A prestação jurisdicional conforme à Constituição

Autor: Clenio Jair Schulze

Juiz Federal, Mestre em Ciência Jurídica

publicado em 30.10.2013


Resumo

O referente deste artigo reside em fixar breves comentários acerca da prestação jurisdicional à luz da Constituição e do Estado Constitucional Democrático. Apresenta-se abordagem dos princípios da vedação de proteção insuficiente e da proibição de excesso, do princípio de proteção da confiança, do princípio da dignidade da pessoa humana, do dever de progresso, da proibição de retrocesso e da eficácia dos direitos fundamentais em relação a terceiros.

Palavras-chave: Jurisdição constitucional. Constituição. Estado Constitucional Democrático.

Abstract

The referent of this article is to fix brief comments about the adjudication in the light of the Constitution and the Democratic Constitutional State. Approach presents the principles of sealing insufficient protection and prohibition of excess, the principle of protection of confidence, the principle of human dignity, duty of progress, the prohibition of retrogression and effectiveness of fundamental rights against third parties.

Keywords: Constitutional jurisdiction. Constitution. Democratic Constitutional State.

Sumário: Introdução. 1 Vedação de proteção insuficiente e proibição do excesso. 2 Proteção da confiança. 3 Dignidade da pessoa humana e mínimo existencial. 4 Dever de progresso e proibição de retrocesso. 5 Eficácia dos direitos fundamentais em relação a terceiros. Conclusão. Referências.

Introdução

O Estado Constitucional Democrático instaurado com a Constituição de 1988 consolidou os direitos fundamentais no sistema jurídico pátrio, permitindo, de forma alvissareira, a intervenção do Poder Judiciário para a proteção e o cumprimento das prestações jurídicas e materiais previstas no texto magno.

Assim, a fim de manter a integridade do direito, que, na perspectiva apontada por Ronald Dworkin,(1) está assentada nos princípios de justiça, equidade e devido processo legal, é indispensável que o Poder Judiciário preste jurisdição adequada às normas encapsuladas na Constituição.

Nesse contexto, pretende-se abordar neste trabalho alguns pressupostos e princípios necessários à prestação jurisdicional, com o fim de cumprir as determinações e as promessas sufragadas no texto constitucional.

1 Vedação de proteção insuficiente e proibição de excesso

O não cumprimento do dever fundamental estatal de prestar a jurisdição com efetividade – apresentando a resposta adequada, tal como exigido pela cláusula prevista no art. 5º, XXXV, da Constituição – configura inconstitucionalidade decorrente da proteção insuficiente.

O Estado possui o dever fundamental de praticar todos os atos necessários a conferir presteza, eficiência e eficácia à tutela jurisdicional, caso contrário haverá “insuficiência de proteção” ou “proibição de déficit” (Untermassverbot).
A vedação de proteção insuficiente é uma decorrência do princípio da proporcionalidade – plasmado implicitamente no art. 5º, LIV, da CF –, que se destina à proteção de um direito fundamental.

José Joaquim Gomes Canotilho afirma que “existe um defeito de protecção quando as entidades sobre quem recai um dever de protecção (Schtzpflicht) adoptam medidas insuficientes para garantir uma protecção constitucionalmente adequada dos direitos fundamentais”.(2)

Para José Carlos Vieira de Andrade, trata-se de princípio de proibição de défice(Untermassverbot) no qual o Estado se obriga a assegurar um nível mínimo adequado de tutela dos direitos fundamentais, responsabilizando-se pelas omissões legislativas que impliquem o não cumprimento dessa imposição constitucional.(3)

José Paulo Baltazar Junior menciona que a proibição de insuficiência encontra fundamento no conteúdo objetivo dos direitos fundamentais.(4) Explica o aludido autor gaúcho:

“Quer dizer, na atual dogmática constitucional, os direitos fundamentais, ao lado da sua clássica função negativa de limitar o arbítrio das intervenções estatais na liberdade, ou seja, da proibição do excesso (Übermassverbot), passaram a desempenhar também o papel de mandamentos de proteção (Schutzgebote) que determina a existência de deveres de proteção jurídico-fundamentais (Gruedrechrliche Schutzpflichten), na terminologia mais aceita, que enfatiza o aspecto da obrigação estatal, ou direitos de proteção jurídico-fundamentais (grundrechtliche Schutzrechten), expressão que dá ênfase ao direito do cidadão, e não ao dever do Estado.”(5)

Assim, cabe ao órgão jurisdicional verificar se há abusividade decorrente da omissão estatal na implementação do direito fundamental ou ao menos no cumprimento de um standard mínimo necessário a satisfazer as normas constitucionais. Esse é o parâmetro de atuação, por exemplo, no controle judicial das políticas públicas – de saúde, educação, previdência social, fomento a cultura, entre outras. Ou seja, a inércia estatal decorrente da ausência do serviço ou da sua prestação ineficiente permite a atuação do Estado-Juiz, que determinará a aplicação e a observância da norma constitucional correlata.(6)

A proibição de déficit não configura meta optata estatal instransponível, devendo ser exercida na medida do possível, pois o Estado também encontra limites nas condições fáticas existentes, na liberdade individual e na sociedade livre e democrática.(7)

Por outras palavras, o dever de atuação do Estado-Juiz materializa-se sempre que a prestação estatal não é cumprida total ou parcialmente em abstrato – perante o legislador – ou em concreto – perante o administrador –, remanescendo à jurisdição a expectativa de realização estatal do conteúdo essencial do direito fundamental do cidadão e da sociedade.

Portanto, a relação entre direitos fundamentais e deveres fundamentais configura uma simbiose em prol do Estado e da sociedade.(8)

De outro lado, o Estado também não pode pecar pelo excesso, ou seja, deve atuar na medida suficiente para cumprir as determinações constitucionais, sem abuso.

Nas palavras de Jorge Reis Novais(9):

“Não há, hoje, controlo judicial das restrições aos direitos fundamentais sem o recurso sistemático, permanente, imprescindível ao princípio da proibição do excesso, nas suas diferentes dimensões, máximas ou subprincípios. Para além de outros requisitos, qualquer restrição ou intervenção restritiva em um direito fundamental só passa o teste de constitucionalidade se se puder sucessivamente demonstrar que é apta para realizar um fim legítimo e de peso superior ao direito fundamental em questão; que é indispensável à realização de tal fim; que não é desproporcionada; que não é desrazoável; que não é indeterminada.”

Verifica-se, assim, que é dever fundamental indissociável da jurisdição evitar o excesso na sua atuação e proteger suficientemente os indivíduos titulares de direitos fundamentais.

2 Proteção da confiança

É impossível imaginar a condução da vida em sociedade sem segurança para a definição de planos e objetivos individuais e coletivos. É nessa perspectiva que o princípio da segurança jurídica tem relevante importância no Estado Constitucional Democrático.

No plano objetivo, a segurança jurídica está consagrada no trinômio direito adquirido, ato jurídico perfeito, coisa julgada(art. 5º, XXXVI, da Constituição).(10) Vincula-se, portanto, às ideias de “estabilidade jurídica, segurança de orientação e realização do direito”.(11)

Contudo, a estabilidade estatal não se conforma apenas com a segurança jurídica na perspectiva objetiva, pois a confiança também constitui meta a ser perseguida pelo Estado.

Assim, no plano subjetivo, a segurança jurídica materializa a proteção da confiança dos indivíduos em relação ao Estado, que “fica vinculado a umdever de boa-fé (ou seja, de cumprimento substantivo, e não meramente formal, das normas e de lealdade e respeito dos particulares)”.(12)

Para José Joaquim Gomes Canotilho, a “protecção da confiança se prende mais com as componentes subjectivas da segurança, designadamente a calculabilidade e a previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos dos poderes públicos”.(13)

O Estado deve estabelecer condições necessárias para que o cidadão deposite confiança nas atitudes estatais, sem desconfiar sobre eventual validade, função e eficácia dos atos.

Em relação aos direitos fundamentais, o princípio da proteção da confiança manifesta-se: a) na generalidade e na abstração das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias; b) na proibição de normas restritivas com efeito retroativo; c) na subordinação de leis que estabeleçam condicionamentos às mesmas normas; d) na necessidade de declaração de estado de sítio para legitimar eventual suspensão de direitos, liberdades e garantias.(14)

O alcance da proteção da confiança é amplo, atingindo todos os agentes públicos, entes e órgãos estatais. Ao Legislativo, impõe o dever de coerência, seriedade e boa-fé em relação à concepção, à votação e à aplicação das leis editadas, sem deixar de observar, ainda, a necessária estabilidade normativa. Em relação ao Executivo, a proteção da confiança exige a transparência e a publicidade, plasmando, ainda, a impossibilidade de adoção inopinada de comportamentos contraditórios no agir da administração.

Por fim, e não menos importante, o Judiciário também é destinatário da proteção da confiança, pois cabe à jurisdição, no plano externo, o controle da sua aplicação pelo Estado-legislador e pelo Estado-administrador e, no plano interno, a consagração do princípio como forma de estabilização das decisões e na ausência de oscilação jurisprudencial. Vale dizer, deve-se prestigiar a durabilidade dos posicionamentos judiciais, evitando modificações rotineiras ao sabor do intérprete-julgador, que possui o dever fundamental de prestar a jurisdição adequada.
Lembra Marinoni que não

“adiantaria ter legislação estável e, ao mesmo tempo, frenética alternância das decisões judiciais. Para dizer o mínimo, as decisões judiciais devem ter estabilidade porque constituem atos de poder. Ora, os atos de poder geram responsabilidade àquele que os instituiu. Assim, as decisões não podem ser livremente desconsideradas pelo próprio Poder Judiciário.”(15)

A proteção da confiança também se conexiona com a vedação de duplicidade de comportamento contraditório (venire contra factum proprium). É dizer, não permite que o Estado – juiz, legislador e administrador – altere, retroativa e inconsequentemente, um posicionamento já consolidado.
O Supremo Tribunal Federal já decidiu que:

“Os postulados da segurança jurídica e da proteção da confiança, como expressões do Estado Democrático de Direito, mostram-se impregnados de elevado conteúdo ético, social e jurídico, projetando-se sobre as relações jurídicas, inclusive as de direito público, sempre que se registre alteração substancial de diretrizes hermenêuticas, impondo-se à observância de qualquer dos Poderes do Estado e, desse modo, permitindo preservar situações já consolidadas no passado e anteriores aos marcos temporais definidos pelo próprio Tribunal.” (MS 26603/DF, Tribunal Pleno, Relator Min. CELSO DE MELLO, j. 04.10.2007)

Ainda, com base na proteção da confiança, o STF tem evitado aplicar retroativamente decisão que reconhece a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, mantendo, ainda, os efeitos produzidos por atos inválidos que tiveram sua vigência prolongada no tempo.(16)

Cabe ao Estado Constitucional Democrático, na perspectiva da segurança jurídica, assegurar ao cidadão a confiança nos seus atos. Há, nesse sentido, o dever fundamental de prestar jurisdição de modo a estabelecer estabilidade nas decisões, sem promover alterações casuísticas, destituídas de base legal e sem o prévio debate público.

3 Dignidade da pessoa humana e mínimo existencial

Outro pressuposto necessário à Jurisdição estatal é a observância da dignidade da pessoa humana, cujo núcleo essencial é a proteção à pessoa humana e encontra assento constitucional nos arts. 1º, 5º, § 3º, e 109, § 5º.

Trata-se de sobreprincípio ou metaprincípio(17) que envolve e norteia todo o sistema jurídico.

Na visão de Luís Roberto Barroso, o princípio da dignidade da pessoa humana é composto de três elementos: valor intrínseco, autonomia e valor social.(18) Segundo o autor carioca, o valor intrínseco distingue a pessoa humana dos outros seres vivos e das coisas, demonstrando que as coisas têm preço e as pessoas têm dignidade, inteligência, sensibilidade e comunicação, e materializa o direito à vida, à igualdade, à integridade física e à integridade moral. A autonomia da vontade, na perspectiva de Barroso,(19) consiste na capacidade de autodeterminação, ou seja, na possibilidade de o indivíduo escolher livremente os rumos da sua vida, sem a intervenção estatal. Por fim, o valor comunitário refere-se à heteronomia, à vinculação das pessoas em relação ao grupo, projetando-se, também, a solidariedade.(20)

A dignidade da pessoa humana precisa ser interpretada em três perspectivas: a) individual, quando o referente é cada pessoa; b) universal, todas as pessoas sem discriminações; e c) no âmbito livre, considerado cada homem como ser autônomo.(21)

A dignidade projeta-se de forma multifacetada, englobando conjuntamente a perspectiva solitária – individual – e a dimensão social – solidária –, e representa, também, a superação da intolerância, da discriminação, da exclusão social, da violência, da impossibilidade de aceitar a pessoa diferente.

É um princípio relativo como qualquer outro, mas contempla um valor fundamental para o sistema jurídico, potencializando os direitos fundamentais e o Estado Constitucional.

Jorge Miranda enumera algumas projeções do princípio da dignidade humana, destacando que:

“a) a dignidade da pessoa humana reporta-se a todas e a cada uma das pessoas e é a dignidade da pessoa individual e concreta; b) a dignidade da pessoa humana refere-se à pessoa desde a concepção, e não só desde o nascimento; c) a dignidade é da pessoa como homem e como mulher; d) cada pessoa vive em relação comunitária, o que implica o reconhecimento por cada pessoa de igual dignidade das demais pessoas; e) cada pessoa vive em relação comunitária, mas a dignidade que possui é dela mesma, e não da situação em si; f) a dignidade determina respeito pela liberdade da pessoa, mas não pressupõe capacidade (psicológica) de autodeterminação; g) a dignidade da pessoa permanece independentemente dos seus comportamentos sociais; h) a dignidade da pessoa exige condições adequadas de vida material; i) o primado da pessoa é o ser, não o ter; a liberdade prevalece sobre a propriedade; j) só a dignidade justifica a procura da qualidade de vida; l) a dignidade de cada pessoa é um prius em relação à vontade popular.”(22)

A maior crítica estabelecida ao princípio da dignidade humana refere-se à sua plasticidade e à sua ambiguidade, que permitem a sua invocação retórica em qualquer situação jurídica.(23)

Assim, o grande desafio da função jurisdicional é estabelecer os limites, a extensão e o alcance da dignidade da pessoa humana, vale dizer, saber quais os fatos jurídicos que autorizam a invocação do princípio para a proteção dos direitos fundamentais.

Nessa perspectiva, a dignidade da pessoa humana não pode ser invocada isoladamente para a resolução de todos os casos sociais, pois não há, in abstrato, a sua prevalência em todo e qualquer confronto fático e jurídico. Servirá como importante parâmetro argumentativo se o princípio estiver acompanhado de outro princípio ou valor constitucional para alicerçar a fundamentação jurídica.

O atual panorama constitucional, que consagrou a estabilidade democrática, jurídica e política produzida após 1988, também exige o cumprimento de condições mínimas de vida em sociedade.

O cidadão possui direito ao mínimo existencial, vale dizer, ao patrimônio mínimo para satisfação dos seus direitos fundamentais primários. Trata-se de princípio constitucional implícito que configura o núcleo essencial dos direitos fundamentais.

O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais fixou uma definição de mínimo existencial, estabelecendo, no art. 11, que os

“Estados-membros do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive a alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim com a uma melhoria contínua de suas condições de vida.”

O conjunto de prestações que envolvem o mínimo existencial pressupõe, ao menos, renda mínima, saúde básica, moradia e educação fundamental. É possível incluir, também, um elemento instrumental, de acesso à justiça, indispensável para a exigibilidade e a efetivação dos direitos materiais.

A estatura constitucional do mínimo existencial já foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, conforme destacado na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 45.(24)

Nesse contexto, a Constituição exige que a jurisdição constitucional seja prestada com a observância da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial.

4 Dever de progresso e proibição de retrocesso

O Estado Constitucional Democrático está assentado em duas vertentes(25): o dever de progresso e a proibição de retrocesso.(26)

O dever de progresso impõe ao Estado o avanço na sua atuação legislativa, executiva e judicial, pois a pretensão estatal não se limita ao já conquistado, contemplando a melhoria qualitativa e quantitativa das prestações materiais e imateriais a implementar em prol da sociedade.

O dever de progresso projeta-se ao futuro e está conectado com o princípio do desenvolvimento encapsulado de forma implícita no artigo primeiro da Constituição da República, porquanto configura manifestação decorrente do Estado Democrático de Direito, e também está contemplado expressamente no artigo terceiro do diploma constitucional ao prever o objetivo fundamental de garantia do desenvolvimento nacional.

A proibição de retrocesso constitui princípio constitucional implícito e vários são os seus fundamentos, a destacar: a) princípio do Estado Democrático e Social de Direito; b) princípio da dignidade da pessoa humana; c) princípio (e dever) da máxima eficácia e efetividade das normas definidoras de direitos fundamentais (art. 5º, § 1º, da CF); d) normas específicas da CF previstas no art. 5º atinentes à segurança jurídica; e) princípio da proteção da confiança; f) a negação da proibição de retrocesso também implicaria a frustração da efetividade constitucional, pois admitiria, equivocadamente, que o legislador infraconstitucional e o poder público em geral pudessem livremente adotar decisões em flagrante desrespeito ao texto da Constituição; g) o sistema de proteção internacional, que impõe a progressiva concretização da proteção social por parte dos Estados soberanos; h) enunciados do art. 3º e do art. 170 da Constituição.(27)

Na perspectiva de Luísa Cristina Pinto e Netto, a vedação de retrocesso possui várias fontes, especialmente o princípio da supremacia da Constituição, o postulado da máxima eficácia das normas de direitos fundamentais, os princípios estruturantes (juridicidade, democracia e socialidade) e a internacionalização dos direitos fundamentais.(28) A mesma autora menciona, ainda, que a aceitação do princípio de proibição de retrocesso encontra guarida na vinculação do legislador aos direitos sociais, destacando a necessidade de ponderação para a hipótese de afastamento da sua aplicação.(29)

Enquanto o dever de progresso mira o porvir, a proibição de retrocesso espelha-se no passado, vedando a redução da atuação estatal benéfica já consolidada socialmente.

O dever de progresso e a proibição de retrocesso estão materializados em várias disposições constitucionais, especialmente naquelas consagradoras de prestações sociais, destacando-se, por exemplo, a seguridade social – na sua tríplice perspectiva: previdência social, saúde e assistência social – (arts. 193-203), a educação (arts. 205-214), a cultura (arts. 215-216), o desporto (art. 217) e o meio ambiente (art. 225).

Ingo Wolfgang Sarlet também destaca que “o dever de progressividade e a proibição de retrocesso (de uma evolução regressiva) constituem, portanto, dimensões interligadas e que reclamam uma produtiva e dinâmica compreensão e aplicação”.(30)

Em resumo, o dever de progresso e a proibição de retrocessodemonstram que não se pode regredir, é preciso sempre mais.

5 Eficácia dos direitos fundamentais em relação a terceiros

A teoria dos direitos fundamentais surgiu como necessidade de imposição de limites à atuação estatal frente aos indivíduos. Atualmente é tranquila, também, a aplicação dos direitos fundamentais nas relações entre particulares, em decorrência da dinâmica da vida em sociedade e da pluralidade de relações sociais.

Tal pensamento foi desenvolvido inicialmente na Alemanha (Drittwirkung) e, após várias fases evolutivas, culminou com admissibilidade da eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais aos particulares,(31) com o fim de equilibrar as regras de direito privado.

É nessa perspectiva que se admite a aplicação dos direitos fundamentais apresentando, na dicção de José Carlos Vieira de Andrade, duas premissas básicas:

“em primeiro lugar, afirma-se que os direitos fundamentais como princípios e valores constitucionais não podem deixar de aplicar-se em toda a ordem jurídica e, portanto, também nas áreas do direito privado (princípio da unidade do ordenamento jurídico); em segundo lugar, põe-se em relevo a necessidade de protecção dos particulares não apenas perante o Estado, mas também, por meio do Estado, perante outros particulares, pelo menos, perante indivíduos ou entidades privadas que sobre eles exercem ou estão em condições de exercer verdadeiros poderes, jurídicos ou de facto.”(32)

Por isso, também é dever fundamental do Estado-Juiz fomentar o respeito dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares.
Na lição de José Carlos Vieira de Andrade:

“o homem individual, destinado ou condenado a viver em comunidade, tem também deveres fundamentais de solidariedade para com os outros homens e para com a sociedade, obrigando-se a suportar as restrições e as compreensões indispensáveis à acomodação dos direitos dos outros e à realização dos valores comunitários, ordenados à felicidade de todos.”(33)

Nesse contexto, é possível afirmar, ainda, que os direitos fundamentais encontram suporte no princípio da dignidade da pessoa humana, ao passo que os deveres fundamentais fundam-se na solidariedade, cabendo ao Estado o dever de proteção dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares – perante terceiros.

Conclusão

Ronald Dworkin afirma que os direitos fundamentais constituem trunfos políticos titularizados pelos indivíduos.(34)

Invocando a mesma metáfora, Jorge Reis Novais assegura que “ter um direito fundamental, em Estado de Direito, equivale a ter um trunfo em um jogo de cartas”, em que “o outro ‘jogador’ é o Estado” – e os direitos fundamentais são situações jurídicas individuais em face ao Estado –, razão pela qual titularizar um direito fundamental significa possuir um trunfo contra o próprio Estado.(35)

Nesse contexto, a jurisdição configura o meio mais adequado para superar o constitucionalismo débil(36) ou o constitucionalismo tardio, adequando a estrutura estatal às necessidades individuais e sociais. Ou, como menciona José Carlos Vieira de Andrade, “a concepção do Estado-prestador, associada aos direitos sociais, abriu caminho para a concepção do Estado-amigo dos direitos fundamentais ou, pelo menos, do Estado responsável pela sua garantia efectiva”.(37)

As considerações acima apresentadas demonstram que a missão do Judiciário é corrigir os erros do passado e projetar as perspectivas estatais para o futuro, com o fim de construir a sociedade justa e solidária, nos termos propostos pelo art. 3º, I, da Constituição da República.(38)

Trata-se, nos dizeres de Jorge Reis Novais, da “consagração da jurisdição constitucional como verdadeiro coroamento do Estado de Direito, a chamada transição do Estado de legislação para o Estado de jurisdição”.(39)

A Constituição funciona como a “carta de navegação de um país”(40) e sua função é a de construção do “melhor dos mundos possíveis”.(41)

Assim, cabe ao Estado-Juiz cumprir sua missão com efetividade, observando seus deveres fundamentais em prol dos indivíduos, protegendo-os de forma suficiente, sem excesso e sem retrocesso, mediante a prestação jurisdicional justa e adequada.

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Notas

1. O Império do Direito. Traduzido por Jefferson Luiz Camargo. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 271 e seguintes.

2. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. 6. reimp. Coimbra: Almedina, 2003. p. 273.

3. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. p. 140.

4. Crime organizado e proibição de insuficiência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 52.

5. Crime organizado e proibição de insuficiência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 52.

6. O Supremo Tribunal Federal já aplicou o princípio de vedação de proteção insuficiente no julgamento do RE 418.376-5, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão de 09.02.2006. No caso, ficou afastada a possibilidade de excluir a sanção penal do tutor que manteve relações sexuais com a tutelada menor de idade, que engravidou aos doze anos, quando ficou formalizada união estável entre a vítima e o acusado. O tribunal negou a extinção da punibilidade prevista no art. 107, VII, do Código Penal, vigente à época dos fatos. Colhe-se a seguinte passagem do voto: “De outro modo, estar-se-ia a blindar, por meio de norma penal benéfica, situação fática indiscutivelmente repugnada pela sociedade, caracterizando-se típica hipótese de proteção insuficiente por parte do Estado, em um plano mais geral, e do Judiciário, em um plano mais específico. [...] Quanto à proibição de proteção insuficiente, a doutrina vem apontando para uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado) já consagrado pelo princípio da proporcionalidade. A proibição de proteção insuficiente adquire importância na aplicação dos direitos fundamentais de proteção, ou seja, na perspectiva do dever de proteção, que se consubstancia naqueles casos em que o Estado não pode abrir mão da proteção do direito penal para garantir a proteção de um direito fundamental. [...] Conferir à situação dos presentes autos o status de união estável, equiparável a casamento, para fins de extinção da punibilidade (nos termos do art. 107, VII, do Código Penal) não seria consentâneo com o princípio da proporcionalidade no que toca à proibição de proteção insuficiente. Isso porque todos os Poderes do Estado, dentre os quais evidentemente está o Poder Judiciário, estão vinculados e obrigados a proteger a dignidade das pessoas”.

7. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. p. 140.

8. Crime organizado e proibição de insuficiência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 61.

9. Direito fundamentais: trunfos contra a maioria. Coimbra: Coimbra, 2006. p. 101.

10. Na perspectiva de Jorge Miranda, a proteção da confiança contempla os seguintes predicados: “– Certeza, como conhecimento exacto das normas aplicáveis, da sua vigência e das suas condições de aplicação; – Compreensibilidade, como clareza das expressões verbais das normas e susceptibilidade de compreensão pelos seus destinatários médios; – Razoabilidade, como não arbitrariedade, adequação às necessidades colectivas e coerência interna das normas; – Determinabilidade, como precisão, suficiente fixação dos comportamentos dos destinatários, densificação de conteúdo normativo; – Estabilidade, como garantia de um mínimo de permanência das normas, por uma parte, e garantia de actos e de efeitos jurídicos produzidos, por outra parte; – Previsibilidade, como susceptibilidade de se anteverem situações futuras e susceptibilidade de os destinatários, assim, organizarem as suas vidas” (Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra, 2000. Tomo IV. p. 272-273).

11. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 257.

12. MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra, 2000. Tomo IV. p. 274.

13. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 257.

14. MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra, 2000. Tomo IV. p. 278-279.

15. Os precedentes na dimensão da segurança jurídica. Revista jurídica, n. 398, p. 33, dez. 2010.

16. Duas decisões representam este posicionamento. A primeira refere-se ao caso do estudante que se transferiu da Universidade Federal de Pelotas para a UFRGS com base em decisão liminar e em razão da sua aprovação em concurso público da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT. A sentença de procedência foi reformada quando o autor da ação estava concluindo o curso universitário, situação que ensejou a concessão de efeito suspensivo, pelo STF, a fim de permitir a colação de grau (DJU 4 jun. 2003, QO na Pet 2.900/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes). O segundo pode ser lido na seguinte ementa: Mandado desegurança. 2. Acórdão do Tribunal de Contas de União. Prestação de Contas da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária – Infraero. Emprego Público. Regularização de admissões. 3. Contratações realizadas em conformidade com a legislação vigente à época. Admissões realizadas por processo seletivo sem concurso público, validadas por decisão administrativa e acórdão anterior do TCU. 4. Transcurso de mais de dez anos desde a concessão da liminar no mandado de segurança. 5. Obrigatoriedade da observância do princípio da segurança jurídica como subprincípio do Estado de Direito. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 6. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica e sua aplicação nas relações jurídicas de direito público. 7. Concurso de circunstâncias específicas e excepcionais que revelam a boa-fé dos impetrantes; a realização de processo seletivo rigoroso; a observância do regulamento da Infraero, vigente à época da realização do processo seletivo; a existência de controvérsia, à época das contratações, quanto à exigência, nos termos do art. 37 da Constituição, de concurso público no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista. 8. Circunstâncias que, aliadas ao longo período de tempo transcorrido, afastam a alegada nulidade das contratações dos impetrantes. 9. Mandado de Segurança deferido” (DJU, 5 nov. 2004, MS 22.357/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes).

17. MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 4. ed. Tomo IV. Coimbra: Coimbra, 2008. p. 200.

18. A dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional contemporâneo: natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação.Versão provisória para debate público. Mimeografado, dez. 2010. Disponível em: <http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/uploads/2010/12/Dignidade_texto-base_11dez2010.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2011. p. 21.

19. A dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional contemporâneo: natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dez. 2010. Disponível em: <http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/uploads/2010/12/Dignidade_texto-base_11dez2010.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2011. p. 23.

20. A dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional contemporâneo: natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dez. 2010. Disponível em: <http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/uploads/2010/12/Dignidade_texto-base_11dez2010.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2011. p. 27.

21. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. p. 97.

22. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra, 2000. Tomo IV. p. 199.

23. Tal perspectiva levou Ruth Macklin a reconhecer a inutilidade do conceito, in Dignity is a useless concept. British Medical Journal, 327:1419, 2003, apud A dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional contemporâneo: natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dez. 2010. Disponível em: <http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/uploads/2010/12/Dignidade_texto-base_11dez2010.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2011. p. 09.

24. A decisão foi proferida monocraticamente pelo Min. Celso de Mello (publicada no Diário da Justiça em 04 maio 2004), e a ementa pode ser assim resumida: “ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ‘RESERVA DO POSSÍVEL’. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO ‘MÍNIMO EXISTENCIAL’. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO)”.

25. De regra, os doutrinadores não estabelecem a diferença entre os dois princípios. Luísa Cristina Pinto e Netto menciona, em trabalho monográfico, que o princípio de vedação de retrocesso está fundado na “ideia de um progresso constante” e que não admite “marcha atrás na consagração e na efetivação dos direitos fundamentais” (O princípio de proibição de retrocesso social. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 111). Contudo, parece ser mais adequada a separação, pois o progresso está assentado no avanço, na melhoria, ao passo que a vedação de retrocesso está cumprida com a simples manutenção do status quo.

26. O Superior Tribunal de Justiça já invocou o princípio de vedação de retrocesso (REsp 567.873-MG, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 25.02.2004), reconhecendo a ilegitimidade da supressão da isenção do IPI para a aquisição de automóveis por parte de portadores de necessidades especiais.

27. Nesse sentido: SARLET, Ingo Wolfgang. Segurança social, dignidade da pessoa humana e proibição de retrocesso: revisitando o problema da proteção dos direitos fundamentais sociais. In: CANOTILHO, J.J. et al. (coord.). Direitos Fundamentais Sociais. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 75-109.

28. O princípio de proibição de retrocesso social. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 129.

29. Op. cit., p. 167.

30. Op. cit., p. 84.

31. São quatro as teorias sobre a eficácia dos direitos fundamentais relativamente a terceiros: (a) a tese da recusa da eficácia; (b) a tese da eficácia mediata ou indireta; (c) a tese dos deveres de proteção; e (d) a tese da eficácia direta e imediata, mais adequada e atualmente mais aceita pela doutrina e pela jurisprudência.

32. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. p. 235.

33. Ibidem,p. 80.

34. Levando os direitos a sério. Traduzido por Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. XV.

35. Direitos fundamentais: trunfos contra a maioria. Coimbra: Coimbra, 2006. p. 17.

36. NOVAIS, Jorge Reis. Direitos fundamentais: trunfos contra a maioria. Coimbra: Coimbra, 2006. p. 37.

37. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. p. 139.

38. “Enquanto antigamente o juiz era chamado sobretudo para decidir com o olhar voltado para o passado – de modo, pode-se dizer, ‘retrospectivo’ –, hoje é frequentemente chamado a escolher, relativamente às possíveis alternativas que lhe são explicitamente deixadas abertas, aquela que melhor se presta a satisfazer os objetivos prefixados no horizonte constitucional. Assim, transfere-se para o juiz a responsabilidade de considerar as possíveis soluções alternativas, de imaginar as suas respectivas consequências, de avaliá-las e, enfim, tomar uma decisão com o olhar constantemente voltado para o futuro. Ou seja, usa-se uma lógica ‘prospectiva’ e, sem dúvida, similar àquela que é considerada como própria aos outros poderes políticos.” FACHINI NETO, Eugênio. O Judiciário no mundo contemporâneo. Juris Plenum, a. V, n. 26, p. 55, mar. 2009.

39. Direito fundamentais: trunfos contra a maioria. p. 38.

40. NINO, Carlos Santiago. Fundamentos del Derecho Constitucional: analisis filosófico, jurídico y politológico de la prática constitucional. Buenos Aires: Ástrea, 1992. p. 1.

41. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 4. ed. Almedina: Coimbra, 2009. p. 52.

 


Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023:2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., out. 2013. Edição especial 25 anos da Constituição de 1988. (Grandes temas do Brasil contemporâneo). Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS