Parecer: Contrato. Intenção das partes. Interpretação. Exame na via extraordinária. Descabimento.(1)


Autor: Carlos Thompson Flores(2)

Ministro aposentado e ex-Presidente do STF

 publicado em 30.08.2011
Breve exposição dos fatos e dos procedimentos judiciais deles originados

1. Para o devido exame das questões de direito suscitadas pelas partes, impõe-se, ainda que de forma sumária, a reconstituição dos fatos e de como foram eles apresentados, discutidos e apreciados pelos decisórios até agora proferidos nas instâncias judiciais ordinárias.

Faço-o à vista não dos autos, mas das peças deles xerocopiadas, as quais me foram encaminhadas pela consulente.

2. Por sua inteira fidelidade com elas, as xerocópias, permito-me transcrever a parte expositiva do despacho presidencial, da lavra do nobre Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Gentil do Carmo Pinto, ao admitir, parcialmente, o recurso extraordinário, manifestado pelas duas cooperadas, autoras das ações declaratórias e rés na ordinária contra elas intentada pela Cooperativa.

Diz (fls. 1052-7):

“1. Versam os autos três ações conexas, uma delas com reconvenção, precedidas e seguidas de medidas cautelares atípicas (Feitos nos 2303/80, 3517/80 e 3641/80), além de exceções de incompetência (Apenso nº 2844/80/1) e de suspeição (Apenso nº 2844/80-III), já julgadas.

Na primeira, a Usina Central do Paraná S.A. – Agricultura, Indústria e Comércio move ação declaratória contra a Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo – Copersucar (Feito nº 2705/80) objetivando a declaração da inexistência de direito (e correspondente relação jurídica) da Ré ao recebimento para comercialização de sua produção de açúcar e álcool enquanto, segundo critério previsto na CC-DE-022/79-80, incorporada ao Protocolo de 14.08.1979, que foi plenamente obedecido na safra 1979/1980, mas modificado unilateralmente pela Copersucar, tornando mais onerosa a atividade da Autora. Invocando o artigo 1.092 do Código Civil, pede também o direito de comercializar diretamente sua produção.

Nessa ação a Copersucar ingressou com pedido reconvencional, postulando a condenação da Usina Central do Paraná S.A. no pagamento do débito em aberto de Cr$ 2.113.255.305,02 (atualizado em 04.11.1980), sobre o qual deverão continuar a incidir juros e correção monetária até final liquidação.

Na segunda, a Central Paulista de Açúcar e Álcool Ltda. também move ação declaratória negativa contra a Cooperativa Central de Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo – Copersucar (Feito nº 2844/80), visando igual declaração objetivada no Feito 2705/80, com relação aos ajustes entre essas entidades.

Na terceira, finalmente, a Cooperativa Central de Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo – Copersucar move ação ordinária contra A Central Paulista de Açúcar e Álcool Ltda. (Feito nº 3595/80), pleiteando a entrega de toda a produção da cooperada-ré à cooperativa-autora, já realizada ou a realizar-se, para a comercialização, até o encerramento da safra agrícola 80/81. Pede, também, seja a Ré obrigada a assinar contrato regulamentar, sob pena de suprir-se por provimento judicial, e condenada a pagar pena pecuniária moratória por dia de atraso na entrega.

2. A r. sentença de fls. 467-537 julgou improcedentes as ações declaratórias movidas pela Usina Central do Paraná S.A. – Agricultura, Indústria e Comércio e Central Paulista de Açúcar e Álcool Ltda. contra a Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo – Copersucar, condenadas as Autoras nas custas, despesas judiciais e honorários à base de 10% sobre o valor das causas (Feitos nos 2705/80 e 2844/80). Por outro lado, julgou procedente a ação ordinária movida pela Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo – Copersucar contra a Central Paulista de Açúcar e Álcool Ltda., condenando a ‘Ré a entregar toda a produção de açúcar e álcool, na safra 1980/81, à Autora, apurando-se, com perdas e danos, pelas vias próprias, em execução de sentença, por artigos, eventual impossibilidade parcial ou total’. Determinou, também, que a Ré ‘assine, no prazo de quinze dias, o contrato regulamentar de disposições estatutárias e de assunção de outras avenças, conforme minuta das fls. 140-4 do proc. 3595/80, sob pena de ser a assinatura suprida pelo trânsito em julgado desta decisão ex vi do artigo 641 do Código de Processo Civil’. Condenou, ainda, a Ré ‘a pagar a pena pecuniária de 0,138% sobre o montante equivalente a 60% de sua produção não entregue diretamente à Copersucar, na safra 1980/81, pena essa somente cabível após o trânsito em julgado desta sentença salvo hipótese de impossibilidade onde tudo se converterá em perdas e danos’. Pagará a Ré, outrossim, despesas processuais e honorários advocatícios à base de 10% sobre o valor atribuído à causa (Feito nº 3595/80). Finalmente, julgou procedente também a reconvenção interposta pela Cooperativa Central de Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo – Copersucar contra a Usina Central do Paraná S.A., Agricultura, Indústria e Comércio, condenando a reconvinda a pagar à reconvinte ‘a importância de Cr$ 2.113.255.305,02, saldo apurado até 04.11.80, incidindo, após essa data, juros e correção monetária nos termos contratados, além de custas e despesas processuais eventualmente dispendidas, bem como honorários advocatícios de dez por cento (10%) sobre o valor assim fixado’ (Feito nº 2705/80).

Entendeu a sentença que as cooperadas, tendo em vista a finalidade e as atribuições das cooperativas e, na espécie, determinação estatutária da Copersucar (artigo 28, letra d, do documento 10), se subordinam ao cumprimento fiel das deliberações do Conselho de Administração, cujas circulares expedidas e o Protocolo de 14.08.1979 desautorizavam as pretensões postuladas nas iniciais dos Feitos nos 2705/80 e 2844/80. Assim, no que concerne ao Feito nº 2705/80, o fato da reconvinda deixar de entregar à reconvinte a totalidade de sua produção da safra 1980/81, ora em causa, colocando à disposição desta apenas 40% da produção de açúcar e álcool e comercializando diretamente os restantes 60%, ensejou o vencimento antecipado de toda a dívida da Usina Central do Paraná S.A., nos termos das cláusulas 9ª e 10ª, letra d, do instrumento das fls. 45-50, do respectivo processo. Por último, quanto à ação movida pela Copersucar (Feito nº 3595/80) contra a Central Paulista de Açúcar e Álcool Ltda., entendeu devida, no caso – não obstante amparada por medida cautelar em razão do fumus boni juris e do periculum in mora –, a entrega à Autora da produção da cooperada-ré, não só por se consubstanciar em obrigação decorrente de sua condição de associada, como também em face da dívida confessada e de outras avenças. Cabível, outrossim, ‘a determinação da assinatura do contrato regulamentar de disposições estatutárias e de assunção de outras avenças, além da assertiva de que o critério da CC-DE-022/79/80 se limitou à safra 1979/80, incidindo na safra em lide, de 1980/81, a deliberação vigente do Conselho de Administração (documento oito)’.

3. A Egrégia Segunda Câmara Civil deste Tribunal, por votação unânime, deu provimento parcial ao recurso da Usina Central do Paraná, Agricultura, Indústria e Comércio, retificando o débito, em 04.11.1980, para Cr$ 2.026.189.514,46, uma vez reconhecido pela reconvinte à fl. 441. Negou provimento, porém, aos demais recursos, mantendo a r. sentença de primeiro grau, posto que, em resumo, evidente a conexão das ações e pertinentes os pedidos articulados na ação e na reconvenção movidas pela Copersucar, além de correta a fundamentação e a parte dispositiva da sentença (fls. 943-954).

4. Embargos de Declaração, interpostos pelas partes (fls. 956-957 e 959-963), foram rejeitados unanimemente (fls. 966-969).

5. Inconformadas, interpõem as vencidas recurso extraordinário, com apoio no artigo 119, inciso III, letras a e d, da Constituição da República, alegando que o venerando acórdão negou vigência a direito objetivo da União (artigos 85, 115 e 960 do Código Civil; artigo 811 do Código de Processo Civil; e artigos 83 e 49, inciso I, da Lei nº 5.764/71), além de divergir de decisões firmadas pelo Colendo Supremo Tribunal Federal e pelo Egrégio Tribunal de Alçada Civil de São Paulo (fls. 971-1.017).

Houve impugnação às fls. 1.020-1.049.”

3. Complementando o despacho transcrito, acrescento que, em disposições derradeiras, itens VI e VII, fls. 1.010 e s., a inconformação última sustenta, ainda:

a) que o decisório recorrido dissentiu da Súmula 121 e de julgados que indica, quando admitiu capitalização de juros semestrais, a serem computados na execução sobre o saldo devedor da Usina Central do Paraná; e

b) que os julgados impugnados, ao condenarem as vencidas em honorários de advogado, corrigidos monetariamente a partir do ajuizamento das causas, invocando a Lei 6.889, de 08.04.81, divergiram de duas decisões do Egrégio Supremo Tribunal Federal que indicam, as quais consideraram que a correção proporcionada por aquela lei incide a partir da vigência do citado Diploma.

4. A essa altura do processamento recursal, ou seja, na fase das razões finais, é que a recorrida postula o presente parecer, formulando questionário de seu interesse, a ser respondido.

II Do Recurso Extraordinário e sua apreciação

A) Considerações preliminares

1. Posto que admitido o excepcional apenas em uma pequena porção do decisório recorrido – capitalização dos juros semestralmente e incidência retroativa da Lei nº 6.889/81 sobre as custas e honorários de advogado –, cabe à Eg. Instância Suprema o exame das demais questões suscitadas na irresignação, embora não admitidas no despacho presidencial, ainda que sem interposição de agravo. É o que dispõe a Súmula 528.

2. Todavia, como é óbvio, mister se faz que, sobre cada uma das partes autônomas do julgado impugnado, ocorram todos os pressupostos que o recurso sustenta. É o que, ademais, ficou assentado no julgamento dos ERE nº 65.619-RS, em 20.10.71, Plenário, in RTJ, 61/682 e s., e do RE nº 91.145-RS, de 06.11.79, 1ª Turma, in RTJ, 95-404 e s.

3. Impõe-se, dessarte, o acurado exame de todas as questões compreendidas na inconformação.

Assim se passa a fazer, em seguimento.

B) Análise de todas as questões objeto do recurso

1. Penso que, com absoluto acerto, se conduziu o despacho presidencial, ao inadmitir o recurso nas suas partes essenciais. Posto que conciso, como convém, se fez ele exato e preciso, ao abordar as questões suscitadas.

Subscrevo-o, no particular, e tenho como integrados neste parecer os fundamentos ali aduzidos.

2. A longa e habilidosa argumentação deduzida na petição de recurso, em quarenta e seis laudas datilografadas, bem revela o esforço dos nobres causídicos que a firmaram.

Ingrata tarefa, porém, que se propuseram, dado que, jamais, data venia, lograriam demonstrar a ocorrência dos pressupostos do extraordinário, na sua parte medular, por que inexistentes.

3. O primeiro fundamento do recurso, o qual, se acolhido, tornaria sem objeto o restante das demais impugnações, residiu em que o acórdão impugnado negara vigência ao art. 85 do Cód. Civ. e dissentira do que ficou decidido pelo Eg. STF, por sua 2ª Turma, no RE nº 78.946, cuja xerocópia ofereceram.

3.1. Aí assentaram as recorrentes vencidas todo o peso de sua argumentação.

Começam por acoimar os decisórios de primeiro e segundo graus como em franca contradição com aqueles que apreciaram os procedimentos cautelares. Todavia, não extraíram daí a conclusão necessária, a qual seria, então, a sua nulidade.

Dela, da contradição, se servem como argumento de reforço quando veem e sustentam que o acórdão impugnado adotou (...) critério legal errôneo para interpretação de dispositivo fundamental em sua natureza, desrespeitando claramente a intenção das partes, inclusive do poder público, ali interveniente em sua celebração (fl. 981), o que importou negar aplicação ao citado artigo.

E assim o concluem e repisam, após proceder ao exame dos ajustes e demais documentos vinculadores das partes, para deles extrair sua intenção, contrariamente àquela reconhecida pelas decisões atacadas.

3.2. Todavia, em nenhuma das faltas apontadas incidiram os decisórios comentados.

3.3. Primeiramente, antinomia não poderia ocorrer entre elas, as decisões, porque promanam de premissas diversas. Nas cautelares, proferidas em procedimentos autônomos, o objeto é, apenas, a segurança, e assentam no fumus boni juris e no periculum in mora.

Ditos procedimentos, por sua própria índole, repousam no mero juízo de probabilidades ou verossimilhança, e os vereditos neles proferidos guardam o cunho de provisoriedade. Não examinam, por isso, em caráter definitivo, a relação jurídica em debate. Esta é guardada para o processo de conhecimento, quando o mérito de todas as questões, na amplitude do contraditório, ensejará juízo seguro e definitivo do direito deduzido pelas partes. Essa é a lição da doutrina, tão bem exposta por Carnelutti (Instituziones del Nuevo Proceso Civil Italiano, trad. de J. Guasp, 1942, p. 62). Tal princípio foi incorporado ao nosso direito positivo, por meio dos arts. 807 e 810 do Cód. Proc. Civil.

A propósito escreve o Prof. Galeno Lacerda (Com. ao CPC, Forense, VIII, t. I, nº 78, p. 422):

“Como o juízo cautelar considera apenas a verossimilhança do direito, e não sua existência real, preocupado com a segurança aparente, e não com a declaração do direito, segue-se sua nenhuma influência sobre o julgamento definitivo da lide.”

Não haveria, dessarte, como invalidar os decisórios impugnados, por sua pretensa antinomia ou contradição com aqueles proferidos nos juízos cautelares.

3.4. Igual sorte é de se atribuir à arguida negativa de vigência do art. 85 do Cód. Civil.

E isso porque, da prova documental comprobatória da vinculação entre os litigantes, desvirtuada teria ficado a intenção por eles manifestada.

3.5. Diz, textualmente, o citado art. 85:

“Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem.”

Dele decorre que somente quando as palavras se oferecem imprecisas na declaração de vontade é que se há de ir em busca de sua intenção.

Assim assinala Clóvis, com a sua habitual concisão (Cód. Civ. Com., I, 4. ed., p. 235):

“A lei, por isso, manda atender, de preferência, à intenção, desde que haja elementos para determiná-la, fora da expressão verbal imperfeita, indecisa, obscura ou insuficiente.

Esse preceito é mais do que uma regra de interpretação. É um elemento complementar do conceito do ato jurídico. Afirma que a parte essencial ou nuclear do ato jurídico é a vontade. É a ela, quando manifestada de acordo com a lei, que o direito dá eficácia.”

Era mister, pois, que as recorrentes mostrassem, em princípio, quais as expressões decorrentes das declarações de vontade, vinculadoras das partes, que apresentavam aqueles atributos negativos, ou seja, expressões imprecisas, obscuras ou insuficientes, para, por outros meios, desprezando-as, buscar a intenção da vontade, literalmente mal redigida.

A propósito pontifica Orozimbo Nonato, ao votar no RE nº 4.765, em 20.10.42, in DJ de 27.03.43, p. 1.588: “A regra do art. 85 do Código Civil compreende apenas os casos de emprego de palavras impróprias, errôneas, inajustáveis à intenção comum das partes...”

Não reconheci que assim tenham procedido as recorrentes. Na extensa petição recursal nada apontam com respeito ao linguajar utilizado nos protocolos, confissões de dívida e ajustes outros, expressões que fossem defeituosas para justificar a busca da intenção que norteara a vontade das contratantes, antes que as expressões literais de que se serviram.

Ao contrário, o que se percebe, e sem qualquer dificuldade, o que visam as inconformadas é reapreciar a prova, já considerada nas instâncias ordinárias, a procura de conclusão diversa daquelas a que chegaram os julgados impugnados. E isto sob a insistente pretensão de perquirir a vontade real das partes.

A respeito deliberou o STF, em acórdão da lavra do saudoso Min. Hahnemann Guimarães, ao julgar o RE nº 13.071, em 18.05.48, verbis:

“(...) Embora a convenção produza entre as partes efeitos iguais ao da lei, a hermenêutica contratual não enseja recurso extraordinário, porque a indagação da vontade dos contratantes é questão de fato.” (os grifos são nossos) (Rev. Forense, 131/ 105)

Tudo, pois, está a mostrar a inviabilidade, no ponto, do recurso extraordinário, nos termos da jurisprudência extratificada da Suprema Corte, consubstanciada na Súmula 279, a qual, para o caso, pode aliar-se à de nº 454, em face das cláusulas e condições de certos ajustes.

3.6. Mais não seria necessário acentuar para concluir pela inviabilidade do reexame propugnado pelas inconformadas.

Todavia, e somente por exagero, examine-se onde se alicerçou a conclusão da longa e minuciosa sentença, no estudo e na análise da vasta prova carreada para os volumosos autos. Das fls. 522 a 529, demorou-se o magistrado no exame e no confronto dos documentos, para assim concluir (fls. 529, infra, 530):

“(...)

Desta peroração se infere o sequencial raciocínio de que a liberdade de deliberação do Conselho Administrativo era ampla, devendo ser acatada essa deliberação (item 8.6.2) sob pena de se permitir a ingerência indevida em questões só atinentes à Cooperativa, de cuja administração é partícipe o Grupo Atalla, nos termos do permissivo no art. 27, a, dos Estatutos (documento dez). Aliás, o próprio Jorge Wolney Atalla participou como Presidente da Copersucar, sob cuja égide, aliás, os débitos das Usinas aumentaram.

8.7.5. Inexiste qualquer convenção específica que determine a fixa obediência, para os financiamentos futuros do sistema em vigor pelo documento seis (CC-DE-022-79-80); item 6.1.S – proc. 2705/80.

Referida circular (documento seis) apenas se vincula à safra 1979/80, vigendo para a safra de 1980/81, em lide, outra sistemática (documentos oito e sete), dentro do permissivo do protocolo básico e do específico: aquele que estiver vigorando na oportunidade do financiamento, consoante documentos um e dois (vide itens 8.7.1 e 8.7.2).

Assim o aval e os financiamentos da entressafra, incluídos no documento seis, tiveram aplicação na safra 1979/80, excluídos, pelo livre critério do Conselho de Administração, já analisado, para a safra 1980/81. Não estando previsto financiamento específico para o aval ou para o período de entressafra, nos protocolos básicos, qualquer alteração é passível de ser aceita, considerando-se que o interesse econômico e social da Cooperativa há de ser preservado.”

E, concisamente, confirmando a sentença no particular, consignou o acórdão (fls. 946-7):

“(...)

3. Para melhor compreensão da hipótese sub judice, convém lembrar que o Sr. Jorge W. Atalla presidiu anteriormente a Copersucar e carreou vultosos recursos a suas usinas, colocando em situação difícil a Copersucar.

A finalidade do Protocolo, firmado pelo Governo Federal, por bancos e por entidades financeiras, foi a de resolver a situação difícil da Copersucar e, ao mesmo tempo, assegurar ao Grupo devedor condições para honrar sua dívida. Daí o empréstimo de capital de giro à Copersucar, equivalente a US$ 100.000.000,00. Mas era para favorecê-la, e não para prejudicá-la nem para prejudicar os demais cooperados.

Interpretando as avenças bilaterais (item 2, letra a, do Protocolo de 14.08.79), constata-se que não houve obrigação da prestação de aval e de efetuar a liquidação das obrigações garantidas, devendo a Copersucar, de acordo com as disposições estatutárias, seguir o critério ‘que estiver vigorando na oportunidade desses financiamentos’. A responsabilidade assumida para a liquidação das obrigações dizia respeito às então existentes e não às futuras, tanto que a letra c do item 2 do Protocolo estabeleceu que a Cooperativa se obrigava ‘pelo resgate das letras de câmbio sacadas pelo Grupo Atalla, descontadas no mercado financeiro, isso por estarem seus valores incluídos no débito confessado pelo Grupo Atalla’ (cf. fls. 44).

A melhor interpretação das avenças (art. 85 do Código Civil) não podia deixar de levar em conta a função da Cooperativa, que sempre foi a de comercializar as safras no interesse geral de todos os cooperados e, portanto, considerar a situação mutante em cada safra e as contas em aberto de cada cooperado.

Por isso as Usinas do Grupo Atalla foram classificadas de acordo com o art. 28, letra c, pelo crescimento da dívida e pela insuficiência de produção estimada para solver os débitos parciais.

Não se diga que as sanções seriam estatutárias apenas. O art. 83 da Lei nº 5764 menciona a entrega da produção para a comercialização pela cooperativa. O cooperado pode sofrer sanção estatutária como sócio. Mas, havendo ajuste especial, coexistem obrigações de direito comum a par das sociais.”

Considere-se o cuidado e a meticulosidade com que os julgados, em parte transcritos, mas, mais amplamente, deduzidos em sua fundamentação, apreciaram todos os subsídios informativos contidos nos autos, para firmar suas conclusões.

Seria agora viável que, na via estreita do recurso extraordinário, viesse o Eg. Supremo reapreciar e rever todos esses elementos informativos, em busca de conclusão outra, sob pretexto de violação do art. 85, porque desvirtuada a intenção manifestada pelas partes, por meio de palavras que não exprimiriam sua vontade porque impróprias, imprecisas, obscuras ou imperfeitas? A resposta há de ser, evidentemente, negativa. E, assim, impertinente, nessa porção, o recurso.

3.6. De outra parte, inocorre dissídio entre o julgado recorrido e o único padrão indicado – o RE nº 78.946-MG, de 14.06.76, da 2ª Turma.

Formalmente, não atenderam as inconformadas às exigências do art. 322 do RI do STF, fazendo a transcrição dos trechos que configurem o dissídio. Limitaram-se a copiar os votos vencedores, o que não é bastante.

Ademais, substancialmente, manifesto é que ausentes as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados (artigo citado, última parte).

Outrossim, impendia aos firmatários da petição recursal nela mesma procederem ao cotejo analítico entre o acórdão recorrido e o padrão indicado, pois dele é que deve surgir a diversidade na aplicação do direito federal, partindo, como é óbvio, de idênticos ou semelhantes pressupostos. Por isso, nesta precisa síntese, resumiu o eminente Min. Moreira Alves a jurisprudência da Corte: “Não há divergência entre julgados que dissentem na conclusão, por partirem de premissas de fato diversas” (RE nº 88.040-SP, de 25.10.77, 2ª Turma, in RTJ, 88/325-33).

In casu, ambos os decisórios, o recorrido e o paradigma, fizeram aplicação do art. 85 do Cód. Civil.

No último, o recurso resultou conhecido e provido, porque, do exame de duas cláusulas de um contrato, as instâncias ordinárias se teriam afastado da vontade intencional dos contratantes, desvirtuando o fim da avença, embora dois dos juízes, e que ficaram vencidos, considerassem não ser caso de recurso extraordinário, fundados nas Súmulas 456 e 279.

Aqui as decisões atacadas perquiriram a vontade das partes interessadas, não só no exame dos textos que as vincularam, os quais não julgaram serem ambíguos ou imprecisos, como nos demais elementos informativos, na busca da intenção por elas, partes, revelada.

Imprestável, pois, o padrão indicado para testemunhar o dissídio pretoriano pretendido.

4. Igual sorte é de se atribuir à arguição das recorrentes de negativa de aplicação do art. 115, in fine, do Cód. Civil, uma vez que o aresto impugnado teria admitido submissão total das recorrentes à recorrida, contra a intenção e o espírito dos protocolos.

Como já ficou exaustivamente demonstrado nas considerações anteriores, tanto o acórdão como a sentença rejeitaram a condição potestativa, e o fizeram na busca da intenção das partes, manifestada, segundo elas, sem qualquer arbitrariedade.

Não havia, assim, motivo algum para a invocação da falta referida, por isso, com propriedade, a desprezou o despacho presidencial, cujos termos, por exatos, os transcrevo, no particular.

Diz (fls. 1.060-1):

“(...)

Sem consistência essa dedução dos recorrentes. O venerando acórdão recorrido não só não negou a sujeição ao arbítrio de uma das partes como também deixou claro terem as recorrentes, assim como os demais cooperados, aderido livremente aos regulamentos da Copersucar, cuja função ‘sempre foi a de comercializar as safras no interesse geral de todos cooperados e, portanto, considerar a situação mutante em cada safra e as contas em aberto de cada cooperado’ (fl. 947).

Promana do aresto recorrido, ainda, que os cooperados entre os quais se incluem as recorrentes foram representados no Protocolo pela Copersucar, de molde a evidenciar a presença da ‘convergência de vontades’, fundamentando:

‘O decantado empréstimo de cem milhões de dólares (ou equivalente em moeda nacional) destinou-se a tentar salvar acima de tudo a Copersucar permitindo financiar os cooperados (também o Grupo Atalla) para salvar a ela, vítima de anteriores gestões ruinosas. O Protocolo não contém disposição alguma no sentido de perpetuar as facilidades até então usadas pelo Grupo Atalla. Nem tampouco o direito a consumir o capital de giro posto à disposição da Copersucar.

Portanto, a exigência maior não ofende ao pactuado, mas antes com ele se concilia, pela convergência de vontades que é matéria prima fundamental do direito (v. Carnelutti – Metodologia do Direito, p. 42-43)’" (fl. 948).

5. Sustentam, a seguir, as recorrentes que o acórdão impugnado, ao reconhecer a existência da mora, sem que tivesse ela se verificado, denegou vigência ao art. 960 do Cód. Civil, ao mesmo passo que divergiu de três acórdãos que indicam, oriundos de outros Tribunais.

5.1. Penso que, ainda aqui, razão não assiste às inconformadas.

Acentuou o acórdão proferido nos embargos de declaração, repelindo a coima de ter sido omisso, no pertinente, o julgado proferido na apelação (fl. 967), verbis:

“(...)

Não era de fixar-se data para o termo inicial da mora, até porque não estava em discussão na apelação e a invocação do art. 1.092 do Código Civil opera para os dois lados.”

Assim, se a sentença apreciara e decidira sobre a ocorrência da mora de parte das inconformadas; e se o acórdão dela não cuidou porque não fora objeto da apelação, incide, por ausência de prequestionamento, a Súmula 282, obstando o conhecimento do recurso.

Nem seria possível considerar implícita a matéria da mora para o efeito de merecer consideração na via deste recurso extraordinário, como o reconheceu a Eg. Suprema Corte, ao apreciar o AgRg nº 76.844 (RTJ, 95/672), negando a possibilidade de prequestionamento implícito.

5.2. Todavia, quando assim não sucedesse, e só para argumentar, sem consentir, ainda aqui não vejo tenha ocorrido a invocada negativa de vigência do citado art. 960, última parte.

E isso porque a mora foi reconhecida, com respeito à Usina Central do Paraná, com base em circunstâncias fáticas, ao afirmar o acórdão (fl. 967):

“(...)

Quem tomou a iniciativa de descumprir o ajuste (refere-se à entrega da produção) foi a embargada antes mesmo de ingressar em juízo, não aceitando as deliberações da Copersucar, que foram consideradas legítimas.”

E, quanto à Central Paulista, consigna (fl. 967):

“(...)

Diferente era o petitum, sendo condenada a entregar a produção da safra 80/81 à Copersucar, apurando-se em execução eventual impossibilidade parcial ou total por artigos (fls. 536), sendo descabido fixar-se desde logo e não na execução o termo inicial da mora.”

Assim, não há como falar em negativa de aplicação do citado art. 960 do Cód. Civil.

5.3. No que pertine ao dissídio pretoriano, indicam as recorrentes três decisões.

São elas, duas do Eg. Supremo Tribunal Federal (ERE nº 72.556, publ. na RT, 487/220, e RE nº 10.883, inserta na RF, CXI, p. 410) e Apelação nº 80.130, da 5ª Câmara do Tribunal de Alçada Civil, de São Paulo, sem indicação do Repertório onde estaria publicada.

Não merece ser considerada a última das decisões, porque em franca desatenção ao art. 322 do RI do STF, obstando o necessário confronto.
Quanto às duas outras, considero, em princípio, que, apesar das extensas transcrições dos padrões, com eles não fizeram as inconformadas o indispensável cotejo analítico, procurando mostrar que, idênticas ou semelhantes, eram as hipóteses confrontadas, as quais teriam emprestado exegese oposta ao art. 960, in fine, do Cód. Civil.

Assim, formalmente, no particular, o recurso não satisfaria o citado art. 322 do Regimento, agora em sua última parte.

E tal proceder é da essência do recurso extraordinário, como já assinalava a Súmula 291, pois é com ele que os recorrentes devem demonstrar a divergência na aplicação do direito federal, que a Constituição (art. 119, III, d) quer que seja uniforme em todos os Tribunais do país.

Nem mesmo poderiam as inconformadas convencer que lavraria divergência que se propuseram. E isso porque dissemelhantes são as circunstâncias fáticas deduzidas no acórdão recorrido e nos julgados colacionados, as quais determinaram as respectivas conclusões, negando a ocorrência da mora os paradigmas, enquanto era ela reconhecida no julgado impugnado.

De fato, no primeiro dos padrões, cuidava-se de ação de despejo fundada em falta de pagamento. Considerou o Plenário que em mora não estava o locatário, dado que ficara incerto o valor dos locativos, tornando ilíquida a obrigação de pagar.

No segundo, discutia-se a ocorrência da mora no pagamento de prestações a que se comprometera o autor, na compra de apólices, uma das quais fora sorteada, sem que a devedora se dispusesse a pagar o respectivo prêmio. Reconheceu o acórdão que a mora não se verificara em virtude do comportamento da própria credora, que, com a tolerância no recebimento das prestações, ainda que com atraso, como que modificara as condições do ajuste. Daí as expressões do julgado, em sua própria ementa, exprimindo a essência do decidido:

“O credor que, habitualmente, não exige o pagamento das prestações em tempo certo, como sucede no caso de apólices sorteáveis, arma, com esse teor de proceder, atmosfera de confiança para o devedor, relaxando-se a vigilância quanto ao termo de pagamento.”

Como já ficou assinalado anteriormente, diversas são as premissas fáticas que orientaram o decisório recorrido para o reconhecimento da mora de parte das recorrentes.

Sem qualquer préstimo, dessarte, os padrões comentados ao fim propugnado pelas inconformadas.

6. Aditam, ainda, as recorrentes que o acórdão, como a sentença por ele confirmada, afrontaram o art.  811 do Cód. Proc. Civil. E isso porque lhes aplicaram graves sanções pelo fato de não terem entregue suas safras, mesmo considerando que estavam sob a proteção de medidas cautelares.

6.1. Como o despacho presidencial, considero que não se operou a falta em questão.

A condenação das vencidas inconformadas defluiu do julgamento final das causas, quando foi examinado o mérito, em definitivo, da relação jurídica debatida.

A citação, de parte do acórdão, do art. 811, I, do Cód. Proc. Civil se fez, simplesmente, en passant, sem maior influência nos efeitos do decisório final. Serviu apenas para repelir a pretensão das autoras das declaratórias que se pretendiam forrar dos benefícios das medidas cautelares já mencionadas.

E, sendo certa sua provisoriedade, manifesto é que se tornariam ineficazes, com o julgamento final da causa, em seu desfavor, como ocorreu.

Demais, correta teria sido a interpretação atribuída pelo acórdão, rimando com o julgado do STF, por sua 2ª Turma, proferido no RE nº 88.782-PR, de 09.06.78 (RTJ, 87/665 e s.).

7. Pretendem, ainda, as recorrentes dar como "ofendidos" os arts. 83 e 4º, I, da Lei nº 5.764/71, dado que o acórdão, como a sentença, reconheceu ser a entrega das safras à Cooperativa obrigação de fazer a  cargo dos cooperados.

7.1. Ainda aqui não lhes assiste razão.

Dizem as disposições tidas como afrontadas:

“Art. 4º – As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características:

I – adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviço;

(...)

Art. 83 – A entrega da produção do associado à sua cooperativa significa a outorga a esta de plenos poderes para a sua livre disposição, inclusive para gravá-la e dá-la em garantia de operações de crédito realizadas pela sociedade, salvo se, tendo em vista os usos e costumes relativos à comercialização de determinados produtos, sendo de interesse do produtor, os estatutos dispuserem de outro modo.”

Daí já se poderia deduzir que é dever do cooperado proceder à entrega de sua produção à sua entidade.

Ela, a entrega, para o fim de comercialização, é a própria razão da existência da Cooperativa. É da sua essência, como ensina o douto Walmor Franke, uma das maiores autoridades no assunto e inspirador da lei citada (Direito das Sociedades Cooperativas, Saraiva, 1973, p. 7 e 14).

E, mais, integrando-se na Cooperativa, os associados, além de sujeitos à lei, subordinam-se aos Estatutos da sociedade, como dispõe seu art. 28, d, invocado na sentença (fl. 526), onde se lê, verbis:

“(...) cumprir fielmente as disposições dos presentes estatutos e respeitar as deliberações legalmente tomadas pelas Assembleias Gerais e pelo Conselho de Administração (documento dez).”

Dispondo, outrossim, a letra c do mesmo artigo: “(...) não dispor de sua produção de açúcar e álcool senão por intermédio da Cooperativa, ou com o seu consentimento.”

7.2. Correta, dessarte, se fez a interpretação, por parte dos julgados impugnados, dos preceitos citados, quando bastante seria que tivessem merecido razoável exegese, para o fim de tornar vão o recurso extraordinário, nos termos da Súmula 400.

8. Acometem, outrossim, as recorrentes contra a capitalização semestral dos juros.

Sustentam que, ao admiti-la, o acórdão, além de afrontar o art. 4º do Decreto nº 22.626/33, dissentiu da Súmula, verbete 121, como de julgados outros do STF que indicam.

Posto que o despacho presidencial tenha, no ponto, admitido o recurso, não considerou ele a arguida ausência de prequestionamento, suscitada pela recorrida ao impugnar a irresignação à sua fl. 27.

E parece-me ter ela ocorrido, fazendo incidir a Súmula 282, com o sentido que se lhe tem atribuído.

8.1. Em três passagens, referiu-se a sentença a respeito dos juros (fls. 528 – 8.7.2, in fine; 530 – 8.7.6, in principio; e 535 – 8.7.10, penúltima parte), rematando, na parte dispositiva (fl. 536 – 9.2), verbis: “(...) condeno (referia-se à Usina Central do Paraná) a pagar juros e correção monetária nos termos contratados (...)”

E consignou o acórdão (fl. 951), verbis:

“(...) A única impugnação que fez (referia-se à Usina Central do Paraná S.A.) foi relativa à oportunidade dos lançamentos dos juros e correção monetária. O modo e as taxas não foram especificados no Protocolo, estabelecendo-se a igualdade com os demais cooperados.”

E, mais adiante, afirmou o decisório:

“(...) Naturalmente, na execução serão computadas as amortizações, bem como os juros e correção monetária, calculados semestralmente sobre os saldos devedores às mesmas taxas cobradas dos demais cooperados.”

Na petição dos embargos de declaração opostos no acórdão, nada disseram os embargantes a respeito da contagem dos juros, bem como se seriam eles capitalizados e a partir de que momento.

Como é óbvio, a obscuridade, ou, quiçá, a omissão impendia ser esclarecida, para, sobre a forma estatuída, proporcionar ou não o recurso extraordinário.

Os embargos eram, em verdade, o remédio adequado. Deles se serviram as recorrentes, mas não contemplaram o tema em questão, originando, com a falta cometida, a impossibilidade de se valerem do recurso extremo, como bem dispõem os verbetes 356 e 282 da Súmula.

8.2. Todavia, se admitisse o prequestionamento, no pertinente à capitalização semestral dos juros, ad argumentandum tantum, as expressões da sentença e, notadamente, do acórdão, não deixam certo que a matéria ficasse inteira e definitivamente resolvida. A expressão "naturalmente", de que se serviu o aresto, não é terminante, como se requer das partes dispositivas das decisões judiciárias, as quais devem ser, nessas partes, sempre precisas e imperativas, pondo termo às discussões.

Não caberia, em tais circunstâncias, esperar que a Eg. Suprema Corte, nesta via extrema, viesse solver questão que as instâncias ordinárias teriam deixado para futuro debate (Súmula 281).

9. Por último e derradeiramente, no que toca aos honorários e às custas, sustentam as recorrentes teriam a sentença e o acórdão que a manteve aplicado retroativamente a Lei nº 6.889/81, divergindo, assim, do que decidiu o Eg. STF, por sua 2ª Turma, ao julgar o RE nº 93.644-RJ, in DJ de 06.11.81, fls. 1013-6.

9.1. O benefício pretendido, no pertinente, pelas recorrentes importaria na diferença entre o valor corrigido dos honorários e das custas, estimados pelos decisórios, a partir do ajuizamento das causas, e aquele no qual passou a viger a lei mencionada.

9.2. Não disponho de elementos seguros para fixar o quantum dessa diferença.

Todavia, tudo leva a crer, pelos dados que colhi, que ditos valores não alcançam, com respeito a cada uma das parcelas (honorários e custas), a serem considerados separadamente, o total de cem (100) salários mínimos.

E, em sendo assim, incabível seria o extraordinário, no particular, em face do disposto no RI do STF, art. 325, VIII, primeira parte, combinado com o seu parágrafo único, já que as decisões, no pertinente (correção quanto a honorários e custas), se fizeram uniformes.

9.3. Quando, porém, assim não sucedesse, é mister reconhecer que, no ponto, o recurso caberia conhecimento e parcial provimento, porém com o temperamento, na aplicação da lei em comentário, segundo estatuiu o próprio acórdão paradigma, verbis:

“(...)

Com base nessas premissas, as custas já pagas anteriormente a essa Lei deverão ser corrigidas monetariamente a partir da vigência dela, e, em caso contrário, a partir do momento em que foram pagas; quanto aos honorários advocatícios que foram fixados em valor certo (aferível por mero cálculo) no momento da condenação, quando se levaram em conta os critérios do § 3° do artigo 20 do CPC,  a atualização monetária somente correrá a partir da data dessa condenação.” (RTJ, 102/705)

10. Examinadas que foram todas as questões originadas com a interposição do recurso extraordinário, resta, apenas, extrair as conclusões, respondendo-se, outrossim, às dúvidas suscitadas pela consulente.

É o que se passa a fazer, em seguimento.

III Conclusões


1. Posto que admitido, pelo despacho presidencial, o recurso extraordinário, apenas em duas de suas pequenas partes autônomas, cabe ao STF examinar todas as demais questões compreendidas na irresignação, como dispõe a Súmula 528.

2. Por isso, abordou o parecer a totalidade das questões suscitadas pelas recorrentes na sua longa petição recursal.

3. Desse meticuloso e, por vezes, insistente exame, visando  melhor fundamentação, a segura conclusão é que não há de merecer conhecimento pelo Eg. Supremo a pretensão das inconformadas.

E isso porque, apesar do ingente esforço manifestado pelos ilustres patronos das irresignadas, não lograram demonstrar a ocorrência dos pressupostos que embasaram seu extenso recurso.

4. Nem mesmo é de crer que a inconformação seja conhecida nas porções admitidas pelo despacho presidencial.

Quanto à capitalização semestral dos juros, porque ausente o prequestionamento, incide o disposto nas Súmulas 282 e 356.

E, no que tange aos honorários e custas, uma vez que uniformes as decisões nessas partes, o valor do benefício propugnado pelo recurso não alcançaria o valor de cem (100) salários mínimos, incidindo, pois, o art. 325, VIII, combinado com o seu parágrafo único, do RI do STF, tornando incabível a inconformação.

IV Respostas às questões suscitadas na consulta

Quanto à primeira, sim. Embora o despacho presidencial haja admitido o recurso em duas porções apenas da pretensão, cabe ao STF examinar todas as demais, ainda que a respeito da rejeição não houvesse interposição de agravo. É o que dispõe a Súmula, verbete 528.

Quanto à segunda, sim. É mister, porém, que cada uma das partes autônomas do recurso satisfaçam às irresignadas todas as premissas nas quais o recurso se procurou arrimar, segundo jurisprudência vigorante no STF.

Quanto à terceira, sim. Considero que o recurso não há de merecer conhecimento pela ausência dos pressupostos, nos quais se procuraram arrimar as inconformadas.

Quanto à quarta, sim. Conquanto prejudicada pela resposta anterior, todavia, convém esclarecer.

Posto que o despacho presidencial tenha admitido o recurso em duas porções apenas, penso que, mesmo com respeito a elas, também não há de ser conhecido.

Quanto à capitalização semestral dos juros, porque não prequestionada como cumpria, levando a fazer incidir a Súmula, 282 e 356.

E, quanto aos honorários de advogado e às custas, porque o benefício pretendido no recurso não alcança a alçada regimental, tornando-o incabível, como estatui o RI do STF, art. 325, primeira parte, combinado com seu parágrafo único.

É o parecer.

Porto Alegre, 18 de junho de 1983.

Notas

1. Parecer lavrado em 18.06.1983.

2. Em 2011, comemora-se o centenário de nascimento do Min. Carlos Thompson Flores, falecido em 2001.

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., ago. 2011. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS