Direito fundamental à probidade administrativa e as convenções internacionais de combate à corrupção
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publicado em 30.10.2012
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Resumo O artigo analisa a esfera de responsabilidade em que estão inseridas as sanções por atos de improbidade administrativa previstas na Lei 8.429/92, que, por não possuir fronteiras nitidamente delimitadas, é palco de uma série de controvérsias na doutrina e na jurisprudência. Examina a imbricação do fenômeno da corrupção com a violação dos direitos humanos. Afirma a existência de um direito fundamental à probidade administrativa decorrente dos direitos implícitos, do regime e dos princípios adotados pela Constituição Federal. Observa a inserção da Lei 8.429/92 no âmbito do combate internacional à corrupção, uma vez que a tutela da probidade administrativa não mais se limita à ordem doméstica, realçando a interação e o impacto, no ordenamento jurídico interno, das três convenções internacionais de combate à corrupção firmadas pelo Estado brasileiro. Palavras-chave: Probidade administrativa. Convenções internacionais. Corrupção. Direitos humanos. Sumário: Introdução. 1 Corrupção, moralidade e improbidade administrativa. 2 Natureza jurídica das sanções por atos de improbidade administrativa. 3 Probidade administrativa como direito fundamental. 4 Convenções internacionais de combate à corrupção. Considerações finais. IntroduçãoA Lei de Improbidade Administrativa (nº 8.429/1992), doravante LIA, alcançou sua maioridade no ano de 2010, mas ainda busca afirmar sua identidade. Esse importante instrumento de tutela da probidade administrativa procura demonstrar que possui efetividade, ou, como vulgarmente se diz, que é uma lei que “pegou”. Neste estudo, destacaremos alguns aspectos relacionados à tutela da probidade administrativa, notadamente a natureza jurídica das sanções por atos de improbidade administrativa previstas na LIA, que, por não possuir fronteiras nitidamente delimitadas, é alvo de várias controvérsias. Analisaremos a imbricação da probidade administrativa com a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. Ainda, considerando que a tutela da probidade administrativa não mais se limita à ordem doméstica, examinaremos a inserção da LIA no âmbito do combate internacional à corrupção, realçando a interação e o impacto das três convenções internacionais de combate à corrupção firmados pelo Estado brasileiro no ordenamento jurídico interno. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, expressão de um cenário histórico marcado pelo ideário do jusnaturalismo secularizado, entende certos direitos como preexistentes à instituição do poder civil, pois derivam da natureza humana, e afirma, em seu art. 15, que “a sociedade tem o direito de pedir, aos agentes públicos, as contas de sua administração”. No art. 12 está previsto que a “garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada”. “Com referência à realidade que temos continuamente sob os olhos, qual funcionário público poderia declarar, no momento em que é empossado em seu cargo, que ele se servirá para extrair vantagens pessoais ou para subvencionar ocultamente um partido ou para corromper um juiz que deve julgar um seu parente?” A corrupção acompanha a história da humanidade e a temática acerca da responsabilização dos agentes públicos é antiga. Várias teorias buscam explicar o fenômeno da corrupção,(6) bem como conceituá-la, sob os pontos de vista econômico, moral, político e sociológico.(7) Do ponto de vista jurídico-normativo, a corrupção é tratada no Código Penal(8) e em diversas leis penais esparsas.(9) “O controle, exercido através do juízo criminal, não reveste a importância prática do controle que se exerce na ordem civil. Há muitos casos em que não é cabível, só tendo lugar, a propósito da violação dos direitos subjetivos ou da execução das obrigações públicas, o controle da jurisdição civil. Ainda nas espécies em que tenha cabimento, não resolve, por si só, os interesses postos em jogo pela atividade administrativa. O seu alcance é meramente punitivo. Não cancela nem repara os efeitos resultantes do procedimento administrativo ou da ação individual, o que somente pelo controle de ordem civil se pode obter.” O legislador, atento a essa realidade, buscou outros mecanismos, a par da punição criminal, que buscassem também a recuperação do Erário e o ressarcimento do prejuízo sofrido, já que a tutela penal não era suficiente para a proteção do patrimônio público e da probidade administrativa.(10) Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p. 804) explica que A doutrina que se dedica ao estudo da improbidade administrativa, mais especificamente da LIA, que regulamentou o § 4º do art. 37 da CF, vem associando o conceito de moralidade administrativa ao de probidade.(12) Para alguns autores, o princípio da probidade administrativa está contido no princípio da moralidade administrativa,(13) enquanto para outros a probidade administrativa seria mais abrangente do que a moralidade.(14) De fato, moralidade e probidade são conceitos imbricados, que envolvem noções de honestidade, lealdade, transparência, diligência, eficiência etc. No entanto, na LIA a “lesão à moralidade administrativa é apenas uma das inúmeras hipóteses de atos de improbidade previstos em lei” (DI PIETRO, 2009, p. 805). Importante salientar que referida lei constitui-se “em um dos meios de concretização dos princípios da moralidade e da probidade, mas não o único” (GARCIA, 2007, p. 229). O combate a toda forma de corrupção e à improbidade administrativa, por diversos instrumentos jurídicos, nacionais ou internacionais, de forma preventiva ou repressiva, é um imperativo das sociedades democráticas. Neste artigo, o enfoque recai sobre as normas descritas nos itens (iv) e (v) supra, iniciando-se pela análise da esfera de responsabilidade em que se inserem as condutas definidoras de atos de improbidade, a partir da natureza jurídica das sanções da LIA, já que o equacionamento de várias controvérsias envolvendo esse diploma depende dessa definição.(15) Natureza jurídica das sanções por atos de improbidade administrativa Segundo Mireille Delmas-Marty (2004, p. 195), foi o sociólogo Durkheim,(16) em sua busca de um método para determinar a “função da divisão do trabalho”, o pioneiro em propor um estudo transversal consistente “em classificar as regras jurídicas segundo as diferentes sanções que lhe são vinculadas”. As sanções por atos de improbidade administrativa, de acordo com o § 4º do art. 37 da CF, importarão(17) a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário. No entanto, tanto a indisponibilidade dos bens quanto o ressarcimento ao erário visam apenas a restabelecer as coisas ao seu estado anterior, estando ausente o elemento aflitivo da medida. Dessa forma, as verdadeiras “sanções previstas na Constituição são a suspensão dos direitos políticos e a perda da função pública” (GARCIA, 2007, p. 263). Por essa razão, não é fácil classificar as sanções por atos de improbidade administrativa em um determinado campo de responsabilização do direito. Para Fábio Medina Osório (2008): Para Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (2010, p. 527), as sanções para os atos de improbidade administrativa possuem natureza extrapenal, e sua aplicação, eventualmente, haverá de ser direcionada pelos princípios básicos norteadores do direito penal, que sempre assume uma posição subsidiária no exercício do poder sancionador do Estado. Os autores discordam que o sistema de coibição da improbidade administrativa esteja incluído sob a epígrafe do direito administrativo (sancionador): Esses autores concluem que o ilícito de improbidade administrativa não tem natureza administrativa e suas sanções não são administrativas, mas, sim, ostentam características de natureza cível, cuja aplicação deve observar as garantias prevalecentes nessa seara e com o necessário influxo do direito penal, fonte mor do direito sancionador (GARCIA; ALVES, 2010, p. 529-530). Nessa linha, Walter Claudius Rothenburg (2002, p. 462) propõe Acompanhamos o entendimento de José Jairo Gomes (2002, p. 292), segundo o qual a “responsabilidade aqui é civil-administrativa, apresentando natureza sui generis, diferente das tradicionalmente conhecidas (civil, penal e administrativa)”. Em que pese algumas interfaces com o direito penal, entendemos que, no âmbito do direito sancionador da improbidade administrativa, a “importação” do discurso dogmático-penal deve ser exceção, sob pena de enfraquecer-se o campo dessa responsabilização, pois, como leciona Cárcova (1998, p. 183): Probidade administrativa como direito fundamental De acordo com Bobbio (2004, p. 21), o tema dos direitos do homem, cujo reconhecimento e proteção estão na base das Constituições democráticas modernas, está diretamente relacionado com a paz e a democracia. “Direitos do homem, democracia e paz são três momentos necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos.” (Cf. BOBBIO, 2004, p. 21) A democracia – segundo a célebre frase de Churchill, “a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”, na medida em que permite a constante ascensão do povo ao poder e a renovação de seus representantes eleitos pelo sufrágio – exige, por sua própria natureza, o combate a toda forma de corrupção no exercício das funções públicas e aos atos de corrupção especificamente vinculados a seu exercício. A tutela constitucional e internacional da probidade no Estado de Direito é essencial para assegurar os meios necessários para efetivação dos direitos fundamentais, pois, se o Estado e seus agentes são corruptos ou ímprobos, os recursos ficarão comprometidos, e as consequências serão sentidas pelos administrados. Como refere André de Carvalho Ramos (2002, p. 06-07): Dessa forma, devemos falar em um “direito fundamental(21) à probidade administrativa”, pois há um verdadeiro direito fundamental coletivo da sociedade a uma Administração Pública honesta, que apresenta os contornos identificadores dos direitos difusos. Como leciona Pedro Roberto Decomain (2007, p. 27): “Tanto o patrimônio público quanto o direito a que, no exercício de suas atividades funcionais, os agentes públicos atuem com a mais estrita observância da probidade administrativa apresentam os elementos característicos dos direitos difusos”. Essa “cláusula de abertura” de direitos fundamentais expressos no art. 5º, § 2º, da CF permite a possibilidade de identificação e construção pela jurisprudência de direitos materialmente fundamentais não escritos, no sentido de não expressamente positivados, assim como de direitos fundamentais espraiados em outras partes da Constituição e nos tratados internacionais. Juarez Freitas (2009, p. 22) desenvolve um conceito-síntese de “direito fundamental à boa administração pública”, que pode ser compreendido como: De acordo com o jurista gaúcho, o “direito fundamental à boa administração” possui um caráter vinculante e é um somatório de direitos subjetivos públicos, que abriga, entre outros,(23) o direito à administração pública proba (FREITAS, 2009, p. 42). Na lição de Ingo Sarlet (2008, p. 385-386), há a vinculação do poder público aos direitos fundamentais. A afirmação da existência de um direito fundamental à probidade não é uma questão meramente semântica, destituída de importância prática, pois essa consideração traz consequências jurídicas que refletem na seara da hermenêutica, já que, como é sabido, a interpretação das normas constitucionais e legais deve ser feita a partir das normas de direito fundamental. Noutra quadra, o reconhecimento de um direito fundamental à probidade administrativa vai repercutir no status hierárquico das convenções internacionais firmadas pelo Estado brasileiro nessa matéria. As convenções internacionais de combate à corrupção A concepção histórica de conquista dos direitos humanos surge como uma reivindicação do povo para limitar o arbítrio do poder do Estado. Essa limitação, que se deu inicialmente no âmbito interno dos Estados, paulatinamente estendeu-se para o âmbito internacional, justamente pela insuficiência de relegar a proteção de tais direitos apenas à órbita doméstica dos Estados. O autor informa que, no âmbito internacional, o combate à corrupção inicia-se com estudos, na década de 70, da Securities and Exchange Commission dos Estados Unidos, que deram ensejo à expedição do Foreign Corrupt Practices Act, de 1977. Esses estudos relacionavam-se não com a proteção do patrimônio público, mas sim do particular, em prol de interesses de empresas atuantes no comércio internacional, relacionados a subornos pagos a agentes públicos estrangeiros por empresas norte-americanas para obtenção de vantagem competitiva sobre as empresas rivais (RAMOS, 2002, p. 07-08). Em decorrência da determinação, em seu art. 1º, de tipificação do delito de corrupção de funcionários públicos estrangeiros, foi incluído no Código Penal brasileiro, por meio da Lei 10.467, de 11.06.2002, o Capítulo II-A, no Título XI, denominado “Dos crimes praticados por particular contra a Administração Pública estrangeira”, contendo os artigos 337-B, 337-C e 337-D, criminalizando a corrupção ativa em transação comercial internacional e o tráfico de influência em transação comercial internacional e definindo funcionário público estrangeiro. A Convenção Interamericana contra a Corrupção, além de veicular normas de natureza penal e penal internacional, buscou introduzir modificações no próprio sistema administrativo dos Estados-partes, cuja atuação deveria ser necessariamente direcionada por critérios de equidade, publicidade e eficiência (GARCIA; ALVES, 2010, p. 37). Para André de Carvalho Ramos (2002, p. 30), a natureza não penal das sanções previstas na LIA “faz com que não sejam aplicáveis quer os tratados internacionais genéricos de cooperação judicial, quer a cooperação judicial prevista nos tratados específicos anticorrupção [...], que são destinados à cooperação penal entre os Estados contratantes”.(25) Ainda que se considere que os dispositivos dessas convenções internacionais tenham cunho programático, impende observar a sistematização da doutrina, lembrada por Luís Roberto Barroso (2002, p. 156), que elenca algumas hipóteses de efetividade das normas dessa natureza: “(1) revogam as leis anteriores com elas incompatíveis; (2) vinculam o legislador, de forma permanente, à sua realização; (3) condicionam a atuação da administração pública; (4) informam a interpretação e a aplicação da lei pelo Poder Judiciário”. Para Mônica Nicida Garcia (2007, p. 335-336), no entanto, Na verdade, com a inclusão do § 3º ao art. 5º da Constituição Federal, somente após a aprovação pelas duas casas do Congresso Nacional, em votação em dois turnos e com pelo menos três quintos dos votos, é que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, posteriores à EC nº 45/2004, passam a ter status de “emenda constitucional”. Considerações finais Os comandos normativos da LIA ainda geram muitas divergências na jurisprudência, que necessita uniformizar alguns temas relativos à sua aplicação, levando-se em consideração que o direito sancionador por atos de improbidade administrativa possui uma dogmática própria, voltada à salvaguarda da moralidade e da probidade administrativa, que visam assegurar a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. A probidade administrativa constitui-se em direito fundamental difuso da sociedade, que integra o “direito fundamental à boa administração”, e decorre dos direitos implícitos, do regime e dos princípios adotados pela Constituição Federal, revestindo-se da mesma força jurídica dos direitos fundamentais do catálogo expresso da Constituição, possuindo um caráter vinculante à administração e de plena e imediata aplicação. As convenções internacionais firmadas pelo Brasil vêm reforçar o arcabouço normativo no combate à corrupção, vedando retrocessos nos instrumentos que tutelam a probidade administrativa e impelindo o país a buscar, cada vez mais, os parâmetros de boa governança estabelecidos pela comunidade internacional. Referências BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. ______. Estado, governo e sociedade: para uma teoria geral da política. Traduzido por Marco Aurélio Nogueira. 12. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005. GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. ROTHENBURG, Walter Claudius. Ação por improbidade administrativa. Aspectos de relevo. In: SAMPAIO, José Adércio Leite et al. (org.). Improbidade Administrativa: comemoração pelos 10 anos da Lei 8.429/92. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 461-483. Notas
1. A Lei 10.628, de 24.12.2002, acresceu os §§ 1º e 2º ao art. 84 do CPP. O § 1º tentou ressuscitar a regra da prevalência do foro por prerrogativa de função, em que pese o cancelamento da Súmula 394 pelo próprio STF, por ocasião do julgamento do Inquérito 687-4-SP. O § 2º ampliou o foro por prerrogativa criminal ao âmbito da ação de improbidade administrativa. Foram ajuizadas a ADI 2.797/DF e a ADI 2.860/DF, que foram julgadas procedentes para declarar a inconstitucionalidade da Lei 10.628/02. Já na Reclamação nº 2.138-6, julgada procedente por maioria, o STF entendeu haver imunidade dos agentes políticos à Lei 8.429/92, partindo-se da premissa de que os atos de improbidade administrativa praticados por tais agentes subsumem-se exclusivamente ao campo dos crimes de responsabilidade (Lei 1.079/1950; e artigos 85, V, e 102, I, c, da CF). 2. Proposta de Emenda Constitucional nº 385/05, cujo art. 2º acresce à CF o art. 97-A, in verbis: 3. Na ADI 2.182, o Partido Trabalhista Nacional questionou a constitucionalidade formal da LIA, tendo em vista que a lei teria sido sancionada sem ser submetida ao processo legislativo bicameral (Câmara e Senado), previsto no artigo 65 da Constituição. O STF, por maioria, vencido o ministro Marco Aurélio, relator do processo, julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade ao entender que o caminho percorrido no Congresso Nacional não teve vícios. 4. Sob o aspecto material, a constitucionalidade da LIA está sendo contestada na ADI 4.295, ajuizada pelo Partido da Mobilização Nacional, ainda pendente de julgamento pelo STF. 5. A título de exemplo, registre-se que a 1ª Seção do STJ recebeu, em 18.08.2010, Embargos de Divergência contra acórdão da 2ª Turma, no REsp 1.143.484-SP, em que será analisada a (im)prescindibilidade da presença de dolo do agente e a necessidade de lesão ao erário, para se caracterizar a hipótese prevista no art. 11 da Lei 8.429/92, bem como a possibilidade de exame sobre o excesso na aplicação das penas previstas na referida lei. O processo foi concluso ao Relator, Ministro Arnaldo Esteves Lima, em 10.09.2010, e, até o término deste trabalho, permanecia nesta situação processual. 6. São elas: (i) public choice, (ii) rent seeking e (iii) gerencialismo. Sobre as duas primeiras, ver: MACIEL, Felipe Guatimosim. O Controle da Corrupção no Brasil. 1º Concurso de Monografia da CGU, 2005. Sobre o gerencialismo, ver: SENNA, Naira Gomes Guaranho de. Improbidade administrativa: é constitucional a modalidade culposa? 5º Concurso de Monografia da CGU, 2010. 7. “Do ponto de vista econômico, ela será descrita eminentemente como uma transação onde as pessoas auferem vantagens competitivas ou ganhos pecuniários ilicitamente, por exemplo, mediante o pagamento de propinas. Sob o ângulo moral, a corrupção é o contrário da virtude, do bem e do justo, seja na vida pessoal, seja na vida pública. Dentro do recorte político, a corrupção significa a confusão entre o público e o privado. Do prisma sociológico, é comum fazer menção ao patrimonialismo, ao nepotismo e ao clientelismo como formas de corrupção.” (SENNA, 2010) 8. Crimes de peculato, emprego irregular de verbas ou rendas públicas, concussão, excesso de exação, corrupção passiva e ativa, facilitação de contrabando ou descaminho, prevaricação, condescendência criminosa etc. Com a Lei 10.028/2000 foram incluídos os crimes de contratação de operação de crédito, inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar, assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura, ordenação de despesa não autorizada, prestação de garantia graciosa, não cancelamento de restos a pagar e oferta pública ou colocação de títulos no mercado. 9. V.g., Lei de Licitações (8.666/93), que tipifica os crimes contra as licitações, e o Código Eleitoral (4.737/65), que define os crimes eleitorais. 10. Para uma visão histórica da evolução das normas de controle da probidade administrativa, ver: DECOMAIN, Pedro Roberto. Improbidade Administrativa. São Paulo: Dialética, 2007. p. 11-19; e GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 209-220. 11. Em nível constitucional, a tutela da probidade administrativa tem assento em mais três artigos: art. 14, § 9º, art. 15, V, e art. 85, V. 12. Para Maria Silvia Zanella Di Pietro (2009, p. 801): “Não é fácil estabelecer a distinção entre moralidade administrativa e probidade administrativa. A rigor, pode-se dizer que são expressões que significam a mesma coisa, tendo em vista que ambas se relacionam com a ideia de honestidade na Administração Pública. Quando se exige probidade ou moralidade administrativa, isso significa que não basta a legalidade formal, restrita, da atuação administrativa, com observância da lei; é preciso também a observância de princípios éticos, de lealdade, de boa-fé, de regras que assegurem a boa administração e a disciplina interna na Administração Pública”. 13. “Contido no princípio da moralidade administrativa está o da probidade.” (MARTINS JÚNIOR, 2009, p. 101) Marcelo Figueiredo (2009, p. 47) entende “que a probidade é espécie do gênero ‘moralidade administrativa’ a que alude, v.g., o art. 37, caput e seu § 4º, da CF. O núcleo da probidade está associado (deflui) ao princípio maior da moralidade administrativa (...)”. 14. “Em que pese ser a observância ao princípio da moralidade um elemento de vital importância para a aferição da probidade, não é ele o único. Todos os atos dos agentes públicos devem observar a normatização existente, o que inclui toda a ordem de princípios, e não apenas o princípio da moralidade. Assim, quando muito, será possível dizer que a probidade absorve a moralidade, mas jamais terá a sua amplitude delimitada por esta.” (GARCIA; ALVES, 2010, p. 58) Para Pedro Roberto Decomain (2007, p. 27): “O conceito de improbidade, todavia, pode ter alcance mais amplo, abrangendo não apenas atos atentatórios ao princípio constitucional da moralidade administrativa, como também outros atos que, embora eventualmente não se os reconheça violadores de tal princípio, não obstante agridem outros dentre os norteadores da Administração Pública, também relacionados pelo art. 37, caput, da Constituição Federal”. 15. Em virtude da limitação do trabalho, não empreenderemos análise detalhada dessas controvérsias. No entanto, podem-se citar algumas questões que dependem dessa definição, tais como: (i) a delimitação do juiz natural; (ii) a aplicação do foro por prerrogativa de função para o julgamento das ações de improbidade; (iii) a (in)existência de imunidade dos agentes políticos à Lei 8.429/92, já que, para alguns, os atos de improbidade administrativa praticados por tais agentes subsumem-se exclusivamente ao campo dos crimes de responsabilidade (Lei 1079/1950; e artigos 85, V, e 102, I, c, da CF); (iv) a aproximação da dogmática penal na seara da improbidade administrativa. 16. “Émile Durkheim (1858-1917) foi um cartesiano de formação e convicção, um positivista confesso, lúcido e polêmico, que dialogou com antecessores seus, como Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria (1738-1794), sobretudo, com o conteúdo do livro Dos delitos e das penas, publicado em 1764. Polemizou com criminólogos de sua época, com grande destaque e sucesso, como C. Lombroso, E. Ferri, Moselli, Garofalo, entre outros, além de debater com sociólogos famosos, como G. Tarde. Foi lido e citado por filósofos, adversários do positivismo, da segunda metade do Século XX, como M. Foucault, com repercussões visíveis na obra Vigiar e punir. Dialogou com o sentimento, principalmente, com o denominado sentimento coletivo, ou seja, um dos campos da irracionalidade, porém, de forma racional. [...] Ao focalizar o direito, como objeto de estudo da Sociologia, o referido autor deteve-se, da mesma forma, no campo da repressão, refletindo-se particularmente sobre o crime, como fato social que perpassa toda a história da humanidade.” (SÁ, 2010, p. 8359-8360) 17. “‘Importar’ é ‘ter como consequência ou resultado; causar, produzir, originar, implicar’, donde a conclusão de que o que o dispositivo constitucional estabelece são as consequências ou os resultados dos atos, que podem não ser, necessariamente, sanções.” (GARCIA, 2007, p. 262) 18. O STJ já teve a oportunidade de se manifestar sobre a constitucionalidade do acréscimo de sanções feito pela lei ordinária e que não foram previstas no § 4º do art. 37 da CF: “[...] V – O disposto no art. 12 da Lei nº 8.429/92 se coaduna com a ordem constitucional vigente, mais precisamente com o art. 37, § 4º, da atual Constituição Federal, sendo cabível a aplicação de sanções outras que não as previstas no referido dispositivo constitucional” (STJ, 1ª T., REsp 440.178-SP, rel. Min. Francisco Falcão, j. em 08.06.2004, DJU de 16.08.2004, p. 135). 19. “As normas definitórias da improbidade administrativa são normas de Direito Administrativo Sancionatório, ainda que essa expressão seja utilizada, no direito comparado, muito comumente para expressar o poder punitivo que está nas mãos da Administração Pública. Trata-se, inegavelmente, de normas de Direito Administrativo, seja pela direta vinculação aos princípios que presidem a Administração, seja pelo objeto (punição de atos atentatórios aos princípios administrativos), seja pelos sujeitos (agentes públicos), seja, finalmente, pelas finalidades presentes naquela legislação. Não se trata, evidentemente, de normas penais, porque não se autodefinem como tais, e porque, fundamentalmente, não apresentam características essencialmente penais, pelo menos não pretendem imposição de penas privativas de liberdade, cuja aplicação, aí sim, dependeria de normas penais.” (OSÓRIO, 2000, p. 61-62) 20. A autora não discorda ou entende que seu posicionamento seja incompatível com a posição de Fábio Medina Osório: “A disciplina dos atos de improbidade administrativa definidos pela Lei nº 8.429/1992 está, de fato, sujeita ao Direito Administrativo, sem que isso signifique, contudo, que a responsabilidade decorrente de sua aplicação esteja dentro da esfera específica da responsabilidade administrativa. Sob o pálio do Direito Administrativo podem se abrigar duas esferas de responsabilidade” (GARCIA, 2007, p. 235). 21. A doutrina faz uma separação terminológica entre “direitos fundamentais”, direitos do ser humano reconhecidos e positivados pelo Direito Constitucional de um Estado específico, e “direitos humanos”, que seriam os direitos estabelecidos em tratados internacionais sobre a matéria (SARLET, 2008, p. 35; RAMOS, 2005, p. 26). 22. Para Celso Antônio Bandeira de Mello (2004, p. 112), o princípio da eficiência “é uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o princípio da ‘boa administração’”. 23. No conceito proposto por Juarez Freitas (2009, p. 22-23), além do direito à administração proba, abrigam-se ainda o direito à administração transparente; o direito à administração pública dialógica; o direito à administração pública imparcial; o direito à administração pública respeitadora da legalidade temperada, ou seja, sem a “absolutização” irrefletida das regras; e o direito à administração pública preventiva, precavida e eficaz (não apenas eficiente), pois comprometida com resultados harmônicos com os objetivos fundamentais da Constituição. 24. As avaliações da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE sobre a implementação da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais no Brasil estão disponíveis no endereço <http://www.cgu.gov.br/ocde/avaliacoes.asp>. A Convenção das Nações Unidas possui um capítulo específico destinado aos mecanismos de aplicação (Capítulo VII, artigos 63 e 64), e as medidas adotadas pelo Brasil para o cumprimento desta Convenção podem ser conferidas no endereço <http://www.cgu.gov.br/onu/convencao/implementacao/index.asp>. Quanto à Convenção Interamericana, também existe um mecanismo de acompanhamento em funcionamento chamado “Mecanismo de Acompanhamento da Convenção Interamericana contra a Corrupção” (Mesicic). O relatório sobre a implementação da Convenção Interamericana pelo Brasil está disponível em <https://www.cgu.gov.br/oea/publicacoes/Arquivos/avaliacao2.pdf>. 25. “A Lei nº 8.429/92, em seu art. 16, § 2º, dá margem a que os tratados internacionais firmados pelo Brasil cuidem de medidas constritivas de bens titularizados pelo indiciado no exterior, o que, contudo, vem sendo olimpicamente ignorado.” (GARCIA; ALVES, 2010, p. 982) 26. “[...] existe certa unanimidade no seio da doutrina no sentido de que o termo ‘tratados internacionais’ engloba diversos tipos de instrumentos internacionais, tratando-se de gênero, em relação ao qual as convenções e os pactos (apenas para citar alguns dos mais importantes) são espécies [...].” (SARLET, 2008, p. 134) 27. Firmaram-se quatro correntes interpretativas na doutrina acerca desse assunto: a) hierarquia supraconstitucional dos tratados internacionais de direitos humanos; b) hierarquia constitucional desses tratados; c) hierarquia infraconstitucional, mas supralegal; d) paridade hierárquica entre tratado e lei ordinária (PIOVESAN, 2007, p. 68). O STF, como se verá adiante, passou a encampar a tese da supralegalidade, superando a tese da paridade entre tratado e lei ordinária. 28. “Cada Estado Participante adotará as medidas que sejam necessárias para estabelecer ou manter, em conformidade com seu ordenamento jurídico e seus princípios constitucionais, um equilíbrio apropriado entre quaisquer imunidades ou prerrogativas jurisdicionais outorgadas a seus funcionários públicos para o cumprimento de suas funções e a possibilidade, se necessário, de proceder efetivamente à investigação, ao indiciamento e à sentença dos delitos qualificados de acordo com a presente Convenção.” 29. Entende-se por “‘Funcionário público’, ‘funcionário de governo’ ou ‘servidor público’, qualquer funcionário ou empregado de um Estado ou de suas entidades, inclusive os que tenham sido selecionados, nomeados ou eleitos para desempenhar atividades ou funções em nome do Estado ou a serviço do Estado em qualquer de seus níveis hierárquicos.” 30. “a) Por ‘funcionário público’ se entenderá: i) toda pessoa que ocupe um cargo legislativo, executivo, administrativo ou judicial de um Estado-Parte, já designado ou empossado, permanente ou temporário, remunerado ou honorário, seja qual for o tempo dessa pessoa no cargo; ii) toda pessoa que desempenhe uma função pública, inclusive em um organismo público ou numa empresa pública, ou que preste um serviço público, segundo definido na legislação interna do Estado-Parte e se aplique na esfera pertinente do ordenamento jurídico desse Estado-Parte; iii) toda pessoa definida como ‘funcionário público’ na legislação interna de um Estado-Parte. Não obstante, aos efeitos de algumas medidas específicas incluídas no Capítulo II da presente Convenção, poderá entender-se por ‘funcionário público’ toda pessoa que desempenhe uma função pública ou preste um serviço público segundo definido na legislação interna do Estado-Parte e se aplique na esfera pertinente do ordenamento jurídico desse Estado-Parte;” 31. Num precedente do STJ, envolvendo a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Convenção de Mérida), Reclamação nº 2645, em que se discutia um pedido de remessa de provas extraprocessuais produzidas pela Procuradoria-Geral da República do Brasil à Procuradoria-Geral da Rússia, reconheceu-se apenas o caráter comum desse tratado: “[...] 5. Conforme reiterada jurisprudência do STF, os tratados e convenções internacionais de caráter normativo, ‘(...) uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias’ (STF, ADI-MC 1480-3, Min. Celso de Mello, DJ de 18.05.2001), ficando sujeitos a controle de constitucionalidade e produzindo, se for o caso, eficácia revogatória de normas anteriores de mesma hierarquia com eles incompatíveis (lex posterior derrogat priori) [...]” (STJ, Corte Especial, Reclamação 2645, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. em 18.11.2009, DJE de 16.12.2009, RSTJ v. 00217, p. 308). 32. A decisão foi tomada na conclusão do julgamento dos Recursos Extraordinários (RE) 349.703 e 466.343 e do Habeas Corpus (HC) 87585, em que se discutia a prisão civil de alienante fiduciário infiel. “[...] parece mais consistente a interpretação que atribui a característica de supralegalidade aos tratados e convenções de direitos humanos. Essa tese pugna pelo argumento de que os tratados sobre direitos humanos seriam infraconstitucionais, porém, diante de seu caráter especial em relação aos demais atos normativos internacionais, também seriam dotados de um atributo de supralegalidade. Em outros termos, os tratados sobre direitos humanos não poderiam afrontar a supremacia da Constituição, mas teriam lugar especial reservado no ordenamento jurídico. Equipará-los à legislação ordinária seria subestimar o seu valor especial no contexto do sistema de proteção dos direitos da pessoa humana.” Excerto do voto do Min. Gilmar Mendes.
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Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT): |
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