Estado Socioambiental: qual a posição dos direitos fundamentais neste novo modelo estatal?

 


Autora: Litiane Cipriano Barbosa Lins

Mestre em Direito pela PUCRS, Assessora Jurídica no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

 publicado em 29.06.2012


Resumo

O presente artigo visa ao exame da posição dos direitos fundamentais no modelo de Estado Socioambiental, fazendo um apanhado sobre a evolução do reconhecimento e da proteção dos direitos fundamentais na transição de um Estado Liberal para um Estado Socioambiental, tanto no plano internacional, quanto no plano brasileiro. Realiza-se uma breve análise sobre a relação estabelecida entre o ser humano e o ambiente para fins de uma aproximação sobre o surgimento, as características e os objetivos de um Estado Socioambiental. Analisa-se, por intermédio de propostas classificatórias como a dupla fundamentalidade (formal e material), a dupla dimensão objetiva e subjetiva e a dupla dimensão positiva e negativa dos direitos socioambientais, a forma com a qual os direitos socioambientais estão sendo protegidos pela Constituição Federal de 1988. A ideia é demonstrar que o Estado Socioambiental persegue a concretização de uma existência mais sadia, proporcionando às pessoas uma melhor qualidade de vida que depende da concretização de direitos fundamentais sociais ou dos aqui denominados direitos socioambientais, que, em virtude de sua forte vinculação com a dignidade da pessoa humana e com um mínimo existencial, referem-se, em primeira linha, à salvaguarda da dignidade da pessoa humana, individual ou coletivamente consideradas.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Direitos Fundamentais. Estado Socioambiental. Direitos Socioambientais. Dignidade da Pessoa Humana.

Abstract

This article aims to examine the position of fundamental rights in the Social-Environmental State’s model, making an overview of the evolution of recognition and protection of fundamental rights in the transition from one Liberal state to a Social-Environmental State, both at international level, as the brazilian plan. Carried out a brief analysis of the relation between humans and the environment for an approximation of the emergence, characteristics and objectives of a Social-Environmental State. We analyze, through proposals such as double qualifying fundamentality (formal and material), the dual objective and subjective dimension and two dimensions of positive and negative social and environmental rights, the way in which social-environmental rights are being protected by the Constitution of 1988. The idea is to demonstrate that the Social-Environmental State pursues the achievement of a healthier existence, giving people a better quality of life that depends on the realization of fundamental social rights, or rights referred to herein as the social-environmental because of their strong connection with the dignity of the human person and with a minimum existential concern, primarily, to safeguard the dignity of the human person, individually or collectively considered.

Keywords:Fundamental Rights. Social-Environmental State. Environmental Laws. Dignity of the Human Person.

Sumário: Introdução.1 A transição de um Estado Liberal a um Estado Socioambiental: análise sobre o reconhecimento e a proteção dos direitos fundamentais nos planos nacional e internacional. 1.1 Plano internacional. 1.2 Plano nacional. 2 O Estado Socioambiental. 3 A fundamentalidade dos direitos socioambientais na Constituição Federal de 1988. 3.1 Dimensões subjetiva e objetiva. 3.2 Dimensões positiva e negativa. Considerações finais. Bibliografia.

Introdução

A relação homem-ambiente, com todas as suas tensões, tem provocado um nível de degradação ambiental que já afeta a concretização dos direitos sociais mais básicos dos cidadãos, ensejando a discussão sobre a necessidade do surgimento de um novo modelo estatal que contemple a proteção ao meio ambiente como sua tarefa-fim, aliada à efetivação dos direitos fundamentais sociais. Discute-se, ainda, quais seriam as medidas mais importantes a serem tomadas pelo Estado, visando ao aumento dos níveis de qualidade de vida dos indivíduos como forma de melhor atender aos ditames do princípio da dignidade da pessoa humana.

A Constituição Federal de 1988 assegura os direitos fundamentais sociais, não estabelecendo outra condição senão a de ser o titular pessoa humana. Daí se infere o acesso universal e igualitário a todas as prestações que assegurem a manutenção de uma vida digna. Tem-se que a concretização de tais direitos dar-se-á pela implementação de políticas públicas a encargo do Estado, que assume a responsabilidade na adoção de medidas eficazes para tal fim. Não há de olvidar-se, contudo, a responsabilidade dos particulares na abstenção de condutas que prejudiquem a concretização do direito fundamental social alheio, assim como na adoção daquelas que protejam o meio ambiente, cuja degradação afeta sensivelmente a concretização dos direitos sociais, a exemplo do acesso à água potável, da moradia e da saúde pública.

1 A transição de um Estado Liberal a um Estado Socioambiental: análise sobre o reconhecimento e a proteção dos direitos fundamentais no plano nacional e internacional

Em constante transformação, encontram-se os direitos fundamentais desde os primórdios de seu reconhecimento nas Constituições escritas de matriz liberal-burguesa. Atualmente, estão inseridos nos mais diversos catálogos constitucionais e na seara do Direito Internacional, fruto de uma incessante evolução do contexto político, social, econômico e cultural no mundo inteiro.(1)

Os direitos econômicos, sociais e culturais – quando os direitos ambientais ainda não haviam sido inseridos nesse rol – surgem no decorrer do século XIX como resposta(2) aos anseios da sociedade, reclamando um comportamento ativo por parte do Estado na realização da justiça social. Conforme referiu Sarlet, não “se cuida mais, portanto, de liberdade do e perante o Estado, e sim de liberdade por intermédio do Estado”, tendo em vista o impacto provocado no mundo pelo fenômeno da industrialização. Caracterizados pela prestação social por parte do Estado, tais direitos podem abranger saúde, assistência social, moradia, trabalho, lazer e educação, transcendendo a “liberdades formais abstratas” ao tornarem-se “liberdades materiais concretas”.(3) Positivados nas constituições e objeto de tratados internacionais, mais especificamente no século XX, tais direitos ainda têm o condão de angariar a igualdade material e não abrangem tão somente prestações positivas por parte do Estado, mas se referem a liberdades sociais, a exemplo do direito à greve e outros direitos atribuídos aos trabalhadores, dispostos na Constituição Federal de 1988.

Desse modo, os direitos de segunda dimensão consistem em resposta(4) aos anseios das camadas proletárias da sociedade que não viam mais, na concepção de liberdade assentada no individualismo,(5) a solução para uma série de problemas de ordem social e econômica.(6) Os direitos sociais, econômicos e culturais emergiram como tais em uma sociedade solapada pela desigualdade de condições econômicas, notadamente, a partir do surgimento da industrialização.(7) Atualmente, pode-se afirmar que o projeto de efetivação dos direitos sociais encontra-se inacabado, tendo sido, ainda, complexificado com a necessidade de uma proteção ambiental.(8)

Note-se que a luta pela proteção do meio ambiente – assim como a opção pelo desenvolvimento sustentável – necessita de ações que visem à redução da desigualdade social, concretizando-se direitos sociais básicos aos cidadãos mais pobres, cuja vulnerabilidade potencializa o problema da degradação ambiental. Logo, necessária a simultânea existência de uma dimensão social e de uma dimensão ecológica, como elementos nucleares da dignidade da pessoa humana, o que viabilizaria o alcance dos objetivos traçados pela Constituição Federal de 1988.

De acordo com Fensterseifer, a atual degradação do meio ambiente é resultado de experiências do passado, tempo em que se ignorava a necessidade de promoção do bem-estar aos indivíduos. A busca incessante pelo progresso econômico,(9) para além de dificultar a distribuição igualitária das riquezas e o alcance dos direitos sociais às pessoas, criou um “contexto de devastação ambiental planetária e indiscriminada”.(10) Somente com a crise do petróleo, por volta de 1970, houve maior preocupação com as consequências de um crescimento econômico sem limites e com a exploração dos recursos naturais.(11)

Importa destacar que caberá ao Estado remodelar-se sempre que necessário e da forma que for preciso para fins de atender melhor ao objetivo da proteção ambiental e defender a população dos riscos ecológicos que surgem com a evolução tecnológica, ameaçando a existência digna de todos os seres.

A solidariedade emerge como estandarte desse novo modelo estatal, voltado à proteção do meio ambiente e à satisfação dos direitos sociais, como opção de combate ao individualismo típico do Estado Liberal. O Estado Socioambiental intenta reparar o débito social oriundo do liberalismo e agregar a dimensão coletiva dos direitos, revelada no Estado Social.(12) Em outras palavras, reúne os resultados positivos dos modelos estatais anteriores com vistas à otimização na concretização de direitos transindividuais em uma perspectiva de solidariedade.(13)

1.1 Plano internacional

Discorrendo especificamente sobre as etapas históricas na formação do conceito de direitos econômicos, sociais e culturais, Peces-Barba aduz estar na Grécia o substrato indispensável para o conhecimento das raízes dos direitos fundamentais de segunda dimensão. Segundo o autor, é na ideia de comunidade entre os homens, sustentada pela amizade, pelo amor, pelo apoio e pela colaboração mútuos, que está a origem dos direitos sociais germinados no Ocidente.(14) Sem embargo da contribuição da concepção de dignidade da pessoa humana, sem a qual jamais poderia ter sido construído o conceito de direitos sociais, a cultura grega apresenta-se essencial, pois a própria dignidade da pessoa humana não haveria de ser reconhecida para alguns poucos escolhidos, mas para toda a humanidade.(15)

Mais tarde, o Cristianismo encarregou-se de prolongar e potencializar a ideia de amizade, fraternidade, colaboração e amor ao próximo, o que também serviu de base para a concepção de direitos sociais,(16) razão pela qual não é de se estranhar que essa mensagem possa ser encontrada em autores do século XVIII, como Rousseau. Tomás de Aquino, por sua vez, já na Idade Média fora o responsável por difundir a ideia de amizade social. Nesse passo, a concepção de direitos econômicos, sociais e culturais para Peces-Barba é, em verdade, a raiz do humanismo que vem reaparecendo desde os tempos da Grécia até os tempos atuais, sem embargo das mudanças sociais, econômicas e culturais no mundo todo, com novas roupagens e ganhando, ao longo dos séculos, novo vigor.(17)

Da luta pela proteção do indivíduo, os direitos fundamentais emergiram a fim de garantir um espaço de liberdade inviolável. Nada obstante o ideário de Rousseau influenciando fortemente a Revolução Francesa, foi a visão de Locke que prevaleceu, identificando os direitos humanos com o direito de liberdade. Com efeito, a Revolução Francesa e a Independência que culminaram na fundação do Estado norte-americano(18) foram acontecimentos decisivos, dando início a uma nova era para os direitos fundamentais provenientes dos ideais da Revolução – igualdade, liberdade e fraternidade – que, nas palavras de Sarmento, foram “modelados por novas exigências impostas pela consciência ética dos povos” e que “a história vai tratando de incorporar ao patrimônio jurídico da humanidade”.(19) Nessa época, observa-se o surgimento de novas doutrinas sociais que buscam a transformação da sociedade individualista.(20) Da contribuição do constitucionalismo norte-americano, destaca-se o controle de constitucionalidade dos atos normativos, mecanismo oriundo da compreensão de que os direitos fundamentais poderiam ser concebidos como limitação à atuação dos governantes em prol dos governados. Assim, os direitos fundamentais compreenderiam os limites ao próprio legislador, fiscalizado pelo Poder Judiciário.(21)

Exclusão e desigualdades econômicas e sociais foram geradas pelos valores liberais, o que resultou na elaboração de constituições com conteúdo extremamente protetivo para as classes desfavorecidas e mecanismos viabilizadores da luta por justiça social. Nas palavras de Vieira de Andrade, a superação do liberalismo não foi apenas uma obra política, mas a prova de que a própria sociedade liberal ruiu, sendo substituída por uma nova ordem que se decidiu denominar sociedade de massas.(22) Nesse momento, têm origem as Constituições do México, em 1917, e a de Weimar, em 1919, influenciando a Constituição Brasileira de 1934 e inaugurando o chamado Estado Social de Direito.

Alguns países contribuíram decisivamente para os contornos dos direitos sociais, econômicos e culturais. No período pré-revolucionário, direitos sociais de cunho previdenciário, visando à proteção de doença, velhice e acidente, foram deduzidos do princípio da fraternidade no constitucionalismo francês.(23) No direito alemão, em 1848, por ocasião da Assembleia Nacional Alemã, reunida em Frankfurt, a exemplo do que ocorrera na França, os direitos sociais geraram grande controvérsia quanto à sua inclusão na Constituição. A Constituição de Weimar, por sua vez, abarcou diversos direitos sociais que acabaram aniquilados pela ditadura nazista. Finalmente, em 1949, sobreveio a Lei Fundamental alemã, vigente até os dias atuais, que não prevê especificamente os direitos sociais. Entretanto, em seu art. 6º, alíneas 4 e 5, reconhece o direito de proteção e cuidado das mães perante a comunidade, bem como a igualdade entre filhos concebidos dentro e fora do casamento. Atente-se, ainda, para o fato de que a Lei Fundamental alemã adotou o princípio do Estado Social, a partir da jurisprudência de sua Corte Constitucional aliada à legislação infraconstitucional.

Destaque-se, ainda, a importância das convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, ratificado pelo Brasil em 1976, e da Carta Social Europeia, de 1965, na evolução histórica dos direitos sociais no plano internacional.

A prova inequívoca da historicidade dos direitos fundamentais é a sua constante evolução, transformação e, ainda, o reconhecimento de novos direitos ao longo da história. A abertura ao reconhecimento de novos direitos, bem como à reinterpretação e à transformação daqueles já existentes, faz com que o processo de reconhecimento e proteção dos direitos fundamentais esteja em constante atualização.(24)

Registre-se, ainda, na esteira da evolução dos direitos sociais, econômicos e culturais, o seu desenvolvimento encontra-se imerso em um paradoxo que reflete tensões inevitáveis entre a globalização e a localização. Por um lado, a globalização das relações econômicas, sociais, técnicas, jurídicas ou científicas consolida as democracias neoliberais, a economia capitalista e o respeito aos direitos humanos individuais, além de gerar um forte sentimento de dependência dos países de terceiro mundo em relação aos países desenvolvidos. Tudo isso, nas palavras de Fariñas Dulce, converte o fenômeno da globalização em um processo de ocidentalização, de aculturação em um determinado modelo econômico, social, cultural, jurídico e político que por sua vez está calcado em uma concentração de técnica e ciência, caracterizado, basicamente, pelo princípio do livre mercado e da eficiência financeira.(25)

O problema dessa nova forma de homogeneização é que ela instrumentaliza a seu favor o princípio da igualdade formal e o discurso dos direitos humanos individuais, rechaçando qualquer outro tipo de direito com conteúdo social, redistributivo e igualitário que possa afetar a liberdade econômica e de mercado. Nessa quadra, importa recordar a lição de Arango que, discorrendo sobre a transição do Estado de Direito para o Estado Social de Direito, destaca a importância que teve a substituição de uma concepção formal por uma material de igualdade, que não dependeu exclusivamente das forças que comandam o mercado, mas de uma atuação efetiva do Estado para a realização dos direitos fundamentais, promovendo medidas capazes de satisfazer as necessidades dos grupos desfavorecidos.(26)

Sarmento assinala a dificuldade pela qual passa o Estado com o impacto causado pela globalização.(27) Segundo o autor, o enfraquecimento estatal dificulta a implementação de políticas públicas, comprometendo gravemente a eficácia dos direitos fundamentais. Desse modo, aqueles que outrora criticavam o Welfare State hoje intentam “ressuscitar” a ideia de Estado mínimo.(28) “Para esses, o mercado deixou de ser meio para converter-se em fim, e no seu altar são imolados os direitos sociais, vistos como causas do déficitpúblico, de opressão e da ineficiência dos atores econômicos”.(29)

Antagonicamente ao processo da globalização, surge o fenômeno da localização ou fragmentação, caracterizado pelo ressurgimento do local frente ao universal, sob o qual são tecidas as reivindicações de interesses de grupos determinados, reivindicações de particularidades e identidades culturais. Esse fenômeno é o responsável por um movimento de libertação dos povos mais pobres e desfavorecidos econômica e socialmente, antagonizando o fenômeno da globalização, na medida em que esta supõe a prática de dominar culturas e grupos específicos.(30) Tanto o fenômeno da globalização, quanto o da localização estão originando uma crise nos Estados e provocando uma reestruturação mundial em torno dos grupos sociais, o que poderá levar a cabo o ressurgimento de um pluralismo jurídico.(31)

Outro fenômeno importante da contemporaneidade é a crescente tomada de consciência da sociedade quanto à necessidade de uma ampliação da proteção ao meio ambiente, que se vincula diretamente à proteção de direitos sociais básicos. Nesse passo, modificou-se igualmente a relação entre indivíduo e Estado, na medida em que as atividades sociais, visando à proteção ambiental, intentam uma maior participação do Estado, convidando-o a tomar “medidas de asseguração duradoura das bases naturais da vida”.(32)

Nesse contexto, registre-se a incontestável importância da realização da Conferência de Meio Ambiente das Nações Unidas e Estocolmo, no ano de 1972, como um dos marcos do ambientalismo mundial, a primeira de uma série de três conferências realizadas pela ONU, reunindo 113 países e 250 organizações não governamentais, o que resultou na Declaração sobre o Ambiente Urbano, também denominada Declaração de Estocolmo.

Entretanto, em meados de 1980, um Relatório Internacional – como sugere o seu título, Nosso Futuro Comum – semeou a ideia do elemento social como integrante dos programas de proteção ambiental. Esse relatório também considerado, a exemplo da Declaração de Estocolmo, um dos marcos do ambientalismo mundial, foi divulgado em 1987, vindo a ser conhecido como o Relatório Brundtland, coordenado pela primeira ministra da Noruega, Gro Brundtland.

O referido documento foi o primeiro a defender a ideia de um desenvolvimento sustentável – aquele capaz de atender as necessidades das gerações atuais sem comprometer o atendimento das necessidades das gerações futuras(33) –, alertando para o perigo que o mundo estaria correndo se o modelo de desenvolvimento adotado, mundialmente, persistisse. Já naquela época, o relatório previu uma série de orientações para que os objetivos estabelecidos na Declaração de Estocolmo fossem alcançados, relacionando medidas a serem adotadas para prevenir o esgotamento dos recursos naturais indispensáveis à sobrevivência dos seres. O documento listou três fatores do modelo de desenvolvimento sustentável sugerido: proteção ambiental, crescimento econômico e equidade social.

Assim, nesse modelo de Estado Socioambiental, a tarefa de proteção ao meio ambiente converte-se em dever de proteção(34) que, por sua vez, precisa ser deduzido autonomamente da Constituição.(35) Nesse contexto, Kloepfer destaca o quanto os direitos fundamentais são eficazes, atuando como direitos de defesa contra danos ao meio ambiente provocados pelo Estado.

1.2 Plano nacional

Entre 1970 e 1980, as leis ambientais editadas no Brasil caracterizavam-se pelo conservadorismo, voltando-se, tão somente, para a proteção das espécies e do ecossistema, ignorando, contudo, uma dimensão social na proteção do meio ambiente.(36) Nesse percurso, após o estabelecimento de uma ordem econômica social – que teve início na Constituição de 1934, destacando diretrizes para a concretização de direitos de natureza coletiva, trabalhista e previdenciária –, da necessidade da fixação de um salário mínimo, de proteção à infância e à maternidade e de educação a ser efetivada pelo Estado, bem como, inaugurando a solidariedade entre União e demais entes da federação,(37) surge, em 1988, a Constituição Federal. Essa Constituição veio profundamente calcada na Lei Fundamental alemã, de 1949, sem afastar-se da Constituição de Weimar, privilegiando o social.(38) É a Constituição(39) de um Estado Social(40) – neste estudo, de um Estado Socioambiental –, pois garantidora de direitos fundamentais que intentam nivelar um conjunto de desigualdades até hoje existentes no Brasil.(41)

Da necessidade de se refazer o pacto político-social do Brasil,(42) foi promulgada a Constituição Federal de 1988, privilegiando direitos econômicos, sociais e culturais e nivelando uma desigualdade social há muito conhecida, provocada pelo liberalismo. Esses direitos vêm para amenizar a tensão social e corrigir distorções oriundas do capitalismo, obrigando o Estado a prestações básicas com o fito de promover uma maior igualdade social. Na Carta de 1988, os direitos sociais passam a fazer parte do catálogo de direitos fundamentais, o que evita o seu esvaziamento por parte do intérprete e aplicador do direito. Erigidos à hierarquia de direitos fundamentais, encontram-se protegidos da erosão de seu núcleo, fazendo parte do rol de cláusulas pétreas. Essa Constituição representa um avanço quantitativo no regramento de tais direitos, sendo visível sua ampliação numérica. A exemplo do direito à saúde, que até então não havia sido expressamente contemplado nas Constituições anteriores, o direito ao lazer, à segurança e ao meio ambiente encontram-se positivados na Constituição atual, o que não significa o fim dos esforços para a qualificação dos direitos sociais.(43)

A Constituição Federal de 1988 consiste em precioso arcabouço jurídico para o desenvolvimento de um Estado Socioambiental(44) ao trazer, pela primeira vez na história do constitucionalismo brasileiro, um capítulo (a saber, Capítulo VI, intitulado “Do Meio Ambiente”, inserido no Título VIII “Da Ordem Social”) inteiramente dedicado à proteção ambiental, alinhada com o desenvolvimento do direito constitucional comparado, em especial da última quadra do século XX, quando se verificou o surgimento de uma série de tratados e convenções regulamentando a proteção ecológica. Outro fator que inegavelmente influenciou o texto constitucional foi a urgência “da cultura ambientalista e dos valores ecológicos no espaço político-comunitário contemporâneo”.(45) Aliás, na medida em que os dispositivos constitucionais ofereceram ampla proteção tanto à bio quanto à sociodiversidade, representaram, com isso, importante marco na proteção jurídica ambiental, consagrando a importância de um meio ambiente equilibrado para o desenvolvimento humano, compatível com a dignidade e viabilizador de uma existência digna e saudável.(46)

Ao contemplar valores ecológicos, a Constituição Federal estabeleceu, em capítulo próprio, “o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito (e dever!) fundamental da pessoa humana”,(47) além de estabelecer um conjunto de princípios e regras acerca da tutela ambiental, reconhecendo, com isso, a importância da qualidade de vida para a promoção de um complexo de fatores que possibilitem o máximo bem-estar existencial. A Constituição Federal consagrou a proteção ao meio ambiente como direito e tarefa fundamental do Estado Socioambiental, quando atribuiu ao direito ao meio ambiente status de direito(48) e dever fundamental.(49)

De fato, a preocupação com a preservação do meio ambiente e o apontamento de elementos responsáveis pela necessária construção de um Estado Socioambiental, presentes na Constituição Federal, demonstram o cumprimento do papel dessa Carta Magna, na função de impor condutas mínimas de justiça nas relações humanas. Se assim não fosse, ela estaria incorrendo em omissão que acabaria por legitimar a exclusão social – contrariando todo o arcabouço constitucional que se sustenta na perseguição da concretização dos direitos fundamentais e no respeito à dignidade da pessoa humana.(50)

Nessa linha, a Constituição Federal de 1988 pode ser reconhecida como a Constituição de um Estado Socioambiental por preconizar uma série de medidas capazes de promover o desenvolvimento sustentável, protegendo o meio ambiente ao mesmo tempo em que busca a erradicação da pobreza, a diminuição das desigualdades sociais. Em outras palavras, ao mesmo tempo em que persegue uma sustentabilidade social(51) para além de uma sustentabilidade ambiental.

Em meio à intensa mobilização por parte de diversos segmentos da população que sofreram no período em que se estabeleceu a ditadura militar, a Assembleia Nacional Constituinte não pôde ignorar os anseios de uma sociedade que clamava pelo direito das minorias, pela proteção de deficientes físicos, pelo reconhecimento dos direitos das crianças, dos adolescentes e dos idosos, pela regulamentação de direitos sociais básicos, bem como pela proteção do patrimônio público, social e ambiental.(52)

A história dos direitos fundamentais ainda está por ser escrita.(53) Esforços são empregados pelos órgãos estatais – ainda que se questione a intensidade desse esforço – e pela doutrina, para a concretização desses direitos e do princípio fundamental da igualdade material.(54) Exemplo disso é o surgimento do socioambientalismo brasileiro a partir da segunda metade de 1980, fruto de articulações entre movimentos sociais e ambientalistas, podendo ser identificado com o processo de redemocratização do país, que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988.(55) Foi nesse período que a redemocratização possibilitou à sociedade um espaço de mobilização e articulação entre os movimentos sociais e ambientalistas, traduzidos na luta pela criação de reservas extrativistas perseguidas pelos seringueiros, que almejavam uma reforma agrária combinada com uma política de proteção ambiental. 

Atualmente, o diálogo normativo entre o direito fundamental ao meio ambiente sadio e os direitos fundamentais sociais assume relevância para a conformação do conteúdo jurídico da dignidade da pessoa humana, tendo em vista tais direitos consistirem em “projeções materiais dos elementos mais vitais e básicos para uma existência humana, digna e saudável”.(56) Esse intercâmbio entre o direito fundamental ao meio ambiente e os direitos sociais visa ao alcance dos objetivos de um Estado Socioambiental em que se inserem tanto a efetivação de direitos sociais básicos aos indivíduos quanto a justa distribuição dos recursos naturais disponíveis.

Estando a efetivação dos direitos sociais vinculada ao oferecimento de condições ambientais favoráveis, infere-se que a concretização do direito de acesso à água potável, por exemplo, será possível com a implantação de um sistema de saneamento básico adequado. O direito à alimentação, por sua vez, será viabilizado com o controle do uso de agrotóxicos, com vistas à não intoxicação dos alimentos. Já a concretização do direito à moradia dependerá do controle da poluição do solo, da atmosfera, da proteção das encostas, etc. No caso do direito à saúde, o sistema de abastecimento de água e um regular sistema de saneamento básico serão imprescindíveis para a concretização desse direito.
 
Sem perder de vista a contemporaneidade,(57) há, ainda, aqueles que arriscam um palpite sobre o constitucionalismo do futuro, apostando na consolidação dos direitos de terceira dimensão,(58) próprios de um constitucionalismo fraternal, de solidariedade, comprometido à correção de alguns excessos do constitucionalismo contemporâneo, calcado em valores como a verdade, a solidariedade, o consenso, a continuidade, a participação,(59) a integração e a universalização. Vieira de Andrade discorre sobre tais direitos, referindo-se a eles como aqueles que não podem ser pensados exclusivamente em relação ao indivíduo em face do Estado, mas incluem uma relação de dever de proteção da natureza, do patrimônio cultural e dos direitos dos consumidores, por exemplo. Seriam, para o autor, direitos de quarta categoria na perspectiva histórica, na medida em que não correspondem a direitos de defesa, participação ou prestação, mas direitos dirigidos ao Estado formando um complexo de direitos circulares com uma característica horizontalidade e uma “dimensão objectiva fortíssima, que protegem bens, que, embora possam ser individualmente protegidos e gozados, são, ao mesmo tempo, bens comunitários”.(60)

2 O Estado Socioambiental(61)

É necessário partir de algumas noções sobre o ambiente e a relação estabelecida entre o ser humano e esse ambiente para a compreensão do que significa ser um Estado Socioambiental – terminologia adotada neste estudo por representar com clareza a necessidade da convergência da proteção social e ambiental no mesmo projeto jurídico-político, visando ao melhor desenvolvimento dos seres humanos.

Neste passo, destaca-se a aproximação realizada por Molinaro sobre “relação”, para quem essa consiste em estado de ser, resultado da adjetivação do vínculo natureza/cultura. Uma relação não é invocada ou estabelecida porque, em verdade, já está no entorno de todos os seres, geradora de outras relações. Anacrônica, existe dentro e fora do tempo, viabilizando o conhecimento do mundo.(62)

O mesmo ocorre com o referencial ambiente, que, por sua vez, também é relação. O meio ambiente pode ser definido como um lugar de encontro, e este não exige uma dimensão espaço-temporal determinada. Corresponde, ainda, a uma contraposição; confrontar-se é uma das possibilidades oferecidas pelo encontro. O homem, sujeito e objeto, está vinculado ao biótico, “em seu sentido mais estrito está por esse fato fortemente condicionado, mais ainda, observando-se esta situação desde a sua relação com os demais seres e com o entorno natural-cultural”.(63)

Assim, quanto à relação(64) do homem com o ambiente, é possível afirmar que o ser humano não é biológico, de um lado, e sociocultural, de outro. Não são tais características compreendidas como duas dimensões dicotômicas. O homem é formado por um conjunto de interações e interdependências, razão pela qual ele é visto como sujeito/objeto do conhecimento.(65)

Impende-se, ainda, discorrer sobre a concepção de Estado Constitucional, descrito por Canotilho, antes de adentrar na definição de Estado Socioambiental. Para o autor, “estado de direito” e “estado democrático” são qualidades indispensáveis para a concepção de um Estado Constitucional, ainda que tais qualidades com frequência surjam separadamente. Nessa quadra, no que tange à qualidade de Estado de Direito, destaca que a concretização desse modelo estatal conduz, inevitavelmente, à busca pelo “pluralismo de estilos culturais”, pela “diversidade de circunstâncias e condições históricas” e pelos “códigos de observação próprios de ordenamentos jurídicos concretos”.(66)

Atualmente, o Estado Socioambiental,(67) que já superou o Estado Social, tem como princípio nuclear, além do direito fundamental à vida, também o máximo respeito à dignidade da pessoa humana.(68) Tanto o direito à vida quanto a manutenção das bases que a sustentam somente serão possíveis em um ambiente equilibrado e saudável que garanta uma boa qualidade de vida(69) a todos os seres existentes nesse ambiente. Apenas nesse contexto(70) se concretizará a máxima inscrita no princípio da dignidade da pessoa humana, afinal, “não estamos sós, neste ‘lugar de encontro’, onde somos o encontro; somos com o outro desde uma relação de reconhecimento, respeito, reciprocidade e responsabilidade”.(71) É justamente essa concepção de ambiente como lugar de encontro, elemento primordial na construção de um novo modelo de estado, denominado Socioambiental.

Comentando as inúmeras terminologias adotadas pela doutrina contemporânea, especialmente por Canotilho, Haberle, Molinaro e Fenterseifer. Prestes aponta que o termo “socioambiental é a afirmação de uma Constituição do Estado Social que reconhece direitos fundamentais e fornece meios jurisdicionais para sua garantia, ainda tão carentes de aplicação no Brasil, dentre os quais e com prevalência, o direito ambiental”.(72)

Fensterseifer, traçando as linhas que fundamentam o novo projeto da comunidade estatal, elenca alguns exemplos das diversas denominações(73) ao Estado Socioambiental, vale dizer, Estado Pós-Social, Estado Constitucional Ecológico, Estado de Direito Ambiental, Estado do Ambiente, Estado Ambiental de Direito, Estado de Bem-Estar Ambiental e Estado Ambiental.(74) Entretanto, o autor prefere a utilização do termo “Socioambiental”, tendo em vista a imperiosa “convergência das ‘agendas’ social e ambiental em um mesmo projeto jurídico-político para o desenvolvimento humano”(75) – terminologia essa adotada por este estudo, consoante referência anterior.

O surgimento de um Estado Socioambiental é reflexo de uma preocupação com a proteção do meio ambiente. Cada vez mais essa tem sido a inquietação dos doutrinadores que sustentam a importância de ser essa proteção incorporada ao projeto político-jurídico como objetivo a ser perseguido pelo Estado Constitucional contemporâneo.(76) Afinal, como sugere Kloepfer,(77) atualmente transcende-se à clássica teoria dos três elementos necessários para a existência de um Estado, pois resta imprescindível, igualmente, a existência de um meio ambiente sadio que não ponha em risco a própria continuidade estatal. Com isso, se objetiva assegurar uma existência saudável, com elevada qualidade de vida e o máximo de respeito à dignidade da pessoa humana, aos membros da sociedade.

A situação atualmente posta é fruto de uma transição do Estado Liberal para o Estado Social, que cedeu lugar, nesse fluxo de evolução, ao Estado Socioambiental (também Constitucional e Democrático, consoante afirma Fensterseifer, em alusão à lição de Canotilho) em virtude do “surgimento de direito de natureza transindividual e universal que têm na proteção do ambiente o seu exemplo mais expressivo”.(78)

A transição do Estado Social para o novo modelo de Estado – aqui denominado Socioambiental – teve início a partir do momento em que o Welfare State entrou em crise, colocando em xeque toda a lógica do dirigismo estatal. Em 1970, já era possível observar a chegada da crise do petróleo e, nesse período, o Estado Social começou a apresentar sérias dificuldades(79) para se desincumbir das tarefas assumidas com a realização de uma série de direitos sociais básicos. Era o início de uma longa crise que, de acordo com Sarmento, obstaculiza até hoje o desenvolvimento do sistema de saúde e previdência de muitos países, especialmente do Brasil.(80)

Contudo, registre-se que o surgimento do Estado Socioambiental é continuidade do papel desempenhado, no início, pelo Estado Liberal. Em outras palavras, não se sustenta o surgimento do novo modelo estatal como um marco zero na história da humanidade, mas como a evolução dos projetos político-jurídicos desenvolvidos na fase do liberalismo, que, por sua vez, tiveram continuidade no Estado Social e resultaram nesse novo modelo de Estado que pretende maior proteção aos direitos fundamentais e à dignidade da pessoa humana, combinado com a máxima proteção que se pode oferecer aos bens naturais, ao ecossistema.

O novo modelo estatal encontra fundamento no avanço da ciência e da tecnologia, que acabaram por generalizar os riscos(81) a que estão submetidos os seres humanos. Hoje, já se fala no advento de uma sociedade de riscos(82) em que, diferentemente do Welfare State, em que se partilhavam os bens, a sociedade se vê obrigada a compartilhar os riscos decorrentes do comportamento humano e da evolução científica e tecnológica. Segundo Beck, na sociedade atual, a produção social de riquezas vem acompanhada pela produção social de riscos. Hoje, discute-se não apenas a melhor forma de repartição de riquezas, mas, com o mesmo fervor, a melhor forma de repartição dos riscos.

Canotilho denominou “o ambiente como fim e tarefa do Estado e da Comunidade”. Para o autor, muitas das Constituições optam por considerar o meio ambiente como “tarefa ou fim do Estado”. Assim, essas “normas-tarefas” e “normas-fim” apresentam duas dimensões fundamentais: a) “não garantem posições jurídico-subjectivas, dirigindo-se fundamentalmente ao Estado e a outros poderes públicos”; b) “constituem normas jurídicas objectivamente vinculativas”.(83)

Isso significa que o ambiente, uma vez considerado espécie de norma-tarefa do Estado, reclama a existência de deveres jurídicos dirigidos ao ente estatal ou aos demais poderes, o que subtrai tanto do Estado quanto de seus poderes a possibilidade de proteger ou não os recursos ambientais. Não está nas mãos das entidades estatais “decidir se o ambiente (os elementos naturais da vida) devem ou não ser protegidos e defendidos. A imposição constitucional é clara: devem!”(84) Fensterseifer, à luz da lição de Haberle, igualmente afirma o dever de proteção do Estado, que deverá ajustar-se e até mesmo remodelar-se, se necessário for, com vistas à proteção ambiental, enfrentando cada nova ameaça e cada risco ecológico existente.(85)

De outra banda, apenas para registrar, uma vez que o tema ultrapassa os limites deste estudo, não se demonstra suficiente uma política ambiental restrita aos limites do Estado, sendo necessária, para uma ampla preservação do meio ambiente, a cooperação(86) de diversos atores políticos internacionais.(87) Nessa linha, impõe-se a adoção de medidas ambientais internacionais(88) voltadas para a complexa problemática da preservação ambiental.(89)

Utilizando terminologia diversa do Estado Socioambiental, ao analisar as dimensões jurídicas fundamentais do que denomina Estado Constitucional ecológico, Canotilho assevera a importância de um modelo estatal regido por princípios ecológicos, voltado para novas formas de participação política, “sugestivamente condensadas na expressão democracia sustentada”.(90) Assim, pode-se afirmar que o Estado Constitucional Ecológico está respaldado na concepção de uma cidadania ambiental(91) em termos intergeracionais,(92)visto que o patrimônio natural ambiental(93) não foi concebido por uma única geração e, por isso, merece ser protegido por todas elas. O direito ao meio ambiente se converte em dever fundamental(94) de proteção a este mesmo meio ambiente que, por sua vez, destaque-se, não engloba apenas o que o autor denomina ambiente naturalista,(95) mas todo o conjunto de fatores – conforme estabelece o art. 5º da Lei de Bases do Ambiente(96) – físicos, químicos, culturais e sociais, com efeito direto e indireto na qualidade de vida dos seres humanos. Eis um dos desafios perseguidos por esse novo modelo estatal em Portugal, no Brasil e em outros países atualmente.(97)

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 apresenta-se como a Constituição de um Estado Socioambiental,(98) reconhecendo o “princípio da equidade intergeracional”.(99) Os dispositivos constitucionais condicionam a utilização dos recursos naturais para que as futuras gerações deles também possam desfrutar, além de prever a implementação de políticas públicas, por parte do Estado, para a sustentabilidade desses recursos.(100) O ambiente ecologicamente equilibrado é considerado bem de uso comum também compreendido, atualmente, como bem de interesse público.(101)

3 A fundamentalidade dos direitos socioambientais na Constituição Federal de 1988

No sistema de direitos fundamentais(102) vigente no ordenamento jurídico brasileiro, os direitos socioambientais não correspondem necessariamente à garantia de posições subjetivas a pretensões ao fornecimento de prestações materiais por parte do Estado, nem mesmo à titularidade atribuída a uma categoria social específica. Tais direitos visam, por intermédio de prestações materiais e normativas e pela manutenção do equilíbrio entre as forças nas relações sociais e privadas, ao estabelecimento de uma igualdade material. Trata-se de direitos vinculados à noção de igualdade, ainda que, para estabelecê-la, algumas discriminações sejam necessárias, na medida em que dizem respeito aos direitos de homens concretos.(103) No mesmo sentido é a lição de Faria ao apontar que os direitos socioambientais são direitos das preferências e das desigualdades, direitos discriminatórios com propósitos compensatórios.(104)

Os direitos socioambientais, positivados na Constituição Federal como autênticos direitos fundamentais, viabilizam o fornecimento de recursos fáticos imprescindíveis para o exercício dos demais direitos, buscando a efetivação da liberdade pela igualdade material. O que diferencia os direitos fundamentais entre si é a forma de articulação de cada um no que concerne à universalidade e à igualdade. A primeira pode ser reconduzida ao objetivo final de um direito que deve ser estendido a todas as pessoas; já a segunda, diz respeito a uma pretensão organizativa da sociedade com base nesses direitos.(105)

Assim, nos direitos individuais e civis, vige o princípio da não discriminação, pois existe, já no ponto de partida, uma igualdade entre todos os indivíduos. Do mesmo modo, há universalidade, pois a igualdade de tratamento deverá ser destinada a todos os indivíduos independentemente das circunstâncias em que se encontrem.(106) Os direitos políticos, por sua vez, surgiram da tentativa de restrição da cidadania apenas àqueles que possuíssem certo nível de instrução e cultura, além de recursos econômicos. Já os direitos socioambientais não se inserem nesse esquema, na medida em que não existe igualdade no ponto de partida desses direitos, mas uma desigualdade fática impedindo que as pessoas satisfaçam suas necessidades de forma autônoma. Note-se que são essas diferenças econômicas, sociais e culturais que ensejam as prestações viabilizadas pelos direitos socioambientais para todos aqueles que se encontrem em situação de desvantagem. A universalidade, nesses casos, consiste em objetivo a ser alcançado pelo direito; é o ponto de chegada. Já a igualdade não se faz por equiparação, mas pela discriminação das situações de desigualdade com o fito de alcançar a igualdade. Observe-se, contudo, que a universalidade como fim do direito e a igualdade como diferenciação, em que pesem características dos direitos socioambientais, não excluem sua fundamentalidade, comprometida com o favorecimento do desenvolvimento humano.(107)

A fundamentalidade material(108) dos direitos socioambientais está vinculada a uma certa ordem de valores aceita pela comunidade, além de outros elementos de cunho social, político, econômico e cultural, consagrados naquele sistema constitucional. No Brasil, esse conjunto valorativo se depreende dos princípios fundamentais (art. 1º da Constituição Federal), dos objetivos fundamentais (art. 3º da Constituição Federal), dos princípios das relações internacionais (art. 4º da Constituição Federal) e dos elementos do Preâmbulo da Carta Magna, além de outros – que podem aferir a fundamentalidade material de direitos não previstos expressamente no texto constitucional –, como as normas do catálogo de direitos fundamentais, os princípios e as normas gerais do Sistema Tributário Nacional, os princípios gerais da atividade econômica e diversos preceitos contidos no Título VIII.

A fundamentalidade formal,(109), por sua vez, diz respeito à positivação dos direitos fundamentais, com a qual se outorgam ao objeto da norma constitucional a supremacia e a força normativa da Constituição. Nesse contexto, os arts. 5º, § 1º, e 60 da Constituição Federal desempenham papel importante nessa proteção, impondo a aplicabilidade imediata das normas de direitos fundamentais e referindo as normas do dificultado processo de reforma constitucional, respectivamente.

Registre-se, por oportuno, que os critérios formal e material, referentes à fundamentalidade dos direitos, no Brasil, são interpretados de forma complementar e não excludente. Consoante lição de Sarlet, os direitos fundamentais consistem em posições jurídicas que dizem respeito às pessoas e que, por seu conteúdo e sua importância (fundamentalidade material), foram integradas ao texto constitucional, protegidas do arbítrio dos poderes constituídos (fundamentalidade formal), além daquelas posições jurídicas cujo objeto e significado possam ser àquelas equiparados, tendo ou não assento na Constituição formal, de acordo com o disposto no art. 5º, § 2º, da Carta Magna.(110)

Quanto à amplitude dos direitos socioambientais, importa destacar que o conceito materialmente aberto de direitos fundamentais integra:

a) os direitos fundamentais expressamente positivados no Título II da Constituição Federal;

b) os direitos fundamentais dispersos na Constituição Federal (direitos com status constitucional material e formal);

c) direitos fundamentais não escritos, sem previsão expressa do direito positivo, e decorrentes do regime e dos princípios;(111)

d) direitos estabelecidos em tratados internacionais de que o País faça parte.(112)

3.1 Dimensões subjetiva e objetiva

Os direitos fundamentais – aí incluídos, evidentemente, os direitos socioambientais – podem ser dimensionados objetiva ou subjetivamente,(113) por constituírem, de forma simultânea, fonte de direitos subjetivos e base fundamental da ordem jurídica.

A dimensão objetiva dos direitos fundamentais, consagrada no julgamento do caso Lüth pela Corte Constitucional germânica em 1958,(114) expressa, de acordo com o magistério de Hesse, as “bases da ordem jurídica da coletividade”.(115) Nessa dimensão, os direitos fundamentais correspondem a decisões valorativas(116) e fornecem diretrizes para os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.(117) Logo, para além de princípios e garantias atuantes na relação estabelecida entre indivíduo e Estado,(118) operam, igualmente, como princípios superiores estruturantes da ordem jurídica,(119) difundindo a “sua influência normativa no ordenamento jurídico e na vida da sociedade”.(120)

A dimensão objetiva remete os direitos fundamentais para o âmbito privado, transcende a relação entre indivíduo e Estado e limita a autonomia dos particulares. Toda a legislação ordinária, portanto, deverá estar conforme com os ditames dos direitos fundamentais.(121) Nesse contexto, importa referir dois dos desdobramentos mais importantes dessa dimensão: a denominada eficácia irradiante(122) dos direitos fundamentais – que em nada se confunde com a questão relativa à eficácia horizontal(123) – e a teoria dos deveres de proteção.

A eficácia irradiante é o meio pelo qual os direitos fundamentais convertem-se em norte para o ordenamento jurídico, emitindo diretrizes aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como condicionando a interpretação das normas legais. Nesse sentido, a eficácia irradiante enseja a “humanização da ordem jurídica”, nas palavras de Sarmento, ao exigir que as normas sejam reexaminadas pelo operador do direito “com novas lentes, que terão as cores da dignidade da pessoa humana, da igualdade substantiva e da justiça social, impressas no tecido constitucional”.(124)

Essa constatação conduz à ideia de que os direitos fundamentais expressam determinados valores essenciais à sociedade,(125) portanto, imperioso que sua análise seja feita do ponto de vista da comunidade,(126) o que enseja uma responsabilidade comunitária dos indivíduos na concretização dos direitos fundamentais. Por essa razão, Sarmento sustenta que a dimensão objetiva liga-se à ideia de que os direitos fundamentais não aspiram uma liberdade anárquica, mas social.(127) Daí advém, igualmente, que “todos os direitos fundamentais (na sua perspectiva objetiva) são sempre também direitos transindividuais”.(128) Logo, a limitação de direitos subjetivos individuais encontra respaldo visando ao interesse comunitário prevalente,(129) sempre respeitando-se o seu núcleo essencial.

De acordo com o magistério de Vieira de Andrade, no âmbito dos direitos fundamentais, “os preceitos constitucionais determinam espaços normativos, preenchidos por valores ou interesses humanos, afirmados como bases objectivas de ordenação da vida social”.(130)

Registre-se que os direitos em sua dimensão objetiva produzem efeitos jurídicos autônomos, desvinculados de uma dimensão subjetiva, razão pela qual é possível afirmar que a perspectiva jurídico-objetiva não consiste em “mero reverso da medalha”, para utilizar-se da expressão cunhada por Sarlet. Nesse sentido, os direitos nessa dimensão atuam como impositores legiferantes para a criação e a instituição de mecanismos que viabilizem o exercício dos direitos socioambientais, densificadores da dimensão subjetiva de tais direitos e executores do cumprimento das imposições institucionais.(131) Ademais, a dimensão objetiva protege normas que criam instituições e institutos públicos ou privados – de que é exemplo o Sistema Único de Saúde(132) – SUS –, assim como é capaz de fornecer parâmetros para a criação de instituições e a interpretação das normas procedimentais.(133)

A dimensão subjetiva,(134) por sua vez, corresponde ao direito, dos respectivos titulares,(135) de exigir, na esfera do Poder Judiciário, prestações materiais, mecanismos de proteção e defesa dos direitos. De acordo com o magistério de Morais, corresponde ao conjunto de competências que a normatividade objetiva confere aos titulares do direito.(136) Consiste no poder que o titular do direito possui para a realização dos interesses previstos na norma jurídica como seus, ainda que tais interesses possam ser simultaneamente coletivos e individuais.(137) A dimensão subjetiva, contudo, não pode ser reconduzida apenas aos direitos subjetivos públicos, não se limitando aos direitos de defesa oponíveis ao Estado.(138)

De acordo com o magistério de Hesse, em sua dimensão subjetiva, os direitos fundamentais consistem em “direitos básicos jurídico-constitucionais do particular, como homem e como cidadão”.(139) Sarlet adverte, contudo, que tal dimensão não se resume aos clássicos direitos de liberdade, em que pese a nota de subjetividade aparecer mais claramente nessa categoria.(140)

De modo geral, entende-se por direito subjetivo a possibilidade(141) que um titular tem de “impor judicialmente seus interesses juridicamente tutelados perante o destinatário (obrigado)”.(142) Daí advém que o direito subjetivo está alicerçado em uma relação trilateral(143) entre titular, objeto e destinatário de um direito.(144) Os direitos sociais,(145)especialmente, são compreendidos como direitos subjetivos inerentes à existência dos indivíduos,(146) independentemente de sua justiciabilidade e sua exequibilidade imediatas.(147) Portanto, direitos como o da saúde, o do meio ambiente e o da qualidade de vida possuem dignidade equivalente à dos direitos de liberdade, não podendo o Estado ou os particulares interferirem negativamente no seu âmbito de proteção.(148) Como bem referiu Mello, “a luta pela eficácia dos direitos fundamentais sociais tem sido acima de tudo uma luta para conceder a eles o status de direitos subjetivos”.(149) Além disso, não se pode olvidar a complexidade(150) que a perspetiva subjetiva dos direitos fundamentais oferece, porquanto o direito é compreendido como um feixe de posições jurídicas diversas,(151) cuja positivação, conteúdo e alcance demonstram-se tão diferenciados quanto as funções que podem assumir os diversos direitos fundamentais existentes.(152)

Para Alexy, os direitos fundamentais constituem um sistema de posições jurídicas fundamentais, formando, em seu conjunto, o direito fundamental como um todo, admitidas três posições básicas: direitos a algo (direitos a ações negativas e direitos a ações positivas), liberdades e competências.(153)

Inspirado em Alexy, Canotilho organiza a dimensão subjetiva dos direitos fundamentais da seguinte maneira:

a) direitos a atos negativos com uma tríplice perspectiva (direito ao não impedimento de determinados atos por parte dos órgãos públicos, direito à não intervenção em situações jurídico-subjetivas pelos entes públicos, direito à não eliminação de posições jurídicas);

b) direitos a ações positivas (de natureza fática ou de natureza normativa);

c) liberdades (possibilidade de escolha de um comportamento);

d) competências (possibilidade da prática de algum comportamento e, com isso, a alteração de determinadas posições jurídicas).

Na organização adotada por Sarlet – diferenciando-se da proposta de Canotilho na divisão dos elementos –, os direitos fundamentais apresentam-se como um “feixe de posições estruturalmente diferenciadas”, divididos da seguinte maneira: a) direitos a qualquer coisa (direitos de defesa e direitos a prestação); b) liberdades (negação de exigências e proibições); c) poderes (competências e autorizações). Em outras palavras, no âmbito da perspectiva subjetiva,(154) os direitos fundamentais consistem na possibilidade de se exigirem judicialmente os “poderes, as liberdades ou mesmo o direito à ação ou às ações negativas ou positivas que lhes foram outorgadas pela norma consagradora do direito fundamental em questão”.(155)

3.2 Dimensões positiva e negativa

Diversas podem ser as classificações dos direitos fundamentais, partindo-se de inúmeros critérios. A classificação adotada por Sarlet será aplicada neste estudo.

Ademais, registre-se que a classificação dos direitos fundamentais encontra óbice em diversas peculiaridades do direito constitucional positivo. Da mesma forma, a técnica legislativa empregada muitas vezes dificulta o esforço de classificação. Um exemplo dessa dificuldade pode ser compreendido a partir dos direitos sociais, que correspondem tanto a direitos a prestações quanto a concretizações dos direitos de liberdade e igualdade. Por essa razão, adverte-se que o ato de incluir um ou outro direito fundamental em determinada categoria baseia-se na predominância de um elemento específico desse direito – um elemento defensivo ou prestacional.(156)

De fato, não poderia ser diferente, pois a Constituição Federal de 1988 concebeu as diversas categorias de direitos fundamentais em um todo harmônico, de modo que, nos direitos fundamentais previstos no art. 5º, encontra-se uma dimensão social, quebrando o formalismo e a abstração, visando à concretização material dos valores ali contidos. Essa é uma das características de um Estado que transitou do regime político-formal para uma democracia de conteúdo social. Os direitos sociais valem como pressupostos de gozo dos direitos individuais, na medida em que auxiliam no alcance de uma igualdade real, o que melhora as condições de exercício da liberdade.(157)

Sarlet, na esteira de Alexy e Canotilho, parte da divisão dos direitos fundamentais em dois grandes grupos. O primeiro composto pelos direitos de defesa, e o segundo, pelos direitos a prestações. Esse segundo grupo, por sua vez, subdivide-se em direitos a prestações em sentido amplo – abrangendo os direitos de proteção e de participação na organização e procedimento – e direitos a prestações em sentido estrito – direitos materiais sociais.(158)

Entretanto, cumpre ressaltar que, no âmbito dos direitos fundamentais – o que se observa com clareza na categoria dos direitos sociais –, convivem simultaneamente as dimensões defensiva e prestacional, portanto inevitável uma superposição. O direito fundamental como um todo, consistindo em complexo de posições subjetivas fundamentais, tem, em regra, uma dupla dimensão negativa e positiva.(159) Assim, a inclusão de um dado direito em um ou outro grupo ocorrerá levando-se em conta a predominância do elemento de defesa ou de prestação.

Sarlet classifica os direitos fundamentais – aí incluídos, evidentemente, os direitos socioambientais –, tendo em vista o caráter multifuncional dessas normas, em dois grandes grupos, a saber: direitos de defesa(160) (abstenção) e direitos a prestações (ação). Todavia, registre-se, essa divisão não guarda correspondência com os direitos de liberdades e com os direitos sociais, até mesmo porque é possível extrair destes últimos, a título de exemplo, uma função negativa, como é o caso da declaração de inconstitucionalidade.

A dimensão negativa dos direitos socioambientais reclama uma abstenção

por parte do Estado – que não poderá intervir na esfera individual da pessoa ou poderá fazê-lo apenas em determinadas hipóteses e sob certas condições(161) – ou dos particulares. Implica o dever de respeito a outrem, que poderá recorrer ao Poder Judiciário, caso esse direito seja desrespeitado.(162) Nesse contexto, é possível verificar que o Estado realiza prestações com o fito de resguardar a dimensão negativa dos direitos fundamentais.(163)

Nesse contexto, a dimensão negativa poderá ser verificada em um âmbito fático e em um âmbito legal. No primeiro, a dimensão negativa atua impedindo a prática de condutas que possam causar algum prejuízo ao direito em apreço. No caso específico do direito fundamental à saúde, por exemplo, a dimensão negativa desse direito impede a aplicação de terapias experimentais em pacientes que não autorizem essas práticas. No que diz respeito ao âmbito legal, a dimensão negativa torna inconstitucionais as normas que não estiverem de acordo com os ditames da Constituição Federal, seja porque não foram respeitadas as normas referentes ao procedimento legislativo por ocasião da sua elaboração, seja porque seu conteúdo se apresente contrário ao que fora determinado pelo texto constitucional. Nesse sentido, são as cláusulas pétreas que impõem limites ao poder reformador, justamente para impedir a supressão de elementos essenciais presentes na Constituição Federal, o que ensejaria, inevitavelmente, uma afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana.(164) No caso do direito à saúde, a dimensão negativa do direito no âmbito legal se manifesta, a título de exemplo, com a atuação do princípio da vedação do retrocesso,(165) impedindo a revogação de normas que protejam o direito à saúde ou a diminuição de benefícios já concedidos para a sua concretização. 

A dimensão positiva dos direitos fundamentais, por sua vez, reclama uma conduta ativa por parte do Estado que tem o dever de fornecer prestações capazes de satisfazer as necessidades dos cidadãos, tendo como parâmetro a dignidade da pessoa humana. Originando-se do que Alexy denominou “direito a algo”,(166) impõem ao Estado uma atuação ativa na implementação de medidas e na viabilização de condições fáticas e normativas para a fruição dos direitos, sem olvidar-se da responsabilidade dos particulares e das instituições privadas na contribuição para a concretização dos direitos fundamentais.

Realizados tais apontamentos sobre a dupla dimensão positiva e negativa dos direitos fundamentais, se impõe a digressão sobre os direitos originários e os derivados, ainda que de forma singela. Os primeiros correspondem à possibilidade de extraírem-se, diretamente da norma constitucional, direitos subjetivos, sem que, para tanto, exista uma lei infraconstitucional.(167) Já os direitos derivados necessitam da atuação do legislador ordinário para que deles possa ser extraído um direito subjetivo.(168)

A dimensão defensiva dos direitos fundamentais gera ao titular um direito subjetivo originário,(169) assim como a dimensão prestacional em sentido amplo – direitos a proteção, por meio de organização e procedimento –, de acordo com Canotilho, é capaz de conceber direitos subjetivos originários a prestações. Quanto à dimensão prestacional em sentido estrito (prestações materiais),(170) também é possível extrair direito subjetivo originário, especialmente no que se refere à realização do mínimo existencial. Já no tocante ao direito à saúde, a jurisprudência brasileira tem concedido tratamentos e medicamentos, diretamente, com base na norma constitucional.

A compreensão dos direitos socioambientais como direitos originários (direitos originários a prestações), segundo Canotilho, remete ao problema da efetivação desses direitos, pois a sua concretização não está reduzida a simples apelo ao legislador – tendo em vista que o direito à saúde, por exemplo, depende de uma atividade mediadora dos poderes públicos –, existindo verdadeira “imposição constitucional legitimadora, entre outras coisas, de transformações econômicas e sociais”(171) sempre que se fizer necessário para a efetivação de tais direitos.(172) O autor ainda destaca que as normas consagradoras de direitos socioambientais implicam interpretação de normas legais conforme a “constituição social econômica e cultural”, assim como a inércia estatal na criação de condições de efetivação desses direitos ensejará inconstitucionalidade por omissão.(173)

Considerações finais

Do exercício investigativo realizado é possível extrair algumas conclusões parciais:

A proteção ambiental foi lançada como um dos valores mais importantes a serem perseguidos pelo Estado de Direito, tendo em vista toda a sorte de riscos que marcam a sociedade contemporânea. O Estado Socioambiental, reunindo os resultados positivos dos modelos estatais anteriores, intenta reparar o débito social oriundo do liberalismo, e agregar a dimensão coletiva dos direitos, surgida no Estado Social, com vistas à otimização na concretização de direitos socioambientais em uma perspectiva de solidariedade.

A Constituição Federal de 1988 consiste em precioso arcabouço jurídico para o desenvolvimento de um Estado Socioambiental, trazendo, pela primeira vez na história do constitucionalismo brasileiro, um capítulo inteiramente dedicado à proteção ambiental, alinhada com o desenvolvimento do direito constitucional comparado. Na medida em que os dispositivos constitucionais ofereceram ampla proteção tanto à bio quanto à sociodiversidade, representaram importante marco na proteção jurídica ambiental, consagrando a importância de um meio ambiente equilibrado para o desenvolvimento humano, compatível com a dignidade e viabilizador de uma existência digna e saudável.

O Estado Socioambiental persegue a concretização de uma existência mais sadia, proporcionando às pessoas uma melhor qualidade de vida e a satisfação dos direitos socioambientais. Em que pese a proteção das bases naturais da vida corresponder a uma tarefa pública destinada à comunidade, não impõe apenas a atuação estatal, convocando a colaboração de todos os membros da comunidade. De igual modo, não se pode olvidar a importância do papel desempenhado pelas instituições políticas e sociais, a exemplo do Ministério Público e da Defensoria Pública.

Os direitos socioambientais possuem dupla fundamentalidade. A fundamentalidade material está vinculada a uma certa ordem de valores aceita pela comunidade, além de outros elementos de cunho social, político, econômico e cultural, consagrados naquele sistema constitucional. A fundamentalidade formal, por sua vez, diz respeito à positivação dos direitos fundamentais, com a qual se outorga ao objeto da norma constitucional a supremacia e a força normativa da Constituição. Todavia, os critérios formal e material, referentes à fundamentalidade dos direitos, no Brasil, são interpretados de forma complementar, e não excludente.

Tais direitos ainda podem ser dimensionados objetiva ou subjetivamente. A dimensão objetiva dos direitos fundamentais expressa as bases da ordem jurídica da coletividade, bem como remete os direitos fundamentais para o âmbito privado, limitando a autonomia dos particulares. Os desdobramentos mais importantes dessa dimensão consistem na eficácia irradiante dos direitos fundamentais e na teoria dos deveres de proteção. A dimensão subjetiva corresponde ao direito, dos respectivos titulares, de exigir na esfera do Poder Judiciário prestações materiais, mecanismos de proteção e defesa dos direitos. Consiste no poder que o titular do direito possui para a realização dos interesses, previstos na norma jurídica como seus, ainda que tais interesses possam ser, simultaneamente, coletivos e individuais.

Os direitos fundamentais possuem dupla dimensão negativa e positiva. Em síntese, a primeira reclama uma abstenção por parte do Estado ou dos particulares na prática de condutas que possam interferir indevidamente na esfera individual da pessoa, implicando o dever de respeito a outrem, que poderá recorrer ao Poder Judiciário sempre que sofrer ameaça ou lesão a essa esfera de liberdade pessoal. A dimensão positiva dos direitos fundamentais, por sua vez, reclama uma conduta ativa por parte do Estado, que tem o dever de fornecer prestações capazes de satisfazer as necessidades dos cidadãos, tendo como parâmetro a dignidade da pessoa humana.

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Notas

1. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 46.

2. Porto, sobre a tensão entre a burguesia e o proletariado, ocorrida nessa época, leciona: “Entretanto, como tudo que nasce traz em si o princípio de sua própria transformação, a Revolução Industrial do Século XIX, consequência mais nítida das revoluções liberais, carregava consigo o gérmen do fim da hegemonia burguesa: a acumulação do capital nas nações mais ricas, em razão do incremento industrial, a produção em série, o desemprego crescente e as péssimas condições de trabalho geraram o surgimento de nova tensão social, já não mais entre a burguesia e a nobreza, mas entre a burguesia e o proletariado, manifestando-se, assim, a oposição entre os que possuíam os meios de produção e os detentores da força de trabalho” (PORTO, Pedro Rui da Fontoura. Direitos fundamentais sociais: considerações acerca da legitimidade política e processual do Ministério Público e do sistema de justiça para sua tutela. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p.46-47).

3. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 46-47.

4. Os direitos sociais – e essa perspectiva igualmente pode ser estendida aos direitos socioambientais – são compreendidos como respostas históricas ao problema da convivência, das lutas sociais e das diversas formas de necessidades humanas (DULCE, María José Fariñas. La historicidad de los derechos humanos: desde la perspectiva sociológico-jurídica a la actitud postmoderna. Madrid: Dykinson, 2006. p. 6).

5. O individualismo do século XVIII, segundo Peláez, distorcia a realidade humana por duas razões: primeiro, porque tratava o ser humano como uma espécie de mente desencarnada, centrando sua atenção em exigências de caráter espiritual, sem atender a uma dimensão biológico-econômica da pessoa; segundo, porque criava uma imagem autossuficiente do homem, ignorando vínculos de solidariedade que ligam o sujeito com seu entorno social. Os direitos sociais partem de uma visão integrada do homem, que não pode ser visto como um ermitão, mas como um ser em constante interação com seus semelhantes. Por isso, há quem sustente ser a expressão “direitos sociais” redundante, pois o conceito de direito já está imbuído de uma noção implícita de sociedade como precondição de sua existência. Tais direitos somente fazem sentido se inseridos em um contexto socializante. O direitos sociais são mecanismos de integração do indivíduo pelos quais as pessoas beneficiam-se e contribuem para a manutenção do bem-estar social (PELÁEZ, Francisco José Contreras. Derechos Sociales: teoría e ideología. Madrid: Tecnos, 1994. p. 26-27).

6.  BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 187-191.

7. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 47-48.

8. FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos Fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 94-95.

9. Caberá ao homem a tarefa de recuperar o meio ambiente que degradou, com a incessante busca pelo progresso econômico e tecnológico. Afinal, consoante lição de Hannah Arendt, a vita activa – a vida do homem que se propõe e se empenha em fazer algo – cria raízes em um mundo de homens ou composto de coisas feitas por eles (ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 31).

10.FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 95.

11. Os novos direitos, segundo Bobbio, surgem necessariamente dos perigos à vida, à liberdade e à segurança, ocasionados pelo progresso tecnológico (BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 229).

12. Morato Leite e Ayala asseveram que o “Estado de Direito Ambiental” – denominação eleita pelos autores para referir o que, nesta pesquisa, é denominado “Estado Socioambiental” – tem por objetivo a garantia do que já existe (o bem ambiental) e a recuperação daquilo que deixou de existir. (LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Novas tendências e possibilidades do Direito Ambiental no Brasil. In: LEITE, José Rubens Morato; WOLKMER, Antonio Carlos. Os “novos” direitos no Brasil: natureza e perspectivas: uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 194-195).

13. FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 97.

14.PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de Filosofía Jurídica y Política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 8-9.

15. Peces-Barba assevera: “En efecto en el origen está la dignidad humana, pero no de unos pocos elegidos, sino la de todos y esa idea está ya en su raiz, en la afirmación fundamental de la cultura griega de que ‘la humanidad, el ser del hombre, se hallaba essencialmente vinculado a las características del hombre, considerado como um ser político’. Por eso un rasgo común del espíritu griego será el servicio a la comunidad y la especial relación entre los hombres con el concepto de ‘philia’, de amistad” (PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de Filosofía Jurídica y Política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 9).

16. PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de Filosofía Jurídica y Política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 13.

17. De acordo com Peces-Barba: “Apesar de los cámbios enormes de circunstancias, en la Edad Media, con la cristianización de Cicerón y de Aristóteles, se mantiene, en las condiciones propias de su tiempo la idea de la fraternidad, bajo denominaciones y planteamientos diferentes, pero con la idea de la comunicación, y de la ayuda y el auxilio. En el tránsito a la modernidad, las circunstancias sociales, económicas y culturales cambiarán y eso matizará y completará los cimientos de los derechos sociales desde nuevas perspectivas, aunque para tejer esa nueva tela, se utilizarán muchos hilos viejos, especialmente de la antigüedad clásica. Es la vieja raiz del humanismo que reaparece con renovado vigor” (PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de Filosofía Jurídica y Política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 15).

18. Sobre a formação do Estado norte-americano, Sarmento leciona: “Com a independência das 13 Colônias, formou-se uma Confederação de Estados soberanos, e vários deles chegaram a editar declarações de direitos, sendo a mais célebre a Declaração do Estado de Virgínia de 1776. Porém, a Constituição de 1787, que unificou as 13 colônias, criando um Estado Federal, deixou, paradoxalmente, de estabelecer qualquer rol de direitos, omissão que só veio a ser suprida em 1791, com a aprovação de 10 emendas que consubstanciam o Bill of Rights, elenco de liberdades públicas e garantias constitucionais em favor do cidadão americano” (SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 381).

19. SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 380.

20. Novas fontes de inspiração para os direitos fundamentais têm origem: o Manifesto Comunista, as doutrinas marxistas que postulavam o alcance de uma igualdade material dentro de um regime socialista, a doutrina social da Igreja com o intuito de promover a ideia de uma ordem mais justa que acolhesse, efetivamente, todos aqueles menos favorecidos, bem como o intervencionismo estatal, que passa a reconhecer a importância de uma conduta ativa do Estado, intervindo nos setores econômicos e sociais para promover a igualdade entre as pessoas (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 174-175).

21.SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 381-382.

22. ANDRADE, José Carlos Vieira. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 57.

23. LEDUR, José Felipe. Direitos fundamentais sociais: efetivação no âmbito da democracia participativa. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 71.

24. DULCE, María José Fariñas. La historicidad de los derechos humanos: desde la perspectiva sociológico-jurídica a la actitud postmoderna. Madrid: Dykinson, 2006. p. 7.

25. DULCE, María José Fariñas. La historicidad de los derechos humanos: desde la perspectiva sociológico-jurídica a la actitud postmoderna. Madrid: Dykinson, 2006. p. 9-10.

26. ARANGO, Rodolfo. Estado Social de Derecho y derechos humanos. Disponível em: <http: //www.revistaumero.com/39sepa6htm> Acesso em: 1º jun. 2010.

27. De acordo com Sarmento, a globalização “vem alimentando o processo de esfacelamento do Estado-Providência, na medida em que vai corroendo seu poder de efetivamente subordinar, de modo soberano, os fatores econômicos e sociais que condicionam a vida de cada comunidade política. Cada vez mais avulta a importância de variáveis exógenas sobre a economia nacional, sobre as quais o Estado-Nação não exerce nenhum poder” (SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 398).

28. Nesse contexto, poder-se-ia referir a fórmula de justiça distributiva de Nozick, um defensor do Estado mínimo: (tradução livre do original em inglês) “De cada um, como eles escolherem; a cada um, como foram escolhidos” (NOZICK, Robert. Anarchy, State and utopia. New York: Basic Books, 1974. p. 161).

29. SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 396.

30. DULCE, María José Fariñas. La historicidad de los derechos humanos: desde la perspectiva sociológico-jurídica a la actitud postmoderna. Madrid: Dykinson, 2006. p. 10-11.

31. DULCE, María José Fariñas. La historicidad de los derechos humanos: desde la perspectiva sociológico-jurídica a la actitud postmoderna. Madrid: Dykinson, 2006. p. 12-13.

32. KLOEPFER, Michael. A caminho do Estado Ambiental? A transformação do sistema político e econômico da República Federal da Alemanha através da proteção ambiental especialmente desde a perspectiva da ciência jurídica. In: SARLET, Ingo Wolfgang Sarlet (org.). Estado Socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 43.

33. A definição de desenvolvimento sustentável, cunhada pelo Relatório Brundtland, já incorporava os componentes ambiental e social do desenvolvimento, sustentando a ideia de que tal desenvolvimento deveria ser ambiental e socialmente sustentável, além de economicamente viável.

34. O filósofo Gaarder fala sobre a importância desse dever de proteção ao meio ambiente, referindo-se à necessidade de estabelecerem-se “obrigações naturais”. O autor afirma que a “insensatez ecológica do mundo ocidental também é uma infração às obrigações do homem. O conceito de ‘direitos naturais’ tem uma história de mais de dois mil anos, e agora pergunto: ‘Quando estaremos dispostos a assumir o conceito de obrigações naturais?’” (GAARDER, Jostein. Maya. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 44).

35. Kloepfer exemplifica com o caso da Constituição Alemã que, embora não contemplasse um dever de proteção ambiental até 1994, já previa direitos fundamentais que continham uma asseguração parcial da proteção do meio ambiente (art. 2, § 2º, e art. 14 da Lei Fundamental Alemã) e que poderiam obrigar o Estado a assumir condutas cautelosas em relação ao meio ambiente ou assumir diretamente o dever de proteção desse. Em 21.10.1994, contudo, a Lei Fundamental Alemã previu em seu art. 20 bis (20-A) o dever do Estado na proteção das bases naturais da vida, com vistas ao cumprimento de sua responsabilidade com as gerações futuras no contexto da estrutura constitucional e em conformidade com a lei e a jurisdição (KLOEPFER, Michael. A caminho do Estado Ambiental? A transformação do sistema político e econômico da República Federal da Alemanha através da proteção ambiental especialmente desde a perspectiva da ciência jurídica. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Estado Socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 45).

36. Orientação que somente foi rompida entre os anos 1990 e 2000, com a edição de leis socioambientais que preveem mecanismos de gestão dos recursos naturais, além da repressão de determinadas condutas lesivas ao meio ambiente (SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 29-30).

37. Segundo Bercovici, a Constituição de 1934 “procurou, também, uma nova estruturação para o federalismo brasileiro, que podemos denominar cooperativo, de acordo com seu art. 9º. O artigo 10 da Constituição de 1934 fixou, pela primeira vez na história constitucional brasileira, a repartição das competências concorrentes (artigo 10), dando ênfase à solidariedade entre a União e os entes federados” (BERCOVICI, Gilberto. Tentativa de instituição da democracia de massas no Brasil: instabilidade constitucional e direitos sociais na Era Vargas (1930 – 1964). In:SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 35).

38. Bonavides afirma a semelhança “efetiva e inarredável” entre o Direito Constitucional brasileiro e o alemão. BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 369-370.

39. A Constituição Federal de 1988, nas palavras de Ledur, “deu um salto qualitativo de extraordinário significado no terreno dos direitos sociais ao incluí-los no rol dos direitos fundamentais e porque reconheceu novos direitos, resultantes da influência do movimento social na convocação da Assembleia Nacional Constituinte e no desenvolvimento dos seus trabalhos”. (LEDUR, José Felipe. Direitos fundamentais sociais: efetivação no âmbito da democracia participativa. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 77).

40. Estado Social esse que, nas palavras de Bonavides, deriva do consenso, das transformações pacíficas dos elementos que compõe a sociedade, da força desenvolvida pela reflexão criativa e dos efeitos da acomodação lenta dos interesses políticos e sociais. Afigurando-se o Estado Social do Constitucionalismo Democrático da segunda metade do século XX, o mais apropriado para a concretização dos direitos fundamentais (BONAVIDES, Paulo. O Estado Social e sua evolução rumo à democracia participativa. In:SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p.69).

41. Consoante a diferenciação proposta por Bonavides: “Uma coisa é a Constituição do Estado liberal, outra, a Constituição do Estado Social. A primeira é uma Constituição antigoverno e antiestado; a segunda, uma Constituição de valores refratários ao individualismo no Direito e ao absolutismo no Poder” (BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 371).

42. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 21-24.

43. A Emenda Constitucional nº 64/2010 ampliou o art. 6º, inserindo em seu rol de direitos sociais o direito à alimentação, ficando a redação do artigo nestes termos: “ Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Disponível em: <www.planalto.gov.br> Acesso em: 12 jun. 2010.

44. SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 42.

45. SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. O papel do Poder Judiciário brasileiro na tutela e efetivação dos direitos e deveres socioambientais. In: Revista de Direito Ambiental – RDA, São Paulo, a. 13, n. 52, out.-dez. 2008, p. 75.

46. A garantia de um mínimo existencial ecológico, segundo Molinaro, e o princípio da vedação da retrogradação ambiental, contemplados pela Constituição Federal de 1988, consistem em elementos estruturantes de um verdadeiro Estado Socioambiental e Democrático de Direito, na medida em que um Estado Socioambiental somente poderá ser pensado “em um ‘lugar de encontro’ onde os cidadãos e cidadãs possam minimamente conviver e desenvolver-se em condições de segurança, liberdade e igualdade substanciais, conformadoras na dignidade que lhes é atribuída, (com) viver exige, pois, uma ambiência saudável, sustentadora e sustentada, o que pode ser alcançado com a promoção, conservação, manutenção e consequente vedação da degradação deste ‘lugar de encontro’” (MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 103).

47. SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. O papel do Poder Judiciário brasileiro na tutela e efetivação dos direitos e deveres socioambientais. In: Revista de Direito Ambiental – RDA, São Paulo, a. 13, n. 52, out.-dez. 2008, p. 75.

48. O direito ao meio ambiente, como direito subjetivo fundamental, transcende aos limites deste estudo. Sobre o tema, vide CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O direito ao ambiente com direito subjetivo. In: A tutela jurídica do meio ambiente: presente e futuro. Coimbra: Coimbra, 2005. p. 53-55.

49. Acerca do dever de proteção ambiental, registre-se a lição de Medeiros: “Intrinsecamente vinculado ao direito de proteção ambiental, existe um dever fundamental. Esse dever fundamental caracteriza-se pela obrigação incumbida ao Estado e a cada um dos indivíduos partícipes de nossa sociedade em manter um ambiente saudável, sadio e equilibrado, seja por intermédio de cuidados básicos para com o meio, seja por grandes participações populares na luta pela não destruição do hábitat natural” (MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 124).

50. De acordo com a lição de Sarmento: “Se é certo que a Constituição não pode tudo, e não deve, por isso, ser sobrecarregada com tarefas que ela não tem minimamente como cumprir, sob pena da sua desvalorização como norma jurídica, também é certo que decapitar a Constituição da sua carga substantiva, condenando-a ao silêncio sobre a opressão e a injustiça social, corresponde, mutatis mutandi, a convertê-la em um Pôncio Pilatos, que lava suas mãos diante da ignomínia” (SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 413).

51. SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 46.

52. O século XX foi o gestor, ainda que incipiente, de um movimento capaz de contestar o modelo de atuação científica e política. O “ecologismo”, travando diálogo com outros movimentos típicos da segunda dimensão de direitos humanos, redefine o eixo de produção e conquista a igualdade perseguida pelos movimentos sociais (PORTANOVA, Rogério. Direitos humanos e meio ambiente: uma revolução de paradigma para o século XXI. In: LEITE, José Rubens Morato; BELLO FILHO, Ney de Barros (org.). Direito Ambiental contemporâneo. São Paulo: Manole, 2004. p. 632-633).

53. LEDUR, José Felipe. Direitos fundamentais sociais: efetivação no âmbito da democracia participativa. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 80.

54. Nesse sentido, Piovesan assevera que a Constituição Federal de 1988 desponta como uma das constituições mais avançadas no mundo no que diz respeito ao regramento dos direitos fundamentais, empenhada em assegurar os valores da dignidade da pessoa humana e do bem-estar como imperativo da justiça social (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 25-27).

55. Santilli aponta a importância, nesse mesmo período, da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, no ano de 1992, chamada Eco-92. Marco histórico do ambientalismo nacional e internacional, é vista como a maior conferência realizada pela ONU. Por ocasião da Eco-92, foram assinados diversos documentos importantes para o desenvolvimento da concepção do socioambientalismo, prevendo a implementação de formulações políticas, sociais e ambientais em todo o mundo. Essa conferência trouxe grande visibilidade política para os movimentos ambientalistas, bem como para muitos dos temas das agendas nacional e global. Em virtude da Eco-92, foi criado o Fórum Brasileiro de Organizações Não Governamentais e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, desempenhando papel essencial na promoção da participação da sociedade brasileira, no que se refere às articulações entre movimentos sociais e ambientalistas (SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 43).

56. FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 73.

57. Sobre a Idade Contemporânea, registre-se a lição de George Marmelstein: “ainda temos muito a evoluir. Na verdade, nem a sociedade antiga era tão insensível assim, nem a sociedade contemporânea é composta apenas por seres humanos bondosos que respeitam incondicionalmente os direitos de seus semelhantes. Do mesmo modo que os nossos antepassados defenderam ideias e praticaram atos que hoje são condenáveis do ponto de vista ético, nós também certamente estamos sujeitos a sermos julgados negativamente pelas gerações que virão” (MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 33).

58. Os direitos de terceira dimensão – direito ao desenvolvimento, à autodeterminação dos povos, à defesa da paz e ao meio ambiente – podem ser encontrados na Constituição Federal de 1988, respectivamente: no preâmbulo, no art. 4º, incisos III e VI, e no art. 225, caput.

59. Nesse contexto, oportuno mencionar a lição de Leal, para quem o “Estado como novíssimo movimento social” é um Estado articulador que detém o monopólio da metagovernação. Nas palavras do autor: a “experimentação externa do Estado nas novas funções de articulação societal deve igualmente ser acompanhada por experimentação interna, no nível do desenho institucional que assegura com eficácia democrática essa articulação” (LEAL, Rogério Gesta. Esfera pública e participação social: possíveis dimensões jurídico-políticas dos direitos civis de participação social no âmbito da gestão dos interesses públicos no Brasil. Interesse Público, Porto Alegre, a. 8, n. 38, jul./ago. 2006, p. 75-76).

60. ANDRADE, José Carlos Vieira. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 64-65.

61. Análise mais aprofundada sobre o tema, vide: LINS, Litiane Cipriano Barbosa. Direitos socioambientais: titularidade e exigibilidade judicial a partir da análise do direito fundamental à saúde. Curitiba: Juruá, 2012.

62. MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 21-22.

63. MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 28.

64. Consoante lição de Teixeira: “O ponto de equilíbrio para alcançar o meio ambiente sadio será determinado pela harmonia entre os componentes do ecossistema – em especial, entre o homem, os seres vivos e a natureza, com suas características físico-químicas. Todos os integrantes do ecossistema estão inter-relacionados e devem, portanto, conviver em harmonia, sob pena de romper ou de desequilibrar o ecossistema planetário” (TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 31).

65. MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 28.

66. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 93.

67. Nas palavras de Molinaro, o direito socioambiental consiste em domínio de regulação do entorno, regulamentando a emancipação dos seres humanos que ali estabelecem uma convivência, seja ela harmoniosa ou não, seja ela fruto de uma relação mediata ou imediata (MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e Estado Socioambiental e Democrático de Direito. Dissertação de Mestrado, PUCRS, 2006. p. 45).

68.  Nesse sentido, Molinaro afirma que o princípio nuclear de um Estado Socioambiental é o direito fundamental à vida “e a manutenção das bases que a sustentam, o que só se pode dar em um ambiente equilibrado e saudável, onde vai concretizar-se, em sua plenitude, a dignidade humana; ademais, um tipo de Estado com essa característica está comprometido com o privilegiar a existência de um ‘mínimo ecológico’, pois tem a obrigação de proteção à posteridade” (MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 104).

69. O conceito de vida passou a exigir uma dimensão plena de desenvolvimento existencial, ultrapassando os limites do biofísico e tendo por elemento nuclear o pleno desenvolvimento da personalidade humana. (FENSTERSEIFER, Tiago. Ambiente e dignidade: a dignidade das gerações humanas futuras e do animal não humano. Revista da Faculdade de Direito da FMP, Porto Alegre, n. 1, 2007, p. 106-107).

70. Aqui vale destacar a abordagem feita por Molinaro sobre o ambiente visto como local de encontro, onde o respeito mútuo deve prevalecer, com vistas à existência digna e saudável de todos os seres. Nesse contexto, o autor trouxe o exemplo das culturas africanas, explicando que, na maior parte delas, observa-se que “a diferenciação é considerada como essencial e pré-requisito funcional para que cada um seja indispensável ao outro. Isso porque, na cultura africana, somente podem viver juntos aqueles que são diferentes, tendo em vista que, na perspectiva africana do mundo, a vida é um processo em que cada um se identifica progressivamente, não com o outro, do qual deve reivindicar sua diferença, mas com a totalidade da comunidade, vale dizer, com a vida cósmica e, especialmente, com a vida divina; aqui evidencia-se um matiz forte de um ‘mínimo existencial ecológico’ como núcleo material do princípio da dignidade humana” (MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e Estado Socioambiental e Democrático de Direito. Dissertação de Mestrado, PUCRS, 2006. p. 109).

71. MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e Estado Socioambiental e Democrático de Direito. Dissertação de Mestrado, PUCRS, 2006. p. 106.

72. PRESTES, Vanêsca Buzelato. Dimensão constitucional do direito à cidade e formas de densificação no Brasil. Dissertação de Mestrado, PUCRS, 2008. p. 52.

73. De acordo com a referência de Sarlet e Fensterseifer: “Estado Constitucional Ecológico”, denominado por Canotilho, em: CANOTILHO, J.J. Gomes. Estado constitucional ecológico e democracia sustentada. In:SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Direitos fundamentais sociais: estudos de direito constitucional, internacional e comparado. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003. p. 493-508; “Estado Pós-Social”, na visão de Sarmento, em: SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 375-414; e PEREIRA DA SILVA, Vasco. Verde cor de direito: lições de direito do ambiente. Coimbra: Almedina, 2002. p. 24; “Estado de Bem-Estar Social”, na concepção de Portanova, em: PORTANOVA, Rogério. Diretos humanos e meio ambiente: uma revolução de paradigma para o século XXI. In:BENJAMIN, Antônio Herman (org.). Anais do 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental – 10 anos da ECO-92: o Direito e o desenvolvimento sustentável. São Paulo: Instituto O Direito por um Planeta Verde/Imprensa Oficial, 2002. p. 681-694; “Estado Ambiental de Direito, para Nunes Jr., em: NUNES JÚNIOR, Armandino Teixeira. Estado ambiental de direito. Jus Navigandi, n. 589, fev. 2005. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6340>; “Estado do Ambiente,para Haberle, em: HABERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 128; “Estado de Direito Ambiental”, para Morato Leite, em: LEITE, José Rubens Morato. Estado de direito do ambiente: uma difícil tarefa. In:______ (org.). Inovações em direito ambiental. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2000. p. 13-40; e “Estado Socioambiental”, na concepção de Fensterseifer, em: FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008 (SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. O papel do Poder Judiciário brasileiro na tutela e efetivação dos direitos e deveres socioambientais. Revista de Direito Ambiental – RDA, São Paulo, a. 13, n. 52, out.-dez. 2008, p. 80-81).

74. De acordo com a lição de Kloepfer: “O conceito ‘Estado ambiental’ necessita de uma aclaração, pois ele pode ser entendido de modo bastante diverso, seja no que se refere à sua abrangência, seja no que diz ao seu propósito. Como já foi mencionado, esse conceito pretende definir primeiramente um Estado que faz a incolumidade do seu meio ambiente sua tarefa, bem como o critério e a meta procedimental de suas decisões. Um ‘Estado ambiental’ no sentido apresentado aqui como básico poderia também ser caracterizado por uma proteção do meio ambiente sustentada mais fortemente pelo setor não estatal” (KLOEPFER, Michael. A caminho do Estado Ambiental? A transformação do sistema político e econômico da República Federal da Alemanha através da proteção ambiental especialmente desde a perspectiva da ciência jurídica. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Estado Socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 6).

75. FENSTERSEIFER, Tiago. Estado socioambiental de direito e o princípio da solidariedade como seu marco jurídico-constitucional. Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10887> Acesso em: 07 jul. 2009.

76. Sobre o tema, vide coletânea lançada neste ano: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Estado Socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.

77. Registre-se a opção de Kloepfer pela utilização da expressão “Estado Ambiental” (KLOEPFER, Michael. A caminho do Estado Ambiental? A transformação do sistema político e econômico da República Federal da Alemanha através da proteção ambiental especialmente desde a perspectiva da ciência jurídica. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Estado socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 43).

78. FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 96.

79. Sarmento afirma que a globalização econômica excludente é um dos elementos que influenciam diretamente a crise do Estado Social. O autor explica como se dá essa influência ao referir que, sob “o impacto da globalização, o Estado se debilita, na medida em que vai perdendo o domínio sobre as variáveis que influem na sua economia. Deteriora-se a sua capacidade de formulação e implementação de políticas públicas, regulamentação e fiscalização do seu mercado interno e, com isso, o seu poder de garantir a eficácia dos direitos sociais” (SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In:SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 396-398).

80. Para Sarmento: “A explosão de demandas reprimidas, gerada pela democratização política, tornara extremamente difícil a obtenção de recursos financeiros necessários ao seu atendimento. Por outro lado, o envelhecimento populacional, decorrente dos avanços da medicina e do saneamento básico, engendrou uma perigosa crise de financiamento na saúde e na previdência social – pilares fundamentais sobre os quais se assenta o Estado Social” (SARMENTO, Daniel. Os direitos fundamentais nos paradigmas liberal, social e pós-social (pós-modernidade constitucional?). In: SAMPAIO, José Adércio Leite (coord.). Crise e desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 395).

81. Discorrendo sobre o conceito de risco, Morato Leite e Ayala assinalam que “o conceito de risco evoca necessariamente as noções de probabilidade, de cálculo, de controle estatístico de expectativas, mas, sobretudo, de normalização das contingências por meio de mecanismos que permitam diminuir a incerteza que qualifica os efeitos das decisões, de modo que é possível argumentar que o que se procura, em última análise, é submeter ao controle o próprio futuro” (LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Direito Ambiental na sociedade de risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 14).

82. A doutrina tem analisado a sociedade de riscos. Marques, por exemplo, alerta para a crise ambiental que se ergueu a partir do Século XVIII, com a Revolução Industrial, pela qual passa a sociedade contemporânea. Essa crise consiste, parafraseando a autora, na crise da sociedade técnica, na falência de um sistema de regulação, na promessa de segurança ainda pendente de cumprimento e na urgência em uma ruptura das racionalidades instituintes dos tempos modernos (MARQUES, Angélica Bauer. A cidadania ambiental e a construção do Estado de Direito do Meio Ambiente. In: FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 169). Ademais, sobre a sociedade de riscos, vide: BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: hacia una nueva modernidad, 2002.

83. CANOTILHO, J. J. Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra, 2004. p. 181.

84. CANOTILHO, J. J. Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra, 2004. p. 181.

85. FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteção do ambiente: a dimensão ecológica da dignidade humana no marco jurídico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 96.

86. Sobre a necessidade de uma atuação global para a proteção do meio ambiente, Morato Leite e Ayala: “Não se pode adotar uma visão individualista e sem solidariedade sobre as responsabilidades difusas globais a respeito da proteção ambiental. É um pensamento equivocado dizer que os custos da degradação ambiental devem ser repartidos por todos, em escala global, que ninguém sabe calcular. Essa visão é distorcida e leva ao esgotamento total dos recursos ambientais e a previsões catastróficas. Portanto, somente com a mudança para a responsabilização solidária e participativa dos Estados e dos cidadãos com os ideais de preservação ecológica é que se achará uma luz no fim do túnel” (LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Direito Ambiental na sociedade de risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 37-38).

87. Para Koepfer, uma estratégia global é necessária para a solução de problemas globais relacionados ao meio ambiente, entretanto, essa estratégia somente “poderá ser realizada por uma instituição central no plano mundial. Consequentemente, segundo essa concepção, uma política eficaz para o meio ambiente só pode ser levada a cabo por um governo mundial – qualquer que seja sua configuração – ou por formas multilaterais de organização” (KLOEPFER, Michael. A caminho do Estado Ambiental? A transformação do sistema político e econômico da República Federal da Alemanha através da proteção ambiental especialmente desde a perspectiva da ciência jurídica. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Estado Socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 28).

88. No mesmo sentido, considerando a questão do meio ambiente sadio e equilibrado como um desafio global: TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 32.

89. Sobre a cooperação internacional em busca da preservação do meio ambiente, vide MARQUES, Angélica Bauer. A cidadania ambiental e a construção do Estado de Direito do Meio Ambiente. In: FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 169-188.

90. CANOTILHO, J.J. Gomes. Estado Constitucional Ecológico e democracia sustentada. In:FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 3. Ademais, Canotilho, ao discorrer sobre o Postulado Globalista, assinala nestes termos: “a proteção do ambiente não deve ser feita em nível de sistemas jurídicos isolados (estatais ou não), mas sim em nível de sistemas jurídico-políticos, internacionais e supranacionais, de forma que se alcance um standard ecológico ambiental razoável em nível planetário e, ao mesmo tempo, estruture-se uma responsabilidade global (de Estados, organizações, grupos) quanto às exigências de sustentabilidade ambiental” (CANOTILHO, J.J. Gomes. Estado Constitucional Ecológico e democracia sustentada. In:FERREIRA, Heline Sivini; MOATO LEITE, José Rubens (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 6).

91. Respaldada na doutrina de Canotilho, Marques aponta que a “cidadania e a cooperação ambiental são os princípios estruturantes que acompanham a necessidade de superação dessa crise para a construção de um novo modelo de organização societária, alicerçada em um Estado de direito do meio ambiente” (MARQUES, Angélica Bauer. A cidadania ambiental e a construção do Estado de Direito do Meio Ambiente. In: FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 170).

92. CANOTILHO, J.J. Gomes. Estado Constitucional Ecológico e democracia sustentada. In:FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 6.

93. Sobre o patrimônio natural comum da humanidade, vide: PUREZA, José Manuel. El património común de la humanidad. Madrid: Trotta, 2002. p. 351-374.

94. A constitucionalização de um dever de proteção ao meio ambiente tende a expressar a integração solidária entre a comunidade e seus cidadãos, consistindo, ainda, em reforço enérgico do bem protegido, como bem referiu Echavarría (ECHAVARRÍA, Juan José Solozábal. El derecho al medio ambiente como derecho público subjetivo. In: MESQUITA, José Antônio et al. A tutela jurídica do meio ambiente: presente e futuro. Coimbra: Coimbra, 2005. p. 43).

95. Canotilho assegura que “o bem protegido – o bem ambiente – tem subjacente uma concepção ampla de ambiente que engloba não apenas o conceito de ambiente naturalista (...)” (CANOTILHO, J.J. Gomes. Estado Constitucional Ecológico e democracia sustentada. In: FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 8.

96. A Lei de Bases do Ambiente, referida por Canotilho, tem por objetivo a definição de bases da política de ambiente, e assim dispõe no seu art. 5º, intitulado Conceitos e Definições: “(...) 2-a) Ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida do homem”. Disponível para acesso online, na página da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, em <http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=752&tabela=leis> Acesso em: 10 jul. 2009.

97. Canotilho destaca a importância de se perceber que a construção do aqui denominado Estado Socioambiental deve levar em conta as condições ambientais, econômicas e sociais das diversas regiões, asseverando que a “construção do Estado constitucional ecológico deve ela própria ser autossustentada no sentido de não poder dispensar a tomada em consideração das condições do ambiente nas diversas regiões, do desenvolvimento económico e social, das vantagens e dos encargos que podem resultar da ausência de actuação e das estruturas jurídicas existentes. Nem sempre o objectivo de se alcançar um nível de protecção elevado toma na devida conta as estruturas jurídicas existentes, que não podem ser totalmente neutralizadas por medidas e planos ambientalmente dirigidos” (CANOTILHO, J.J. Gomes. Estado Constitucional Ecológico e democracia sustentada. In: FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato (org.). Estado de Direito Ambiental: tendências, aspectos constitucionais e diagnósticos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 13).

98. SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 60-70.

99. Ao elevar o meio ambiente à condição de direito de todos e bem de uso comum do povo, a Constituição Federal de 1988 modificou o conceito jurídico de meio ambiente e, “em razão da alta relevância do bem jurídico tutelado, a Lei Fundamental estabeleceu a obrigação do Poder Público e da Comunidade de preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 65).

100. A Constituição Federal, privilegiando a promoção de uma justiça social, prevê que o acesso aos bens ambientais deve ser equitativo, sempre respeitando o princípio da inclusão. Princípios como o da precaução, o da responsabilidade, o do poluidor-pagador e o da cooperação, desenvolvidos pela doutrina a partir do texto constitucional, demonstram o caráter socioambiental do texto trazido pela Carta Magna brasileira. Princípio da precaução: “quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”. Na Constituição Federal, o princípio encontra expressão na necessidade de um estudo de impacto ambiental para determinadas atividades. Princípio da responsabilidade: restou expressamente estabelecido no art. 225, § 3º, da Constituição Federal, consagrando uma responsabilização nas esferas administrativa, cível e penal pelos danos ambientais, na medida em que tal dispositivo determina que as “condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Princípio do poluidor-pagador: procura internalizar os custos externos da deterioração do meio ambiente, uma vez que o poluidor deverá arcar com os custos da diminuição dos danos que causou ao meio ambiente ou, até mesmo, com a extirpação dessas lesões. Princípio da cooperação: impõe uma política de cooperação entre Estados e atores sociais, porquanto os danos ambientais assumem caráter transfronteiriço. Essa cooperação implicaria uma soberania mais solidária (SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 63-64).

101. “Distingue-se ainda o meio ambiente ecologicamente equilibrado – definido como um macrobem, unitário e integrado, de natureza incorpórea e material, e pertencente à coletividade – dos elementos corpóreos que o integram”, a exemplo das florestas, dos minerais, da água ou dos seres vivos, razão pela qual, não importa se tais bens se encontram em domínio público ou privado, eles são de interesse público independentemente da propriedade incidente sobre eles (SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo: Peirópolis, 2005. p. 62).

102. De acordo com o magistério de Sarlet, o sistema de direitos fundamentais não deve ser reconhecido como lógico-dedutivo, mas como um sistema “aberto e flexível, receptivo a novos conteúdos e desenvolvimentos, integrado ao restante da ordem constitucional, além de sujeito aos influxos do mundo circundante” (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 72).

103. FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Direito fundamental à saúde: parâmetros para sua eficácia e efetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado. p. 63.

104. FARIA, José Eduardo. O Judiciário e os direitos humanos e sociais: notas para uma avaliação da justiça brasileira. In:FARIA, José Eduardo (org.). Direitos humanos, direitos sociais e justiça. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 105. Com a ressalva de que o autor não se utiliza da expressão “direitos socioambientais”, e sim “direitos sociais”.

105. PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de filosofía jurídica y política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 62-65.

106. PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de filosofía jurídica y política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 62-65.

107. FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Direito fundamental à saúde: parâmetros para sua eficácia e efetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado. p. 66.

108. Importante referir, necessariamente pelo brilhantismo da exposição, as palavras de Sarlet: a fundamentalidade material “decorre das circunstâncias de serem os direitos fundamentais elemento constitutivo da Constituição material, contendo decisões fundamentais sobre a estrutura básica do Estado e da sociedade. Não obstante não necessariamente ligada à fundamentalidade formal, é por intermédio do direito constitucional positivo (art. 5º, § 2º, da CF) que a noção da fundamentalidade material permite a abertura da Constituição a outros direitos fundamentais não constantes de seu texto e, portanto, apenas materialmente fundamentais, assim como a direitos fundamentais situados fora do catálogo, mas integrantes da Constituição formal [...]” (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 74-75).

109. Sarlet sustenta que a fundamentalidade formal encontra-se ligada ao direito constitucional positivo e resulta dos seguintes aspectos, devidamente adaptados ao nosso direito constitucional pátrio: “a) como parte integrante da Constituição escrita, os direitos fundamentais situam-se no ápice de todo o ordenamento jurídico, de tal sorte que – neste sentido – se cuida de direitos de natureza supralegal; b) na qualidade de normas constitucionais, encontram-se submetidos aos limites formais (procedimento agravado) e materiais (cláusulas pétreas) da reforma constitucional (art. 60 da CF) [...]; c) por derradeiro, cuida-se de normas diretamente aplicáveis e que vinculam de forma imediata as entidades públicas e privadas (art. 5º, § 1º, da CF)” [destaque do autor] (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 74-75).

110. SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia e efetividade do direito à saúde na Constituição de 1988. In: Revista Diálogo Jurídico, Salvador, n. 10, p. 41. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br> Acesso em: 25 ago. 2010.

111. Nesse contexto, Ferreira Filho aponta que, não obstante a importância de direitos fundamentais implícitos, decorrentes do regime e dos princípios, especialmente da dignidade da pessoa humana, imperiosa a observância de um critério material, substancial e indispensável para que seja possível verificar se um direito é verdadeiramente fundamental. Afinal, do contrário, não seria possível a identificação de um direito fundamental implícito (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 296).

112. SARLET, Ingo Wolfganf. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 111-126.

113. Para Peces-Barba, os direitos fundamentais desempenham duas funções no sistema constitucional: em uma dimensão objetiva, consistem em um subsistema e formam regra fundamental material para identificar as demais regras do sistema jurídico, juntamente com valores e princípios tidos como essenciais para aquela comunidade. Em uma dimensão subjetiva, traduzem as pretensões justificadas dos indivíduos e dos grupos (PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de filosofía jurídica y política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 136).

114. BverfGE v. 7, p. 198 et seq.

115. HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Traduzido por Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998. p. 239.

116. A dimensão objetiva abarca os elementos essenciais da ordem jurídica, verdadeiros marcos da vida comunitária de uma nação (PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de filosofía jurídica y política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 136).

117. SARLET, Ingo Wolfganf. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 143.

118. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 147. No mesmo sentido: PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Derechos sociales y positivismo jurídico (escritos de filosofía jurídica y política). Madrid: Dykinson, 1999. p. 137-138. O autor assevera que os direitos fundamentais, em sua dimensão objetiva, orientam a aplicação e a interpretação das normas, servindo de guia para os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Sobre a concretização dos direitos fundamentais, deixando de ser vista apenas no campo da verticalidade entre indivíduo e Estado, vide: CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. Um olhar crítico-deliberativo sobre os direitos sociais no Estado Democrático de Direito. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2008. p. 99.

119. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 141-143.

120. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 115.

121. SARMENTO, Daniel. A dimensão objetiva dos direitos fundamentais: fragmentos de uma teoria. In: SAMPAIO, José Adércio Leite. Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 255.

122. Conforme Vieira de Andrade, a doutrina constitucional refere a perspectiva objetiva dos direitos fundamentais com alcances e contextos diversos, além do efeito de irradiação para todo o ordenamento jurídico: garantias institucionais, eficácia externa ou horizontal dos direitos, deveres de proteção estatal contra os demais membros da sociedade, normas de direito organizatório, direito procedimental necessário para uma efetiva aplicação dos preceitos de direitos fundamentais. Segundo o autor, o que acontece com algumas dessas funções é que elas acabam por atuar com vistas a um alcance da dimensão subjetiva, “na medida em que se aceita haver dificuldades ou direitos subjetivos à proteção, à organização e ao procedimento, bem como direitos a prestações, de participação e de defesa no âmbito das próprias garantias institucionais” (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 116). No mesmo sentido: SARMENTO, Daniel. A proteção judicial dos direitos sociais: alguns parâmetros ético-jurídicos. In:SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 568.

123. Em apertadíssima síntese, a discussão acerca do caráter direto ou indireto da incidência dos direitos fundamentais em relação aos particulares deu origem, basicamente, a duas teorias: a) a de eficácia direta ou imediata dos direitos fundamentais e b) a de eficácia horizontal indireta ou mediata dos direitos fundamentais. De acordo com a primeira, os direitos fundamentais incidem diretamente nas relações entre particulares, sem a necessidade de uma atuação mediadora por parte do legislador ordinário. A segunda, a seu turno, defende a incidência dos direitos fundamentais nas relações privadas por meio de duas formas distintas: I) pela atuação do legislador ordinário a quem caberia a função de, ao disciplinar as relações particulares, orientar a promoção e proteção dos direitos fundamentais ou II) pela interpretação de cláusulas gerais por parte dos magistrados, inspirada nesses direitos e nos valores que os lastreiam (SARMENTO, Daniel. A dimensão objetiva dos direitos fundamentais: fragmentos de uma teoria. In: SAMPAIO, José Adércio Leite. Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 289-291).

124. SARMENTO, Daniel. A dimensão objetiva dos direitos fundamentais: fragmentos de uma teoria. In: SAMPAIO, José Adércio Leite. Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 279. O autor, ainda, assevera que a eficácia irradiante manifesta-se, sobretudo, em relação à interpretação e aplicação de cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados da legislação infraconstitucional, como é o caso, entre outros, da boa-fé, da ordem pública, do abuso de direito e dos bons costumes. p. 284.

125.  No tocante à perspectiva objetiva, Sarlet discorre sobre a dimensão axiológica da função objetiva dos direitos fundamentais. Para o autor, a valoração da eficácia dos direitos fundamentais não deve ser feita tão somente a partir do ponto de vista individual, mas também do ponto de vista da sociedade, na medida em que a essa caberá a concretização dos direitos que expressam os valores por ela cultuados (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 145).

126. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 115.

127. SARMENTO, Daniel. A dimensão objetiva dos direitos fundamentais: fragmentos de uma teoria. In: SAMPAIO, José Adércio Leite. Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 256.

128. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 146.

129. Registre-se a lição de Sarlet, no sentido da existência de uma dimensão comunitária da dignidade da pessoa humana, por serem todas as pessoas iguais em dignidade e por conviverem em comunidade (SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 24).

130. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2001. p. 111.

131. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 476-477. O autor adverte, ainda, que os direitos econômicos, sociais e culturais não se dissolvem em mera norma programática, exemplificando com o caso do direito à saúde que consiste em direito social, “independentemente das imposições constitucionais destinadas a assegurar a sua eficácia (ex.: a criação de um serviço nacional de saúde, geral e tendencialmente gratuito, como impõe o art. 64./2) e das prestações fornecidas pelo Estado para assegurar o mesmo direito (por exemplo, cuidados de medicina preventiva, curativa e de reabilitação (...)”. [destaque do autor]

132. Registre-se o magistério de Sarlet que assevera a importância, para um funcionamento adequado do SUS, de providências de cunho procedimental especialmente para fiscalizar os procedimentos do sistema de saúde, bem como a adequação constitucional de suas políticas (SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas notas sobre a relação entre os direitos fundamentais, o processo e o direito à saúde. In: TELLINI, Denise Estrela; JOBIM, Geraldo Cordeiro; JOBIM, Marco Félix (org.). Tempestividade e efetividade processual: novos rumos do processo civil brasileiro (estudo em homenagem à Professora Elaine Harzheim Macedo). Caxias do Sul: Plenum, 2010. p. 351).

133. MATEUS, Cibele Gralha. Direitos fundamentais sociais e relações privadas: o caso do direito à saúde na Constituição Brasileira de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 62.

134. Sarlet sustenta que, em certa medida e em sua perspectiva objetiva, todos os direitos fundamentais são sempre direitos sociais e transindividuais. Entretanto, impossível afirmar uma “posição secundária e subordinada da dimensão subjetiva (individual ou transindividual) em prol de uma dimensão objetiva (comunitária e, nesse sentido, coletiva), nem mesmo no âmbito de uma supremacia apriorística do interesse público sobre o particular” (SARLET, Ingo Wolfgang. Os direitos fundamentais, na sua dimensão organizatória e procedimental e o direito à saúde: algumas aproximações. Revista de Processo, a. 34, n. 175, set. 2009. p. 16).

135. Nesta quadra, importa referir a lição de Vieira de Andrade acerca dos direitos de exercício coletivo, entendidos como aqueles que não suportam a exigência pelos seus titulares individualmente considerados, clamando por uma atuação convergente de uma pluralidade de sujeitos. O autor exemplifica com os direitos à greve, à associação, à reunião, entre outros. Ocorre que, nesses casos, o elemento coletivo faz parte do conteúdo do direito que só ganha sentido se analisado sob a ótica dos interesses da comunidade. Estar-se-ia, portanto, diante de uma titularidade coletiva dos direitos fundamentais. Entretanto, o autor ressalva que o titular do direito continua sendo o indivíduo, pois os coletivos normalmente atuam como instrumento, e não sujeitos de direitos (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 123).

136. MORAIS, José Luis Bolzan de. A ideia de Direito Social: o pluralismo jurídico de Georges Gurvitch. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. p. 46.

137 Para referir o conjunto de posições jurídicas individuais, utiliza-se o conceito de direito subjetivo que, entendido em um sentido amplo, corresponde a uma posição jurídica subjetiva ativa ou de vantagem, segundo Vieira de Andrade (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 117-119).

138. MATEUS, Cibele Gralha. Direitos fundamentais sociais e relações privadas: o caso do direito à saúde na Constituição Brasileira de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 63.

139. HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Traduzido por Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998. p. 232.

140. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 153.

141. De acordo com Vieira de Andrade, o direito subjetivo exprime a “soberania jurídica do indivíduo”, seja por garantir-lhe poder de decisão, seja por tonar efetiva a “afirmação do poder querer” que o direito lhe atribui (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 120).

142. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 152.

143. No mesmo sentido: NARDI, Marcelo De. Direito à prestação do Estado em atenção à saúde. Revista CEJ, Brasília, a. XII, n. 42, p. 40-47, jul./set. 2008. Disponível em: <http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/cej/article/view/1049/1201> Acesso em: 14 ago. 2010. O autor assevera que somente fará sentido falar em “direito subjetivo contra o Estado” quando existir um indivíduo “com pretensão qualificada pela chancela estatal a haver prestação determi­nada e quando houver a correspectiva obrigação do Estado de prover a dita prestação determinada”. Somente a partir da composição dessa relação triádica será possível a tutela em face do Estado de bem determinado.

144. Registre-se a lição de Kelsen, para quem o direito subjetivo não consiste apenas no poder de mover uma ação judicial, concedido a um indivíduo. Desse modo, “por direito subjetivo não se entende somente este poder jurídico, mas este poder jurídico em combinação com o direito reflexo, quer dizer, com o dever cujo não cumprimento se faz valer por meio do exercício do poder jurídico – por outras palavras, um direito reflexo provido ou revestido deste poder jurídico. Nessa perspectiva o centro gravitacional reside no direito reflexo” (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 152).

145. Defendendo a dimensão subjetiva dos direitos sociais, Mello sustenta: “não há nada na estrutura normativa dos direitos sociais que os impeça conceitualmentede ser uma espécie de direito subjetivo e, portanto, que o impeça por definição de beneficiar-se do regime jurídico próprio dos direitos subjetivos em sentido técnico” [destaques do autor]. Para o autor, alguns direitos sociais não são judicialmente exigíveis diretamente do Estado, como é o caso dos direitos dos trabalhadores. Outros não são individualmente exigíveis, como o direito à moradia. Isso significa apenas que esses consistem em direitos subjetivos prima facie, e não em direitos subjetivos tout court (MELLO, Cláudio Ari. Os desafios dos direitos sociais. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, p. 105-138, n. 56, set./dez. 2005. p. 130).

146. Neste aspecto, vale mencionar o tratamento conferido ao direito à saúde no direito comparado, conforme entendimento da jurisprudência constitucional colombiana. Informa Arango que o direito à saúde é interpretado ora como direito fundamental, ora como direito constitucional de ordem social. O duplo caráter origina-se da tese que distingue os direitos fundamentais de exigibilidade imediata e os direitos sociais, econômicos e culturais que exigem certo desenvolvimento legislativo infraconstitucional para a sua satisfação. Entretanto, a Corte colombiana vem sustentando o duplo caráter dos direitos sociais, especialmente quando apresentam-se indissociáveis do direito à vida – como é o caso da saúde. Nesses casos, o direito à saúde torna-se fundamental por similaridade (ARANGO, Rodolfo. O direito à saúde na jurisprudência constitucional colombiana. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 723-724).

147. Em virtude da escassez de recursos, das diversas formas possíveis para a concretização dessas posições jurídicas, bem como da prioridade concedida ao legislador para a adoção de medidas que garantam a efetividade dos direitos sociais, esses não podem ser considerados direitos subjetivos definitivos. Disso decorre que não basta que alguém precise de um tratamento de saúde para que, em simples silogismo, conclua-se que o Estado deverá fornecer a prestação requerida. Essas situações requerem a conjugação de princípios como o da proporcionalidade, além da avaliação sobre os interesses de terceiros que seriam afetados com a determinação no fornecimento de determinadas prestações estatais (SARMENTO, Daniel. A proteção judicial dos direitos sociais: alguns parâmetros ético-jurídicos. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (org.). Direitos sociais: fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 567).

148. Além dos exemplos citados, Canotilho refere os direitos sociais à segurança social, à habitação, à educação e à cultura, ao ensino, à formação e à criação cultural e à cultura física e ao desporto (CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 476).

149. MELLO, Cláudio Ari. Os desafios dos direitos sociais. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, n. 56, set./dez. 2005, p. 106.

150. Destaca Vieira de Andrade, em que pese pertencerem ao mesmo gênero, diferenciam-se os direitos subjetivos dos direitos subjetivos privados, por possuírem características únicas que vão desde a qualidade dos sujeitos passivos típicos, até a complexidade de conteúdo, variedade estrutural, diversidade funcional e sujeição a distintos regimes constitucionais (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 120).

151. Nas palavras de Vieira de Andrade: “feixe de faculdades ou poderes de tipo diferente e diverso alcance, apontados em direções distintas” (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2004. p. 173).

152. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 153.

153. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Traduzido por Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros. p. 193.

154. Registre-se a lição de Hesse, para quem os direitos fundamentais não se destinam apenas ao rechaço contra a interferência estatal indevida, pois também “normalizam o status dos cidadãos, que não meramente devem se proteger, em uma esfera de discricionariedade privada, contra o ‘Estado’, mas que devem, livre e autorresponsavelmente, configurar sua vida e cooperar nos assuntos da coletividade” (HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Traduzido por Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998. p. 236). No mesmo sentido: ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 2001. p. 111.

155. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 154.

156. Exemplo dessa duplicidade no conteúdo de um mesmo direito subjetivo é o direito fundamental à saúde, que tanto pode assumir uma natureza negativa, no sentido de obrigar o estado à abstenção de qualquer ato que venha a prejudicar a saúde, quanto de natureza positiva, quando emite uma diretriz ao Estado impelindo-o a uma conduta ativa na realização de determinadas tarefas que venham a concretizar o direito.

157. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 185, 287.

158. Registre-se que Sarlet oferece um esquema na página 167 com a organização da classificação suprarreferida, com vistas à melhor compreensão do leitor. Vide: SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 166-167.

159. De acordo com a lição de Alexy, o direito que um indivíduo possui em face do Estado de que esse não o mate, assim como o direito que o mesmo indivíduo possui em face do Estado de que esse proteja a sua vida contra intervenções de terceiros, diferenciam-se exclusivamente por seu objeto. O primeiro desses direitos a algo tem como objeto uma ação negativa ou defensiva. O segundo, por sua vez, tem por objeto uma ação positiva ou de fazer. Por conseguinte, os direitos a ações negativas corresponderiam aos assim denominados diretos de defesa, e os direitos a ações positivas corresponderiam aos direitos a prestações (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Traduzido por Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 195-196).

160. Canotilho explica que os direitos de defesa surgiram historicamente como limites aos poderes do soberano, perfazendo uma esfera de autonomia na qual o Estado não poderia intervir, cumprindo com duas funções: a primeira, em um plano jurídico-objetivo, proibindo que os órgãos do poder estatal interferissem no âmbito de liberdade dos indivíduos; a segunda, no plano jurídico-subjetivo, outorgando aos indivíduos uma liberdade positiva que os autoriza a exercer seu direito de liberdade, bem como uma liberdade negativa no sentido de exigir que o Estado se abstenha da prática de qualquer ato lesivo à liberdade dos cidadãos (CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 48).

161. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 168.

162. Tais direitos, assumindo um caráter instrumental, consagram os princípios informadores da ordem jurídica, provendo a essa ordem diversos mecanismos de tutela. Essa finalidade instrumental permite ao indivíduo pleitear perante o Estado o cumprimento de prestações sociais, nelas incluídas as prestações de saúde, a proteção contra os demais membros da sociedade, bem como a tutela contra as discriminações (BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 405).

163. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 409.

164. MATEUS, Cibele Gralha. Direitos fundamentais sociais e relações privadas: o caso do direito à saúde na Constituição Brasileira de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 71-76.

165. O princípio da proibição do retrocesso social “assume feições de verdadeiro princípio constitucional implícito que pode ser reconduzido tanto ao princípio do Estado de Direito (no âmbito da proteção da confiança e da estabilidade das relações jurídicas inerentes à segurança jurídica), quanto ao princípio do Estado Social, na condição de garantia da manutenção dos graus mínimos de segurança social alcançados, sendo, de resto, corolário da máxima eficácia e efetividade das normas de direitos fundamentais sociais e do direito à segurança jurídica, assim como da própria dignidade da pessoa humana” (SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas notas em torno da proibição de retrocesso na esfera dos direitos fundamentais sociais. Direito & Justiça. Revista da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, v. 32, n. 1, jun. 2006. p. 41). Em artigo mais recente sobre o tema: SARLET, Ingo Wolfgang. A assim designada proibição de retrocesso social e a construção de um direito constitucional comum latino-americano. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais – RBEC, v. 3, n. 11, p. 167-204, jul./set. 2009.

166. De acordo com Alexy, “o objeto de um direito a algo é sempre uma ação do destinatário. Isso decorre de sua estrutura como relação triádica entre um titular, um destinatário e um objeto. Se o objeto não fosse uma ação do destinatário, então, não faria sentido incluir o destinatário da relação” (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Traduzido por Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 194).

167. De acordo com a lição de Canotilho, fundado na dimensão subjetiva dos direitos fundamentais, será possível a observância de direitos originários a prestações quando, a partir da norma constitucional, o cidadão puder exigir imediatamente a concretização desse direito. Nas palavras do autor: “(1) a partir da garantia constitucional de certos direitos; (2) se reconhece, simultaneamente, o dever do Estado na criação dos pressupostos materiais, indispensáveis ao exercício efectivo desses direitos; (3) e a faculdade de o cidadão exigir, de forma imediata, as prestações constitutivas desses direitos” (CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 477). No mesmo sentido, Sarlet, para quem os direitos originários a prestações consistem naqueles decorrentes diretamente das normas consagradoras de direitos fundamentais, outorgando aos seus titulares direitos ao fornecimento de determinada prestação pelo Estado sem que exista um sistema prévio de oferta desses bens e serviços a serem prestados (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 188).

168. Nas palavras de Canotilho, os direitos derivados consistem na possibilidade de o indivíduo exigir do Estado a emissão de uma norma concretizadora de determinado direito fundamental, bem como no poder de se exigir uma participação isonômica nas prestações criadas pelo legislador (CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 408).

169. De acordo com o magistério de Sarlet, no que concerne aos direitos sociais a prestações como direitos subjetivos – na condição de direitos originários a prestações – no âmbito do mínimo existencial, impõe-se o reconhecimento da exigibilidade da prestação em face do Estado, ainda que não se afaste a exigibilidade de prestações que ultrapassem esse parâmetro mínimo (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 350).

170. Nas palavras de Farias, “direitos sociais por excelência”, por reportarem-se, exemplificativamente, aos cuidados médicos, ao direito ao trabalho, à educação, à habitação e à intervenção policial (FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1996. p. 89).

171. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 478.

172. Cumpre referir, nesse contexto, a lição de Leal – naquela oportunidade versando sobre os direitos do idoso – no sentido de que as disposições jurídicas devem ser interpretadas a partir de uma ideia de integração do sistema jurídico-constitucional, “sob pena de aviltar a própria estrutura organizacional do ordenamento brasileiro, cuja lógica informativa é outorgada pelos direitos e pelas garantias fundamentais indisponíveis e cogentes. Significa dizer que, enquanto dosimetria objetiva da dignidade da pessoa humana, as normas constitucionais e o microssistema infraconstitucional protetivo do idoso no Brasil estão a imprimir às suas prerrogativas natureza vinculante a todos os corresponsáveis pela mantença e efetivação da República Democrática de Direito” (LEAL, Rogério Gesta. O serviço público no Brasil e seus impactos extranormativos: aspectos econômicos e sociais das decisões judiciais. Interesse Público, Belo Horizonte, a. 11, n. 57, set./out. 2009, p. 47).

173. CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 478.

 

 

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., jun. 2012. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS