Aspectos comuns entre o crime praticado por Milícias no Brasil e o tipo Mafioso na Itália

Autora: Salise Monteiro Sanchotene

Juíza Federal, Especialista em Direito Penal e Processo Penal pela UnB, Doutoranda em Direito Penal pela Universidad Autónoma de Madrid.

 publicado em 30.04.2013


Resumo

Este trabalho tem por escopo realizar um exame comparativo entre os fenômenos da Máfia e da Milícia, quanto aos seus contextos históricos e sociais, na Itália e no Brasil, respectivamente, para, na sequência, analisar o crime de tipo mafioso e a proposta de criminalização da milícia no Brasil. Busca-se, com o estudo, a identificação dos pontos convergentes de uma e outra realidade social, que podem ser utilizados para a construção, de lege ferenda, do crime praticado por milícias.

Sumário: Introdução. 1 Método mafioso. 2 Estrutura do tipo mafioso. 2.1 Evolução legislativa. 2.2 Individualização da conduta coletiva. 3 Milícias. 3.1 Compreensão do fenômeno social. 3.2 Conceito de Milícias. 4 Estrutura do tipo de Milícias no anteprojeto do Código Penal. 4.1 Domínio ilegítimo do território ou sobre os atos da comunidade ou moradores. 4.2 Uso de violência ou grave ameaça. 4.3 Exigência de entrega de bem móvel ou imóvel, a qualquer título, ou de valor monetário periódico ou constrangimento da liberdade do voto. 4.4 Prestação de serviço de segurança privada, transporte alternativo, fornecimento de água, energia elétrica, venda de gás liquefeito de petróleo, ou qualquer outro serviço ou atividade não instituída ou autorizada pelo Poder Público. 4.5 Participação de servidor público. 5 Similitudes entre o crime de tipo mafioso e o crime praticado por milícia. Conclusão.

Palavras-Chave: Direito Penal. Crime de tipo mafioso. Crime de Milícia. Aspectos comuns.

Introdução

Observando-se o crescente fenômeno das milícias no Brasil, o que tem sido objeto, inclusive, de enfrentamento jurisprudencial nos Tribunais Superiores, percebe-se a necessidade de um conhecimento mais aprofundado sobre o funcionamento de tais grupos criminosos organizados, tanto nos aspectos social e econômico, quanto do ponto de vista criminal. As leis existentes não se têm revelado suficientes para reprimir a ação da moderna criminalidade organizada e, em especial, a violenta forma de atuação dos grupos milicianos. Assim, tentar-se-á, ao longo do trabalho, identificar se existem características comuns entre a associação de tipo mafioso, na Itália, e os crimes praticados pelos grupos milicianos no Brasil, na busca de subsídios para a construção de um eventual crime de milícia.

Para tanto, após identificar-se o modus operandi da Máfia e o da Milícia, examinar-se-á a lei penal italiana no que tange aos núcleos utilizados para criminalizar a associação mafiosa e, a partir de então, se passará à análise do texto constante do anteprojeto de Código Penal, que está sob debate no Senado.

1 Método mafioso

A Itália sofreu com os grupos organizados do tipo mafioso – entendidos como aqueles que atuavam à semelhança de uma empresa –, os quais foram aperfeiçoando sua forma de atuação através dos tempos *, sempre objetivando o lucro fácil e a redução de custos.(1) Tais organizações, por seu modo de atuação, geraram o desgaste político das instituições públicas e seu consequente descrédito perante os cidadãos. Na década de 60, a máfia passou a utilizar em larga escala sequestros de pessoas para extorquir dinheiro.

A máfia italiana é considerada um fenômeno delinquencial(2) que opera por meio de organizações ilegais denominadas Racket, as quais, mediante violência e extorsão, impõem a própria proteção a determinados setores da atividade comercial, exigindo compensações financeiras e exercendo o controle das próprias atividades, como revela Forgione.(3)

Historicamente, as organizações mafiosas se consolidaram como estruturas econômicas e de poder que se alimentam da perpetuação da forma de obtenção de renda de modo parasitário, já que instauram um sistema extrainstitucional de controle social, com tendência a sobrepor-se, de fato, à autoridade legal.(4) É interessante observar que, na prática, essa “máfia parasitária” nunca cobra a extorsão de modo a levar o comerciante à ruína, pois a regra é cobrar pouco, mas sempre.

Tais organizações mafiosas costumam cobrar o pizzo, expressão que pode ser traduzida como a quantia de dinheiro mensalmente exigida dos comerciantes em troca de proteção, sempre mediante chantagem e violência, condicionando o modo de agir da sociedade local.(5) Para manter tal domínio, as organizações mafiosas utilizam expedientes tais como a eliminação física do adversário, a acumulação de riqueza de forma violenta e a prática de diversas condutas punidas penalmente.(6)

O resultado da extorsão praticada pela máfia, no que se refere ao comércio existente, é o desaparecimento do mercado ou a realocação a outros distritos de produção, de tal forma que as empresas que sobrevivem apesar da máfia revelam três tipos de comportamento: aquiescência, resistência ou conivência.(7) Essa última conduta dá-se, normalmente, pela lavagem de dinheiro.

O modelo de associação mafiosa possui uma estrutura piramidal, com poucas pessoas na cúpula exercendo o poder decisório e diversos escalões com mais pessoas encarregadas da execução de tarefas.(8)

A estrutura de uma organização mafiosa tem como característica vital a existência de vínculo identitário(9) e de pertencimento de seus membros,(10) unidos que são pela fidelidade a um código de honra.

Há, na doutrina, quem consiga listar alguns elementos estruturais no crime com “selo” da máfia: dificuldades de acesso ao poder, em razão da desigualdade na distribuição da riqueza, o que enseja a tentativa de ganhar a vida por meio do crime; ausência do poder e da lei; possibilidade de construção de um poder paralelo; deslegitimação do poder da lei e do Estado como organização normativa e coercitiva; existência de alguns elementos de organização; os procedimentos podem ser sangrentos; existência de alianças ou confrontações com grupos similares; uso do poder que outros exercem; manutenção do grupo com base na estrutura corrupta; às vezes, as características ou condições do Estado em que estão possuem papel facilitador; há participação das vítimas; vinculam-se ao mundo dos negócios; possuem ramificação internacional.(11)

2 Estrutura do tipo mafioso

2.1 Evolução legislativa

O Código Penal italiano de 1930 não possuía artigo dedicado à máfia.

É imperioso consignar que, até chegar à tipificação penal dos crimes praticados por grupos mafiosos, a Itália percorreu um longo caminho de debates internos no parlamento. Anteriormente, o criminoso era condenado somente pelos crimes em espécie que praticasse, ou então por atuar em quadrilha, mas jamais por pertencer a uma organização criminosa de tipo mafioso.

Assim, em 1962, foi instituída a Comissão Parlamentar de pesquisa sobre a máfia na Sicília, que permitiu um conhecimento aprofundado do fenômeno mafioso, criando a premissa para uma adequada resposta institucional ao problema. O resultado desse trabalho foi a elaboração da primeira lei antimáfia da Itália, a Lei n° 575, de 31 de maio de 1965, denominada “Disposições contra a máfia”. Esse texto, em que pese modesto, teve grande importância porque constituiu a base em torno da qual a jurisprudência passou a construir os elementos que dariam suporte à definição jurídica da associação mafiosa pelo legislador de 1982.(12)

O ordenamento penal italiano conceituou, inicialmente, duas formas de associações criminosas. A primeira, que pode ser chamada de comum, é representada por quadrilha ou bando, não tem característica de permanência(13) e existia no ordenamento italiano desde 1810. Por conseguinte, a aplicação desse conceito era insuficiente para caracterizar as associações mafiosas, que possuíam características muito peculiares.(14) Já a segunda é a que se conhece por modelo mafioso, que tem como marcas a estabilidade e o modo de atuação empresarial.(15)

Nessa senda evolutiva, inseriu-se no Código Penal italiano, por meio da Lei n° 646, de 13 de setembro de 1982,(16) no artigo 416-bis, pela primeira vez, o conceito de crime de associação de tipo mafioso, sancionando, assim, uma conduta de extrema complexidade, caracterizada pela potencialidade de intimidação em razão da dupla condição de sujeição e silêncio que decorre de tal força intimidadora.

Note-se que as expressões “Máfia” e “mafioso”, com a redação legal do artigo 416-bis do Código Penal, deixaram de ter a conotação meramente sociológica de então e ganharam significado jurídico-penal independente e autônomo de outras possíveis acepções.(17) Pode-se afirmar, assim, que o artigo 416-bis do Código Penal Italiano partiu de um conceito metajurídico (o conceito de máfia) para construir uma categoria jurídica (a associação de tipo mafioso) que constitui figura especial de associação criminosa.

Interessante consignar que, com a morte do juiz Rosário Livatino e a pressão de juízes da Sicília, surgiu o Dec. Lei nº 152/1991, convertido, posteriormente, na Lei nº 203/1991, que criou uma causa de aumento de pena para quem facilita a associação de tipo mafioso ou se vale da condição intimidativa dessa (artigo 7).(18)

A última modificação ocorrida no artigo 416 do Código Penal Italiano deu-se no ano de 1992, por meio do Decreto-Lei nº 306, de 08 de junho daquele ano, com a introdução do terceiro parágrafo do dispositivo aludido, prevendo a finalidade de condicionamento ao livre exercício do voto por ocasião do pleito eleitoral.(19) Cria-se, então, o art. 416-ter do Código Penal Italiano, para a infiltração mafiosa no tecido político-administrativo.

2.2 Individualização da conduta coletiva

São três os elementos, portanto, que caracterizam a associação mafiosa, por se constituírem em instrumento da manutenção do programa criminoso típico dessa forma de criminalidade organizada: força de intimidação, condição de sujeição e condição de silêncio.(20) A interpretação literal do artigo 416-bis do Código Penal Italiano permite punir alguém pela simples constatação do vínculo com a associação mafiosa.

A dificuldade na coleta da prova fez com que a jurisprudência desenvolvesse algumas técnicas ao longo dos anos. Assim, por exemplo, decidiu-se que a vontade de aderir a um programa criminoso decorre automaticamente do fato de o indivíduo participar de um grupo mafioso. Para essa linha de construção jurisprudencial, há como que uma sobreposição entre associação mafiosa e associação para a prática de crimes, a ser analisada sob o prisma criminológico. Contudo, do ponto de vista jurídico-penal, essa técnica não resolve integralmente, pois, para lograr-se a condenação, deve ser provada a participação individual no programa criminoso da organização.(21)

O crime de associação de tipo mafioso pode ser analisado, metodologicamente, sob dois aspectos: sob o ponto de vista da estrutura, a norma descreve o método utilizado e a modalidade comportamental; sob o aspecto da finalidade perseguida, o tipo penal descreve o recurso à força de intimidação do vínculo associativo – que ocorre mediante a sujeição, ou constrição, e a imposição de silêncio (denominada omertà). Assim, o uso da força de intimidação não constitui uma modalidade de realização da conduta típica, mas sim um elemento instrumental típico do qual o associado se vale em razão da realização do próprio escopo da associação – o que a doutrina denomina “instrumento de trabalho” da associação.(22)  Nesse sentido, a jurisprudência italiana assentou que a violência ou ameaça, instrumentos da força de intimidação da associação mafiosa, são acessórios eventuais, latentes, da organização, podendo derivar da simples existência e notoriedade do vínculo associativo. Isso porque a condição de sujeição e a imposição de silêncio à sociedade e aos membros da associação mafiosa constituem a consequência do prestígio criminal da associação, que, em razão da sua fama(23) negativa e pela capacidade de enviar advertências, ainda que simbólicas, é vista como um autoritário centro de poder.(24)

Como se percebe, o método de intimidação, requisito estrutural do tipo mafioso, deve ser deduzido da capacidade constante e atual de incutir temor, própria da associação mafiosa, que, mesmo quando age com aparente licitude, incute medo na população, após ter adquirido fama de violência, a ponto de caracterizar uma organização de tipo mafiosa.(25) O legislador italiano optou, assim, por não descrever a singular conduta do membro da associação mafiosa, mas sim por delinear a conduta da associação mafiosa em um aspecto dinâmico.

O bem jurídico tutelado pela norma do artigo 416-bis do CP italiano é pluriofensivo, pois a conduta ilícita da associação mafiosa vem diversamente relacionada a um amplo contexto de liberdades pública e privada: da iniciativa econômica à concorrência de mercado e à ordem econômica; do direito político à legalidade democrática; e até a própria liberdade moral individual. A norma incrimina, pois, um genérico programa criminoso, do qual não se requer a concretização de ato penalmente relevante, uma vez que a relativa ofensa consiste na própria capacidade do grupo criminoso de colocar em perigo o livre arbítrio individual ou coletivo, sintetizado na noção de “ordem pública”.(26)

Assim, de acordo com Turone,(27) uma vez comprovada a existência de uma associação mafiosa, essa deve ser, necessariamente, considerada uma associação criminosa, porquanto reúne os elementos essenciais ao tipo penal.

Examinando-se o tipo penal sob o aspecto da finalidade típica da associação do tipo mafioso, pode-se desmembrá-lo em três classes distintas: cometimento de crimes; aquisição da gestão ou do controle da atividade econômica, operada, também, por meio do condicionamento do ato administrativo; obtenção de lucro ou vantagem injusta.

Embora o perfil da conduta ilícita previsto no artigo 416-bis do CP italiano inicie com a previsão de várias condutas individuais (participação de ao menos três pessoas na associação, condutas de promoção, direção ou organização) – todas de natureza diretiva e que justificam a incriminação de condutas mais graves de participação –, a principal inovação da norma reside na tipificação da conduta coletiva atribuída à associação de tipo mafioso, que permite dividir a norma sob duas estruturas: a utilização de um determinado modus operandi (o denominado método mafioso) para cumprir uma série de propósitos (o chamado programa da associação). O dolo individual de quem promove, dirige ou organiza uma associação de tipo mafioso deve estar voltado para a vontade de contribuir individualmente à realização comum tanto do método mafioso no momento do programa da associação mafiosa.(28) Desse modo, o partícipe deve saber que contribui com sua conduta individual para a consecução do método mafioso, voltado ao cumprimento do programa associativo.

3 Milícias

3. 1 Compreensão do fenômeno social

O estudo da criminalidade moderna, no Brasil, revelou nos últimos anos o surgimento de uma nova estrutura de crime organizado, constituído pelas denominadas milícias privadas. Tais grupos, que compõem a realidade sociológica brasileira, possuem caráter paraestatal e paramilitar, atuam de modo violento e armado, sendo que seus membros são, via de regra, oriundos das forças policiais ou de grupos de extermínio.(29)

Assim, a fim de poder entender o que são as milícias e que risco tais organizações representam para a segurança pública, socorremo-nos de estudo sociológico pontual que se dedicou a investigar a questão, tendo por base a realização de entrevistas com moradores de áreas dominadas por milícias, com líderes comunitários e com um integrante da milícia de uma comunidade do Rio de Janeiro,(30) bem como o exame de matérias jornalísticas dos principais jornais da cidade, além de consulta aos dados do Disque-Denúncia.(31)

De acordo com esse estudo realizado por Cano, o tema “milícias” surgiu nos jornais do Rio de Janeiro no ano de 2006. Os poucos estudos publicados sobre o tema podem ser justificados diante das dificuldades de entendimento a respeito dele, que são de diversas ordens, podendo-se mencionar a pouca tradição existente – considerando-se que essas organizações possuem história recente –, a realidade dinâmica com que o fenômeno se altera e o medo que afeta as pessoas passíveis de testemunhar sobre o tema.(32)

O levantamento efetuado examinou os dados compilados no período de janeiro de 2006 a abril de 2008 no Disque-Denúncia, importante fonte de informação de inteligência para os órgãos de segurança pública. A partir dos dados coletados, é possível verificar que as naturezas dos crimes praticados por milícias e como tais narrados pela população são de diversas ordens. A lista é encabeçada pelos crimes de extorsão e ameaça, seguido de porte ilícito de armas de fogo, homicídios, tráfico de drogas e crimes de corrupção lato sensu.(33)

Cano chama atenção para o verdadeiro temor da população em falar sobre o tema e conclui que as milícias exercem um “domínio coativo” nos moradores.(34)

Alguns dos traços observados nos crimes praticados por organizações mafiosas podem ser verificados na forma de atuação dos grupos milicianos. Nesse sentido, podem-se mencionar, entre as principais características de tais grupamentos: a construção de um poder paralelo ao Estado; o modo sangrento de alguns procedimentos aplicados àqueles que não aceitam o modo de agir da organização; a manutenção da organização às custas da corrupção; a motivação de sua existência vinculada ao mundo dos negócios; existência dependente da colaboração das vítimas.

De acordo com dados do Núcleo de Pesquisas das Violências da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, estima-se que, no ano de 2008, das 965 favelas do Rio de Janeiro/RJ, 41,5% estavam dominadas por milícias, as quais, no ano de 2009, contavam com número superior a 1000 agentes em seus quadros, dominando cerca de 170 comunidades daquela cidade.(35)

Concordamos com Cirino, no sentido de que não é possível importar para o sistema jurídico penal brasileiro o conceito de organização criminosa do tipo mafioso sem, antes, realizarmos um estudo sociológico dos problemas nacionais enfrentados pelo Brasil quanto à prática de crimes por meio de certos grupos organizados.(36) É certo que cada país deve tomar iniciativas legislativas no âmbito penal tendo por fundamento o fenômeno social e a realidade sócio-política expressa naquele dado momento histórico, como ocorreu com a Itália.(37)

Contudo, para fins do presente estudo, impõe-se consignar que os crimes perpetrados por organizações milicianas já foram objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça em diversos julgados, datando o mais antigo do ano de 1993.(38) A jurisprudência consolidou-se, naquela Corte, no sentido da afirmação da atuação das organizações milicianas no contexto da realidade social do Estado brasileiro, atuando mediante a prática de crimes com violência ou grave ameaça. Nesse sentido, cumpre transcrever trecho do voto condutor de acórdão do Superior Tribunal de Justiça, como segue:(39)

In casu, além da materialidade do delito e de indícios suficientes de autoria, a decretação da constrição cautelar fundou-se, primordialmente, na necessidade de preservar a ordem pública e a instrução criminal, em razão da real periculosidade do paciente, que faz parte de quadrilha armada (milícia intitulada como Liga da Justiça) que causa grande temor na Região de Rio das Pedras (Zona Oeste do Município do Rio de Janeiro), acusada de vários crimes, dentre eles: extorsões, homicídios, exploração de transporte alternativo, ameaça e lavagem de dinheiro. Cumpre estabelecer, ainda, que o ora paciente fora condenado a 09 anos de reclusão como incurso no art. 158, § 1°, do CPB (extorsão cometida por duas ou mais pessoas ou com emprego de arma) e encontra-se denunciado como incurso no art. 121, § 2°, IV (homicídio qualificado por motivo que dificultou a defesa da vítima), do CPB por duas vezes, e no art. 121, § 2°, IV, c/c o art. 14, II (tentativa de homicídio qualificado por motivo que dificultou a defesa da vítima), ambos do CPB, por duas vezes, ficando assim evidente a reiteração criminosa e a sua personalidade voltada para o crime.”

Como ocorre no território dominado por associações mafiosas, também nos locais em que as milícias atuam verifica-se que esse sistema de relações informais culmina por aniquilar o direito de cidadania, deixando espaço para a formação perversa da relação político-empresarial-mafiosa/miliciana. Ou seja, por meio do controle de setores da economia, tais grupos organizados consolidam-se potencialmente e, concomitantemente, estreitam laços com pessoas ligadas à administração pública, ao meio empresarial e à política.(40)

3.2 Conceito de Milícias

Na visão de Cano, o conceito de Milícia, para fins analíticos, deve conter cinco características simultâneas, a saber: o controle de um território e da população que nele habita por parte de um grupo armado irregular; o caráter coativo desse controle nos moradores do território; o principal objetivo desse grupo de obtenção de lucro individual; o discurso de legitimação baseado na proteção dos moradores e na instauração de uma ordem que garante alguns direitos e exclui outros, mas gera expectativa de normatização de condutas; a participação ativa e reconhecida de agentes do Estado como integrantes do grupo.(41) O autor destaca, porém, que muitos desses elementos são comuns a outros grupos criminosos, como o narcotráfico, por exemplo. Assim, afirma que, para a população, as características que mais se vinculam com as milícias são de duas ordens, a saber: a cobrança de taxas de proteção a comerciantes e a moradores e a invasão do território por pessoas armadas, que não são moradoras do local.(42) Sob a ótica de Farias, o termo milícia pode ser conceituado como a representação da

“reunião de policiais civis e militares, da ativa e da reserva, bombeiros, agentes penitenciários, ex-traficantes e até mesmo cidadãos sem quaisquer patentes, que, armados e à margem da Lei, advogam em causa própria, a partir do controle total de territórios e da utilização do aparato estatal – inteligência, equipamentos, viaturas e rede de informantes – para promover seus interesses privados ou no máximo de grupos de amigos.”(43)

Cumpre referir que, no ano de 2008, foi instaurada Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a Investigar a Ação de Milícias no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. A CPI, ao final dos trabalhos, conceituou milícias como:

“grupos armados para prática de diversas extorsões e exploração irregular de serviços públicos, controlados por integrantes das instituições de segurança pública e/ou das Forças Armadas, para fins econômicos escusos, não raro com representação direta de parlamentares ou indiretamente na forma de sustentação dessa atividade criminosa, contando, no mínimo, com a tolerância de autoridades de Poderes Executivos (braço político-eleitoral).”(44)

A impossibilidade de o Estado oferecer proteção a todas as pessoas, a par do aumento do domínio do tráfico de drogas sobre o território em algumas favelas, propiciou o surgimento das milícias como um poder paralelo.(45) É possível identificar esse conceito de “poder paralelo” também em âmbito jurisprudencial:(46)

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. QUADRILHA ARMADA. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA EM 05.09.08. CANCELAMENTO DA AUDIÊNCIA DE INTERROGATÓRIO. PEDIDO PREJUDICADO. REALIZAÇÃO DO INTERROGATÓRIO COM A PRÉVIA DISPONIBILIZAÇÃO DOS ÁUDIOS SOLICITADOS. PACIENTE MEMBRO DA CÚPULA DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO. SUPOSTA CHEFIA DE MILÍCIA ARMADA. ENVOLVIMENTO DE MEMBRO DO LEGISLATIVO ESTADUAL. PRISÃO CAUTELAR COM FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. EXCESSO DE PRAZO (1 ANO E 1 MÊS) JUSTIFICADO. PLURALIDADE DE RÉUS (11 PESSOAS). COMPLEXIDADE DOS FATOS. ADITAMENTO DA DENÚNCIA. DILIGÊNCIAS REQUERIDAS. VÁRIOS PEDIDOS DE LIBERDADE PROVISÓRIA E DE HABEAS CORPUS. PARECER DO MPF PELO INDEFERIMENTO DO WRIT. ORDEM DENEGADA.
1.   Resta prejudicado o pedido de cancelamento do interrogatório, tendo em vista que, em cumprimento à liminar deferida, foi disponibilizada a mídia ao paciente antes da realização de seu interrogatório.
2.   Presentes indícios veementes de autoria e provada a materialidade do delito, a decretação da prisão cautelar encontra-se plenamente justificada na garantia da ordem pública, bem como na conveniência da instrução criminal, em razão da real periculosidade do réu (Tenente-Coronel da Polícia Militar, supostamente chefia organização criminosa – milícia armada – com atuação na execução de crimes, impondo às comunidades da cidade do Rio de Janeiro um verdadeiro poder paralelo e valendo-se, muitas vezes, da própria estrutura oferecida pelo Estado para o combate à criminalidade, como viaturas policiais, armas etc.).
3.   A concessão de Habeas Corpus em razão da configuração de excesso de prazo é medida de todo excepcional, somente admitida nos casos em que a dilação (A) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela acusação; (B) resulte da inércia do próprio aparato judicial, em obediência ao princípio da razoável duração do processo, previsto no art. 5°, LXXVIII, da Constituição Federal; ou (C) implique em ofensa ao princípio da razoabilidade.
4.   No presente caso, a dilação para a conclusão da instrução (1 ano e 1 mês) pode ser debitada à complexidade do feito, à quantidade de acusados (11 pessoas), ao aditamento da denúncia e às diligências requeridas, bem como a reiterados pedidos de liberdade provisória e de Habeas Corpus.
5.   Ordem denegada, em consonância com o parecer ministerial.”

Esses grupos privados paraestatais passaram a ver a segurança como um bem, na lógica mercantil, passível de comercialização.(47) Tal finalidade econômica na atuação das milícias já foi objeto, inclusive, de reconhecimento pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como se vê do seguinte julgado:(48)

“Colhe-se dos autos que, ante o apurado na denominada ‘Operação Blecaute’ (Inquérito Policial nº 066/2009 – DRACO-IE), em março de 2011, o paciente e outros 7 (sete) corréus foram denunciados, como incursos nas penas do art. 288, parágrafo único, do Código Penal, c/c o art. 8º, caput, da Lei nº 8.072/90, por supostamente integrarem organização criminosa voltada à prática de diversos crimes, notadamente de extorsão, ‘relacionados a pretensos serviços de 'segurança' e de 'proteção', fornecimento de gás e serviços de distribuição de internet e TV a cabo clandestinos, fornecimento de água encanada, venda de imóveis, esbulho de propriedades e parcelamento irregular do solo urbano, prestação de transporte coletivo alternativo (vans e moto-táxis), venda de botijões de gás de cozinha (GLP) e uso e exploração de máquinas de jogos de azar, dentre outros, formando, dessarte, uma perigosa quadrilha armada, vulgarmente chamada de 'milícia', que se autointitula 'PESSOAL DO DECO'. (destaquei)

As milícias efetuam o controle do território em algumas favelas ou comunidades, com o pretexto de oferecer segurança e certas prestações de serviço à população. Para tanto, o grupo organizado exige o pagamento de uma taxa, o que acaba caracterizando a modalidade criminosa de extorsão.(49) Entretanto, é preciso destacar que esse discurso de legitimação da atuação da milícia, em prol da proteção dos moradores de uma comunidade, apresentando-se como uma alternativa à tirania do tráfico de drogas e oferecendo a instauração de uma nova ordem pública que traga paz e proteção aos habitantes da localidade, pode ser justificado, em verdade, como um plano de marketing da “venda” de segurança. Tudo para justificar a finalidade de lucro.

O estudo do tema revela que as milícias não possuem padronização ou modelo comum, pois são redes difusas, fragmentadas, reflexo de iniciativas locais de certas comunidades. Contudo, têm-se revelado mais organizadas que outros grupos criminosos, com vocação moderna e empresarial, de modo que fazem uso de cadastro dos moradores, emitem recibos dos valores cobrados dos cidadãos, organizam reuniões formais entre os habitantes da comunidade e revelam cuidado com a utilização de armas.(50)

Todas essas práticas dão-se em um contexto de extrema gravidade, com a implantação de um verdadeiro clima de terror, como já reconheceu a jurisprudência.(51) Há na doutrina quem qualifique esse sentimento social de medo da criminalidade como insegurança urbana cidadã.(52) Esse medo é, em muitos casos, a causa da impunidade de atos de extorsão ou corrupção praticados por organizações milicianas que intimidam testemunhas e ameaçam a coletividade, quando não há uma atuação firme do poder judiciário com a segregação dos integrantes desses grupos, conforme se vê no seguinte precedente:(53)

HABEAS CORPUS. QUADRILHA ARMADA (MILÍCIA). INÉPCIA DA DENÚNCIA. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. PERICULOSIDADE CONCRETA DO GRUPO CRIMINOSO. INTIMIDAÇÕES A TESTEMUNHAS. CRIMES GRAVES (MODUS OPERANDI). COMUNIDADES ATEMORIZADAS. RISCO À SEGURANÇA DA COLETIVIDADE. NECESSIDADE DE INTERRUPÇÃO DAS ATIVIDADES ILÍCITAS. IRRELEVÂNCIA DE CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. REQUISITOS DA CUSTÓDIA CAUTELAR CUMPRIDOS. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, DENEGADA.
1. O STJ, em regra, não pode apreciar diretamente em habeas corpus questão não debatida no tribunal de origem, sob pena de incorrer em indevida supressão de instância. Impossibilidade de exame da alegação de inépcia da denúncia.
2. A prisão preventiva é tida como um ‘mal necessário’, somente se justificando quando existirem elementos suficientes que levem a crer que a liberdade do acusado colocará em risco a conveniência da instrução criminal, a aplicação da lei penal ou a garantia da ordem pública ou econômica.
3. Na hipótese dos autos, evidencia-se que o decreto de prisão preventiva apresenta fundamentação idônea, pois a custódia cautelar está fundada na garantia da ordem pública – dada a periculosidade concreta do grupo criminoso (milícia armada), que supostamente praticava, reiteradamente, crimes graves, pondo em risco, mormente pelo modus operandi, a segurança da coletividade –, bem como no resguardo da instrução processual, diante da probabilidade de destruição de provas e intimidação de testemunhas.
4. A segregação provisória revelou-se não apenas a medida mais adequada para a espécie, mas, sobretudo, a mais necessária, ante o resguardo da ordem pública, já que buscou interromper ou diminuir a atuação dos integrantes da quadrilha armada conhecida como ‘grupo do Deco’, inclusive com relação ao ora paciente, apontado como o suposto líder da milícia, a qual atemorizava 13 (treze) comunidades carentes do bairro de Jacarepaguá/RJ.
5. Eventuais condições pessoais favoráveis do acusado (tais como primariedade, domicílio certo e trabalho lícito) não se mostram aptos a obstaculizar a prisão processual caso estejam presentes seus requisitos e demonstrada a sua imprescindibilidade.
6. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, denegado.”

Tal fenômeno não é único da realidade brasileira, pois os cargos de poder, em especial os que possuem exclusividade sobre uma determinada atividade, encontram terreno fértil para que seus integrantes excedam os limites da normatividade e incursionem em práticas delitivas na estrutura da organização a que pertencem, em clara confusão entre a coisa pública e a coisa privada, seja no que se refira aos bens, seja no que diga respeito aos interesses.(54) O uso da condição de servidor público para promover a atuação de grupo miliciano já foi reconhecido pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como se vê da seguinte ementa:(55)

HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. GRAVIDADE CONCRETA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. EXCESSO DE PRAZO. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO NESSE PONTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.
1. Não há constrangimento ilegal quando apontados elementos concretos que evidenciam a necessidade de manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, haja vista a gravidade concreta dos delitos em tese cometidos pelo paciente, o qual, além de ser apontado como a principal liderança da quadrilha, utilizava a sua condição de policial civil para promover os interesses da milícia, usando o aparato estatal para dar guarida à atuação dos demais integrantes da apontada organização delituosa.
2. Inviável a análise diretamente por este Superior Tribunal do aventado excesso de prazo na custódia cautelar quando essa matéria não foi analisada pelo Tribunal de origem, sob pena de incidir na indevida supressão de instância.
3. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, ordem denegada.”

4 Estrutura do crime praticado por Milícias no anteprojeto do Código Penal

Os elementos do crime de quadrilha ou bando, previsto no artigo 288 do Código Penal brasileiro, não servem para o enfrentamento da moderna criminalidade organizada, não obstante o reiterado uso desse dispositivo, pelos tribunais pátrios, para enquadramento dos fatos praticados por milícias levados a julgamento, por falta de outra opção legislativa.

Raul Cervini destaca que o país, para construir um verdadeiro conceito de crime organizado, deve percorrer sucessivas etapas de análise, passando pelo estudo da real ameaça que representam as organizações criminosas existentes, de sua agressividade e das atividades desenvolvidas por elas.(56) É preciso identificar os novos poderes criminosos,(57) entidades que devem ser consideradas na estratégia desenvolvida pela segurança pública de cada país, uma vez que o crime organizado opera no conceito moderno de sociedade de rede, abandonando a forma tradicional.

Conforme já se teve oportunidade de mencionar alhures, os julgados do Superior Tribunal de Justiça não só reconhecem o fenômeno dos crimes praticados por milícias, como assentam as bases teóricas e práticas para a construção de um tipo penal pertinente, ainda que de lege ferenda. Impende consignar, ademais, que o crime praticado por mílicia também já foi objeto de reconhecimento por julgado recente do Supremo Tribunal Federal.(58)

Tipificar o crime organizado tem sido um desafio em diversos ordenamentos jurídicos e, no caso brasileiro – como no caso da Itália, analisado anteriormente –, não é diferente. A descrição adotada pelo Projeto de Lei nº 6578/2009,(59) em tramitação na Câmara dos Deputados, foi espelhada na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (conhecida como Convenção de Palermo)(60) e considera como causa de aumento de pena o concurso de funcionário público, valendo-se a organização criminosa dessa condição para a prática da infração penal. O projeto de lei prevê, ainda, agravamento da pena se a organização criminosa utilizar arma de fogo.(61)

O Relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a Investigar a Ação de Milícias no âmbito do Estado do Rio de Janeiro arrolou, entre as conclusões finais, a sugestão de tipificação do crime de milícia,(62) por entender que a modalidade comporta elementos próprios distintos da tradicional figura do crime de bando ou quadrilha, sem sugerir, contudo, uma redação apropriada.

A Comissão de juristas constituída pelo Senado para elaboração do anteprojeto do Código Penal brasileiro fez uma proposição de conceituação do crime praticado por milícias como uma modalidade de crime praticado por organizações criminosas.(63) Para tanto, a Comissão considerou que a conceituação do crime praticado por milícias deve conter os seguintes elementos:

4.1 Domínio ilegítimo do território ou sobre os atos da comunidade ou dos moradores

O domínio ilegítimo exercido sobre determinado território, ou ainda sobre atos da comunidade de moradores, como regra, revela a substituição do Estado por tais grupos criminosos organizados de milicianos, que atuam controlando o direito de ir e vir dos moradores, impondo regras de conduta social, inclusive de cunho moral, bem como diversas restrições aos habitantes da comunidade. Muitas vezes, o controle de atos da vida civil dos moradores dá-se mediante a utilização de estruturas estatais existentes, de modo a respaldar a legitimidade que os integrantes de tais organizações sentem, por serem funcionários públicos.(64)

Vê-se, nesse modo de agir, algo muito semelhante ao que ocorre com as associações mafiosas, que, para se manterem como centros de poder, necessitam externar atos de dominação sobre um determinado território ou região, cerceando o livre arbítrio dos cidadãos.

De acordo com as pesquisas efetuadas, na maioria dos casos examinados no Rio de Janeiro há controle de ingresso na entrada da comunidade, com guardas armados que se revezam por turnos, e, de forma excepcional, utiliza-se toque de recolher. O tamanho do grupo miliciano varia de 5 a 30 integrantes ou mais, dependendo do resultado econômico que a organização criminosa possa obter na região em que se instala.(65)

A finalidade de domínio do território por parte da milícia ficou expressa em julgado do Superior Tribunal de Justiça, no HC 145765/RJ:(66)

“PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE QUADRILHA ARMADA. CONFIGURAÇÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO. ALEGAÇÃO QUE ENSEJA REEXAME APROFUNDADO DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE PELA VIA ESTREITA DO WRIT.
1. Verifica-se da peça acusatória que os denunciados e terceiras pessoas não identificadas participavam de ‘milícia’, que tinha como finalidade o domínio de favela no Rio de Janeiro, com consequente exploração dos moradores, estabelecendo um verdadeiro poder paralelo ao do Estado.
2. Consoante jurisprudência desta Corte, para a caracterização do crime de quadrilha ou bando não é imprescindível que todos os coautores sejam identificados, bastando elementos que demonstrem a estabilidade da associação para a prática de crimes. Precedentes.
3. De mais a mais, a alegação de atipicidade da conduta do paciente, no alegado cometimento do delito do art. 288, parágrafo único, do CPB, a verificação da sua pertinência (ou não) dependeria de ampla e profunda avaliação do acervo probatório, impossível de realização no âmbito do HC.
4. Ordem denegada.” (destaquei)

4.2 Uso de violência ou grave ameaça

De modo geral, o uso de extorsão por grupos criminosos está vinculado à prática de outros crimes. Na União Europeia, foi possível mapear a prática de extorsão por organizações criminosas relacionadas ao tráfico de drogas, à atividade ilegal associada à prostituição, ao roubo armado e ao contrabando de cigarros.(67)

No caso da milícia brasileira, o comportamento desviante identificado em algum morador da comunidade que deixa de seguir as regras impostas é punido de modo implacável, sempre mediante violência. As penalidades impostas podem ir desde a agressão física, passando pela expulsão da comunidade, até culminar com a morte.(68)

A ameaça chega a tal nível que os moradores acabam adotando atitude resignada, aceitando a milícia como uma realidade inevitável,(69) da mesma forma como ocorre com a atitude adotada pelos cidadãos de locais dominados pela máfia. A efetiva força de intimidação, que é a finalidade perseguida com a atuação de ambos os grupos – milícia e máfia –, caracteriza mais um elemento típico comum entre tais organizações. O crime de tipo mafioso, contudo, como já visto, não exige que a violência ou ameaça sejam efetivadas, pois o poder de intimidação da associação decorre de seu histórico construído ao longo do tempo naquela determinada coletividade. No que tange ao tipo previsto no anteprojeto, em relação à milícia, a violência ou grave ameaça deve ser concreta para caracterizar a conduta.

4.3 Exigência de entrega de bem móvel ou imóvel, a qualquer título, ou de valor monetário periódico ou constrangendo a liberdade do voto

O objetivo de auferir lucro consta da gênese das organizações mafiosas. Por conseguinte, o crime de associação de tipo mafioso, no Código Penal Italiano, é expresso quanto ao intuito econômico de tais grupamentos, punindo a conduta de quem exerce o controle ou gestão de atividades econômicas, concessões, autorizações, contratos e serviços públicos, usando, para tanto, o poder de intimidação e a condição de sujeição ao silêncio que caracterizam tal organização.

Na minuta do anteprojeto de Código Penal brasileiro, a coação para entrega de alguma vantagem econômica ou para assegurar determinado resultado na eleição é exercida pela milícia, conforme já se pontuou anteriormente, de forma a caracterizar a conduta de extorsão. A exigência de uma remuneração pelo serviço imposto à comunidade revela que o principal intuito das organizações milicianas também é a obtenção do lucro. A ideia inicial de restauração da ordem, que estaria na gênese do surgimento de tais grupos paraestatais integrados, na maioria das vezes, por funcionários públicos, é cortina de fumaça para a real finalidade econômica que essas organizações criminosas possuem, já que o numerário ou patrimônio arrecadado reverte em prol dos indivíduos que integram o grupo miliciano.(70)

Há relatos de moradores, inclusive, no sentido de que todas as transações imobiliárias realizadas são submetidas ao pagamento de uma taxa à milícia, mediante recibo de pagamento, seja relativamente a venda ou a aluguéis realizados no âmbito da comunidade, mantendo-se registro dos moradores que pagam – os quais recebem proteção preferencial – e daqueles que estão em débito – que serão pressionados pela organização a regularizar o pagamento.(71)

A inclusão do constrangimento à liberdade do voto pode soar peculiar no tipo penal proposto no anteprojeto. Entretanto, a observação prática tem revelado que o clientelismo político existe em muitas das comunidades ocupadas por milicianos. Em tais locais há forte pressão, inclusive armada, para que os moradores votem em determinado candidato e recebam, como moeda de troca, a concessão de benesses.(72) Essa ideia de controle do voto pode se manifestar, ainda, pela proibição de outros candidatos fazerem campanha na comunidade ou pela ordem expressa de apoio a determinado candidato miliciano.(73)

No relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a Investigar a Ação de Milícias no âmbito do Estado do Rio de Janeiro,(74) observou-se que quase todos os milicianos ouvidos pela CPI

“se declararam líderes comunitários e justificaram suas ações como defesa dos interesses das comunidades. Praticamente todos reconheceram ter apoiado candidatos a cargos eletivos em todos os níveis (Câmaras Municipais, Assembleia Legislativa, Câmara Federal) oriundos dos órgãos de Segurança. Balanço das votações recebidas pelos candidatos citados mostra que, realmente, alguns deles tiveram votação expressiva em áreas controladas pelas milícias.”

O outro viés que a realidade cotidiana revela no Estado do Rio de Janeiro é a existência de vários líderes de milícias eleitos para cargos de vereador ou de deputado estadual, o que, na visão de Cano, “fecha o círculo da junção das dominações” informal e formal mediante a consagração pelo voto popular, ao mesmo tempo em que assegura a imunidade parlamentar contra eventuais processos criminais.(75)

Uma vez mais é necessário destacar que a utilização do método desenvolvido pela milícia para influenciar no pleito eleitoral não é exclusividade brasileira. Na Itália, a inserção do parágrafo terceiro do artigo 416 do Código Penal prevê a aplicação da pena prevista ao artigo 416-bis do mesmo código a quem obtém promessa de voto em troca de dinheiro.

4.4 Prestação de serviço de segurança privada, transporte alternativo, fornecimento de água, energia elétrica, venda de gás liquefeito de petróleo, ou qualquer outro serviço ou atividade não instituída ou autorizada pelo Poder Público

Considerando-se o real intuito de lucro que todas as organizações milicianas possuem, o anteprojeto do Código Penal enumerou alguns dos serviços dominados por tais associações e que, uma vez impostos aos moradores da comunidade, justificariam a cobrança indevida.

Veja-se que a mera contratação de serviço de segurança privada é ato lícito na vida de qualquer cidadão. Contudo, o modo de agir das milícias dá-se pela imposição de tais serviços por meio de coação. Portanto, se a iniciativa de impor proteção à comunidade parte dos integrantes do grupo miliciano,(76) não existe o exercício legítimo de atividades de segurança no âmbito privado, porque à população não resta outra opção distinta da contratação forçada; não há, assim, uma legítima relação de consumo. Cuida-se de traço distintivo das milícias em relação a outros grupos armados. Em alguns casos, ainda, a milícia estabelece aos moradores a proibição de comprar determinados bens fora da comunidade,(77) controlando os produtos e mercadorias que ingressam naquele determinado território.

De acordo com a jurisprudência examinada, os moradores da comunidade passam a ter sua liberdade de consumo vigiada pela milícia ou são obrigados ao pagamento de uma taxa de segurança, como se vê do seguinte aresto:(78)

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. PACIENTES DENUNCIADOS PELO CRIME DE QUADRILHA ARMADA (ART. 288, PAR. ÚNICO, DO CPB, C/C ART. 8°, CAPUT DA LEI 8.072/90). SUPOSTOS INTEGRANTES DE GRUPO PARAMILITAR (MILÍCIA), COMPOSTA POR MAIS DE 65 PESSOAS, DENTRE ELAS 25 POLICIAIS CIVIS E MILITARES, ALÉM DE INTEGRANTES DAS FORÇAS ARMADAS, COM ATUAÇÃO NA ZONA OESTE DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO/RJ. PERICULOSIDADE CONCRETA DO GRUPO DEMONSTRADA PELAS SUPOSTAS AÇÕES PRATICADAS, QUE INCLUÍAM: HOMICÍDIOS, AMEAÇAS, COBRANÇA DE TAXA DE SEGURANÇA DOS COMERCIANTES LOCAIS, EXPLORAÇÃO DE JOGOS DE AZAR, CONTROLE SOBRE A DISTRIBUIÇÃO DE GÁS, TRANSPORTE ALTERNATIVO DE PASSAGEIROS E SERVIÇOS DE TV A CABO. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, COMO FORMA DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA.
1. O grupo paramilitar (Liga da Justiça), supostamente integrado pelos pacientes (são mais de 65 denunciados na Ação Penal, sendo 25 deles integrantes das Polícias Civil e Militar, além de membros das forças Armadas), mostra-se hegemônico na exploração de toda e qualquer atividade que possa gerar lucro na circunscrição territorial por ele dominada, como, por exemplo, o transporte alternativo de passageiros, a exploração de jogos de azar por meio de máquinas caça-níqueis, o monopólio da venda de gás de cozinha, a cobrança de taxa de segurança aos comerciantes, a exploração ilícita de transmissão de TV a cabo e a manutenção e exploração de depósitos clandestinos de combustíveis.
2. A periculosidade concreta do grupo em que atuavam os pacientes é razão suficiente para a manutenção da custódia preventiva, mormente para garantia da ordem pública.”

4.5 Participação de servidor público

Considerando-se que nos grupos milicianos nem todo

s os integrantes são funcionários públicos, optou a Comissão por conceituar a efetiva participação de servidor ou ex-servidor público (lato sensu) como circunstância qualificadora do crime.

Como regra, a prática revela que o miliciano faz questão de dizer que é policial, bombeiro ou agente penitenciário. As razões que levam a essa exposição intencional são muitas, podendo-se destacar, entre as principais: o fato de que o pertencimento ao Estado é que legitima a existência das milícias e o discurso de oposição à criminalidade, uma vez que os milicianos são a personificação do Estado na comunidade; por serem oriundos dos quadros da polícia, os integrantes da milícia teriam mais técnica para desempenhar atividades de segurança privada e, assim, maior facilidade em acionar a força pública, caso se faça necessário, diante da ação de traficantes; o verdadeiro temor que o cidadão tem de acionar o aparato estatal diante da prática de abusos por parte da milícia, pois os milicianos pertencem aos quadros do Estado e seriam, em tese, mais hábeis para identificar possíveis delatores.(79) A propósito e em convergência com a gravidade verificada na participação de funcionários públicos em tais organizações criminosas, calha mencionar trecho do voto proferido no HC 115748/RJ:(80)

“1. O grupo paramilitar (Liga da Justiça), supostamente integrado pelo paciente – composto, igualmente, por policiais civis e militares, membros das Forças Armadas e do Legislativo Estadual e Municipal –, mostra-se hegemônico na exploração de toda e qualquer atividade que possa gerar lucro na circunscrição territorial por ele dominada, como, por exemplo, o transporte alternativo de passageiros, a exploração de jogos de azar por meio de máquinas caça-níqueis, o monopólio da venda de gás de cozinha, a cobrança de taxa de segurança aos comerciantes, a exploração ilícita de transmissão de TV a cabo e a manutenção e exploração de depósitos clandestinos de combustíveis.

(...)

3.   A periculosidade da quadrilha indica a necessidade da manutenção da custódia cautelar dos seus membros para a garantia da ordem pública, afrontada pelas condutas criminosas perpetradas pelo paciente e os seus corréus. A prisão afigura-se imprescindível ao bom andamento da instrução criminal, sobretudo para dar segurança às vítimas e às testemunhas ameaçadas e obrigadas, na fase policial, a se retratarem dos depoimentos prestados.” (destaquei)

Contudo, observa-se que, entre todos, o principal motivo que leva o miliciano a divulgar sua condição de funcionário público é a certeza da redução ou da total eliminação das incursões policiais naquela determinada comunidade, pois o levantamento analisado revela que a polícia apenas age com vigor nas favelas em que o tráfico tem o domínio do território.(81) Diante desse conjunto de motivos, o anteprojeto de Código Penal considerou a participação de agentes ou ex-agentes públicos, ou, ainda, de agentes políticos, nos crimes praticados por tais organizações criminosas como circunstância de extrema gravidade, que qualifica o crime, ao qual se estipula o dobro da pena mínima cominada ao delito.

Os exemplos colhidos da jurisprudência ora analisada são fartos em demonstrar o acerto da opção, porquanto a efetiva participação de agentes públicos nos crimes praticados por milícias dificulta a investigação e a obtenção da prova por parte dos órgãos de repressão estatal.

Conclusão

1. A doutrina é unânime em apontar que nem todo o crime organizado está calcado no modelo mafioso.(82) Entretanto, existem fortes indícios nos levantamentos sociológicos até então estudados para apontar muitos traços comuns entre o crime de tipo mafioso existente na Itália e o crime praticado por milícia no Brasil, tais como: relação clientelista, uso da violência ou da intimidação, imposição da lei do silêncio e intuito de lucro.

2. Nos últimos 60 anos, a Itália mostrou ao mundo o quão perversa pode ser a subversão do aparato Estatal e das classes dirigentes que governam o país. Francesco Forgione, no recente livro traduzido para o português e publicado no Brasil, intitulado “Máfia Export: como a ‘Ndrangheta, a Cosa Nostra e a Camorra colonizaram o mundo”, conclui que, “se é possível e necessário existir uma política sem máfia, não podem existir máfias sem a participação e as conclusões da política”. O autor afirma, ainda, que é preciso eliminar as zonas cinzentas, que identifica como os vácuos nas legislações de outros países (dentre os quais o Brasil se insere), para possibilitar a atuação global.

Segundo esse mesmo autor, a riqueza criminosa cria consenso onde as políticas públicas não dão respostas às necessidades das pessoas, gerando, como desdobramento, trabalho sujo que, contudo, fornece emprego a milhares de famílias.

3. Esse fenômeno, ocorrido na Itália há mais de cinquenta anos, também é constatado no Brasil, pois, diante da inabilidade do poder público em resolver problemas estruturais da sociedade – como segurança e transporte, para exemplificar alguns –, grupos organizados, que hoje são conhecidos por milícias, proliferaram-se de modo assustador em certas comunidades de alguns Estados. Faz-se necessário perquirir os riscos de uma eventual consolidação nesse estado de coisas, pois, mediante práticas reiteradas de sonegação fiscal e de trabalho clandestino em tais organizações milicianas, elimina-se a concorrência saudável que deveria prevalecer em um Estado de Direito. Afinal, como competir em determinadas comunidades com quem utiliza capital ilícito e custo zero?(83) É preciso, urgentemente, reconhecer que o Brasil está diante de um grave problema de ordem social e econômica, diante do crescimento vertiginoso das milícias. Em resposta, é imperativo que o legislativo aprove a criminalização dos crimes praticados por tais organizações criminosas, a fim de dotar os órgãos de repressão de instrumento adequado para o enfrentamento dessa problemática, porquanto a legislação em vigor não atende aos anseios da sociedade.

4. A criminalização da conduta de praticar crime por meio de milícia é apenas um primeiro passo na luta contra essa nova forma de criminalidade surgida no Brasil. É preciso concordar com Grinover(84) quando este afirma que o êxito na luta contra o crime organizado deve ir além do aparato legislativo para tornar-se fruto de verdadeira vontade política do Estado em dotar as instituições policiais e o Ministério Público de estrutura humana e material, de modo que possam realizar trabalho coordenado e arrostar as organizações criminosas que solapam a segurança pública. Afinal, uma legislação moderna configura-se em uma ferramenta idônea fundamental para o combate ao crime organizado, para que se possa agir eficazmente.

5. O crime praticado por milícias, embora já revele uma grande extensão de danos até o momento, é relativamente novo no país, motivo pelo qual urge um esforço coletivo das forças de segurança para impedir sua expansão.

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Notas

1. BITTAR, Walter Barbosa. Delação premiada no Brasil e na Itália. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 88, ano 19, jan./fev.2011, p. 229. No mesmo sentido: LUPO, Salvatore. História da máfia: da origem aos nossos dias. São Paulo: UNESP, 2002.

2. TURONE, Giuliano. Il delito di associazione mafiosa. 2. ed. Milano: Giuggrè: 2008. p. 5.

3. FORGIONE, Francesco. Máfia Export: como a ´Ndrangheta, a Cosa Nostra e a Camorra colonizaram o mundo. Traduzido por Karina Jannini. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011. p. 20.

4. TURONE, ob. cit., p. 7.

5. FORGIONE, ob. cit., pp. 22 e 35.

6. TURONE, ob. cit., p. 7.

7. GRASSO, Pietro. La Mafia Imprenditrice. In: Pubblica Amministrazione – Diritto Penale – Criminalità Organizzata – Pubblicazione Atti del Convegno. Milano: Giuffrè, 2008, p. 298.

8. ANIYAR DE CASTRO, Lolita. La Sombra del Padrino (concepto criminológico del delito organizado). Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 42, jan/2003, p. 307.

9. PELLEGRINI, Angiolo; COSTA JR., Paulo José da. Criminalidade Organizada. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 70. Os autores destacam que esse vínculo é formado pela transmissão de um sistema de valores subculturais aos jovens, que constituem os novos agregados da organização criminosa.

10. Nesse sentido, Forgione, ob. cit., p. 79.

11. ANIYAR DE CASTRO, ob.cit.

12. TURONE, ob. cit., p. 3.

13. Art. 416 do Código Penal Italiano:
– Associazione per delinquere –
Quando tre o più persone si associano allo scopo di commettere più delitti, coloro che promuovono o costituiscono od organizzano l'associazione sono puniti, per ciò solo, con la reclusione da tre a sette anni.
Per il solo fatto di partecipare all'associazione, la pena è della reclusione da uno a cinque anni.
I capi soggiacciono alla stessa pena stabilita per i promotori.
Se gli associati scorrono in armi le campagne o le pubbliche vie si applica la reclusione da cinque a quindici anni.
La pena è aumentata se il numero degli associati è di dieci o più.

14. MILITELLO, Vicenzo. Associazione di tipo mafioso. In: Dizionario di Diritto Pubblico. Milano: Giuffrè, 2006. V. I, p. 483.

15. Art. 416-bis do Código Penal Italiano:
“– Associazione di tipo mafioso –
Chiunque fa parte di un'associazione di tipo mafioso formata da tre o più persone, è punito con la reclusione da tre a sei anni.
Coloro che promuovono, dirigono o organizzano l'associazione sono puniti, per ciò solo, con la reclusione da quattro a nove anni.
L'associazione è di tipo mafioso quando coloro che ne fanno parte si avvalgono della forza di intimidazione del vincolo associativo e della condizione di assoggettamento e di omertà che ne deriva per commettere delitti, per acquisire in modo diretto o indiretto la gestione o comunque il controllo di attività economiche, di concessioni, di autorizzazioni, appalti e servizi pubblici o per realizzare profitti o vantaggi ingiusti per sè o per altri ovvero al fine diimpedire od ostacolare il libero esercizio del voto o di procurare voti a sè o ad altri in occasione di consultazioni elettorali.
Se l'associazione è armata si applica la pena della reclusione da quattro a dieci anni nei casi previsti dal primo comma e da cinque a quindici anni nei casi previsti dal secondo comma.
L'associazione si considera armata quando i partecipanti hanno la disponibilità, per il conseguimento della finalità dell'associazione, di armi o materie esplodenti, anche se occultate o tenute in luogo di deposito.
Se le attività economiche di cui gli associati intendono assumere o mantenere il controllo sono finanziate in tutto o in parte con il prezzo, il prodotto, o il profitto di delitti, le pene stabilite nei commi precedenti sono aumentate da un terzo alla metà.
Nei confronti del condannato è sempre obbligatoria la confisca delle cose che servirono o furono destinate a commettere il reato e delle cose che ne sono il prezzo, il prodotto, il profitto o che ne costituiscono l'impiego. Decadono inoltre di diritto le licenze di polizia, di commercio, di commissionario astatore presso i mercati annonari all'ingrosso, le concessioni di acque pubbliche e i diritti ad esse inerenti nonchè le iscrizioni agli albi di appaltatori di opere o di forniture pubbliche di cui il condannato fosse titolare.
Le disposizioni del presente articolo si applicano anche alla camorra e alle altre associazioni, comunque localmente denominate, che valendosi della forza intimidatrice del vincolo associativo perseguono scopi corrispondenti a quelli delle associazioni di tipo mafioso."

16. É a denominada Lei antimáfia Rognoni-La Torre, de 1982, que introduz no ordenamento penal italiano, por vez primeira, a associação de tipo mafioso. Essa lei veio após as mortes do sindicalista La Torre e do Chefe de Polícia General Dalla Chiesa.

17. TURONE, ob. cit., p. 106.

18. D’AMBROSIO, Lóris, ob. cit., p. 180.

19. Art. 416-ter do Código Penal Italiano:
“– Scambio elettorale politico-mafioso –
La pena stabilita dal primo comma dell'articolo 416 bis si applica anche a chi ottiene la promessa di voti prevista dal terzo comma del medesimo articolo 416 bis in cambio della erogazione di denaro.”

20. TURONE, ob. cit., p. 2.

21. TURONE, ob. cit., p. 15.

22. TURONE, ob. cit., p. 113.

23. BORRELLI, G. Il metodo mafioso, tra parametri normativi e tendenze evolutive. Cassazione Penale, 2007, n. 19141, sez. V, p. 7.

24. Cass., Sez. V, 16 de março de 2000, Frasca, CED – 215965.

25. BORRELLI, ob. cit., p. 7, refere que se deve atribuir à expressão “si avvalgono” do artigo 416-bis do Código Penal italiano a ideia de uma modalidade habitual de comportamento mafioso, que se insere entre os meios de pressão pelos quais a associação pretende valer-se, mas cujo exercício não é necessário. O dispositivo, assim, deve ser aplicado para as associações mafiosas que atingiram um poder intimidatório em razão de anteriores exteriorizações de atos de intimidação ou violência.

26. MILITELLO, ob. cit., p. 484.

27. TURONE, ob. cit., p. 10.

28. MILITELLO, ob. cit., p. 485 e 488.

29. GIAMBERARDINO, André. Tráfico de drogas e o conceito de controle social: reflexões entre a sociedade e a violência. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 83. São Paulo: RT, 2010. p. 206.

30. Até onde se tem notícia, o fenômeno das milícias surgiu em favelas do Rio de Janeiro, contudo, a imprensa noticia que essa modalidade de organização criminosa já está sendo investigada em pelo menos outros 11 Estados, tais como Rio Grande do Sul (http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/policia/noticia/2012/03/policia-investiga-grupo-de-soldados-suspeitos-de-mortes-e-formacao-de-milicia-no-rs-3713022.html), Amazonas (http://pbrasil.wordpress.com/2009/11/15/pf-investiga-elo-das-farc-com-milicias-de-indigenas-no-am/), São Paulo (http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/749859-grupos-de-exterminio-se-unem-para-formar-milicia-em-sp.shtml) e Rio Grande do Norte (http://tvuol.uol.com.br/assistir.htm?video=crime-organizado-ameaca-os-passeios-de-bugue-no-rn-0402CD1A3660DCC12326). O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o HC 168428/PE, que teve como relator o Min. Og Fernandes, 6ª Turma, DJe 27.09.2010, reconheceu a existência de milícia armada no Estado de Pernambuco.

31. CANO, Ignácio. Seis por meia dúzia? Um estudo exploratório do fenômeno das chamadas ‘Milícias’ no Rio de Janeiro. Segurança, Tráfico e milícias no Rio de Janeiro. Organizado por Justiça Global. Rio de Janeiro: 2008. p. 49.

32. CANO, ob cit., p. 50. O autor refere que, em razão do temor dos entrevistados, a pesquisa deve ser considerada de cunho exploratório.

33. CANO, ob cit., p. 56.

34. CANO, ob cit., p. 57.

35. SCHELAVIN, José Ivan. A Teia do Crime Organizado Documentário: Força Nacional de Segurança Pública e Operação no Rio de Janeiro. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 119.

36. CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Crime Organizado. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 42, jan. 2003.

37. GRINOVER, Ada Pellegrini. O Crime Organizado no Sistema Italiano. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 12, out.1995.

38. Superior Tribunal de Justiça, AgRg no CC 3782/MG, rel. Min. Pedro Acioli, 3ª Seção, DJ 17.05.1993.

39. Superior Tribunal de Justiça, HC 111680/RJ, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, DJe 15.12.2008.

40. GRASSO, ob. cit., p. 300 e 302.

41. CANO, ob cit., p. 59.

42. CANO, ob cit., p. 81.

43. FARIAS, Luiz Kleber Rodrigues. Territorialização e segregação urbana: as milícias e a conformação de estruturas e oportunidades.  Intratextos, Rio de Janeiro, Número Especial 01, 2010, p. 48.

44. Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a Investigar a Ação de Milícias no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, p. 261.

45. Ver conceito de “poder paralelo” em SCHELAVIN, José Ivan. A teia do crime organizado documentário: Força Nacional de Segurança Pública e operação no Rio de Janeiro. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 93-4.

46. Superior Tribunal de Justiça, HC 134160/RJ, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, DJe 30.11.2009.

47. GIAMBERARDINO. Ob. Cit., p. 210. No mesmo sentido: CONSERINO, Cassio Roberto. Crime Organizado e institutos correlatos. Organizado por Clever Vasconcelos e Levy Magno. São Paulo: Atlas, 2011. p. 39.

48. Superior Tribunal de Justiça, HC 219244/RJ, rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora convocada do TJ/PE), 6ª Turma, DJe 13.08.2012.

49. GIAMBERARDINO. Ob. Cit., p. 206.

50. CANO, ob. cit., p. 77 e 82.

51. Superior Tribunal de Justiça, HC 229214/RJ, rel. Min. Sebastião Reis Junior, 6ª Turma, DJe 07.05.2012.

52. GIAMBERARDINO. Ob. Cit., p. 209.

53. Superior Tribunal de Justiça, HC 209006/RJ, rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), 6ª Turma, DJe 12.03.2012.

54. ANIYAR DE CASTRO, ob. cit., cita exemplo de corrupção constatado em alguns serviços policiais do Brooklyn, em forma de crime organizado, bem similar ao modelo mafioso.

55. Superior Tribunal de Justiça, HC 229214/RJ, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 07.05.2012. No mesmo sentido, os julgados do Superior Tribunal de Justiça: HC 215954/RJ, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, DJe 29.02.2012, no qual o réu e os chefes de uma milícia foram denunciados por serem os mandantes dos assassinatos de duas testemunhas do processo criminal; HC 115748/RJ, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, DJe 04.04.2011, no qual as vítimas e testemunhas foram ameaçadas a ponto de serem obrigadas, na fase policial, a se retratarem dos depoimentos prestados.

56. CERVINI, Raul. XV Congresso Internacional de Direito Penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais,  n. 8. São Paulo: RT, 1994.  p. 148.

57. PICCA, Georges. Crime Organizado Transnacional. Revista Consulex, n. 158. São Paulo, 2003, p. 13.

58. STF, RHC 106697/DF, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 14.05.2012.

59. De acordo com o artigo 1º do Projeto, eis o conceito de organização criminosa:
“§ 1° Considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam iguais ou superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.”

60. Introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 5.015/2004.

61. “Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas.
(...)
§ 2º As penas dos crimes previstos neste artigo aumentam de metade, se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo.”

62. Relatório da CPI, p. 267.

63. Texto do Anteprojeto do Código Penal, elaborado pela comissão de juristas indicada pelo Senado:
“Organização Criminosa
Art. 256. Organizarem-se três ou mais pessoas, de forma estável e permanente, para o fim específico de cometer crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos, mediante estrutura organizada e divisão de tarefas, com hierarquia definida e visando a auferir vantagem ilícita de qualquer natureza:
Pena – prisão, de três a dez anos, sem prejuízo das penas relativas aos crimes cometidos pela organização criminosa.
§ 1º A pena aumenta-se até a metade se a organização criminosa é armada, se um ou mais de seus membros integra a Administração Pública, ou se os crimes visados pela organização tiverem caráter transnacional.
Milícia
§ 2º Se a organização criminosa se destina a exercer, mediante violência ou grave ameaça, domínio ilegítimo sobre espaço territorial determinado, especialmente sobre os atos da comunidade ou moradores, mediante a exigência de entrega de bem móvel ou imóvel, a qualquer título, ou de valor monetário periódico pela prestação de serviço de segurança privada, transporte alternativo, fornecimento de água, energia elétrica, venda de gás liquefeito de petróleo, ou qualquer outro serviço ou atividade não instituída ou autorizada pelo Poder Público, ou constrangendo a liberdade do voto:
Pena – prisão, de quatro a doze anos, sem prejuízo das penas relativas aos crimes cometidos pela organização miliciana.
Circunstância Qualificadora
§ 3º Se a organização é integrada por agentes ou ex-agentes do sistema de segurança pública ou das forças armadas, ou por agentes políticos:
Pena – prisão, de oito a vinte anos.
Causas de aumento
§ 4º A pena é aumentada de um terço até a metade:
I – se a organização criminosa é armada;
II – quando a violência ou grave ameaça recair sobre pessoa incapaz, com deficiência, ou idoso; ou
III – se houver prática de tortura ou outro meio cruel.”

64. CANO, ob. cit., p. 60. A pesquisa revela a ameaça da milícia em recorrer ao Conselho Tutelar para controlar os motivos pelos quais as crianças não estavam frequentando a creche da comunidade.

65. CANO, ob. cit., p. 75-6.

66. Rel. Min. Og Fernandes, 6ª Turma, DJs 30.11.2009.

67. SAVONA, Ernesto U. Study on extortion racketeering: the need for an instrument to combat activities of organized crime. Relatório financiado pela Comissão Europeia, Bruxelas, 13 de janeiro de 2010, p. 18.

68. CANO, ob. cit., p. 60.

69. CANO, ob. cit., p. 76.

70. CANO, ob. cit., p. 62, chama de “mito libertador” a ideia de que a criação da milícia está associada a uma cruzada contra o crime organizado, especialmente contra o tráfico de drogas, que submete à tirania os moradores da favela.

71. CANO, ob. cit., p. 63 e 76.

72. CANO, ob. cit., p. 79.

73. SCHELAVIN, ob. cit., p. 121.

74. Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a Investigar a Ação de Milícias no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, p. 260.

75. CANO, ob. cit., p. 79.

76. CANO, ob. cit., p. 61.

77. CANO, ob. cit., p. 73.

78. Superior Tribunal de Justiça, HC 175139/RJ, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, DJe 13.12.2010.

79. CANO, ob. cit., p. 67 e 68.

80. Superior Tribunal de Justiça, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, DJe 04.04.2011.

81. CANO, ob. cit, p. 70, registra que a pesquisa revelou verdadeira integração e cooperação entre polícia e milícia nas conquistas de territórios que estavam sob o domínio do tráfico.

82. Nesse sentido: ANIYAR DE CASTRO, ob. cit.

83. GRASSO, ob. cit., p. 308.

84. GRINOVER, ob. cit.

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., abr. 2013. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS