Comissão Parlamentar de Inquérito – substituição de membro da comissão – ato interna corporis

Autor: Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Desembargador Federal do TRF da 4ª Região

 publicado em 30.04.2013



The Constitution sought to divide the delegated powers of the new federal government into three defined  categories, legislative, executive and judicial, to assure, as nearly as possible, that each Branch of government would confine itself to its assigned responsibility. The hydraulic pressure inherent within each of the separate Branches to exceed the outer limits of its power, even to accomplish desirable objectives, must be resisted.

(Chief Justice Warren Burger, in Significant Supreme Court Opinions, 1984, p. 31)

Na elaboração das leis reside a função precípua do Poder Legislativo.

A par dessa, porém, há outras igualmente relevantes, como a de fiscalização do Poder Executivo, por meio da criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar fato determinado, observados os limites traçados na própria Constituição.

Questão pouco versada na doutrina é a forma de constituição da Comissão, oportunizando o debate no Direito Constitucional.

É legítimo, do ponto de vista da Constituição, o ato do Presidente da Casa Legislativa de substituir membro da Comissão Parlamentar de Inquérito?

Pode o Judiciário examinar, via mandamus, a legalidade desse ato?

As questões suscitadas não encontram solução, de forma expressa, no texto constitucional.

Os parlamentares, ao serem indicados para integrar uma Comissão Parlamentar de Inquérito, estão representando os partidos políticos a cujos quadros pertencem, de forma a respeitar a proporção desses mesmos partidos, de maneira a cumprir o disposto no art. 58, § 1º, da Carta Política.

É ela, a Constituição, omissa sobre o modo de nomeação ou de afastamento dos membros de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, cabendo, portanto, ao regimento interno do Parlamento regular a matéria.

Assim preleciona Duguit, em seu festejado Droit Constitutionnel, verbis:

Règlement des chambres. – Le réglement est un ensemble de dispositions par voie générale déterminant l’ordre et la méthode des travaux dans chaque chambre. C’est en quelque sorte la loi interne de chaque assemblée. Par la force des choses, les règlements des assemblées politiques contiennent souvent des dispositions très importantes, qui pourraient très justement trouver leur place dans la loi constitutionnelle.” (DUGUIT, Léon. Manuel de Droit Constitutionnel. Paris: E. de Boccard Éditeur, 1923. p. 430, n. 101)

No mesmo sentido é o magistério de Saint-Prix, verbis:

(...) le règlement renferme la procédure parlementaire (...) Les dispositions du règlement destinées à procurer l’application d’un article constitutionel (...) sont de véritables lois organiques; Eles doivent être observées jusqu’à modification régulière.” (SAINT-PRIX. Théorie du Droit Constitutionnel. Paris: Libr. De La Cour de Cassation, 1851-1853. p. 430-1)

O mesmo sucede com a lição de J. Barthélemy, ao aduzir, verbis:

Il y a un règlement intérieur des commissions, les dispositions écrites en figurent au règlement générale de l’assemblée; mais il y a un grand nombre des dispositions coutumières.” (BARTHÉLEMY, J. Essai sur le Travail Parlementaire. Paris: Libr. Delagrave, 1934. p. 115)

Vale aqui, ainda, a observação de Frederico Mohrhoff, o corifeu do direito parlamentar italiano, verbis:

Altra fonte specifica del diritto parlamentare sono i regolamenti interni delle assemblee politiche, i qualli compilati in forza di un’autorizzazione tacita od espressa del legislatore contengono quasi tutto quello che potrebbe definirsi diritto parlamentare scritto. Tali regolamenti, dai qualli dipende in gran parte il buon funzionamento delle assemblee legislative (...).” (MOHRHOFF, Frederico. Trattato di Diritto e Procedura Parlamentare. Roma: Dott. G. Bardi Editore, 1948. p. 17)

Creio que tal entendimento tem plena aplicação ao Direito Pátrio.

Com efeito, da simples leitura do art. 58 da Carta Magna, resulta que o Poder Legislativo se rege de acordo com o seu regimento interno, que lhe cabe elaborar, disciplinando a sua organização e polícia e o provimento dos cargos de seus serviços.

O que importa, porém, acentuar é que nada impede que o regimento interno contenha dispositivo prevendo que, a pedido do líder de determinado partido político, o Presidente do Parlamento nomeie ou substitua membro de uma Comissão Parlamentar de Inquérito.

Realmente, a Constituição, em seu art. 58, § 1º, estatui que, “na constituição das Mesas e de cada Comissão, é assegurada, tanto quanto possível, a representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares que participam da respectiva Casa”, sendo, pois, lícito à agremiação política participar ou não de qualquer comissão, ou, então, retirar-se da mesma comissão, consoante sua deliberação, comunicando o fato ao Presidente da Casa Legislativa para que efetive tal medida.

Trata-se, assim, de consideração circunscrita ao âmbito partidário, de natureza eminentemente política.

Nesse sentido, pontifica Vincenzo Miceli, ao se referir à composição das comissões legislativas, verbis:

(...) in genere non sono i criteri tecnici, ma i criteri politici quelli che guidano la camera nella composizione di essa. La scelta dei suoi componenti diventa questione di partito (...).” (MICELI, Vincenzo. Principii di Diritto Parlamentare. Milano: Società Editrice Libraria, 1910. p. 101)

Nesse sentido, também, orienta-se o direito parlamentar na Inglaterra, conforme noticia G. Campion em CAMPION, G. An Introduction to the Procedure of the House of Commons. London: Philip Allan & Co. Ltd., 1929. p. 217 e seguintes.

É no sentido exposto o pensamento de Bernard Schwartz, ao ilustrar o modelo norte-americano das comissões legislativas, verbis:

“No Congresso americano, a designação dos membros para as diferentes comissões permanentes e a escolha dos presidentes dessas comissões estão entre os primeiros atos de cada câmara ao se iniciar um novo período legislativo. No curso normal dos acontecimentos, o Senado e a Câmara dos Representantes simplesmente ratificam as escolhas já feitas nas reuniões dos dois partidos. A composição política das comissões corresponde aproximadamente à da própria câmara, sendo que o partido majoritário possui a maioria de membros em cada comissão permanente, enquanto a minoria é representada em proporção à sua força numérica na câmara em questão.” (SCHWARTZ, Bernard. American Constitutional Law. Cambridge: Cambridge University Press, 1955. p. 89)

Em tais condições, se a determinado partido político, em razão de considerações de ordem partidária, não for mais conveniente manter o seu representante na Comissão Parlamentar de Inquérito, é legítima a sua substituição por meio de ato do Presidente da Casa, nos termos do disposto no regimento interno.

A propósito do papel a ser desempenhado pelo Presidente da Casa Legislativa nos dias atuais, oportuno colacionar a lição de Henri Ripert, em obra clássica, verbis:

Les présidents d’assemblées sont appelés à exercer d’autre part une influence de plus en plus considérable sur le fonctionnement des assemblées législatives et la tenue de leurs séances. A mesure que ces séances se passionnent à raison même de leur répercussion sur la vie politique du pays, l’action du président qui, aux jours de tumulte, réprime les désordres et fait cesser les troubles, devient plus étendue. De la confiance qu’une assemblée possède en son président et des pouvoirs qu’elle ne craint pas de lui conférer peut seul résulter le maintien de l’ordre en son sein. Le temps est passé où, dans une assemblée calme et paisible que les grandes passions n’agitaient pas, la majorité pouvait se réserver à elle-même l’exercice du pouvoir disciplinaire, laissant seulement à son président le souci matériel de la direction des débats. Le temps est passé aussi des règlements bénévoles et des peines anodines, en présence des luttes ardentes soulevées dans certaines assemblées par les conflits de nationalités et dans d’autres par l’avènement de couches démocratiques plus impatientes dans leurs désirs et plus vives dans leurs manifestations. Pour faire face à l’obstruction qui s’est manifestée dans diverses assemblées, pour réprimer les grandes manifestations qui risquent de fausser le mécanisme de la vie parlementaire, un pouvoir disciplinaire étendu et sa concentration entre les mains du président de l’assemblée s’imposent comme une nécessité même de la vie parlementaire moderne.” (RIPERT, Henri. La Présidence des Assemblées Politiques. Paris: Arthur Rosseau Éditeur, 1908. p. 3-4)

Nessa mesma ordem de considerações se estende Yves Daudet, verbis:

En ce domaine, par conséquent, les textes n’ont pas une importance déterminante: c’est la pratique qui importe et cette pratique veut que le Président soit l’autorité supérieure dans l’organisation interne des Assemblées: dans les faits, il est un chef de service dont l’autorité dépend tout naturellement de sa personnalité propre: s’agissant des fonctions administratives, il n’y a donc pas une conception de la Présidence mais des types de Président. La même idée est sous-jacent en ce qui concerne l’autre attribution capitale du Président relative au travail parlementaire.” (DAUDET, Yves. La Présidence des Assemblées Parlementaires. Paris: Presses Universitaires de France, 1965. p. 32)

Desse modo, é legítimo o ato do Presidente da Câmara Legislativa ao proceder à substituição de parlamentar integrante de Comissão Parlamentar de Inquérito, a pedido da respectiva liderança partidária, constituindo-se tal medida em ato interna corporis, sem margem a revisão judicial.

A esse propósito, o saudoso Ministro Laudo de Camargo, ao comentar a importância das Comissões de Inquérito, afirmou, verbis:

“Corporações, como a Câmara e o Senado, contando avultado número de membros, terão certamente de desdobrar-se para o conhecimento dos fatos, com as investigações necessárias.

Dentro, pois, da esfera que lhe é própria e sobre assuntos não estranhos à sua competência, soberano se apresenta o Parlamento, nas suas manifestações, por intermédio das Comissões de Inquérito, que a sabedoria do legislador-constituinte houve por bem instituir.

Governa, portanto, como governam os demais poderes, sem restrições outras que as impostas pela Lei Maior.” (In Revista Forense, v. 151, p. 7)

Nesse passo é a jurisprudência do Eg. Supremo Tribunal Federal, rememorada pelo eminente Ministro Octavio Gallotti, ao relatar o Mandado de Segurança nº 20.509-DF, julgado em 16.10.1985, invocando decisões anteriores, consoante consta de seu substancioso voto, verbis:

“Versando matéria análoga, referente a constituição de Comissão da Câmara dos Deputados (naquele caso, de Comissão Parlamentar de Inquérito), este Tribunal já concluiu pela inviabilidade do writ, para garantia do suposto direito ofendido, ao julgar o Mandado de Segurança nº 20.415, relatado pelo eminente Ministro Aldir Passarinho (DJ de 19.04.85).

No mesmo sentido e abordando tema vinculado ao processo legislativo, três outros precedentes abonavam essa conclusão: MS 20.247 (RTJ 102/27, Rel. Ministro Moreira Alves), MS 20.464 (RTJ 1112/598, Rel. Ministro Soares Muñoz) e MS 20.471 (RTJ 112/1023, Rel. Min. Francisco Rezek).

Indeferindo liminarmente o Mandado de Segurança nº 20.522, impetrado por deputados com vistas a obter a repetição da votação de emenda a projeto de lei, o eminente Ministro Rafael Mayer prolatou douto despacho de que reproduzo o seguinte trecho:

‘Além disso, os procedimentos que se cumprem no âmbito interno do Poder Legislativo, momentos e trâmites dos trabalhos que seguem o respectivo Regimento Interno, exaurem ali o seu campo de competência, se daí não extravasam para afetar direitos subjetivos.

São os chamados atos interna corporis, sem que deles resulte, pela descrição mesma da inicial, a afetação do direito líquido e certo que caiba assegurar na via heroica.

Nessas condições, é incabível que, por essa via, intervenha o Poder Judiciário, na intimidade do Poder Legislativo, para determinar que se proceda a uma nova contagem de votos, em razão de dúvida quanto à primeira que se fez, e tudo à base de alegações e de notícias.’ (DJ de 26.06.85)

Nessa mesma linha repeli, de plano, o Mandado de Segurança nº 20.253, com idêntica finalidade (DJ de 31.10.80).

Também aqui se visa à invalidação de atos do Presidente da Câmara, proferidos nos limites de sua competência, com eficácia caracteristicamente interna, ligados à constituidade e à disciplina dos trabalhos da casa, sem que se argua preterição vestibular de formalidade alguma, atacando-se, ao revés, o mérito da interpretação dada ao Regimento, matéria em cujo exame não cabe ao Poder Judiciário ingressar.” (In RTJ 116, p. 70-1)

Em caso semelhante, no julgamento do Mandado de Segurança nº 20.415-DF, relator o eminente Ministro Aldir Passarinho, julgado em 19.12.1984, deliberou o Pretório Excelso, verbis:

“Constitucional. Comissões Parlamentares de Inquérito. Substituição do Presidente de CPI.

A Constituição Federal, quanto à composição das CPIs, apenas prevê que deve ser assegurada, tanto quanto possível, ‘a representação proporcional dos partidos políticos que participem da respectiva Câmara’. Não dispõe sobre a forma de nomeação ou de afastamento de seus membros, diferentemente do que ocorre com os componentes da Mesa Diretora, que exercem um mandato por prazo certo: dois anos. Os membros da CPI representam os Partidos Políticos e, assim, se a estes não mais interessar manter determinado representante seu na Comissão, a questão é interna corporis; se o Regimento não prevê expressamente como resolver a questão, cabe fazê-lo o órgão competente para interpretar as normas regimentais.” (In RTJ 114, p. 537)

Do laborioso voto proferido pelo ilustre Relator, destaco extrato em que assim se expressou, verbis:

“Os deputados, quando integram uma CPI, ali estão como representantes dos partidos a que pertençam. A situação em que se encontram é peculiar. A composição das Comissões se forma proporcional aos partidos. É o que estabelece o parágrafo único, letra a, do art. 30 da CF e, por isso mesmo, os representam.

A Constituição Federal, quanto à composição das CPIs, apenas prevê  que deve ser assegurada, tanto quanto possível, ‘a representação proporcional dos partidos nacionais que participem da respectiva Câmara’. Não dispõe sobre a forma de nomeação ou de afastamento de seus membros. A norma, erguida ao altiplano constitucional, acentua exatamente que os membros das Comissões representam os partidos. A situação é diversa da composição da Mesa Diretora, pois a letra j do parágrafo único do art. 30 prevê que os seus membros exercem um mandato, por dois anos.

Desse modo, se ao partido não mais interessar manter um representante seu na Comissão, a questão é realmente interna corporis, e se o Regimento não prevê expressamente a hipótese, então ela há de ser decidida pelos órgãos internos da própria Câmara dos Deputados encarregados de interpretar o Regimento e suprir-lhe as lacunas.” (In RTJ 114, p. 540)

Com efeito, atos interna corporis expedidos no âmbito das atribuições da autoridade legislativa, com eficácia interna, relacionados à continuidade e à disciplina dos trabalhos legislativos, amparados na interpretação dada pelo Presidente da Câmara Legislativa ao respectivo regimento interno, sem violar qualquer dispositivo da Constituição, configuram competência privativa do Poder Legislativo, sendo insuscetível de reexame pelo Poder Judiciário.

Nesse sentido, farta é a doutrina: MOHRHOFF, Frederido. op. cit., p. 27; FINKELSTEIN, M. Judicial Self-Limitation. In: Harvard Law Review, v. XXXVII, p. 338-364; WESTON, Melville Fuller. Political Questions. In: Harvard Law Review, v. XXXVIII, p. 296-333; SCHARPF, Fritz W. Judicial Review and Political Question, In: The Yale Law Journal, v. 75, p. 596; HENKIN, Louis. Is There a Political Question Doctrine? In: The Yale Law Journal, v. 85, p. 597-625.

Parece-me ser essa a exegese que melhor se harmoniza ao sentido das normas de direito constitucional citadas, e levam a uma melhor compreensão de uma das mais relevantes atribuições do Poder Legislativo.

Considero, em princípio, como observam François Geny e Ferrara, em lições tantas vezes invocadas, que o intérprete deve considerar na norma, sobretudo na constitucional, não somente a letra da regra e a sua solução expressa, mas principalmente o seu conteúdo espiritual e a sua solução latente e implícita (Littera enim occidit, spiritus autem vivificat).

É essa a melhor doutrina e a que se encontra consagrada nos Tribunais.

François Geny refere-se-lhe dizendo que “il faut bien, puisque la formule reste muette et close, pénétrer, par d'autres voies, la volonté qui l'a inspirée, dégager l'esprit de la loi, pour contrôler, rectifier, compléter, restreindre ou étendre sa lettre” (GENY, François. Méthode d’interprétation – Essai critique. Paris: Libr. Générale de Droit et de Jurisprudence, 1919. t. 1, p. 32, n. 15).

Efetivamente, de conformidade com a nossa Constituição, em seu artigo 58, § 1º, os diversos partidos políticos, dentro do possível, deverão estar proporcionalmente representados na composição da Comissão Parlamentar de Inquérito.

Sendo a Constituição omissa sobre a forma do preenchimento ou da substituição dos membros de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, é no regimento interno do Legislativo que se vai encontrar a forma legal, o rito da formação e do funcionamento da Comissão.

Por outro lado, inexiste na Constituição norma impeditiva aos partidos políticos de promoverem a substituição dos seus membros integrantes de determinada Comissão Parlamentar de Inquérito.

Pode, pois, o Presidente do Parlamento acolher o pedido da liderança do partido político que postula tal substituição, sendo incabível o exame dessa questão pelo Judiciário, pois se trata de ato interna corporis do Legislativo, em homenagem ao princípio da separação dos poderes insculpido no artigo 2º da Constituição Federal.

Abonando-se em Rui Barbosa e na jurisprudência das Cortes Americanas, na parte inaugural de seu erudito voto, proferido no julgamento do Mandado de Segurança nº 18.293-DF, julgado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal em 03.04.1968, ponderou o saudoso Ministro Themístocles Cavalcanti, verbis:

“Entende o impetrante que a Resolução atinge a pessoa do Presidente do Senado, que tem na C.F., art. 31, § 1º, o seu direito líquido e certo a exercer aquelas funções.

Tratar-se-ão, assim, do exame de um ato interno das duas Câmaras Legislativas, no exercício de sua competência, expressa no mesmo art. 31, que atribui às duas Câmaras em conjunto – elaborar o seu Regimento Interno.

À primeira vista, o problema se resumiria à apreciação de um ato interno das duas Câmaras. Em princípio, a matéria estaria excluída da apreciação judiciária, por se tratar de questão interna corporis.

Das Constituições conhecidas, apenas a da Turquia, de 1961, admite expressamente o exame da constitucionalidade dos Regimentos Internos das duas Câmaras.

Nesse sentido, a questão é política, porque envolve o princípio da separação de poderes, podendo-se tomar como referência o caso Luther Borden da Corte Suprema dos Estados Unidos.

Relembraríamos aqui os longos debates e a preciosa contribuição doutrinária que deu este eg. Tribunal para a tese e o exaustivo estudo de Rui Barbosa no Direito do Amazonas ao Acre Setentrional.” (In RTJ 50, p. 295)

Escrevendo em 1924, Maurice Finkelstein, em alentado artigo intitulado “Judicial Self-Limitation” publicado na prestigiada Harvard Law Review, v. XXXVII, p. 344-5, asseverou, verbis:

There are certain cases which are completely without the sphere of judicial interference. They are called, for historical reasons, ‘political questions’. What are these political questions? To what matters does the term apply? It applies to all those matters of which the court, at a given time, will be of the opinion that it is impolitic or inexpedient to take jurisdiction. Sometimes this idea of inexpediency will result from the fear of the vastness of the consequences that a decision on the merits might entail. Sometimes it will result from the feeling that the court is incompetent to deal with the particular type of question involved. Sometimes it will be induced by the feeling that the matter is ‘too high’ for the courts. But always there will be a weighing of considerations in the scale of political wisdom.

Daí haver o Juiz Learned Hand proclamado, após dissertar acerca da origem e dos limites do judicial review, verbis:

On the other hand, it was absolutely essential to confine the power to the need that evoked it: that is, it was and always has been necessary to distinguish between the frontiers of another ‘Department's’ authority and the propriety of its choices within those frontiers.” (HAND, B. Learned. The Bill of Rights. Cambridge: Harvard University Press, 1977. p. 29-30)

Do que ficou exposto, é de se concluir que, por força da Constituição, toda a matéria relativa à organização e ao funcionamento do Poder Legislativo constitui disciplina de natureza regimental (artigo 58 da Constituição Federal).
Em princípio, desde que não contrariada norma expressa da Constituição, a interpretação dada ao regimento interno pelo Poder Legislativo deve ser acatada, consoante assinalado pelo eminente Ministro Francisco Rezek por ocasião do julgamento do Mandado de Segurança nº 20.471-DF, verbis:

“Mandado de Segurança.

Processo Legislativo no Congresso Nacional. Interna Corporis.

Matéria relativa à interpretação, pelo Presidente do Congresso Nacional, de normas de regimento legislativo é imune à crítica judiciária, circunscrevendo-se ao domínio interna corporis.

Pedido de segurança não conhecido.” (In RTJ 112, p. 1.023)

Ante o exposto, infere-se resumidamente:

I) Do ponto de vista do direito constitucional, é legítimo o ato do Presidente da Casa Legislativa ao substituir membro de Comissão Parlamentar de Inquérito, a pedido do líder do partido político a que pertence o parlamentar substituído;

II) Tratando-se de ato interna corporis do Poder Legislativo, praticado nos limites de sua competência, amparado na interpretação do regimento interno, é insuscetível de reexame na via judicial, nos termos de inúmeros precedentes do Eg. Supremo Tribunal Federal, publicados nas RTJs 112, p. 1.023, 114, p. 537, e 116, p. 67.

Ademais, para finalizar, recorde-se o testemunho do Justice Brennan no célebre caso Baker v. Carr (369 U.S. 186, ano 1962), julgado pela Suprema Corte, verbis:

The nonjusticiability of a political question is primarily a function of the separation of powers (...). Deciding whether a matter has in any measure been committed by the Constitution to another branch of government, or whether the action of that branch exceeds whatever authority has been committed, is itself a delicate exercise in constitutional interpretation (...).” (SWISHER, Carl B. Historic Decisions of the Supreme Court. 2. ed. New York: Van Nostrand Reinhold Co., 1969. p. 178)

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., abr. 2013. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS