155 e 171”.(3)

No âmbito deste trabalho, importa destacar que a configuração do crime de apropriação indébita (art. 168 do CP) depende da apropriação de coisa alheia móvel que esteja na posse ou detenção do agente. Evidente, portanto, que a tipificação não possui qualquer relação com o inadimplemento de dívidas, porquanto o dinheiro que não sai dos cofres do agente para o pagamento de algum débito não se caracteriza, por óbvio, como coisa alheia. O que se incrimina, enfim, é a lesão do patrimônio alheio por meio de conduta que denota abuso de confiança – daí a denominação do delito escolhida nas legislações francesa e portuguesa.

2 O não recolhimento das contribuições previdenciárias recolhidas dos empregados, mas não repassadas à autarquia previdenciária

A previdência social é financiada por diferentes modalidades de contribuições, algumas delas a cargo das empresas, outras por conta dos trabalhadores, sem falar nas exações que incidem sobre os contribuintes em geral, independentemente do fato de se qualificarem como empregadores ou empregados.

Como forma de facilitar a arrecadação, no caso das contribuições incidentes sobre os salários pagos aos empregados, há longa data a legislação tem estabelecido a responsabilidade dos empregadores de descontarem o valor da contribuição do montante dos salários e repassá-lo ao órgão previdenciário. Essa forma de arrecadação vem se ampliando ao longo do tempo, sendo utilizada, atualmente, não só para as contribuições devidas pelos empregados, mas também em diversas outras hipóteses.(4)

À falta de tipo específico, a conduta do empregador que efetuasse o desconto das contribuições, mas não as repassasse à previdência, era enquadrada no art. 168 do Código Penal, inclusive por força de norma remissiva constante da Lei nº 3.807/60.(5)(6) Assim, por exemplo, manifestou-se o Supremo Tribunal Federal no RE 89345/PR, julgado em 02.03.1979,(7) e no RHC 61201/SC, julgado em 20.09.1983.(8)

Posteriormente, a edição da Lei nº 8.137/90 trouxe a modalidade delitiva ao abrigo do art. 2º, II, que conta com a seguinte redação: “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”.

Pouco depois, entrou em vigor a Lei nº 8.212/91, que instituiu vários tipos penais – alguns deles, inexplicavelmente, sem a cominação de pena – relacionados com fatos jurídicos relevantes do ponto de vista da previdência. Dentre eles, destaco os que possuem ligação com o tema ora abordado:

“Art. 95. Constitui crime:

(...)

d) deixar de recolher, na época própria, contribuição ou outra importância devida à Seguridade Social e arrecadada dos segurados ou do público;

e) deixar de recolher contribuições devidas à Seguridade Social que tenham integrados custos ou despesas contábeis relativos a produtos ou serviços vendidos;

f) deixar de pagar salário-família, salário-maternidade, auxílio-natalidade ou outro benefício devido a segurado, quando as respectivas quotas e valores já tiverem sido reembolsados à empresa;”

Por fim, a Lei nº 9.983/2000 revogou o citado art. 95 da Lei nº 8.212/91 e transferiu ao Código Penal o trato dos crimes de apropriação, introduzindo o art. 168-A, que conta com a seguinte redação:

"Apropriação indébita previdenciária

Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem deixar de:

I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;

II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;

III – pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.

§ 2º É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.

§ 3º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que:

I – tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou

II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais."

3 Distinção entre as diferentes hipóteses do art. 168-A

Como visto anteriormente, não se vislumbra qualquer óbice constitucional ao típico crime de apropriação indébita, que tutela o patrimônio jurídico alheio, agredido pela conduta do agente que, abusando da confiança, toma para si o que não é seu.

Ao apreciar inúmeros processos relacionados com a conduta do empregador de descontar as contribuições devidas pelos empregados, mas não repassá-las à previdência social, firmou-se jurisprudência no sentido de que a criminalização desse fato não viola o art. 5º, LXVII, da Constituição.

Cita-se, a título ilustrativo, os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal:

“EMENTA: HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. CONDUTA PREVISTA COMO CRIME. INCONSTITUCIONALIDADE INEXISTENTE. VALORES NÃO RECOLHIDOS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. ORDEM DENEGADA. 1. A norma penal incriminadora da omissão no recolhimento de contribuição previdenciária – art. 168-A do Código Penal – é perfeitamente válida. Aquele que o pratica não é submetido à prisão civil por dívida, mas sim responde pela prática do delito em questão. Precedentes. 2. Os pacientes deixaram de recolher contribuições previdenciárias em valores muito superiores àquele previsto no art. 4º da Portaria MPAS 4910/99, invocada pelo impetrante. O mero fato de a denúncia contemplar apenas um dos débitos não possibilita a aplicação do art. 168-A, § 3º, II, do Código Penal, tendo em vista o valor restante dos débitos a executar, inclusive objeto de outra ação penal. 3. Ordem denegada.” (HC 91704/PR, 2ª Turma, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 20.06.2008)

“APROPRIAÇÃO INDÉBITA. NÃO RECOLHIMEN, E NÃO CIVIL. INOCORRÊNCIA DE OFENSA AO ART. 5º, LXVII, DA CF. AGRRE improvido.” (RE-AgR 391996/SC, 2ª Turma, rel. Min. Ellen Gracie, DJ 25.11.2003)

Igualmente, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região editou súmula com o seguinte teor: “A pena decorrente do crime de omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias não constitui prisão por dívida” (Súmula nº 68).

Todavia, a análise da jurisprudência demonstra que os casos que embasaram as decisões diziam respeito às hipóteses de apropriação propriamente dita, isto é, de omissão no pagamento das contribuições devidas por terceiros, em relação às quais a empresa já descontara o montante respectivo, quando do pagamento dos produtos ou serviços. Na esmagadora maioria dos casos, trata-se da hipótese de não recolhimento das contribuições descontadas dos salários dos empregados.

Porém, não são todos os delitos previstos no art. 168-A que mantêm as características de uma apropriação indébita. Vejamos.

Os tipos penais definidos no caput e nos incisos I e III do § 1º correspondem, efetivamente, à criminalização da indevida apropriação de valores de terceiros. Tanto o caput como o § 1º, I, têm como objeto a conduta de não repassar à previdência social os valores das contribuições (ou outra importância) que tenham sido “recolhidos” ou “descontados” dos contribuintes (os verdadeiros devedores da contribuição). Trata-se de hipóteses em que o agente, portanto, mantém a posse de recursos financeiros de terceiros para efetuar o pagamento das contribuições devidas por estes, mas não cumpre com o seu encargo.

O inc. III do § 1º, por sua vez, diz respeito à conduta de não “pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social”. Se, nos casos antecedentes, o agente se apropria de valores dos segurados ou contribuintes que eram devidos à previdência, nessa última hipótese tem-se a situação inversa: o agente se apropria de valores pagos pela previdência em favor dos segurados.

Há, por fim, a figura típica do art. 168-A, § 1º, II – a qual repete, em termos gerais, o antigo art. 95, e, da Lei nº 8.212/91. A conduta incriminada, como visto, consiste em deixar de recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços.


4 O art. 168-A, parágrafo 1º, inciso II


4.1 O objeto material do delito


O fato típico caracteriza-se pelo não recolhimento (não pagamento) de parcelas devidas pela empresa, a título de obrigação própria. Não há, portanto, a figura prevista, quer no caput, quer no § 1º, I ou III, do art. 168-A do Código Penal – aí sim a típica ação equiparável à apropriação indébita: nos casos do caput e do inciso I do § 1º, apropriam-se os valores de titularidade dos segurados/contribuintes para o pagamento das suas contribuições, enquanto no caso do inciso III do § 1º são apropriados valores pagos pela previdência em favor do segurado, por meio do tomador dos serviços.

Desse modo, o texto incriminador (do inciso II, § 1º, do art. 168-A) tipifica a simples conduta de não efetuar o pagamento das contribuições devidas à previdência social, com o adendo de que estas "tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços".

Vejamos, agora, as circunstâncias elementares que, a uma primeira vista, limitariam a incidência do tipo penal, porquanto este abarcaria apenas as contribuições que “tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços”.

4.2 O elemento do tipo “ter integrado despesas contábeis”

A primeira circunstância
que aparentemente restringiria a incidência da lei penal – integrar despesas contábeis – é absolutamente irrelevante, porque a própria lei determina que a despesa tributária incorrida seja registrada nos demonstrativos contábeis, independentemente de sua realização.

Explico. Há dois conceitos básicos de contabilidade, para a realização das anotações nos livros contábeis e fiscais: o de regime de competência e o de regime de caixa. Entende-se por regime de competência a contabilização de receitas, custos e despesas em determinado período, independentemente de sua realização em moeda. Já por regime de caixa, tem-se o reconhecimento das receitas, custos e despesas, pela entrada e saída efetiva da moeda.

O regime de competência, "universalmente adotado, aceito e recomendado pela Teoria da Contabilidade e pelo Imposto de Renda", portanto, é aquele que "evidencia o resultado da empresa (lucro ou prejuízo)" contabilizando a receita e a despesa no momento em que foram geradas ou incorridas, independentemente do efetivo pagamento ou recebimento do valor (cfme. MARION, José Carlos. Contabilidade Básica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 78-79).

Nessa linha, a legislação fiscal expressamente determina que os contribuintes adotem o regime de competência em sua contabilidade, ressalvadas algumas exceções. Assim, por exemplo, o Decreto nº 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social) estabelece, em seu artigo 225, § 13, que "os lançamentos de que trata o inciso II do caput, devidamente escriturados nos livros Diário e Razão, serão exigidos pela fiscalização após noventa dias contados da ocorrência dos fatos geradores das contribuições", indicando, já no primeiro inciso, que se deve, obrigatoriamente, "atender ao princípio contábil do regime de competência". E a referência ao inciso II da cabeça do artigo indica a obrigação da empresa em "lançar mensalmente em títulos próprios de sua contabilidade, de forma discriminada, os fatos geradores de todas as contribuições, o montante das quantias descontadas, as contribuições da empresa e os totais recolhidos".

Igualmente, a legislação que disciplina a apuração do lucro real das pessoas jurídicas dispõe expressamente: "os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência" (art. 41 da Lei nº 8.981/95). Tais normas são repetidas no Regulamento do Imposto de Renda (art. 344 do Decreto nº 3.000/99), no qual, diga-se de passagem, constam inúmeras disposições relativas à observância do regime de competência para o lançamento de despesas contábeis.

Evidentemente, haverá casos de receitas escrituradas e não recebidas, bem como de despesas lançadas na contabilidade e que não foram pagas. Para isso, a ciência contábil e a legislação preveem a utilização de vários sistemas de ajustes periódicos. Assim, a receita incorrida e contabilizada, mas não recebida, pode ser posteriormente debitada das receitas de períodos futuros a título de prejuízo; de igual modo, despesas contabilizadas, mas não pagas, podem permanecer no passivo da empresa, porquanto sempre haverá a possibilidade de sua cobrança e pagamento por meio de medidas judiciais.

Portanto, o fato de o débito relativo à contribuição previdenciária ter sido lançada como despesa contábil da empresa – independentemente do recolhimento do tributo – decorre da simples aplicação da própria norma legal que determina a observância do regime de competência na contabilidade da empresa.

4.3 O elemento do tipo “ter integrado custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços”

A segunda circunstância
constante do dispositivo incriminador, que aparentemente restringiria o seu campo de aplicação – ter o valor da contribuição inadimplida integrado custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços, nada restringe, na verdade. Ora, é evidente que todo o custo ou despesa de uma empresa com finalidades lucrativas reflita em seus preços; e esse reflexo não torna a empresa depositária de parte do preço pago pelos seus consumidores.
Nessa linha é pertinente a lição de Andreas Eisele, para quem o crime em questão consiste, na verdade, em simplesmente "deixar de recolher contribuição social (qualquer uma, exceto a devida pelo empregador doméstico – art. 24 da Lei nº 8.212/91)". Isso porque o "seu âmbito de abrangência inclui todos os custos de produção ou despesas contábeis da atividade empresarial, já que todos estes levam em consideração os reflexos econômicos da carga tributária" (Crimes contra a ordem tributária. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 216).

5 Crítica doutrinária ao art. 168-A, parágrafo 1º, inciso II

Substanciosa doutrina interpreta esse artigo como de incerta constitucionalidade, pois configuraria criminalização de dívida própria do contribuinte, afigurando-se a cláusula de “integração em custos” mero expletivo (SILVA, Juary. Elementos de direito penal tributário. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 246).

Faz coro a essa doutrina a lição de Heloísa Estellita Salomão (Crimes previdenciários: arts. 168-A e 337-A do CP – aspectos gerais. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 36, 329-330):

"O tipo penal inserido no dispositivo ora analisado confronta-se abertamente com a vedação de prisão por dívida, já que define como crime o não recolhimento de contribuição devida pela própria empresa."

Também pela inconstitucionalidade do preceito legal é a opinião de Roque Antônio Carraza, citado por Heloísa Estellita Salomão (op. cit., p. 329):

"Conclui o renomado tributarista que, nestes casos, o 'comerciante' – e ele faz referência ao ICMS, mas suas conclusões aplicam-se perfeitamente ao caso das contribuições 'previdenciárias' nesta hipótese – 'não está deixando de recolher, no prazo legal, tributo descontado de terceiro. O tributo é devido por ele (em nome próprio). Ora, dado que 'em nosso ordenamento constitucional não há crime por dívida tributária', não há que se falar em crime."

Referida autora adverte que, ao se considerar presente uma apropriação indébita no caso em análise, por uma questão de coerência haveria de se chegar a idêntica conclusão na seguinte situação: imagine-se a hipótese de um comerciante que embute no preço final do produto o custo da energia elétrica, porém não efetua o pagamento da respectiva tarifa (op. cit. p. 329, nota 56)... Estaria aí incorrendo em apropriação indébita (art. 168 do Código Penal)? A resposta só pode ser negativa, pois o fato de as empresas – todas elas – embutirem nos preços de seus produtos todos os seus custos e despesas não a convertem, por óbvio, em depositárias dos valores cobrados pelos consumidores, dos quais parte deveria ser destinada aos seus fornecedores e credores. O preço dos produtos e serviços, uma vez repassados à empresa, integra patrimônio seu; não há falar, aqui, na posse ou detenção de recursos de terceiros.

6 Precedentes jurisprudenciais

Poucas decisões tratam especificamente do tema ora em análise. Como já foi dito, o número elevado de casos de apropriação indébita previdenciária diz respeito à hipótese do parágrafo 1º, inciso I, isto é, do empregador que retém as contribuições descontadas dos salários de seus empregados (ou prestadores de serviços), mas não as repassa para a previdência.

Especificamente sobre o inadimplemento das contribuições devidas pela própria empresa, duas decisões devem ser citadas.

Já se decidiu que “a mera ausência de pagamento das denominadas ‘contribuições patronais’, por si só, representa simples irregularidade tributária, sanável mediante os meios legais de execução judicial postos à disposição do Estado, não implicando a incidência da figura típica prevista no artigo 168-A do Código Penal”.(9) Da leitura do voto condutor, não se extrai uma análise acerca da modalidade delitiva do art. 168-A, § 1º, inc. II, sua legitimidade constitucional e hipóteses de caracterização do delito.

Por outro lado, a mesma Corte já decidiu que “o mero inadimplemento da cota patronal, SAT e terceiros não se encontra tipificado no inciso I do art. 168-A, porém, pode ser enquadrado no inciso II daquele dispositivo legal, quando demonstrado que tais valores foram lançados na contabilidade da empresa jurídica a título de custos/despesas, circunstância que reflete na redução artificial do lucro da empresa”.(10) Com a devida vênia, tal entendimento não leva em consideração o que já foi exposto sobre a determinação legal da adoção do regime de competência na contabilidade das empresas, isto é – repito –, a anotação das despesas e receitas na competência em que estas foram geradas, independentemente de sua efetivação. Por outro lado, se houver redução artificial do lucro da empresa (em outra hipótese que não a de simples escrituração com base no regime de competência), está-se diante, então, de crime de sonegação fiscal (do imposto de renda e da contribuição sobre o lucro), tipificado no art. 1º da Lei nº 8.137/90, e não de apropriação indébita previdenciária.

7 A incompatibilidade do tipo penal com o art. 5º, LXVII, da Constituição

A Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVII, estabelece que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".

Analisando norma similar do texto constitucional anterior, assim manifestou-se Pontes de Miranda (grifei):(11)

“o que a Constituição proíbe é a pena de prisão por não pagamento de dívidas, de multas ou de custas, e não a prisão como meio para impedir que o que tem a posse imediata de algum bem se furte à entrega dele. (...) Sempre que se trata de dívida, no sentido estrito, e não de entrega do bem alheio, a prisão por dívida é constitucionalmente proibida. Salvo se por dívida de alimentos.”

Como visto acima, o delito do art. 168-A, § 1º, II, não guarda qualquer semelhança com a apropriação tradicionalmente apreciada nos pretórios (art. 168-A, caput e § 1º, I, em sucessão ao art. 95, d, da Lei nº 8.212/91), pois o dispositivo em análise torna crime a simples existência de uma dívida.

Veja-se que há tempos imemoriais (desde a Lex Poetelia Papiria do Direito Romano) não se admite que a inadimplência seja motivo de punição pessoal do devedor.

Poderia se arguir, então, que a proibição constitucional somente restringiria a prisão civil por dívida, não impedindo que a pura e simples inadimplência fosse alçada à condição de crime. Essa argumentação decorreria de uma interpretação literal da garantia constitucional.

Não é essa a melhor interpretação, pois tornaria letra morta a proibição de prisão por dívida; bastaria ao legislador, então, no intuito de burlar a Constituição, erigir como crime o simples fato de inadimplir dívida, para após alegar que a prisão, aí, não seria civil, mas criminal... Na verdade, a essência da garantia em questão parece ser a de que “não haverá prisão por dívida civil”: o qualificativo civil deve se referir à natureza da dívida, e não à da prisão, até mesmo porque, ressalvadas as normas procedimentais, prisão é sempre prisão – representa o ponto máximo de limitação da liberdade de ir e vir, pouco importando que seja qualificada como criminal ou civil. Nesse particular, parece melhor redigida a norma da Constituição de 1934, primeira que tratou do tema: “Não haverá prisão por dívidas, multas ou custas”.

Assim, em nosso ordenamento jurídico, a tutela penal do patrimônio público ou privado não pode avançar a ponto de erigir como criminosa a simples conduta de estar inadimplente.

Veja-se que, nos crimes meramente patrimoniais tradicionalmente tipificados em nosso ordenamento jurídico, e de cuja constitucionalidade não se duvida, há algo mais a justificar o enquadramento da conduta como crime. Jamais configurou crime a simples existência de dívida. Assim, criminalizam-se condutas que implicam lesão ao patrimônio alheio, muitas delas praticadas com fraude (estelionato, furto), com ação clandestina (furto), com violência (roubo, extorsão), com abuso de confiança (apropriação indébita ou o crime do art. 176 do Código Penal), entre outras.

Da mesma forma, nos crimes de sonegação estabelecidos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90, longe se está de tipificar como delito a mera inadimplência desacompanhada de qualquer conduta fraudulenta. As hipóteses delitivas contêm em si a prática de fraude ou falsidade (art. 1º, I a V, art. 2º, I e V), abuso de poder (art. 2º, III), desvio de finalidade (art. 2º, IV) ou abuso de confiança (art. 2º, II – considerando-se, quanto a este último tipo, que ele só se configura quando há omissão de pagamento de tributo devido por terceiro e retido pela empresa na condição de responsável tributário, e não contribuinte – CTN, art. 121, parágrafo único –, sob pena de incorrer-se, aqui também, em prisão por simples dívida). O mesmo se dá com a sonegação das contribuições previdenciárias (art. 337-A do CP), em que o débito do contribuinte é qualificado pela ação fraudulenta.

Assim, o simples fato de possuir um débito fiscal, não acompanhado de qualquer ação fraudulenta, violenta, clandestina, etc, não pode ser qualificado como crime, sob pena de violação ao art. 5º, LXVII, da Constituição. Neste ponto, convergimos com a opinião de Hugo de Brito Machado, segundo a qual:

"Não se diga que a vedação constitucional, porque se reporta apenas à prisão civil, não se opõe à lei ordinária que define como crime o inadimplemento de dívida, para reprimi-lo com pena prisional. Não é assim. A lei ordinária que defina como crime o simples inadimplemento de uma dívida, e comina para o que nele incorre pena prisional, conflita com a norma da Constituição que proíbe a prisão por dívida. Há, na verdade, evidente antinomia entre a norma da Constituição, que proíbe a prisão por dívida, e aquela da lei ordinária, que define como crime o inadimplemento de dívida, para viabilizar, dessa forma, a aplicação da pena prisional ao devedor inadimplente." (MARTINS, Ives Gandra da Silva [coord.]. Crimes Contra a Ordem Tributária. 3. ed. São Paulo: RT, p. 128-129)

Também nessa linha, em análise ao art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90 – que se assemelha, em termos, ao tipo ora em análise –, manifestou-se o ex-Procurador-Geral da República Aristides Junqueira Alvarenga, para quem "não se sanciona penalmente a mera falta de recolhimento de tributos, a não ser quando ela se verifica mediante fraude, reveladora de conduta dolosa" (Crimes Contra a Ordem Tributária, op. cit, p. 62).
Por fim, convém mencionar o pensamento de Heleno Cláudio Fragoso acerca da necessária distinção entre o simples inadimplemento do tributo e o não pagamento qualificado pela fraude:

"(...) a incriminação da fraude fiscal constitui, num país como o nosso, importante elemento de uma séria política tributária. Esse tipo de ilícito, entre nós, não ofende o mínimo ético, e o cidadão não tem consciência de que o cumprimento da obrigação tributária constitui um dever cívico, cuja transgressão ofende gravemente a economia pública, e, pois, interesses fundamentais da comunidade. A violação desse dever pode apresentar-se como simples atitude passiva de descumprimento da obrigação tributária, fato adequadamente sancionado através de medidas de natureza administrativa (multa). Todavia, pode apresentar maior gravidade, quando o descumprimento da obrigação se realiza por meio do engano e da fraude, com o emprego de meios tendentes a induzir em erro a autoridade, iludindo o pagamento do tributo. Em tais casos, é imperativa a sanção penal, que existe em muitos países, de longa data." (in Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal, 12/67-68, a. III, jan./mar. 1966, apud Crimes... op. cit, p. 54)

8 A incompatibilidade do tipo penal com o Pacto de São José da Costa Rica

Ainda que a ilegitimidade do tipo penal já se extraia da violação ao art. 5º, LXVII, da Constituição, há outro empecilho jurídico para a criminalização do simples inadimplemento de um débito. Com efeito, vige em nosso ordenamento jurídico a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica, ratificado, sem reservas, pelo Brasil e promulgado pelo Decreto nº 678/1992. O art. 7º, parágrafo 7, da Convenção assim prescreve: “Ninguém deverá ser detido por dívida. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar”.

Como visto, a literalidade do texto é mais abrangente do que a garantia constitucional. E não nos referimos, aqui, às exceções autorizadas (em que a convenção limita à inadimplência da obrigação alimentar, enquanto nossa Constituição também afasta a garantia ao depositário infiel); o texto convencional veda a prisão por dívida, sem qualquer qualificativo acerca da natureza da prisão. Assim, eventual argumentação sobre ser a prisão civil ou criminal – o que seria viável em face do texto constitucional, embora improcedente, conforme acima expusemos – não tem espaço algum em face da norma em comento.

Por óbvio, a garantia em questão não afasta a punição penal quando se está diante de lesões ao patrimônio alheio – como ocorre no caso do furto, da apropriação indébita propriamente dita, do estelionato, etc. Porém, como o art. 168-A, § 1º, II, criminaliza a inadimplência de débito próprio, há flagrante contrariedade entre os dispositivos.

Como resolvê-la? O Pacto de São José da Costa Rica vigora em nosso ordenamento desde 1992. Já o tipo penal em análise, criado pela Lei nº 8.212/91, foi renovado pela Lei nº 9.983/2000, que o deslocou para o Código Penal. Assim, se se considerar que o tratado tem a mesma hierarquia que a legislação infraconstitucional, sendo revogado por norma legal interna posterior – tese tradicional de nossa jurisprudência, desde o julgamento do Recurso Extraordinário nº 80.004(12) –, a edição da Lei nº 9.983/2000 teria derrogado a garantia convencional, ao menos no que diz respeito às dívidas decorrentes de contribuições previdenciárias da empresa.

Ocorre, porém, que o Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu entendimento – e justamente em face do Pacto de São José da Costa Rica –, outorgando a esse tratado hierarquia supralegal, afastando a aplicação da norma legal que o contrarie, seja ela anterior ou posterior. Cito, nesse sentido, o julgamento do Habeas Corpus nº 88.240, que conta com a seguinte ementa:

“Há o caráter especial do Pacto Internacional dos Direitos Civis Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ratificados, sem reserva, pelo Brasil, no ano de 1992. A esses diplomas internacionais sobre direitos humanos é reservado o lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior, seja posterior ao ato de ratificação.”(13)

Desse modo, se não bastasse a garantia constitucional, também a norma convencional impede a aplicação do tipo penal do art. 168-A, § 1º, inc. II, do Código Penal.

Conclusões

1) O tipo penal do art. 168-A, § 1º, inc. II, do Código Penal criminaliza a conduta de não efetuar o pagamento de dívida própria; as circunstâncias elementares de que as contribuições não pagas “tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços” são irrelevantes para essa conclusão.

2) O crime em comento, portanto, difere fundamentalmente da apropriação indébita clássica (art. 168 do Código Penal), bem como das demais hipóteses de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, caput, § 1º, inc. I e III) – estas, sim, configuram propriamente uma forma de apropriação de valores de terceiros.

3) Eventual supressão ou redução indevida de tributos decorrente da contabilização, como despesas contábeis, de contribuições não pagas – na hipótese de esse procedimento não ser admitido pela legislação (o que não é a regra atual) –, encontra tipificação no delito do art. 1º, I e II, da Lei nº 8.137/90.

4) A jurisprudência pacífica, inclusive com precedentes do STF e Súmula do TRF da 4ª Região, formou-se a partir da apreciação de casos de apropriação propriamente dita (art. 168-A, caput, § 1º, inc. I e III), e não do crime do art. 168-A, § 1º, II, do Código Penal.

5) A criminalização da conduta de não pagar dívida própria esbarra na norma do art. 5º, LXVII, da Constituição, entendendo-se que a vedação em tela proíbe não só a prisão civil por dívida, mas, sim, a prisão por dívida civil – impedindo, consequentemente, que o legislador erija como crime o simples fato de estar inadimplente.

6) Ainda que não bastasse a vedação constitucional, o crime do art. 168-A, § 1º, II, do Código Penal viola frontalmente a norma do art. 7, item 7, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, pela qual “ninguém deve ser detido por dívida”. Referida convenção foi incorporada ao direito interno brasileiro a partir da publicação do Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, e, segundo o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, goza de hierarquia supralegal, paralisando a eficácia da legislação interna contrária, inclusive a editada posteriormente.

Bibliografia

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NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. v. 2. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1965.

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SILVA, Juary. Elementos de direito penal tributário. São Paulo: Saraiva, 1998.

Notas

1. De forma atécnica, tem-se utilizado a expressão “contribuição patronal” para caracterizar o débito próprio da empresa, distinguindo-o das contribuições que, devidas por empregados ou terceiros, a empresa deve recolher na condição de mero agente repassador.

2. HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao Código Penal. v. 7. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 126-127.

3. NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. v. 2. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1965. p. 384.

4. Os artigos 30 e 31 da Lei nº 8.212/91 estabelecem várias situações em que a empresa é obrigada a efetuar o papel de agente retentor das contribuições devidas por terceiros, descontando-as da remuneração ou pagamento devido a estes, para posteriormente repassá-las à previdência. É o que ocorre, por exemplo, com as contribuições devidas pelos trabalhadores avulsos, pelos contribuintes individuais prestadores de serviços, pelos produtores rurais, por empresas cedentes de mão de obra, etc. Nestas hipóteses, a empresa tomadora dos serviços ou adquirente dos produtos fica com a posse de valores de terceiros e com o encargo de efetuar o pagamento das contribuições respectivas.

5. O art. 86 da Lei Orgânica da Previdência Social – Lei nº 3.807/60 – assim dispunha: “Será punida com as penas do crime de apropriação indébita a falta de recolhimento, na época própria, das contribuições e de outras quaisquer importâncias devidas às instituições de previdência e arrecadadas dos segurados ou do público. Parágrafo único. Para os fins dêste artigo, consideram-se pessoalmente responsáveis o titular da firma individual, os sócios solidários, gerentes, diretores ou administradores das emprêsas incluídas no regime desta lei.”

6. Aparentemente, a primeira norma do gênero foi o Decreto-Lei nº 65/1937, que, regulamentando o recolhimento das contribuições devidas aos Institutos e Caixas de Aposentadorias e Pensões, dispunha o seguinte em seu art. 5º: “O empregador que retiver as contribuições recolhidas de seus empregados e não as recolher na época própria incorrerá nas penas do art. 331, nº 2, da Consolidação das Leis Penais, sem prejuízo das demais sanções estabelecidas neste decreto-lei”.

7. RE 89345/PR, 2ª Turma, rel. Min. Moreira Alves, j. 02.03.1979, DJ 19.04.1979.

8. RHC 61201/SC, 1ª Turma, rel. Min. Soarez Muñoz, j. 20.09.1983, DJ 16.12.1983.

9. ACR 2002.72.00.010449-0/SC, 8ª Turma do TRF da 4ª Região, rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, DJ 14.07.2004.

10. ACR 2002.71.07.013033-5/RS, 8ª Turma do TRF da 4ª Região, rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJE 10.01.2008.

11. Comentários à Constituição de 1967, Com a Emenda nº 1 de 1969. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987. p. 264-265. Tomo V.

12. “De setembro de 1975 a junho de 1977, estendeu-se, no plenário do Supremo Tribunal Federal, o julgamento do Recurso Extraordinário 80.004, em que assentada, por maioria, a tese de que, ante a realidade do conflito entre tratado e lei posterior, esta, porque expressão última da vontade do legislador republicano, deve ter sua prevalência garantida pela Justiça – sem embargo das consequências do descumprimento do tratado, no plano internacional.” REZEK, Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar.7. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 106-107.

13. HC 88.240/SP, 2ª Turma, rel. Min. Ellen Gracie, DJ 23.10.2008.

 

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., dezembro. 2009. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS