Uma visão hermenêutica sobre o interesse público como diretriz de inclusão dos portadores de deficiência: a relativização do direito de autor em face do direito de igualdade

Autora: Maria Lúcia Luz Leiria

Desembargadora Federal, Mestre e Doutora em Direito, Pós-Doutoranda na Universidade de Lisboa

Autora: Laura Lessa Gaudie Ley

Advogada, Mestre em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito da Universidade de Montreal

 publicado em 30.04.2013


Introdução

Na contemporaneidade, vislumbra-se a grande importância dos direitos de propriedade intelectual, mormente em um mundo informatizado, em um mundo de avanços tecnológicos e aceleração de conhecimentos, com novas técnicas em todos os ramos do conhecimento humano ao alcance de um “clic” de botão. Assim, em face da realidade brasileira, na qual, a partir de 1988, vive-se um estado democrático de direito, em que os direitos do cidadão, os deveres do Estado, enfim, toda a regulação da sociedade brasileira, encontram-se insculpidos no próprio texto constitucional, constata-se a importância de toda política pública, toda regulamentação jurídica tendente a excluir discriminações. Tece-se um arcabouço de inclusão social, quer por meio de ações afirmativas, exemplo das cotas, quer por meio de licenças compulsórias de patentes, para permitir o alcance de todos a novos medicamentos, por exemplo. A regulação por meio de limitações aos direitos individuais, como é o caso da acessibilidade dos portadores de deficiência a todo o arsenal de obras educativas, de informação e de cultura, é objeto de exame neste trabalho. Aí, o ponto em que se tecem considerações acerca da possível e aparente colidência de interesses públicos e privados, nos casos específicos do direito de autor e do direito à educação, à informação e à cultura daqueles portadores de deficiência.

Navega-se na legislação brasileira, incursionando-se nos postulados internacionais, para concluir-se que muito tem sido feito para a concretização dos direitos sociais.

1 Hermenêutica

Passados mais de vinte anos desde a promulgação de nossa Constituição, ainda é necessário dizer que somente é válido o texto que está conforme a Constituição. Essa conformidade passa por uma interpretação capaz de se aliar ao que é o Estado Democrático de Direito.

Desde sempre, o estudioso do Direito tem pela frente grandes questões e um mundo novo que lhe parece distanciado, afastado, do mundo real, aquele em que vive, em que se relaciona, em que transita com suas emoções e sua razão.

A partir daí, começa a visualizar uma dualidade entre o chamado “mundo fático” e o “mundo jurídico”. Ambos precisam partir dos conhecimentos que se lhes vão ajuntando e que permitem, por fim, a clara visão de que os textos, as relações, os fatos e os atos do mundo do Direito são tão reais e tão necessariamente ligados ao mundo visível, sentido e ouvido. Da ideia da abstração primeira, surge a ideia da necessária equivalência, conexão, coexistência e explicação da importância do aprimoramento e do aprofundamento nesta ciência que, em toda e qualquer sociedade humana, torna-se cada vez mais imprescindível à própria sobrevivência do homem como ser social.

A ideia de homem como ser social remonta às concepções do contrato social criadas por Rousseau. Com efeito, para este filósofo iluminista, os homens, em busca da sobrevivência, deixam o seu estado de natureza,(1) que é um estado primitivo, e reúnem todas as suas forças e propriedades por meio do chamado “pacto social”, pelo qual “todos os cidadãos são iguais, o que todos devem fazer, todos podem prescrever, ao passo que ninguém tem o direito de exigir que um outro faça aquilo que ele mesmo não faz.”(2) Fundam, assim, um estado civil cuja finalidade é o bem comum,(3) entregando todos, em igual medida, a sua liberdade e os seus direitos a todos, associando-se em um estado pautado pela igualdade social que corrige as desigualdades físicas existentes entre os homens, em virtude da natureza, por meio da convenção e do direito.(4)

Já a filosofia atual da integração, desenvolvida por Michel Serres, parte da premissa de que o homem é um com a natureza, propondo uma revisão do contrato social(5) primitivo, concebido por Rousseau, de modo a redirecionar esse contrato para o seu genuíno objeto, que é a natureza, formando o denominado “contrato natural”.(6) Michel Serres, diante das constatações de que “o que está em risco é a Terra em sua totalidade, e os homens, em seu conjunto”,(7) e de que “a história global entra na natureza, a natureza global entra na história”,(8) defende que o homem, ao realizar o contrato social, apenas se ocupou consigo como ser social e com a sociedade em si, sem se ocupar minimamente da natureza, sendo imprescindível para a sobrevivência da humanidade e do planeta ampliar, ou mesmo deixar para trás, os conceitos de contrato social(9) e de contrato científico.(10) Propõe, então, um retorno à natureza, sem o qual não será mais possível viver ou conviver harmonicamente.

Nas palavras deste autor:

“Volta à natureza! Isto significa: ao contrato exclusivamente social juntar o estabelecimento de um contrato natural de simbiose e de reciprocidade onde a nossa relação com as coisas deixaria domínio e posse pela escuta admirativa, pela reciprocidade, pela contemplação e pelo respeito, onde o conhecimento não mais suporia a propriedade, nem a ação a dominação, nem estas os seus resultados ou condições estercorárias. Contrato de armistício na guerra objetiva, contrato de parasita, nosso estatuto atual condena à morte aquele que pilha e que habita, sem tomar consciência de que no final condena-se a desaparecer.
O parasita toma tudo e não dá nada, o hospedeiro dá tudo e não toma nada. O direito de domínio e de propriedade se reduz ao parasitismo. Ao contrário, o direito de simbiose se define por reciprocidade: o que a natureza dá ao homem é o que este deve restituir a ela, transformada em sujeito de direito.”(11)

Portanto, para o citado autor,

“O contrato natural nos leva a considerar o ponto de vista do mundo em sua totalidade. Todo contrato cria um conjunto de elos cuja rede canoniza as relações; a natureza hoje se define por um conjunto de relações cuja rede unifica a Terra inteira; o contrato natural conecta em rede o segundo ao primeiro.”(12)

É assim que, a partir da obrigatória caminhada pelas inúmeras teorias que buscam explicar e fundamentar o Direito como ciência, de forma a possibilitar a sua função maior, que é a de transformar e manter uma sociedade mais justa, de criar para todas as relações interindividuais e multifacetadas os mais justos e benéficos resultados, encontra-se o operador jurídico frente a uma primeira e basilar constatação: existem textos jurídicos, existem situações fáticas, existem litígios, e, para tanto, mister que se busque nos textos a sua função regradora, a sua atribuição regulamentadora, capaz de permitir a manutenção da ordem, da paz e do progresso das sociedades humanas.

É exatamente nessa base, nesse início, que se apresenta a necessidade de se interpretar, de se conhecer o texto que deve ser aplicado, o que deve ser compreendido, o que deve ser manifestado. E isso é o objeto da Hermenêutica.

Para abordar a questão proposta, mister que, já de início, fique estabelecida, no mínimo, uma distinção entre o que seja uma interpretação legal, para concluir que ela “não consiste apenas no estudo isolado e sistemático do referido texto, para surpreender-lhe o sentido e o alcance, e na análise dos fatos (aos quais o dito texto se deva aplicar) em face dos diversos elementos legais que contenha”,(13) e a nova postura hermenêutica como instrumento da construção jurídica, nas exatas palavras de Lenio Streck,(14) de que é necessário compreender e de que interpretação é compreensão.

Considerando-se que a doutrina diverge acerca do que seja o objeto de estudo da hermenêutica jurídica, reporta-se este trabalho, inicialmente, à concepção tradicional de hermenêutica formulada por Francesco Ferrara, que assim afirma sobre o papel do juiz na interpretação e na aplicação das leis:

“O juiz é o intermediário entre a norma e a vida: é o instrumento vivo que transforma a regulamentação típica imposta pelo legislador na regulamentação individual das relações dos particulares; que traduz o comando abstrato da lei no comando concreto entre as partes, formulado na sentença. O juiz é a viva vox iuris.”(15)

Ressalte-se, no entanto, que a hermenêutica, como tema a ser desenvolvido ao longo deste trabalho, deve ser entendida aqui não sob este enfoque tradicional acima mencionado, a partir do qual o seu objeto são as técnicas para uma interpretação o mais objetiva possível da lei, na busca de sua vontade objetiva, mas sob o prisma que concebe a hermenêutica como condição de ser no mundo, onde interpretar é aplicar. É que a hermenêutica deve levar em consideração não apenas o campo abstrato da lei, mas também o campo concreto e real dos fatos. A doutrina tradicional da interpretação(16) por meio de métodos e fórmulas pretende atingir a vontade objetiva da norma ou a vontade subjetiva do legislador. Há a ilusão da possibilidade de reprodução do texto sem que o intérprete se insira dentro do ambiente histórico/cultural do qual depende também a sua interpretação, para, interagindo, chegar à construção da norma para o caso concreto, para o caso posto.

Feitas essas considerações, cumpre, então, destacar que apenas na modernidade passou-se a entender a hermenêutica e a interpretação como conceitos diversos. A hermenêutica é concebida, desde então, como ciência que se ocupa das técnicas pertinentes à elaboração da interpretação, enquanto a interpretação diz com o estabelecimento das relações de um texto com o presente, ao aplicá-lo a uma situação presente.

Ou melhor, o julgador, como intérprete do texto, necessita sopesar todos os elementos fáticos que envolvam o caso posto a fim de concluir pela aplicação do texto da forma mais justa, de maneira a estabelecer uma relação com o texto já vindo do passado para o momento presente em que será aplicado.

Também a respeito da interpretação é necessário destacar alguns aspectos. Igualmente, o conceito de interpretação que vai ser trabalhado e adotado neste texto é mais amplo que o conceito clássico, pelo qual normalmente não se indaga sobre quem são os participantes da interpretação. Contudo, especialmente em matéria de direitos e garantias individuais e sociais previstos em sede constitucional, há que se adotar um modelo de interpretação mais aberto, levando em conta a interpretação dos intitulados “participantes materiais do processo social”,(17) que são, entre outros, os cidadãos, seus grupos e os órgãos estatais, sendo impossível discriminar e quantificar todos os que fazem parte da interpretação.

É este, aliás, o conteúdo central da tese de Peter Häberle, que propõe a democratização da interpretação constitucional, nos seguintes termos:

“Se se considera que uma teoria da interpretação constitucional deve encarar seriamente o tema ‘Constituição e realidade constitucional’ – aqui se pensa na exigência de incorporação das ciências sociais e também nas teorias jurídico-funcionais, bem como nos métodos de interpretação voltados para atendimento do interesse público e do bem-estar geral –, então há de se perguntar, de forma mais decidida, sobre os agentes conformadores da ‘realidade constitucional’.”(18) 

Mais adiante, prossegue este mesmo autor:

“O conceito de interpretação reclama um esclarecimento que pode ser assim formulado: quem vive a norma acaba por interpretá-la ou pelo menos por cointerpretá-la (Wer die Norm ‘lebt’, interpretiert sie auch (mit)). Toda atualização da Constituição, por meio da atuação de qualquer indivíduo, constitui, ainda que parcialmente, uma interpretação constitucional antecipada. Originalmente, indica-se como interpretação apenas a atividade que, de forma consciente e intencional, dirige-se à compreensão e à explicitação de sentido de uma norma (de um texto). A utilização de um conceito de interpretação delimitado também faz sentido: a pergunta sobre o método, por exemplo, apenas se pode fazer quando se tem uma interpretação intencional ou consciente. Para uma pesquisa ou investigação realista do desenvolvimento da interpretação constitucional, pode ser exigível um conceito mais amplo de hermenêutica: cidadãos e grupos, órgãos estatais, o sistema público e a opinião pública (...) representam forças produtivas de interpretação(interpretatorische Produktivkräfte); eles são intérpretes constitucionais em sentido lato, atuando nitidamente, pelo menos, como pré-intérpretes (Vorinterpreten).Subsiste sempre a responsabilidade da jurisdição constitucional, que fornece, em geral, a última palavra sobre interpretação (com a ressalva da força normatizadora do voto minoritário). Se se quiser, tem-se aqui uma democratização da interpretação constitucional. Isso significa que a teoria da interpretação deve ser garantida sob a influência da teoria democrática. Portanto, é impensável uma interpretação da Constituição sem o cidadão ativo e sem as potências públicas mencionadas.(19)

Desde os tempos em que o homem, dominando a natureza, passou a se relacionar com os demais, aparece em qualquer grupo aquele que diz o caminho, a lei, as regras, as condutas. E aquele que determina as sanções, que escolhe as consequências, que julga os demais.

É deste ator, o julgador, que se passa a exigir uma perfeita sincronia com o mundo em que vive, para que possa permitir o desenvolvimento da própria sociedade. Assim, tanto a hermenêutica precisa do juiz como o juiz precisa da hermenêutica. Um não vive sem o outro. Não há julgamento sem interpretação; não há juiz que não interprete.

O homem, através dos tempos, foi-se relacionando e interagindo com os seus semelhantes e com a natureza. Para poder sobreviver e conviver, foram surgindo, ao longo dos tempos e de acordo com as realidades sociais, pensadores, filósofos, homens letrados que, ao lado do poder da força, exerciam nas comunidades o poder de determinar, de decidir o que era necessário para a sobrevida da comunidade e de suas relações em todos os campos.

Assim, a comunicação por meio de sinais, da linguagem, de símbolos, é o fator fundamental e básico para o crescimento da comunidade e para o enfrentamento dos fenômenos naturais que se foram conhecendo. Esta é, sem dúvida, desde os tempos bíblicos, a grande descoberta do homem-ser-social: a habilidade de comunicar-se.

A partir dessa rápida abordagem (e tendo em conta que a hermenêutica, como construção do Direito, permite a manutenção do Estado Democrático de Direito), afirma-se que cabe aos detentores do poder de dizer a norma a obrigação de interpretar de acordo com e conforme a realidade que os rodeia. Tudo porque é da própria essência desse poder esta atribuição, que emana da soberania popular (Constituição Federal, art. 1º, parágrafo único).

Carlos Maximiliano, que, dentro de nossa cultura jurídica, foi um dos pioneiros em se preocupar com a aplicação dos textos legais aos casos concretos, salientou que a hermenêutica não se confunde com a interpretação. Diz que aquela é a teoria científica da arte de interpretar, afirmando que “a hermenêutica jurídica tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance do Direito”.(20)

Tanto em valor histórico como na sempre presente busca de aplicar o bem interpretado, pode-se dizer que a postura tradicional hermenêutica é aquela que busca classificar métodos eficientes, enclausurando, muitas vezes, outros fatores e valores tão necessários para fazer o que diz o bom direito: aplicar as normas com justiça.

É que a hermenêutica contemplada a partir do paradigma clássico, bem reproduzido pela Escola da Exegese, restringe a atividade judicial, por meio de seus métodos de interpretação, a mera subsunção da norma ao caso concreto, numa reprodução mecânica de seu sentido em que não há qualquer espaço para a criação. Entretanto, não há como negar a liberdade de criação do intérprete, porque, como bem coloca Márcio Augusto de Vasconcelos Diniz, “isso equivaleria a negar a sua própria humanidade”(21) e, já que “pensar é criar, hermenêutica é cultura e, portanto, obra humana”.(22) Aliás, nesse sentido, pertinente a advertência realizada por Paulo Bonavides de que a hermenêutica tradicional não foi feita para ser aplicada aos direitos fundamentais, tendo em vista que estes, em geral, simplesmente não se prestam à interpretação, mas sim à concretização: “Os direitos fundamentais, em rigor, não se interpretam; concretizam-se”.

A metodologia clássica da Velha Hermenêutica de Savigny, de ordinário aplicada à lei e ao Direito Privado, quando empregada para interpretar direitos fundamentais, raramente alcança decifrar-lhes o sentido. Os métodos tradicionais, a saber, gramatical, lógico, sistemático e histórico, são de certo modo rebeldes a valores, neutros em sua aplicação, e por isso mesmo impotentes e inadequados para interpretar direitos fundamentais. Estes se impregnam de peculiaridades que lhes conferem um caráter específico, demandando técnicas ou meios interpretativos distintos, cuja construção e emprego gerou a Nova Hermenêutica.(23)

Há, pois, que se estabelecer que, na busca da aplicação dos direitos e garantias fundamentais, a compreensão do presente, da atualidade que deve ser conferida ao texto a ser aplicado, a ser entendido, deve passar por uma presença do intérprete, por uma valoração do pretendido direito frente aos objetivos e princípios constitucionais. Não há por que deixar de referir que essa interpretação é sistemática, axiológica, hierárquica e teleológica, como método e forma a ser utilizada,(24) bem como que está fincada na pré-compreensão do estar aí no mundo, como quer Lenio Streck, porque uma não afronta a outra; ao contrário, apontam novos horizontes àquele cuja atribuição é a de construir o direito para o caso concreto.(25)

2 O interesse público e o interesse privado

Ao se analisar o tema proposto, necessário se faz adentrar no estudo dos interesses envolvidos e na sua valoração. Doutrinariamente, existe uma grande discussão sobre a coerência do principio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado.

Em uma primeira corrente identifica-se Maria Sylvia Zanella di Pietro,(26) que, mediante uma abordagem histórica calcada na dicotomia entre público e privado, entende que, a fim de se alcançar o bem-estar coletivo, necessário se faz reconhecer a proeminência do interesse público sobre os interesses individuais. Nessa mesma linha, Celso Antônio Bandeira de Mello(27) defende a superioridade do interesse público, definindo esse como “(...) o conjunto de interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da sociedade”.

Celso Antônio Bandeira de Mello diz que “a estrutura do conceito de interesse público responde a uma categoria lógico-jurídica, que reclama tal identificação. Inversamente, a individuação dos múltiplos interesses públicos responde a conceitos jurídico-positivos”.(28)

Daí que a falada supremacia do interesse público sobre o privado só pode ser entendida quando em linha direta para o alcance do interesse público, e não para “satisfazer apenas interesses ou conveniências tão só do aparelho estatal, e muito menos dos agentes governamentais”.(29)

Por isso, atendendo-se ao tema ora em exame, temos que as limitações impostas ao direito de autor são flagrantes manifestações do atendimento ao interesse público, base e fundamento da própria democracia, a fim de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais: a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

Assim, o direito social de livre acesso à informação, à educação e à cultura deve compor-se de forma a garantir o alcance de todos aos bens inerentes à concretização do próprio direito.

Por isso, bem andou o legislador infraconstitucional ao aderir a tratados e convenções internacionais, bem como ao regular no artigo 46 da Lei nº 9610/98, como se vê no item abaixo.

Oportuno referir que a doutrina, ao discorrer sobre a conceituação de interesse público, tende a decompô-la em interesses públicos primários e interesses públicos secundários. Os primeiros consistem nos fins que cabem ao Estado promover, enquanto os segundos se identificam com os interesses da pessoa jurídica de direito público.

De outra banda, para Luís Roberto Barroso,(30) que defende uma posição intermediária, o interesse público primário sempre prevalece sobre o interesse privado, como se percebe, a contrário sensu, da transcrição, in verbis:

“O interesse público primário é a razão de ser do Estado, e sintetiza-se nos fins que cabe a ele promover: justiça, segurança e bem-estar social. Estes são os interesses de toda a sociedade. O interesse público secundário é o da pessoa jurídica de direito público que seja parte em uma determinada relação jurídica – quer se trate da União, do Estado-membro, do Município ou das suas autarquias. Em ampla medida, pode ser identificado como o interesse do erário, que é o de maximizar a arrecadação e minimizar as despesas.

(...) essa distinção não é estranha à ordem jurídica brasileira. É dela que decorre, por exemplo, a conformação constitucional das esferas de atuação do Ministério Público e da Advocacia Pública. Ao primeiro cabe a defesa do interesse público primário; à segunda, a do interesse público secundário. Aliás, a separação clara dessas duas esferas foi uma importante inovação da Constituição Federal de 1988. É essa diferença conceitual entre ambos que justifica, também, a existência da ação popular e da ação civil pública, que se prestam à tutela dos interesses gerais da sociedade, mesmo quando em conflito com interesses secundários do ente estatal ou até dos próprios governantes.

(...)

O interesse público secundário – i.e., o da pessoa jurídica de direito público, o do erário – jamais desfrutará de supremacia a priori e abstrata em face do interesse particular.”

Uma terceira corrente, por fim, discorda da existência de um princípio de supremacia, apontando para um “vazio semântico” do termo “interesse público”. Nesse sentido, Marçal Justen Filho(31) entende impossível reunir a pluralidade de interesses, muitas vezes conflitantes, presentes na sociedade contemporânea em um só valor comum e homogêneo. Humberto Ávila, fundado nas lições de Robert Alexy, sustenta que a ideia de um princípio de supremacia do interesse público não corresponde à definição de normas-princípios. Assim, prescreve que não existe respaldo normativo para este principio na Constituição brasileira, a Constituição cidadã, alicerçada na proteção dos interesses individuais. Segundo o autor, “o interesse público e o interesse privado estão de tal forma instituídos pela CR que não podem ser separadamente descritos na análise da atividade estatal e de seus fins. Elementos privados estão incluídos no próprio fim do Estado”.(32) Para Gustavo Binenbojm,(33) “dimensões individuais e coletivas convivem, lado a lado, no texto constitucional, impondo-se como paradigmas normativos a vincular a atuação do intérprete da Constituição”. De acordo com esse autor, não há que se falar em supremacia do interesse publico, uma vez que este mesmo pode significar direitos eminentemente individuais. Nesse contexto, defende que a determinação do conceito de interesse público só poderia ser alcançada pela ponderação dos valores colidentes mediante o princípio da proporcionalidade (necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito).

Tem-se, pois, que é possível defender a supremacia do interesse público, e mais do que isso: em um Estado Democrático de Direito, fundado na contemplação dos interesses da coletividade, isto é, na composição dos interesses individuais coincidentes, essa defesa é necessária. Nesse sentido, colacionam-se as palavras de Romeu Felipe Bacellar Filho:(34)

“A Constituição estabelece que o Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, fundamentado na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e no pluralismo político (art. 1 da CF). Define ainda como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil ‘promover o bem de todos’ (art. 3, IV, da CF). Se a cidadania e a dignidade da pessoa humana constituem fundamentos republicanos, e a promoção do bem de todos configura um de seus objetivos fundamentais, não é possível que o interesse perseguido com o exercício da função administrativa não encontre seu princípio e fim no interesse dos próprios cidadãos, tanto numa perspectiva individual como coletiva.

(...)

Partindo-se dessa noção jurídica, não há qualquer dificuldade de se sustentar a supremacia do interesse público. Se, como visto, o interesse público representa os interesses da coletividade – aí incluídos os interesses individuais tutelados pelo ordenamento jurídico –, e o seu conteúdo nuclear é composto por princípios constitucionais, a afirmação de sua supremacia só pode significar a própria afirmação da supremacia da Constituição.”

3 Direito do autor: breve histórico

O direito brasileiro, de origem romano-germânica, adota, no que tange à proteção das relações jurídicas surgidas a partir da criação de obras literárias, artísticas ou científicas, o sistema europeu continental. Esse sistema caracteriza-se por colocar em foco a pessoa do direito, o autor. Difere, assim, do sistema anglo-saxão, baseado na Common Law, cujo centro de interesse é determinado pelo objeto do direito, isto é, a obra, e pela prerrogativa patrimonial de sua reprodução, daí o nome “copyright”.

A natureza jurídica dessa forma de direito, todavia, ainda não é pacífica na doutrina. Historicamente, esses direitos assumem relevo constitucional a partir da Carta Magna de 1891,(35) em que foram inseridos como direitos fundamentais no seu artigo 72, § 26, a seguir transcrito:

“Art. 72. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
§ 26 Aos autores de obras literárias e artísticas é garantido o direito exclusivo de reproduzi-las, pela imprensa ou por qualquer outro processo mecânico. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei determinar.”

Opta o legislador constituinte por conferir ao autor um direito exclusivo de reprodução de suas obras, sendo essas consideradas sua propriedade. Essa posição foi adotada igualmente pela Constituição da República dos estados Unidos do Brasil(36) de 1934, quando tratou do tema no artigo 113, item 20, Título III, Da Declaração de Direitos, Capítulo II, dos Direitos e das Garantias Individuais, inovando apenas ao dispor, no artigo 113, item 9, que “A publicação de livros e periódicos independe de licença do Poder Público”. Por sua vez, a Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937(37) retira o direito de autor do rol dos Direitos e Garantias individuais, tratando do tema dentro das competências dos entes federados, dando competência privativa à União de sobre ele legislar, conforme disposto no artigo 16, incisos XX e XXI. O posicionamento antigo, todavia, é retomado na Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946,(38) que, no artigo 141 do Título IV, da Declaração de Direitos, Capítulo II, Dos Direitos e Garantias Individuais, dispõe:

“Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
§ 5º É livre a manifestação do pensamento, sem que dependa de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um, nos casos e na forma que a lei preceituar pelos abusos que cometer. Não é permitido o anonimato. É assegurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos não dependerá de licença do Poder Público. Não será, porém, tolerada propaganda de guerra, de processos violentos para subverter a ordem política e social, ou de preconceitos de raça ou de classe.
(...)
§ 19 Aos autores de obras literárias artísticas ou científicas pertence o direito exclusivo de reproduzi-las. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei fixar.”

A suprarreferida redação foi mantida na Constituição da República Federativa do Brasil de 1967 (EC 1/69),(39) no artigo 158, parágrafos 8º e 25. Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,(40) também conhecida como Constituição Cidadã, o direito de autor tomou novos contornos. Primeiramente, o texto constitucional vigente inova em sua redação, dispondo no artigo 5º do Capítulo sobre os Direitos e Garantias Individuais e Coletivos, no Título referente aos Direitos e Garantias Fundamentais:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXVII – aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII – são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas;”

Em segundo lugar, a norma máxima vigente passou a proteger o instituto jurídico da propriedade, desde que assegurada a sua função social. Essa disposição constitucional passa a relativizar o direito de propriedade frente aos objetivos e princípios perseguidos pela República Federativa do Brasil, dispostos nos artigos 1º a 4º do texto constitucional.

Embora, como já referido, haja discussão na doutrina acerca da natureza jurídica do direito de autor, isto é, se ele consiste em um direito de propriedade, em um direito de personalidade, ou em um direito de natureza híbrida que abarque ambos, certo é referir que ele pode ser dividido em duas esferas: direitos patrimoniais e direitos morais. Os primeiros são os direitos de “propriedade” do autor sobre a sua obra, e como tais podem ser negociados, cedidos, transferidos. Já os segundos são identificados como direitos personalíssimos do autor, de cunho inalienável. Nos primeiros, encontramos as faculdades de reprodução, edição, publicação e adaptação da obra. Nos segundos, apresentam-se os direitos inerentes ao autor de paternidade, integridade. Nos dizeres de Maristela Basso:(41)

“A divergência entre os representantes dos países anglo-saxões e os de tradição romano-germânica tinha como foco o alcance da proteção, isto é, se aos autores seriam conferidos direitos econômicos e morais, ou somente os primeiros.
Os países de tradição romano-germânica reconhecem aos autores direitos morais e econômicos, posição prevalecente também na América Latina. Os direitos morais do autor têm dupla face: (a) o ‘direito de paternidade’, que implica o direito do autor de reclamar a autoria de sua obra, e (b) o ‘direito de integridade’, isto é, de objetar qualquer modificação, distorção ou mutilação que possa prejudicar a sua honra ou reputação. Os direitos morais são independentes dos econômicos, que incluem o direito de autorizar a reprodução, a tradução, a adaptação, a representação pública, a gravação sonora ou cinematográfica e a radiofusão da obra.”

Nesse contexto, os direitos patrimoniais de um autor sobre a sua obra são constitucionalmente protegidos desde que mantida a sua função social, isto é, desde que o interesse privado do autor em sua obra não obstaculize de forma intransponível o interesse público de acesso à informação, à educação, à cultura e ao conhecimento.

A proteção do direito de autor na legislação infraconstitucional data da instituição dos primeiros cursos de Direito em solo pátrio (Olinda e São Paulo), com o advento da Lei Imperial de 1827.(42) Em 1830,(43) o Código Penal Pátrio foi o primeiro na América Latina a criminalizar uma conduta de contrafação, garantindo, ainda, o privilégio de 10 anos ao autor sobre a sua obra. Em 1922, o país aderiu à convenção de Berna de 1886(44) para a proteção de obras literárias e artísticas, sendo o pioneiro dentre os países da América Latina a aderir a essa convenção. Esse tratado é um dos principais marcos regulatórios internacionais sobre o tema e hoje conta com 164 países signatários, sendo de responsabilidade da Organização Mundial da Propriedade Intelectual. Com a Lei nº 5.988, de 1973,(45) houve a consolidação legislativa das regras sobre o tema. Esse diploma normativo foi a referência legislativa sobre direitos de autor até 1998, ano em que entraram em vigor a Lei nº 9.609,(46) que regula a proteção aos programas de computador, e a Lei nº 9.610,(47) que institui uma nova regulamentação, vigente até hoje, para os direitos de autor, conformada com a Constituição de 1988.

4 Limitações ao direito do autor e o acesso dos deficientes à educação e à informação

Trata-se de examinar aqui o direito à educação, à informação e à cultura dos deficientes para que eles sejam incluídos socialmente. Aliás, tudo deflui do próprio direito à igualdade insculpido no caput do art. 5º da Constituição Federal. Cuida-se, pois, de inclusão social, e não de colidência entre o interesse do autor e o interesse público; cuida-se da própria concretização do interesse publico primário e secundário que determina o tratamento desigual aos desiguais – daí a importância dessa limitação ao direito do autor.

Assim, de uma perspectiva sistemática, o texto constitucional brasileiro vem conferir ao chamado direito de autor, ou seja, à propriedade intelectual, a conotação de direito fundamental, sem caráter absoluto, já que o próprio texto limita tal direito.

Notório que, sendo o direito do autor direito de propriedade, seu caráter não é absoluto e sofre limitações em face do interesse público, entendido este como a soma dos interesses individuais. Assim, em face de uma colidência entre o interesse do particular – proprietário intelectual – e a sociedade organizada, há que se ponderar sobre o interesse de mais valia capaz de manter o próprio estado democrático de direito, sob pena de tornar-se inócua a própria proteção à propriedade intelectual. Tudo isso está também garantido no plano internacional, como se vê de diversos artigos da Convenção de Berna.

Claramente fica demonstrado o interesse dos países signatários a uma proteção a direitos sociais e coletivos, como, por exemplo, o direito à educação, à informação e à cultura.

Diversos artigos da Convenção expressam esse objetivo. Vale destacar o artigo que estabelece a “regra dos três passos” (artigo 9(2)), que diz:(48)

“Às legislações dos países da União reserva-se a faculdade de permitir a reprodução das referidas obras [obras literárias e artísticas] em certos casos especiais, contanto que tal reprodução não afete a exploração normal da obra nem cause prejuízo injustificado aos interesses legítimos do autor.”

No mesmo tom, o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Acordo ADPIC), da OMC,(49) reproduz em seu artigo 13 a Convenção de Berna:

“Os Membros restringirão as limitações ou exceções aos direitos exclusivos a determinados casos especiais, que não conflitem com a exploração normal da obra e não prejudiquem injustificadamente os interesses legítimos do titular do direito.”

Além, pois, das limitações impostas pelo próprio texto constitucional, a legislação brasileira de regência prevê hipótese de limitação a tal propriedade no que diz com o direito de autor. As limitações aos direitos de autor abrangem, portanto, nas palavras do mestre José de Oliveira Ascensão, tudo aquilo que impede que tais direitos tenham caráter absoluto.(50) Para Carlos Alberto Bittar,(51) as limitações aos direitos autorais “são verdadeiros tributos a que se sujeita o autor em favor da coletividade, de cujo acervo geral retira elementos para as criações de seu intelecto”.

É o que se vê no artigo 46 da Lei 9.610/98, em que o direito individual do autor é limitado pelo direito social dos deficientes, que, em suma, é fruto da necessidade de dar-se maior valor ao interesse público da coletividade, nela incluídos os portadores de deficiência, em face do direito fundamental de igualdade, in verbis:

“Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais:

I – a reprodução:
(...)
d) de obras literárias ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários;”

Da leitura dos dispositivos colacionados, percebe-se que a legislação nacional, no que se refere à ponderação entre direito de autor e acessibilidade, não contemplou em seu texto normas capazes de promover uma verdadeira inclusão social. Em primeiro lugar, trata a norma pátria apenas da reprodução de obras, não trazendo expressamente em seu texto a figura da adaptação para meios realmente acessíveis aos portadores de necessidades especiais. Em segundo, erra a norma em vigor ao restringir seu escopo de proteção apenas ao deficiente visual, ignorando as diversas outras formas de deficiência que encontram seu acesso à cultura, à educação e à informação bloqueado pela não adaptação das obras a formatos compatíveis com as suas necessidades. Em terceiro, proíbe a reprodução com fins comerciais, ignorando a realidade social de que essas obras chegam, muitas vezes, ao seu público alvo mediante instituições sem fins lucrativos, que sobrevivem de doações e que necessitam de uma contraprestação pelo gasto despendido na realização da obra acessível a fim de continuar existindo e mantendo seu programa de inclusão social.

4.1 Emenda Constitucional nº 45/2004 e o Tratado da ONU sobre Direitos dos Deficientes

Ao analisar-se a hierarquia legislativa dos tratados internacionais sobre direitos humanos, é correto afirmar-se que a doutrina se dividia em virtude da interpretação do parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição, in verbis:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”

A primeira corrente entende que a Constituição Federal, ao trazer no seu corpo normativo disposição no sentido de que os direitos e garantias nela elencados não excluem outros que venham a ser reconhecidos em tratados internacionais firmados pela República Federativa do Brasil, autorizava a inclusão dessas novas proteções ao seu catálogo, no mesmo grau hierárquico das demais normas constitucionais, ampliando seu bloco de constitucionalidade.(52) De outra banda, há a corrente que entende que as normas jurídicas decorrentes de tratados internacionais sobre direitos humanos têm assento hierárquico de caráter infraconstitucional, ou seja, ingressam no ordenamento jurídico brasileiro na qualidade de leis de índole ordinária.(53) Por fim, uma terceira corrente doutrinária considera que as normas jurídicas decorrentes de tratados internacionais sobre direitos humanos têm assento hierárquico de normas infraconstitucionais, mas de caráter especial; assim, afasta-se o princípio lex posterior derogat priori, prevalecendo o princípio pelo qual a lei especial revoga a lei geral.

Os nossos Tribunais Superiores adotam a posição doutrinária da segunda corrente, entendendo que as normas oriundas de tratados internacionais, incluindo as que dispõem a respeito de direitos e garantias individuais ou direitos humanos, são recepcionadas pela ordem jurídica brasileira com equivalência a leis ordinárias. Diverge, todavia, o posicionamento destes Tribunais do adotado pela segunda corrente no sentido de que, na maioria dos julgados, a norma decorrente de tratados não é revogada por lei posterior, mas, tão somente, tem a sua prevalência preterida por esta nas hipóteses em que se apresenta antinomia.(54)

Com o advento da Emenda Constitucional nº 45, em 2004, foi agregado o parágrafo 3º ao artigo 5º da Carta Magna, dispondo:

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.”

Essa alteração normativa criou a possibilidade de que um tratado internacional sobre direitos humanos – quando, após ratificação, for aprovado em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos, pelo quorum especificado – passe a ter eficácia formal no ordenamento interno. Assim, criam-se duas situações distintas. A primeira, contida no parágrafo 2º do artigo 5º, dispõe que, seguindo a posição doutrinária a que o STF filiou-se, normas sobre direitos humanos apresentadas em tratados internacionais assinados pelo Brasil integram o ordenamento pátrio na hierarquia de norma infraconstitucional. A segunda, mais restrita, determina que as referidas normas, quando aprovadas pelo quorum qualificado ali especificado, entram no ordenamento jurídico nacional como equivalentes às emendas constitucionais. Ou seja, passam a ter hierarquia constitucional.  Essa disposição produz dois efeitos. Primeiramente, uma vez aprovado o texto de um tratado internacional pelo parágrafo 3º do artigo 5º, opera-se imediatamente a reforma do texto constitucional conflitante. De outra parte, uma vez que se equivalem às emendas constitucionais e, por tratarem de matéria de direitos humanos, incluem-se de forma automática no rol das cláusulas pétreas do texto constitucional, impossibilita-se, assim, a denúncia do tratado internacional que lhes deu origem, mesmo em caso de projeto de denúncia elaborado pelo Congresso Nacional, sob pena de responsabilidade do denunciante. Entendemos, frente ao exposto, que a EC 45 resolveu a discussão doutrinária sobre a hierarquia dos tratados internacionais quando internalizados no ordenamento jurídico nacional.

Em 9 de julho de 2008, a Câmara dos Deputados aprovou, por meio do Decreto Legislativo nº 186, em primeiro turno, a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007, sendo este o primeiro tratado internacional a entrar no ordenamento jurídico nacional com equivalência a emenda constitucional. Foram 418 votos a favor, nenhum voto contra e 11 abstenções, o que credencia o tratado da ONU a utilizar-se do texto do parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição Federal. Assim, pelo disposto no Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009:(55)

“Art. 1º A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, apensos por cópia ao presente Decreto, serão executados e cumpridos tão inteiramente como neles se contém. 
Art. 2º São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que possam resultar em revisão dos referidos diplomas internacionais ou que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, nos termos do art. 49, inciso I, da Constituição.” 

Cabe referir o que dispõe a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no que se refere ao acesso à cultura, à educação, ao conhecimento e à informação.

“Preâmbulo:
Os Estados-partes dessa Convenção,
(...)
s) Reconhecendo a importância da acessibilidade nos ambientes físicos, sociais, econômicos e culturais, para a saúde e educação e para informação e comunicação, habilitando as pessoas com deficiência a desfrutar plenamente todos os direitos humanos e liberdades fundamentais;
(...)
Acordam o seguinte:
Artigo 1 PROPÓSITO
O propósito dessa Convenção é promover, proteger e assegurar o gozo completo e igual de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais pelas pessoas com deficiência e promover o respeito da sua dignidade inerente.
(...)
Artigo 3 PRINCÍPIOS GERAIS
Os princípios fundamentais dessa Convenção deverão ser:
(...)
(c) Inclusão e participação plena e efetiva na sociedade;
(...)
(e) Igualdade de oportunidade;
(f) Acessibilidade;
(...)
Artigo 9 ACESSIBILIDADE
1. Para assegurar que pessoas com deficiência vivam independentemente e participem plenamente em todos os aspectos da vida, os Estados-partes deverão tomar medidas apropriadas para assegurar a acessibilidade para pessoas com deficiência, em igualdade com as outras pessoas, no ambiente físico, no transporte, na informação e na comunicação, incluindo tecnologias de informação e comunicação, e em outras infraestruturas e serviços abertos ao público em áreas urbanas e rurais. Essas medidas, que incluirão a identificação e eliminação dos obstáculos e barreiras para acessibilidade, deverão aplicar-se, entre outras:
(...)
2. Os Estados-partes também tomarão medidas apropriadas para:
(...)
(h) Promover a criação, o desenvolvimento, a produção e a distribuição de tecnologias de informação e comunicação acessíveis o mais rápido possível, para que a sociedade da informação torne-se inclusiva com custo mínimo.
(...)
Artigo 24 EDUCAÇÃO
1. Os Estados-partes reconhecerão o direito de todas as pessoas com deficiência à educação. Com vistas à efetivação desse direito sem discriminação e com oportunidades iguais, os Estados-partes assegurarão um sistema de educação inclusiva em todos os níveis, e aprendizagem ao longo da vida, direcionados:
(...)
(b) Ao desenvolvimento pelas pessoas com deficiência de seus talentos, personalidade e criatividade, assim como de sua habilidade mental e física, em seu pleno potencial;
(...)
2. Em realizando esse direito, os Estados-partes assegurarão:
(...)
(b) Que as pessoas com deficiência tenham acesso à educação inclusiva, de qualidade e gratuita, primária e secundária, em iguais bases com os outros, na comunidade onde vivem;
(c) Adaptações adequadas para as suas necessidades individuais requeridas;
(...)
Artigo 30 PARTICIPAÇÃO NA VIDA CULTURAL, RECREAÇÃO, LAZER E ESPORTE
1. Os Estados-partes reconhecerão o direito das pessoas com deficiência a participar, em igualdade de condições com outros, na vida cultural, e tomarão as medidas necessárias para assegurar que pessoas com deficiência:
(a) Desfrutem do acesso de materiais culturais em formatos acessíveis;
(b) Desfrutem do acesso aos programas de televisão, filmes, teatro, e outras atividades culturais em formatos acessíveis;
(...)
3. Os Estados-partes tomarão todas as medidas apropriadas, de acordo com as leis internacionais, para assegurar que as leis de proteção aos direitos de propriedade intelectual não constituam uma barreira injusta ou discriminatória para o acesso de pessoas com deficiência a materiais culturais.
(...)
5. Os Estados-partes assegurarão que pessoas com deficiência tenham acesso a educação superior regular, treinamento vocacional e educação continuada na vida adulta, sem discriminação e com bases iguais a todos os outros. Para este fim, os Estados-partes assegurarão que adaptações adequadas sejam providenciadas para as pessoas com deficiência.”

Assim, tendo o Estado Brasileiro aderido à Convenção em comento pelo parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição Federal, essas normas passam a fazer parte do nosso ordenamento jurídico, alterando o texto constitucional e a legislação infraconstitucional no que com elas conflitarem. Mais do que isso, elas passam a balizar o agir do próprio Estado, em todas as suas esferas (executivo, judiciário e legislativo). Nesse contexto, e no que se refere à conformidade da legislação pátria sobre direitos de autor ao texto supramencionado, existe hoje um projeto de modificação da Lei 9.610/98 que altera de forma substancial algumas limitações aos direitos de autor e cria outras exceções, além de trazer para o direito de autor pátrio o instituto da licença não voluntária. Parece-nos, assim, que o legislador pátrio buscou, na nova redação da LDA, criar mecanismos que possibilitem a concretização pelos poderes do Estado dos direitos fundamentais de acesso ao conhecimento, à informação, à cultura e à educação pelos portadores de deficiência.

4.2 Projeto de reforma da Lei de Direitos Autorais

Em 2010, foi disponibilizado para consulta pública, no site do Ministério da Cultura, um projeto de reforma da Lei de Direito de Autor atual,(56) que busca conciliar interesses de autores e do público por meio da harmonização das complexidades inerentes a essa relação. As mudanças buscam atualizar a legislação de 1998, levando em consideração as mudanças tecnológicas dos últimos 12 anos, e criar condições para que a economia da cultura se torne autossustentável.(57)



No que tange ao tema proposto neste trabalho, cabe analisar as alterações feitas ao artigo 46 da lei de 1998, que regula as limitações aos direitos de autor, bem como o novo artigo 52-B, que traz para o ordenamento jurídico pátrio a figura da licença não voluntária em matéria de direito de autor.

4.2.1 Alteração do artigo 46

O artigo 46 da atual Lei dos Direitos de autor trata da questão das limitações ao direito exclusivo do autor sobre sua obra, entendendo que existem casos em que “Não constitui ofensa aos direitos autorais” (redação atual) a utilização feita delas sem prévia autorização do titular e não sendo necessária qualquer remuneração por este uso.

A proposta de alteração do caput do artigo 46 visa esclarecer, de forma mais didática, o sentido buscado pelo legislador na redação do artigo em comento. A alteração não tem o intuito de mudar ou alargar o escopo do artigo, mas tão somente de explicitar, mediante uma construção equivalente, o efetivo sentido do que seria uma ofensa ao direito do autor. A alteração do artigo 46, todavia, se faz sentir ao tratar as situações compreendidas como exceções.

Primeiramente, cabe referir que, diferentemente da redação atual, a proposta de alteração do referido artigo traz no seu parágrafo único uma cláusula geral, fundada no disposto na Convenção de Berna e na técnica legislativa contemporânea, aqui transcrito, in verbis:

“Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais a utilização de obras protegidas, dispensando-se, inclusive, a prévia e expressa autorização do titular e a necessidade de remuneração por parte de quem as utiliza, nos seguintes casos:
(...)
Parágrafo único. Além dos casos previstos expressamente neste artigo, também não constitui ofensa aos direitos autorais a reprodução, a distribuição e a comunicação ao público de obras protegidas, dispensando-se, inclusive, a prévia e expressa autorização do titular e a necessidade de remuneração por parte de quem as utiliza, quando essa utilização for:
I – para fins educacionais, didáticos, informativos, de pesquisa ou para uso como recurso criativo; e
II – feita na medida justificada para o fim a se atingir, sem prejudicar a exploração normal da obra utilizada nem causar prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.”

Dessa forma, buscou o legislador contornar o entendimento da jurisprudência nacional no sentido de que às limitações não cabem analogias, bem como evitar que usos justos, por não terem sido previstos no rol de exceções, até então taxativo, sejam penalizados.(58) Assim, permite ao Judiciário a adequação de situações fáticas análogas às situações elencadas, determinando, todavia, que o julgador, em sua interpretação, considere as finalidades implícitas nos casos descritos e siga a chamada “regra dos três passos”, já reconhecida pelo direito internacional. Cabe destacar, ainda, que essa cláusula não busca permitir uma liberação generalizada, mas apenas flexibilizar a aplicação do dispositivo a situações similares não previstas no texto ou a situações que venham a se apresentar no futuro, tendo em vista o avanço tecnológico e as diferentes necessidades sociais.

No que se refere ao tema do presente trabalho, cabe destacar alguns incisos do referido artigo que sofreram alterações importantes. É o caso do inciso II, que permite a cópia privada integral para fins de portabilidade e interoperabilidade. A nova redação permite os processos digitais de troca de formato ou suporte, o que antes era dificultado pelo limite de realização de uma única cópia. Esse dispositivo permite, assim, que um material publicado possa ser escaneado e após impresso em Braille ou em Libras ou passado ao formato digital, convertido em voz e acessado mediante softwares ledores de tela. Entretanto, esse inciso não autoriza o download e o upload de obras não autorizadas pelos autores. Ou seja, autoriza a cópia privada, mas proíbe o seu compartilhamento não autorizado por meios digitais (também conhecido como peer to peer, ou P2P). Por sua vez, o inciso VIII permite os usos transformativos de obras, sendo ampliado para compreender não apenas a reprodução, mas as novas possibilidades multimídia.

No que se refere aos deficientes físicos, especificamente, o inciso IX sofreu louvável alteração no sentido de permitir que obras sejam adaptadas ou reproduzidas segundo as necessidades individuais do portador de qualquer deficiência. Dessa forma, não mais limita o uso da exceção exclusivamente aos deficientes visuais. Todavia, determina que, para que a reprodução ou a adaptação não necessite de autorização, esta deve ser feita sem qualquer fim comercial. Acreditamos, no entanto, que essa disposição deva ser alterada no texto definitivo, por ser dissociada da realidade. A maioria das obras reproduzidas e adaptadas para deficientes físicos são hoje feitas por entidades sem fins lucrativos que sobrevivem de doações da sociedade. Esse material, para ser produzido e distribuído, envolve um custo significativo. Parece-nos que a redação do referido inciso deveria permitir o uso da exceção desde que sem fins lucrativos, ou seja, seria possível o ressarcimento do valor despendido pela Entidade, mas não o lucro. Entender de outra forma tornaria inviável a manutenção do acesso do deficiente a estas obras adaptadas.

4.2.2 A criação das licenças não voluntárias no direito pátrio

O instituto da licença não voluntária no direito de autor não é algo novo.(59) A convenção de Berna de 1886, ratificada pelo Brasil em 1922, já trazia disposições nesse sentido.

A adoção do mecanismo permite que o autor ou titular da obra seja substituído no que se refere à sua exploração quando o seu agir contrarie a função social esperada dessa forma de propriedade ou quando o interesse público assim o exigir, tornando-se uma ferramenta para a concretização dos direitos fundamentais de acesso à cultura, ao conhecimento, à educação e à informação.
Esse instituto, todavia, nunca foi descrito na legislação pátria, tendo sido aventada a possibilidade de seu acolhimento no projeto de reforma da LDA, segundo dispõe o artigo 52-B:

“Art. 52-B. O Presidente da República poderá, mediante requerimento de interessado legitimado nos termos do § 3º, conceder licença não voluntária e não exclusiva para tradução, reprodução, distribuição, edição e exposição de obras literárias, artísticas ou científicas, desde que a licença atenda necessariamente aos interesses da ciência, da cultura, da educação ou do direito fundamental de acesso à informação, nos seguintes casos:
I – Quando, já dada a obra ao conhecimento do público há mais de cinco anos, não estiver mais disponível para comercialização em quantidade suficiente para satisfazer as necessidades do público;
II – Quando os titulares, ou algum deles, de forma não razoável, recusarem ou criarem obstáculos à exploração da obra, ou ainda exercerem de forma abusiva os direitos sobre ela;
III – Quando não for possível obter a autorização para a exploração de obra que presumivelmente não tenha ingressado em domínio público, pela impossibilidade de se identificar ou localizar o seu autor ou titular; ou
IV – Quando o autor ou titular do direito de reprodução, de forma não razoável, recusar ou criar obstáculos ao licenciamento previsto no art. 88-A.”

Segundo o projeto de lei, seria permitida ao poder público, por intermédio do Presidente da República, a concessão de licenças não voluntárias para tradução, reprodução, distribuição, edição e exposição de obras literárias, artísticas ou científicas. O instituto seria aplicado nos casos em que o autor ou titular dos direitos sobre a obra criasse obstáculos injustos à sua exploração e difusão na sociedade. Dessa forma, a vontade do titular do direito seria substituída por uma autorização administrativa concedida pelo poder público, mediante a estipulação de uma retribuição arbitrada segundo os costumes e práticas de mercado.

O requerimento de licença deverá ser encaminhado ao Ministério da Cultura por pessoa (física ou jurídica) que tenha legítimo interesse na matéria e, ainda, que tenha capacidade técnica e econômica para a exploração da obra, sendo garantido ao autor ou titular do direito o contraditório e a ampla defesa durante o processo administrativo. O Ministério da Cultura, depois de ouvidas as partes, elaborará um parecer não vinculante, que será encaminhado ao Presidente da República. Após a decisão deste, caberá pedido de reconsideração. Cabe salientar aqui que, por se tratar de autorização administrativa, são as licenças não voluntárias naturalmente passíveis de revisão judicial.

Depreende-se, ainda, da leitura do projeto que esta forma de licença é sempre não exclusiva e por prazo determinado, podendo ser revogada a qualquer momento se o licenciado deixar de cumprir com os requisitos que o qualificaram para a sua requisição ou se deixar de realizar o pagamento aos titulares dos direitos. Essa licença pode ainda ser revogada se o licenciado não iniciar a exploração dentro do prazo indicado.

No que tange ao tema proposto, o inciso II deste artigo, ao dispor ser possível a concessão de licença não voluntária “Quando os titulares, ou algum deles, de forma não razoável, recusarem ou criarem obstáculos à exploração da obra, ou ainda exercerem de forma abusiva os direitos sobre ela”, abre uma nova dimensão à concretização do direito de acesso à educação, à cultura, ao conhecimento e à informação pelo deficiente físico. Entende-se que existe um enorme mercado não explorado de viabilização de obras em formatos acessíveis para diferentes formas de deficiência; que o interesse do autor reside, em primeiro lugar, em ver a sua obra conhecida e difundida, em segundo, em ser reconhecido como autor da obra e, por fim, mas não por último, em ser recompensado pelo uso de sua obra; e que há interesse público em ver os anseios dessa população atendidos. A nosso ver, a negativa pelo autor ou titular do direito em licenciar voluntariamente a adaptação de suas obras para formatos acessíveis a essa parcela da população só poderia ser entendida como obstáculo não razoável à exploração da obra ou exercício abusivo dos direitos sobre ela. Isso porque se trata de uma parcela da população que hoje não tem acesso a essas obras, não gerando qualquer receita ou reconhecimento para os seus autores ou titulares. Entendemos que qualquer manifestação de interesse em permitir essa forma de acesso só gera benefícios para todas as partes envolvidas. Nesse contexto, a negativa pelos titulares dos direitos de permitir a concretização desse acesso é entendida como enquadrada no disposto no referido inciso, sendo caso possível de concessão de licença não voluntária.

Todavia, entendemos que a redação do caput deste artigo deve ser alterada para permitir a concessão de “licença não voluntária e não exclusiva para tradução, reprodução, distribuição, edição, exposição e adaptação de obras literárias, artísticas ou científicas”. (destaque nosso). Da mesma forma, entendemos que o inciso II deste artigo deve ser alterado para tratar de obstáculos e abusos de direito criados por autores e titulares de direitos. Assim, em nossa opinião, o texto legislativo ficaria mais claro e coerente com a realidade social que busca regrar.

4.3 A proposta brasileira, equatoriana e paraguaia levada à OMPI

Em maio de 2009, a Missão permanente do Brasil para a OMC, a Missão permanente do Equador para o gabinete das Nações Unidas em Genebra e a Missão permanente do Paraguai para as Nações Unidas levaram ao conhecimento do Escritório Internacional da OMPI o texto de um tratado proposto pela União Mundial de cegos sobre exceções e limites aos direitos de autor, para ser discutido na décima oitava sessão do Comitê permanente sobre direitos autorais e conexos.(60) Esse documento consiste em uma proposta de significados e maneiras possíveis de facilitar e promover o acesso a obras protegidas por pessoas cegas, deficientes visuais ou com outras deficiências que impedem a leitura convencional.

'
Dispõe esse Tratado, no que se refere ao tema deste trabalho:

Article 4.  Limitations and exceptions to exclusive rights under Copyright
(a) It shall be permitted without the authorisation of the owner of copyright to make an accessible format of a work, supply that accessible format, or copies of that format, to a visually impaired person by any means, including by non-commercial lending or by electronic communication by wire or wireless means, and undertake any intermediate steps to achieve these objectives, when all of the following conditions are met:
1. the person or organisation wishing to undertake any activity under this provision has lawful access to that work or a copy of that work;
2. the work is converted to an accessible format, which may include any means needed to navigate information in the accessible format, but does not introduce changes other than those needed to make the work accessible to a visually impaired person;
3. copies of the work are supplied exclusively to be used by visually impaired persons; and
4. the activity is undertaken on a non-profit basis.
(…)
(c) The rights under paragraph (a) shall also be available to for profit-entities and shall be extended to permit commercial rental of copies in an accessible format, if any of the following conditions are met:
1. the activity is undertaken on a for‑profit basis, but only to the extent that those uses fall within the normal exceptions and limitations to exclusive rights that are permitted without remuneration to the owners of copyright;
2. the activity is undertaken by a for-profit entity on a non-profit basis, only to extend access to works to the visually impaired on an equal basis with others; or
3. the work or copy of the work that is to be made into an accessible format is not reasonably available in an identical or largely equivalent format enabling access for the visually impaired, and the entity providing this accessible format gives notice to the owner of copyright of such use and adequate remuneration to copyright owners is available.
(d) In determining if a work is reasonably available in (c)(3), the following shall be considered:
(…)
2. for developing countries, the work must be accessible and available at prices that are affordable, taking into account disparities of incomes for persons who are visually impaired.” (destaque nosso)

Da leitura dos dispositivos colacionados, constata-se novamente a preocupação do Estado brasileiro, em suas relações internacionais, de promover a inclusão social dos deficientes físicos. Para isso, mais uma vez opta por criar exceções e limitações aos direitos de autores, sopesando interesses privados e públicos a fim de alcançar a função social dos direitos envolvidos.

Esse texto, todavia, permite que obras protegidas sejam adaptadas para formatos acessíveis, que esses formatos sejam supridos ou que cópias desse formato sejam realizadas por entidades com fins lucrativos, uma vez que o trabalho que se tornará acessível não está razoavelmente disponível (isto é, colocado no mercado em valores adequados e condizentes com a renda de uma pessoa deficiente) em um formato idêntico ou mais amplo que permita o acesso pelo deficiente físico ao seu conteúdo. Para isso, exige apenas que a entidade que irá tornar o material acessível notifique o titular do direito da utilização e da remuneração adequada disponível. Cria, dessa forma, uma alternativa jurídica muito mais ampla e permissiva do que o disposto no Tratado Sobre Deficientes Físicos da ONU e nas alterações propostas para a nova Lei de Direito de Autor nacional, instituindo uma forma de licença não voluntária independente de autorização ou concessão do poder público. Essa disposição, entretanto, nos parece exagerada. Tendo-se em vista os direitos envolvidos, bem como o interesse público presente, entendemos que a licença não voluntária concedida pelo poder público disposta no projeto de lei para alterar a LDA atual é a escolha mais acertada.

Considerações finais

Ao cabo, após a analise da legislação de regência, é de se concluir que inexiste conceito de propriedade intelectual absoluta.

Isso a partir de uma postura hermenêutica que busca desvelar o texto constitucional para que todos os direitos fundamentais sejam efetivamente concretizados.

O direito à propriedade intelectual é direito fundamental de primeira dimensão, protegido e garantido pelo texto constitucional, e, a partir da Emenda 45, seu art. 5º, § 3º, permite concluir que os tratados internacionais internalizados com quorum privilegiado colocam-se no patamar do próprio texto constitucional, devendo a legislação infraconstitucional a eles se adequarem, sob pena de mácula de inconstitucionalidade.

Quanto ao tema específico, tem-se, em linha de pensamento, que, a par da necessidade de se priorizar o interesse público acima dos interesses privados, não se pode olvidar que o direito do autor é direito fundamental individual e o direito à educação, à cultura e à informação é direito fundamental de segunda dimensão, direito social, e que todos devem conformar-se como o fundamento maior do bem-estar social, preâmbulo da constituição, espinha dorsal de um estado democrático de direito.

Conclui-se, também, que o direito fundamental individual à propriedade está limitado pelo interesse público que matiza os direitos sociais, porque neles repousa um maior percentual de interesse público.

Assim, se, de um lado, o autor tem direito sobre sua obra, de outro, essa tem de ser acessada por todos os cidadãos, de forma a suprir-lhes a própria deficiência. Daí que a acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência de forma explícita na legislação e nos tratados internacionais é forma de inclusão social, garantia de concretização de seu direito fundamental à educação, à informação e à cultura. Por isso, é dever do Estado limitar o direito de autor, propiciando o meio capaz de manter a igualdade dos cidadãos.


Notas

1. Sobre a passagem do homem do estado de natureza ao estado civil, afirma Rousseau: “Esta passagem do estado de natureza ao estado civil produz no homem uma mudança notabilíssima, substituindo em sua conduta o instinto pela justiça, e dando às suas ações a moralidade de que não dispunha anteriormente. É só então que, a voz do dever sucedendo ao impulso físico e o direito ao apetite, o homem, que até então apenas havia olhado para si mesmo, é forçado a agir tomando como base outros princípios e consultando sua razão antes de ser influenciado por suas tendências. Embora neste estado se prive de muitas das vantagens que frui da natureza, ganha outras de mesmo porte, suas faculdades se exercitam e se desenvolvem, suas ideias ganham amplitude, seus sentimentos se enobrecem, sua alma inteira se eleva a tal ponto que, se os abusos dessa nova condição não o degradassem frequentemente abaixo daquela de onde saiu, deveria bendizer incessantemente o instante feliz que o arrancou dela para sempre e que, de um animal estúpido e limitado, fez um ser inteligente e um homem”. (ROSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social. São Paulo: Hemus, p. 31)

2. Conferir em ROUSSEAU, Jean Jacques. Op. cit. p. 104.

3. Segundo Rousseau, “A primeira e a mais importante consequência dos princípios anteriormente estabelecidos é que a vontade geral apenas pode dirigir as forças do Estado segundo o fim de sua instituição, que é o bem comum, pois se a oposição dos interesses particulares tornou necessário o estabelecimento das sociedades, foi o acordo desses mesmos interesses que o tornou possível. É o que há de comum nos diferentes interesses que formam o vínculo social, e se não houvesse algum ponto no qual todos os interesses concordassem, nenhuma sociedade poderia existir. Ora, é unicamente segundo este interesse comum que a sociedade deve ser governada”. (Op. cit., p. 37)

4. Assim conclui este autor: “Terminarei este capítulo e este primeiro livro por uma nota que deve servir de base a todo sistema social; é que, em lugar de destruir a igualdade social, o pacto fundamental substitui, ao contrário, uma igualdade moral e legítima naquilo que a natureza poderia trazer de desigualdade física entre os homens, e que, podendo ser desiguais na força ou capacidade, tornam-se todos iguais por convenção e direito”. (Op. cit., p. 34)

5. A respeito do contrato social, diz Michel Serres: “Os filósofos do direito natural moderno associam por vezes a nossa origem a um contrato social que, pelo menos virtualmente, teríamos estabelecido entre nós para entrarmos no coletivo que fez de nós os homens que somos. Estranhamente mudo sobre o mundo, esse contrato, dizem, nos fez deixar o Estado de natureza para formar a sociedade. A partir do pacto, tudo se passa como se o grupo que o assinou, ao despedir-se do mundo, não mais se enraizasse senão em sua história.”(SERRES, Michel. O contrato natural. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. p. 47)

6. Conforme Michel Serres, “Se existe um direito e uma história para as guerras subjetivas, não existe nenhum para a violência objetiva, sem limite nem regra, portanto, sem história. O aumento dos nossos meios racionais nos leva, numa velocidade difícil de calcular, em direção à destruição do mundo que, por um efeito de retorno bastante recente, pode condenar-nos todos juntos, e não mais por localidades, à extinção automática. Repentinamente voltamos aos tempos mais antigos, de que apenas os filósofos teóricos do direito guardaram a memória – em suas concepções e através delas – o momento em que nossas culturas, salvas por um contrato, inventaram a nossa história, definida pelo esquecimento do estado que a precedeu. Nas condições muito diferentes deste estado anterior, mas a elas paralelas, é preciso que, novamente, sob a ameaça da morte coletiva, inventemos um direito para a violência objetiva, exatamente como ancestrais impossíveis de imaginar inventaram o direito mais antigo que, através do contrato, levou sua violência subjetiva a tornar-se o que chamamos de guerras. Um novo pacto, um novo acordo prévio, que devemos fazer com o inimigo objetivo do mundo humano: o mundo tal como está. Guerras de todos contra tudo.” Mais adiante, afirma: “É mais do que isto: trata-se da necessidade de rever e, até mesmo, de renunciar ao contrato social primitivo. Este nos reuniu, para o melhor e para o pior, segundo a primeira diagonal, sem mundo; agora que sabemos nos associar diante do perigo, é preciso prever, ao longo da outra diagonal, um novo pacto a assinar com o mundo: o contrato natural. Cruzam-se assim os dois contratos fundamentais.” (Op cit., p. 24 e 25) (destaquei)

7. SERRES, Michel. O contrato natural. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. p. 15.

8. Idem, ibidem.

9. Ainda no tocante ao contrato social, observa Michel Serres: “Tão miticamente quanto o pensávamos, o contrato social marca o início das sociedades. Em função destas ou daquelas necessidades, alguns homens decidem, certo dia, viver em conjunto e se associam; desde então não sabemos mais passar uns sem os outros. Quando, como e por que esse contrato foi – ou não – assinado, não sabemos e, sem dúvida, nunca saberemos. Não importa.” (Op. cit., p. 57)

10. Sobre o contrato científico, afirma este autor: “O contrato de verdade científica sintetiza um contrato social, exclusivamente intersubjetivo, de constante supervisão recíproca e de acordo em tempo real a respeito do que convém dizer e fazer, e um contrato realmente jurídico de definição de certos objetos, de delimitação das competências, de procedimentos de experiências e de atribuição analítica de propriedades. Pouco a pouco as coisas deixam a rede das nossas relações para adquirir uma certa independência; a verdade exige que falemos delas como se não estivéssemos ali. Uma ciência, desde o seu nascimento, associa indissociavelmente o coletivo e o mundo, o acordo e o objeto do acordo.” (Op. cit., p. 58)

11. SERRES, Michel. Op. cit., p. 51.

12. Idem, p. 59.

13. CARVALHO, Francisco Pereira de Bulhões. Interpretação da lei e arbítrio judicial (direito romano e atual). In: SANTOS, J. M. de Carvalho (org.). Repertório enciclopédico do direito brasileiro. Rio de Janeiro: Borsoi, 1947. v. 28, p. 54.

14. Segundo Lenio Streck, “compreendendo que interpretar é compreender e que somente pela compreensão é que é possível interpretar, não se pode falar na existência de uma hermenêutica constitucional stricto sensu, isto é, como uma disciplina autônoma. Admitir a existência de uma hermenêutica constitucional específica seria admitir, também, a existência de uma hermenêutica do direito penal, do direito processual, etc. O processo de interpretação da Constituição tem, sim, uma série de especificidades e peculiaridades, uma vez que a Constituição – entendida como espaço garantidor das relações democráticas entre o Estado e a Sociedade e como o espaço de mediação ético-política da sociedade – é o topos hermenêutico conformador de todo o processo interpretativo do restante do sistema jurídico. A especificidade de uma hermenêutica constitucional está contida tão somente no fato de que o texto constitucional (compreendendo nele as regras e os princípios) deve se autossustentar, enquanto os demais textos normativos, de cunho infraconstitucional, devem ser interpretados em conformidade com aquele. Como bem diz Ivo Dantas, a interpretação constitucional há de ser feita levando-se em conta o sentido exposto nos princípios fundamentais consagrados na Lei Maior. Acrescente-se, ainda, o dizer de Baracho, para quem ‘a interpretação constitucional tem princípios próprios do Direito Constitucional, entretanto não abandonando os fundamentos da interpretação da lei, utilizados pela Teoria Geral do Direito, pelos magistrados ou pela administração’.” (STRECK, Lenio. Hermenêutica jurídica e(m) crise. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 238) (destaque no original)

15. FERRARA, Francesco. Interpretação e aplicação das leis. São Paulo: Saraiva & Cia., 1934. p. 1.

16. Sobre a questão, assim se manifesta Konrad Hesse: “A doutrina da interpretação tradicional procura, em geral, averiguar a vontade (objetiva) da norma ou a vontade (subjetiva) do legislador ao ter em conta o texto, o trabalho preparatório, a conexão sistemática da norma, a história da regulação e o sentido e a finalidade, o ‘telos’, a ‘ratio’ da norma. Ao conteúdo da norma, comprovado, deste modo, sem atenção ao problema concreto colocado para a decisão, deve então ser subsumido o fato da vida a ser regulado no caminho de conclusão silogística e, deste modo, deve ser encontrada a decisão. Segundo a pretensão, existe interpretação –  também interpretação constitucional –, portanto, fundamentalmente na mera assimilação de uma vontade (objetiva ou subjetiva) preexistente que, por meio daqueles métodos, independentemente do problema a ser resolvido, pode ser averiguada com certeza objetiva.” (HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1998. p. 56)

17. Tal expressão foi utilizada por Peter Häberle em sua tese (HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional. A sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e procedimental da Constituição. Porto Alegre: Fabris, 1997. p. 13).

18. HÄBERLE, Peter. Op. cit., p. 12. (destaquei)

19. Idem, p. 13 e 14. (destaquei)

20. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 4.

21. DINIZ, Márcio Augusto Vasconcelos. Constituição e hermenêutica constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 1998. p. 269.

22. Idem, p. 268.

23. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 545. (destaquei)

24. Segundo Juarez Freitas, “toda a perquirição empreendida parece revelar a necessidade de se robustecer uma formação consciente e séria do intérprete jurídico para a suma tarefa ético-jurídica que consiste em, diante das antinomias, alcançar o melhor e o mais fecundo desempenho da interpretação sistemática em todos os ramos, com o escopo de fazer promissora a perspectiva de um Direito que se confirme dotado de efetiva coerência e de abertura. Em derradeiro, um Direito visto, ensinado e aplicado como o lídimo sistema normativo do Estado Democrático.” (Op. cit., p. 205) (destaque no original)

25. Nas palavras de Eros Grau, “porque a interpretação do direito consiste em concretar a leiem cada caso, isto é, na sua aplicação (Gadamer, 1991, p. 401), o intérprete, ao interpretar a lei, desde um caso concreto, a aplica. Interpretação eaplicação não se realizam automaticamente. O intérprete discerne o sentido do texto a partir e em virtude de um determinado caso dado (Gadamer, 1991, p. 397). Assim, existe uma equação entre interpretação e aplicação: não estamos, aqui, diante de dois momentos distintos, porém frente a uma só operação (Mari, 1991, p. 236). Interpretação e aplicação se superpõem.”(Op. cit., p. 154) (destaque no original)

26. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

27. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 57.

28. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Malheiros. p. 32.

29. Idem, p. 73.

30. BARROSO, Luis Roberto. Interesses públicos X interesses privados: desconstruindo o princípio do interesse público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005. Prefácio.

31. JUSTEN FILHO, Marçal. Conceito de interesse público e a “personalização” do Direito Administrativo. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, Malheiros, n. 26, p. 115-119.

32. ÁVILA, Humberto. Repensando o “princípio da supremacia do interesse público sobre o particular”. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 11, set./out./nov. 2007, p. 13. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/ rere.asp>. Acesso em: 02 dez. 2010.

33. BINENBOJM, Gustavo. Da supremacia do interesse público ao dever de proporcionalidade: um novo paradigma para o Direito Administrativo. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em: 30 nov. 2010.

34. BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. A noção jurídica de interesse público no direito administrativo brasileiro. In: Direito administrativo e interesse público. Estudos em homenagem ao professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 94 e 112.

35. BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. D.O.U. 24.02.1891. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao91.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

36. BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. D.O.U. 16.07.1934. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao34.htm>.
Acesso em: 01 dez. 2010.

37. BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil. D.O.U. 10.11.1937. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil/Constituicao/Constitui%C3%A7ao37.htm>.
Acesso em: 01 dez. 2010.

38. BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil. D.O.U. 19.09.1946. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao46.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

39. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. D.O.U. 20.10.1967. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

40. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. D.O.U. 05.10.1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

41. BASSO, Maristela. O Direito Internacional da propriedade intelectual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 196.

42. BRASIL. Lei de 11 de Agosto de 1827. Publicada em 21.08.1827. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_63/Lei_1827.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010. Segundo o disposto no artigo 7 desse texto legal, “Os Lentes farão a escolha dos compêndios da sua profissão, ou os arranjarão, não existindo já feitos, contanto que as doutrinas estejam de acordo com o sistema jurado pela nação. Estes compêndios, depois de aprovados pela Congregação, servirão interinamente; submetendo-se porém à aprovação da Assembleia Geral, e o Governo os fará imprimir e fornecer às escolas, competindo aos seus autores o privilegio exclusivo da obra, por dez anos.”

43. BRASIL. Código Criminal do Império do Brasil. CLBR de 1830. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

44. Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Revisão de Paris, de 1971). Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/site/wp-content/uploads/2008/02/cv_berna.pdf>. Acesso em: 03 dez. 2010.

45. BRASIL. Lei 5.988, de 1973. D.O.U. 18.12.1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L5988.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

46. BRASIL. Lei 9.609, de 1998. D.O.U. 20.02.1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/Leis/L9609.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

47. BRASIL. Lei 9.610, de 1998. D.O.U. 20.02.1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9610.htm>. Acesso em: 01 dez. 2010.

48. Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Revisão de Paris, de 1971).

49. Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio – ADPIC. 1994. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/site/wp-content/uploads/2008/02/ac_trips.pdf>. Acesso em: 01 dez. 2010.

50. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito autoral. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 256-257.      

51. BITTAR, Carlos Alberto. Contornos atuais do direito do autor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992. p. 121-122.

52. Nesse sentido, Flavia Piovesan diz: “A Constituição de 1988 recepciona os direitos enunciados em tratados internacionais de que o Brasil é parte, conferindo-lhes natureza de norma constitucional. Isto é, os direitos constantes nos tratados internacionais integram e complementam o catálogo de direitos constitucionalmente previstos, o que justifica estender a esses direitos o regime constitucional conferido aos demais direitos e garantias fundamentais. Tal interpretação é consonante com o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, pelo qual, no dizer de Jorge Miranda, a uma norma fundamental tem de ser atribuído o sentido que mais eficácia lhe dê”. (PIOVESAN, Flávia. A Constituição brasileira de 1988 e os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos. In: Temas de Direitos Humanos. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2003. p. 58)

53. Colacionam-se, aqui, os ensinamentos de Ana Cristina Brenner: “se o próprio legislador erigiu como mandamento constitucional a recepção dos tratados por meio dos decretos legislativos, na dicção do que reza o artigo 49, I, c/c o artigo 84, VIII, seria inconstitucionalidade sustentar a incorporação automática na ordem jurídica, dispensando-se, por via de consequência, a edição do decreto pelo executivo para que irradiem efeitos tanto no plano interno como no plano internacional”. (BRENNER, Ana Cristina. Emenda Constitucional n° 45/04 e a posição hierárquica das normas internacionais sobre direitos humanos na ordem jurídica interna. Disponível em: <www.tex.pro.br>. Acesso em: 03 dez. 2010)

54. Nesse sentido, ver SEBBEN, Juliano Lago. Tratados internacionais sobre Direitos Humanos e sua hierarquia normativa no sistema constitucional brasileiro. Portal Jurídico Investidura, Florianópolis/SC, 20 fev. 2010. Disponível em: <www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-constitucional/130489>. Acesso em: 07 dez. 2010.

55. BRASIL. Decreto nº 6.949, de 2009. D.O.U. 26.08.2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acesso em: 15 nov. 2010.

56. Consulta Pública para Modernização da Lei de Direito Autoral. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/consultadireitoautoral/>. Acesso em: 12 nov. 2010.

57. Segundo Juca Ferreira, Ministro da Cultura, em entrevista dada ao jornal O Globo em 09.09.2010, busca-se enfatizar o crescimento e a valorização da economia da cultura em todo o mundo. De acordo com ele, “Nos Estados Unidos, é a segunda indústria mais forte. É a terceira na Inglaterra. É uma indústria pouco poluente, de grande capacidade de empregabilidade, democrática e que cresce a todo momento. O potencial criativo do Brasil é enorme, mas a cultura nunca foi tratada no país como economia formal.”

58. Atualmente, por exemplo, a lei só prevê limitações para execução de músicas em sala de aula, mas não prevê a exibição de filmes na mesma situação; ou seja, o que vale para um contexto não pode ser aplicado em outro. O mesmo ocorre com a reprodução de obras para facilitar o acesso de pessoas com deficiência auditiva, visto que a lei só fala de deficiência visual.

59. Dentre os vários países que adotam algum tipo de licença não voluntária estão, por exemplo, Japão, Portugal, Espanha, França, México, Argentina, Índia, Noruega, Nigéria, República Tcheca, República Dominicana, dentre muitos outros, tanto desenvolvidos quanto em vias de desenvolvimento, com poucas diferenças em relação ao escopo e à abrangência do referido instituto, ou à autoridade que a expede. Nesse sentido, ver GARNETT, Nick. Automated rights management systems and copyright limitations and exceptions. Standing Committee on Copyright and Related Rights, Organização Internacional da Propriedade Intelectual, maio de 2006, Genebra. Disponível em: <http://www.wipo.int/meetings/en/doc_details.jsp?doc_id=59952>. Acesso em: 12 nov. 2010.

60. Proposal by Brazil, Ecuador and Paraguay, relating to limitations and exceptions: Treaty Proposed by the World Blind Union (Wbu). Standing Committee on Copyright and Related Rights, Organização Internacional da Propriedade Intelectual, maio de 2009, Genebra. Disponível em: <http://www.wipo.int/meetings/en/doc_details.jsp?doc_id=122732>. Acesso em: 11 nov. 2010.

 

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., abr. 2013. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS