Súmula vinculante: instrumento de uniformização jurisprudencial e de racionalização processual |
||
Autor: Felipe Veit Leal Juiz Federal Substituto publicado em 19.12.2012
|
||
A súmula vinculante ingressou em nosso ordenamento jurídico por ocasião do advento da Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, a qual introduziu o art. 103-A, §§ 1º, 2º e 3º, na Constituição Federal de 1988. Dito instituto jurídico, que adveio juntamente com outras medidas visando à racionalização dos processos judiciais, pretende, sobretudo, uniformizar a jurisprudência no que se refere a questões de relevância constitucional. Embora seja esse o intuito da nova proposta, muitas são as críticas, as quais desafiam a constitucionalização desse novo instituto. Palavras-chave: Súmula vinculante. Uniformização. Racionalização. Sumário: Introdução. 1 Os sistemas jurídicos e as súmulas. 2 As regras legais da súmula vinculante 3 Críticas e posições favoráveis. Considerações Finais. Referências Bibliográficas. Introdução O Homem, para poder conviver em sociedade, de forma harmônica com seus pares, necessita de instrumentos de pacificação, que venham a regular as relações humanas entre si. O Direito, portanto, decorre do homem, como ser social, como ente coletivo, destinando-se a evitar a autodestruição, normatizando interesses colidentes diante do convívio social, o que se convencionou chamar de direito material; bem como normatizando a forma de solucionar esses conflitos frente ao Poder Público, o que se chamou de Direito Processual. E a solução desses conflitos sociais foi passada ao Estado. Cabe, pois, exclusivamente ao Poder Público estatal a função de jurisdicionar, isto é, somente ao Estado-Juiz cabe conhecer do conflito e sobre ele decidir, com base no que dispõe o ordenamento jurídico. Feitas essas primeiras considerações, o que se tem visto na atual realidade jurídica de nossa sociedade é uma constante multiplicação de processos judiciais. Cada vez mais as pessoas lesadas ou ameaçadas de lesão ao seu direito vêm bater às portas do Poder Judiciário para ver solucionados seus conflitos. Tal fenômeno social detém inúmeras razões, seja em face das garantias do acesso ao Judiciário – o que, inclusive, é assegurado constitucionalmente, por meio do inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal de 1988 –, seja, também, pelas novas ferramentas instituídas, tais como a virtualização do processo judicial. Evidentemente não se pode, nem se quer, criar normas que impeçam esse acesso. O que se deve criar são meios para que se possa dar a resposta que a sociedade espera ao crescente número de demandas judiciais, proporcionando qualidade e justiça nas decisões judiciais de forma célere, sem implicar o perecimento do direito invocado. Inclusive, vale o registro, a razoável duração do processo é garantia constitucional, trazida a nossa Lei Maior pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004. Parece-me que esse é o desafio do Judiciário. Gerir a enorme quantidade de processos, sem deixar que o direito se perca com o transcurso do tempo, proporcionando justiça ao caso concreto. Fala-se em diversos mecanismos para tentar reduzir o número de ações e o tempo de tramitação, tais como, por exemplo, reforma na legislação processual. No entanto, muitos instrumentos já foram estudados e implementados em nosso ordenamento jurídico, como é o caso das súmulas vinculantes, que ingressaram no texto constitucional no ano de 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45, chamada de Reforma do Judiciário. Independentemente das críticas feitas sobre esse instrumento, o intuito do legislador constituinte derivado não foi outro que não o de possibilitar uma uniformização nos julgados emanados pela Corte Suprema de nosso país, aliando-se a uma forma célere de julgar. Este estudo visa a fazer uma análise acerca dos efeitos negativos de tal instrumento, bem como de seus efeitos positivos frente à gestão processual. Para tanto, estruturo o presente trabalho em três partes: em um primeiro momento, uma análise acerca dos sistemas jurídicos da common law e da civil law, bem como sobre a evolução e a atual sistemática das súmulas no Brasil; após, um breve exame acerca das normas instituídas pela EC nº 45/2004 e pela Lei nº 11.417/2006; passando, em um terceiro momento, ao estudo das críticas e das posições favoráveis ao instituto das súmulas vinculantes. 1 Os sistemas jurídicos e as súmulas O modelo brasileiro de direito tem por base a lei como fonte fundamental. As discussões jurídicas em nosso ordenamento decorrem da interpretação e da aplicação dos enunciados legislativos, expressos em textos escritos prevendo suportes fáticos a incidir sobre situações concretas futuras. Dito sistema, fundado na tradição romano-germânica, difere daquele oriundo principalmente da Inglaterra, chamado de common law. Neste, em que pese a atual existência de textos legais, o fundamento das decisões judiciais centra-se em precedentes pretéritos, os quais estabelecem regras a serem aplicadas em situações semelhantes, gerando efeitos vinculativos de uma primeira decisão de um primeiro caso (denominado de leading case) sobre as demais decisões em situações semelhantes ou idênticas. No Brasil, a civil law impõe força vinculativa às normas jurídicas instituídas em um corpo legislativo escrito, baseado em um ato constitucional e em atos infraconstitucionais e infralegais. As decisões judiciais pretéritas não possuem força vinculativa, apenas persuasiva, servindo muitas vezes como fundamento para uma razão de decidir, mas sem impor ao julgador a necessidade de adequar o seu julgado àquela decisão que solucionou conflito análogo do passado, preservando assim a livre convicção e a independência do magistrado. Na verdade, o que me parece ser a grande distinção entre um sistema e outro é a origem da força vinculativa: em um, o surgimento de uma norma genérica e abstrata, decorrente de um processo de dedução lógica visando a estabelecer uma organização geral (civil law); no outro, um modelo a obedecer um raciocínio concreto, voltado a resolver situações individualizadas, partindo daí regras a solucionar situações semelhantes ou idênticas (common law). A segurança jurídica, somada à morosidade dos processos judiciais, foi a grande justificativa para a criação das súmulas e, posteriormente, das súmulas vinculantes. Por súmulas entendem-se enunciados emanados pelos tribunais, voltados a externar os posicionamentos pacificados sobre determinadas matérias que, em face de sua repetição, geraram um entendimento uniforme. A finalidade das súmulas, evidentemente, é positiva. Visam, como já dito, a uniformizar o posicionamento dos tribunais sobre determinado tema, mas não possuem caráter vinculante, apenas persuasivo, orientando os demais julgadores em suas razões de decidir quando a questão a ser enfrentada tiver sido objeto de tais enunciados. Muitos entendem que súmulas são resquícios de um sistema anglo-saxão (common law) inseridos em um sistema codificado (civil law). Compartilho do posicionamento externado por Maurício Ramirez,(1) no sentido de que as súmulas são institutos próprios de um ordenamento romano-germânico, pois, ainda que venham a se originar de julgamentos advindos dos colegiados judiciais, nada mais são do que enunciados que instituem um posicionamento ou uma orientação genérica a ser aplicada sobre um caso concreto futuro. Como diz André Ramos Tavares: “A abstratividade, portanto, é compreendida aqui como a eliminação dos fatores concretos que caracterizam as decisões anteriores que serviram de base para deflagrar (justificar) a formulação da súmula vinculante.”(2) Com relação à evolução das súmulas no Brasil, podemos concluir que tiveram elas um antecessor, chamado de assentos. Os assentos surgiram nas Ordenações Manuelinas, no ano de 1521, e foram aperfeiçoados pelas Ordenações Filipinas, com os assentos da Casa de Suplicação. Os assentos consistiam em normas de caráter vinculativo definidas pela aludida Casa de Suplicação, destinadas essas normas a solucionar dúvidas em seus julgados. Uma vez não sanada a dúvida, a matéria era encaminhada ao Rei para que, então, houvesse a solução mediante lei, alvará ou decreto. Os assentos vigeram ao longo do período colonial, sendo revogados em 1769 por meio da Lei da Boa Razão e restabelecidos em 1808 pelo Alvará Régio.(3) Após a independência da colônia portuguesa, os assentos foram mantidos em virtude da manutenção em vigor das Ordenações Filipinas (Lei nº 5 de 20.10.1823), sendo que somente foram extintos pela Constituição da República, no ano de 1891. Antes disso, porém, os assentos chegaram a ter força de lei, com possibilidade de revogação pelo Poder Legislativo. Com o advento da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o plenário do Tribunal Superior do Trabalho poderia criar prejulgados(4) e dar força de prejulgados às suas decisões, vinculando os Tribunais Regionais do Trabalho e as antigas Juntas de Conciliação e Julgamento. A Lei nº 7.033, de 5 de outubro de 1982, revogou o art. 902 da CLT,(5) o que gerou, posteriormente, a conversão dos prejulgados em enunciados, passando a ter a mesma função, no âmbito da jurisprudência trabalhista, das súmulas editadas pelo STF. O estabelecimento das súmulas na forma como conhecemos hoje veio por sugestão e influência do então Ministro do Supremo Tribunal Federal Victor Nunes Leal, sendo incluída a sua previsão na norma regimental no ano de 1963, mesmo ano em que foram aprovados os primeiros 370 enunciados. As súmulas estenderam-se aos demais tribunais do país, do extinto Tribunal Federal de Recursos ao Superior Tribunal de Justiça, assim como aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça dos Estados. Como já dito, o intuito de se instituir enunciados a externar a posição pacificada sobre determinadas matérias por parte dos tribunais deve ser considerado como positivo, pois, em sendo o juiz o intérprete da lei, essa interpretação, a fim de dar segurança jurídica a todos os jurisdicionados, deve ser uniforme. No entanto, as súmulas, diferentemente dos antigos assentos, não têm força vinculativa, apenas persuasiva. É certo que se instituiu uma cultura de se seguir os entendimentos sumulados. Os magistrados, cientes de que a interpretação da lei por meio de julgados deve ser uníssona, evitando soluções contrapostas a casos idênticos ou análogos, só não os seguem quando verificam que a aplicação sumular fere a sua livre convicção e a adequada solução de justiça sobre o caso concreto, até mesmo porque a função de julgar não pode ser engessada ante o dinamismo das relações sociais. O efeito vinculativo das súmulas só ingressou mesmo no ordenamento jurídico pátrio, embora há muito tempo se viesse discutindo o tema, no ano de 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45, que instituiu o art. 103-A na Constituição Federal de 1988. “Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. A novel norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de 2006. Para muitos, foi a retomada dos extintos assentos; para outros, uma forma de solucionar dois dos problemas mais críticos enfrentados pelo Judiciário: a demora na prestação jurisdicional e a uniformidade nos julgados. Na verdade, o efeito vinculativo das decisões emanadas pelo Supremo Tribunal Federal não é novidade advinda com a Reforma do Judiciário. Ele já existia antes, pelo controle abstrato e concentrado de constitucionalidade, primeiro com a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) e depois também com a ação declaratória de constitucionalidade (ADC). Atualmente, conforme discorre Pedro Lenza,(6) temos as seguintes espécies de súmulas em nosso ordenamento jurídico, além das persuasivas e vinculantes: súmula impeditiva de recursos, introduzida pela Lei nº 11.276/2006, forte no art. 518, § 1º, do CPC, em que um recurso de apelação pode ser rejeitado sempre que a sentença estiver em plena conformidade com súmula do STF ou do STJ (atualmente pressuposto de admissibilidade apenas para as apelações); e súmula de repercussão geral, isto é, o recurso extraordinário somente será conhecido se o seu fundamento jurídico tiver repercussão geral (art. 102, § 3º, da Constituição Federal, com regulamentação da Lei nº 11.418/2006, art. 543-A do CPC). 2 As regras legais das súmulas vinculantes De início, verifica-se que tal enunciado só pode ser editado pelo Supremo Tribunal Federal. Assim como editado, pode ser também modificado e cancelado. Trata-se de competência exclusiva. Quanto ao objeto, deve a súmula versar sobre a validade, a interpretação e/ou a eficácia de determinada norma de matéria constitucional. Logo, questões estritamente de direito legal ou infralegal não podem ser objeto de tal espécie de súmula. E não poderia ser diferente, considerando que a competência do STF é a guarda da Constituição. A doutrina, entre os legitimados, classificou-os como autônomos e incidentais,(7) utilizando como critério a necessidade para uma proposta envolvendo a edição, o cancelamento ou a modificação de uma súmula vinculante a um processo em andamento. Assim, são considerados como legitimados autônomos aqueles que podem propor ao STF independentemente de vinculação a um processo em curso, enquanto são legitimados incidentais aqueles que dependem de uma ação já ajuizada. Do rol previsto na Lei nº 11.417/2006, são tidos como legitimados incidentais apenas os Municípios, cujas propostas tornam-se incidentes nos processos em que são partes. A justificativa para tal tratamento diferenciado decorre da possibilidade de vir-se a inviabilizar os trabalhos do STF caso os Municípios sejam tratados como legitimados autônomos.(8) Afora isso, é requisito indispensável que o enunciado da súmula verse sobre questão enfrentada em elevado número de processos, gerando uma repetição de feitos idênticos. Ora, se uma das razões da súmula vinculante é uniformizar a interpretação jurisdicional e, por consequência, encerrar o debate sobre uma série de processos com a mesma temática, não seria razoável editar súmula para tratar sobre caso isolado, desvirtuando todo o sentido do instituto, fortalecendo as críticas acerca da inconstitucionalidade. Quanto aos efeitos da súmula, são vinculativos ao Judiciário e à Administração Pública, cabendo reclamação ao STF quando verificado o não atendimento ao comando sumular. No caso dos processos administrativos, é necessário esgotar as vias administrativas, podendo gerar à autoridade sanções de natureza cível, penal e administrativa (art. 64-B da Lei nº 9.784/99, introduzido pela Lei nº 11.417/2006). Quanto a eventuais descumprimentos por parte dos juízes, não houve qualquer previsão legal acerca de uma responsabilização, a fim de garantir, segundo referiu o Ministro Marco Aurélio, “a liberdade do magistrado de apreciar os elementos para definir se a conclusão do processo deve ser harmônica ou não com o verbete”.(9) Em que pesem as críticas, não poderia o juiz ser responsabilizado por adotar um entendimento contraposto à súmula vinculante. Por mais que tenha ela um efeito impositivo, a possibilidade de revisão e até de cancelamento só poderá ocorrer se o STF for provocado, mesmo para agir de ofício, quando a provocação, nesse caso, se dá por vias indiretas, por meio, então, do instituto da reclamação. Em outras palavras, o Pretório Excelso poderá modificar seu entendimento quando verificar a ocorrência de decisões contrapostas a ele, pois não pode o Judiciário restar estagnado ante as constantes mudanças sociais. Saliento que uma súmula pode ser adequada como solução a uma determinada realidade social, realidade social que, futuramente, pode ser alterada em face do dinamismo da sociedade. A força vinculativa das súmulas não pode, evidentemente, abarcar o Poder Legislativo, uma vez que sua atribuição constitucional permite a criação de normas contrárias aos enunciados, quando então deverá o STF, de ofício ou por provocação, cancelar a súmula contraposta à nova lei. Além disso, ao instituir uma súmula vinculante, a regra é que sua eficácia seja imediata. No entanto, a exemplo do que já tinha sido previsto pelo art. 27 da Lei nº 9.868/99, referente às ações diretas de inconstitucionalidade, os efeitos podem ser modulados no tempo quando houver necessidade de maior segurança jurídica ou excepcional interesse público. Por fim, existe um quórum para aprovação, ou seja, a súmula só é criada, modificada ou cancelada se aprovada pelo mínimo de 2/3 dos membros do STF. Esse mesmo quórum é que pode modular os efeitos do enunciado no tempo. A Emenda Constitucional nº 45, denominada como Reforma do Judiciário, tratou de diversos temas destinados, senão a solucionar os maiores problemas enfrentados pelo Judiciário, a modernizar a estrutura desse Poder, atribuindo a ele ferramentas voltadas à redução das demandas e a uma maior uniformização das decisões judiciais, além de criar órgão voltado à fiscalização e à maior transparência no trabalho desenvolvido pelos magistrados e pelos membros do Ministério Público. Evidentemente, houve e há uma série de críticas em relação às inovações trazidas pela referida emenda constitucional. Contudo, também são inegáveis muitos dos benefícios que os institutos trouxeram. Um exemplo disso, penso, é a instituição da repercussão geral como pressuposto de admissibilidade de recursos extraordinários. Ora, se ao STF cabe a guarda da Constituição, é certo que somente questões de relevância constitucional é que podem ser enfrentadas pelo Pretório Excelso. A banalização de sua competência acaba, muitas vezes, transformando a Corte Suprema em uma instância ordinária, própria dos juízes de 1º e 2º graus. Dentre essas inovações trazidas pela referida reforma constitucional, veio a chamada súmula vinculante. Com relação a esse instituto, Pedro Leonardo Summers Caymmi, citado por Palhares Moreira Reis, referiu:(10) “A súmula vinculante é o instituto que visa a garantir a uniformidade da disciplina jurídica pela fixação do mesmo sentido da norma em aplicações distintas, gerando a previsibilidade; a gerar a estabilização das expectativas de comportamento pela impossibilidade de nova discussão de matérias já decididas; e, por fim, a tornar a solução jurisdicional de conflitos mais célere e automática, garantindo a efetiva manutenção coercitiva dessas situações de segurança.” Uma vez que a própria Emenda Constitucional nº 45 determinou a garantia de uma razoável duração do processo, era exigível que ela dotasse o Judiciário de formas para atender essa nova imposição constitucional. Sem dúvidas que a súmula vinculante é um desses instrumentos. No entanto, o que se questiona é quanto à constitucionalidade desse instrumento. Em outras palavras, para alguns, estar-se-ia aprimorando a gestão processual com mecanismos contrapostos ao regime jurídico constitucional. Evandro Lins e Silva, acerca do tema, discorreu: “Em nosso sistema, a fonte primária do direito é sempre a lei, emanada do Poder Legislativo, para isso eleito pelo povo diretamente. Os juízes não têm legitimidade democrática para criar o direito, porque o povo não lhes delegou esse poder. A sua função precípua, na organização estatal, é a de funcionar como árbitros supremos dos conflitos de interesse na aplicação da lei. (...) Segundo as queixas dos eminentes magistrados que compõem o STF e o STJ, o principal fator de obstrução do andamento dos seus trabalhos é o imenso recebimento de feitos repetitivos. Foi justamente essa abundância de causas iguais que inspirou a feitura das Súmulas. A Súmula resolve com toda a rapidez os casos que sejam repetição de outros julgados, por simples despacho de poucas palavras do relator. Faz muito tempo que o Supremo não edita novas súmulas, talvez mais de doze anos. A ausência de súmulas retira do julgador o instrumento para solucionar, de imediato, o recurso interposto ou a ação proposta. Por outro lado, os tribunais e juízes inferiores, que, de regra e geralmente, utilizam as súmulas como fundamento de suas decisões, não têm como se valer delas, inclusive para a celeridade de seus pronunciamentos. É muito difícil, devem ser raríssimos os casos de rebeldia contra as súmulas. Ao contrário, os juízes de segunda e primeira instâncias não apenas as respeitam, mas as utilizam, como uma orientação que muito os ajuda em suas decisões. Todos sentem falta das súmulas, que se tornaram instrumentos utilíssimos a todos os juízes e aos advogados. Elas, na prática, já são quase vinculantes, pela tendência natural dos juízes de acompanhar os julgados dos tribunais superiores. Torná-las obrigatórias é que não me parece ortodoxo, do ponto de vista da harmonia, da independência e da separação dos poderes. Todos os juízes devem ter a independência para julgar de acordo com a sua consciência e o seu convencimento, inclusive para divergir da súmula e pleitear a sua revogação.”(11) O Direito não detém esse dinamismo. Deve, por evidente, acompanhar as mudanças sociais, e por isso sofre, seja na seara legislativa, seja na seara judicial, constantes modificações. Toda inovação trazida, se tendente a tornar estática a ordem jurídica, deve ser rechaçada de imediato. Ainda que tenha finalidades práticas positivas, não pode implicar a estagnação jurisdicional. ARAUJO, Luiz Alberto David; JÚNIOR, Vidal Serrano Nunes. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. PASSOS, J.J. Calmon de. Súmula vinculante. Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, n. 9, jan./mar. 2007. Disponível em: <http://www.teiajuridica.com/svinccp.pdf>. Acesso em 09 ago. 2010. SILVA, Evandro Lins e. Crime de Hermenêutica e Súmula Vinculante. Disponível em: <http://campus.fortunecity.com/clemson/493/jus/m05-011.htm>. Acesso em 11 ago. 2010. Notas 3. Na verdade, a Lei da Boa Razão deu aos assentos da Casa de Suplicação força de lei, mas, buscando evitar abusos na interpretação da legislação, suprimiu a criação de novos assentos pelas Casas de Relação, dentre elas as da Bahia e do Rio de Janeiro, o que foi restabelecido com a vinda da Família Real portuguesa para a sua colônia, o Brasil. 4. Decisão jurisprudencial sobre uma determinada causa, passando a reger demais decisões sobre processos semelhantes, visando à uniformização da jurisprudência trabalhista. 5. Art. 902 – É facultado ao Tribunal Superior do Trabalho estabelecer prejulgados, na forma que prescrever o seu regimento interno. 10. REIS, Palhares Moreira. A Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal. Brasília: Consulex, 2009. p. 168. 11. SILVA, Evandro Lins e. Crime de Hermenêutica e Súmula Vinculante. Disponível em: <http://campus.fortunecity.com/clemson/493/jus/m05-011.htm>. Acesso em 11 ago. 2010. |
||
Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT): |
||
|