Justiça também se faz com literatura
O acesso ao livro – um direito cultural

Autora: Marga Inge Barth Tessler

Desembargadora Federal, Mestre em Direito pela PUC/RS

 publicado em 18.12.2013



Sumário: Introdução. 1 As leituras da adolescência. 1.1 A produção de sentidos. 2 As leituras eternas, especiais. 3 Bibliotecas ajudam a viver. 3.1 Livros eternos – os clássicos: ler e reler. 4 O livro-papel e a “era digital”. 5 Recomendação para iniciar com os clássicos. 6 No gênero das biografias. 6.1 Os livros de relevância histórica. 6.2 Os poetas. 6.3 No gênero da ficção científica. 6.4 - Os “livros de cabeceira”. 6.5 O que está lendo. 6.6 O que gostaria de reler. 7 O direito fundamental à cultura: cultura, um conceito abrangente. 7.1 A cultura nas Constituições. 7.2 A proteção e a promoção dos bens culturais. 7.3 O que é literatura. 7.4 Direito e literatura. 7.4.1 Julgamento jurídico e julgamento estético. Conclusão.

Introdução

Distinguida com o convite das ilustres professoras Patrícia Aurélia Del Nero, Paula Andrea Forgioni e Samantha Ribeiro Meyer-Pflug para colaborar em obra coletiva em homenagem ao Desembargador Newton De Lucca, expresso a minha satisfação e o meu encantamento, pois dedico grande admiração ao ilustre magistrado e professor emérito. Há mais de uma década assisti a uma conferência proferida pelo Desembargador Newton De Lucca sobre temática consumerista. A exposição foi clara e elegante. Passados tantos anos, não me lembro do local do evento, de que entidade o teria promovido e sequer de quem teriam sido os demais expositores. Permanece, contudo, firme na minha memória a citação poética que serviu de fecho à preleção. Revelou-se um admirador da poesia, citando, de Álvares de Azevedo:

“Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
Foi poeta – sonhou – e amou na vida.”(1)

O verso é também o meu preferido da romântica e desesperada produção literária de Álvares de Azevedo. Tenho-o sublinhado no amarelecido livro de estudos do secundário, copiado e recopiado muitas vezes. Impactada, identifiquei um companheiro de jornada poética e passei a acompanhar as suas produções acadêmicas, a sua trajetória profissional, sempre ao longe e sem a oportunidade de um contato pessoal, o que só ocorreu quando exercemos cargos de direção nos tribunais federais. Confirmei então aquela antiga impressão: o estimado colega tem uma refinada bagagem de leituras. Ao surgir o convite antes mencionado, pensei ser de grande valia para todos os alunos, amigos e admiradores do Desembargador Newton De Lucca conhecer um pouco mais sobre as suas preferências literárias, as leituras marcantes em sua trajetória de vida. Todos ficaríamos certamente enriquecidos ao compartilhar as experiências literárias do estimado colega. Por outro lado, o mundo jurídico e o das letras têm inúmeros pontos de contato, e as leituras dão sentido ao mundo vivido.

Recentemente, em novembro de 2010, no I Encontro do Fórum Nacional do Judiciário para resolução de demandas de assistência à saúde, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça, mais uma vez, o ilustre homenageado colaborou de forma decisiva para a compreensão sobre um dos temas centrais de sua contribuição acadêmica, a Ética.(2) Introduziu a sua fala desejando que a “acrasia ética reinante na sociedade brasileira seja progressivamente substituída por uma inabalável profissão de fé na transcendente dignidade da pessoa humana”. Citou, jogando em cena, em efeito performático, os versos de Dante,(3) extraídos da Divina Comédia: “Considerai a vossa procedência: não fostes feitos para viver quais brutos, mas para buscar virtude e sapiência”. Ainda, Dalai Lama: “Se você quer transformar o mundo, mexa primeiro em seu interior”. E Mahatma Gandhi: “Nunca perca a fé na humanidade, pois ela é como um oceano. Só porque existem algumas gotas de água suja nele, não quer dizer que ele esteja sujo por completo”. Emprestando tom poético à exposição, lembrou João Cabral de Melo Neto(4):

“Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
[...]
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo entre todos os galos.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretecendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.”

Pura poesia, dinamizada pela voz, e é nessa perspectiva que se pode afirmar que na leitura dos textos dos quais extraímos alegria e reflexão está parte da nossa alma.(5) Segundo Pessoa,(6) “a alma é literatura e tudo acaba em nada e verso”.

Conhecer os livros que moldaram essa “alma literária”, eis o primeiro objetivo. Decidido o que buscaria para homenagear o nosso estimado colega Desembargador Newton De Lucca, enviei-lhe um pequeno questionário, que foi pacientemente respondido e é a base para a construção do texto. Conhecer que livros forjaram o jurista, inspiraram-no e inquietaram-no. Algumas das obras me eram desconhecidas – procurei lê-las e, de algumas, fazer breve referência, tendo como escopo também incentivar a sua leitura. Ao fim, arremato este estudo com uma contribuição sobre os direitos culturais e o acesso ao livro, procurando fazer o elogio da leitura e da escrita, destacando a utilidade da literatura para a compreensão da ciência jurídica, pois “todas as ciências estão presentes no monumento literário”.(7) O estudo pretende oferecer, assim, uma contribuição à temática de Direito e Literatura, vertente que não é nova, mas ainda não desfruta do destaque merecido.

1 As leituras da adolescência

“Ler era a melhor maneira de sonhar.”

Ao responder sobre as leituras da infância e da adolescência, o Desembargador Newton De Lucca refere ter sido esse o período em que pôde exercer o doce direito de sonhar: “Ler, para mim, era a melhor maneira de sonhar”.

Confessa a característica de um “leitor voraz”, assim se situando dentro do mundo e assumindo um papel diante da História. Agradece à generosidade dos pais, pois permitiram-lhe viver apenas como estudante e só começar a trabalhar quando já estava na faculdade. Destaca o professor de Português e Literatura Antônio Salles, do Curso Clássico do Colégio Rio Branco. O mestre teve muita influência sobre a formação cultural do nosso homenageado. Leu então Dante,(8) Camões,(9) Fernando Pessoa,(10) Bocage,(11) Baudelaire,(12) Olavo Bilac,(13) Álvares de Azevedo, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto,(14) entre os poetas; entre prosadores, José de Alencar,(15) Machado de Assis,(16) Hermann Hesse, Sartre e “tudo o que vinha às mãos”.

1.1 A produção de sentidos

Não há dúvidas sobre a importância da leitura em nossas vidas, sobre a necessidade de cultivar o hábito da leitura em qualquer idade. Trata-se de uma atividade de produção de sentido, que reforça o papel do leitor como construtor do sentido.(17) Nessa linha, com a introdução da leitura, da literatura infantil e juvenil, há uma construção prospectória, a criança e o jovem partem do mundo da leitura para a leitura do mundo e provavelmente seguirão com o hábito por toda a vida.(18)

Rubem Alves, emérito educador, refere que “o meu mundo seria muito pobre se em mim não estivessem os livros que li e amei”.(19)

Sobre esse “hábito da leitura”, que De Lucca deve aos pais, ao seu espírito sonhador e ao incentivo de um excelente professor de literatura, percebemos a importância dos incentivadores, dos professores ou mediadores de leitura. Há coincidência com o que nos revelou Pablo Neruda, na obra Confesso que vivi,(20) ao registrar a sua gratidão a Gabriela Mistral, quando era diretora de uma escola: “Poucas vezes a via – mas o bastante para cada vez sair com alguns livros que me presenteava. [...] Gabriela me iniciou nessa séria e terrível visão dos novelistas russos [...]”. Já Alberto Manguel, na obra Uma história da leitura,(21) refere: “Em todas as sociedades letradas, aprender a ler tem algo de iniciação, de passagem ritualizada para fora de um estado de dependência e comunicação rudimentar”. A revelação feita por Moacyr Scliar, em entrevista no Tribunal Regional Federal da 4ª Região(22) – “o hábito da leitura devo a minha mãe”, pois, “em um cotidiano modesto de imigrantes despossuídos, permitia regularmente a compra de um livro” –, reforça a ideia da importância do incentivo de pais e mestres.

Crianças e leituras são um bom início para uma vida mais rica. Monteiro Lobato(23) afirmou que “ainda acabo fazendo livros onde as nossas crianças possam morar”.

Edgar Morin,(24) na autobiografia Meus demônios, ao relembrar as leituras da juventude, refere: “Um livro importante revela-nos uma verdade ignorada, escondida, profunda [...] e causa-nos um duplo encantamento: o da descoberta de nossa verdade, na descoberta de uma verdade exterior a nós [...]”.

Hugo de São Vítor, Mestre Hugo,(25) no Didascálicon: da arte de ler: “A leitura, portanto, é o começo do saber. O bom aluno ouve com prazer todos, lê tudo, não despreza escrito algum, pessoa alguma [...] nenhum texto há que não tenha algo a ser aproveitado, quando é lido no tempo e no modo apropriado”. Justamente o que se revelou na trajetória do nosso estimado De Lucca.

A experiência comprova que apreendemos melhor quando envolvemos também a emoção. Para o filósofo Guillermo Hoyos Vásquez,(26) a literatura amplia os nossos horizontes, proporciona compreensão e compaixão. Já Jorge Volpi(27) vê na leitura de ficção uma máquina de emoções. Hermann Hesse,(28) em troca de correspondência com Thomas Mann (A montanha mágica), em diversas passagens refere-se aos livros. Destaco: “Cada livro que lemos movimenta a nossa bússola interior”; “Quem no mundo imortal dos livros se sente, por assim dizer, em casa estabelece uma nova relação com o conteúdo e com os livros em si mesmos”; “Por que não podemos conversar com nossos livros? Não raro são eles tão inteligentes quanto as pessoas e respeitam mais a nossa liberdade”.

2 As leituras eternas, especiais

“Já devo ter lido três ou quatro vezes e acho que o farei ainda mais algumas antes de morrer.”

Indagado sobre os livros que deram sentido ao seu mundo, diz que foram muitos: “Algumas obras tiveram um sentido especial”. Os poetas sempre o impressionaram. Bem por isso já se disse que “poetas são ladrões de fogo”. Na adolescência: Dom Casmurro e Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis; O lobo da estepe, de Hermann Hesse;(29) Confissões, de Santo Agostinho;(30) Crime e castigo, de Dostoiévski;(31) alguns sermões do Padre Antônio Vieira, em especial, o Sermão da Sexagésima; Mais que um carpinteiro, de Josh McDowell;(32) O espírito das leis, de Montesquieu; A ética protestante e o espírito do capitalismo, de Max Weber. Discursos de Ruy Barbosa, em especial a Oração aos moços, tendo-o destacado como “o mais primoroso que li em minha vida”; Reflexões sobre a vaidade dos homens, de Matias Ayres;(33) e A República, de Platão.(34)

3 Bibliotecas ajudam a viver(35)

“Sim, sempre tive um grande amor por eles, pois me ajudaram positivamente a viver...”

Perguntado se coleciona livros, diz de seu grande amor por eles. “Não posso dizer que tenho uma grande biblioteca, mas, mesmo modesta, acha-se no momento tripartida” – na casa de Campos do Jordão, os livros de filosofia e literatura, e os de Direito, uma parte em sua residência e outra no Tribunal Regional Federal da 3ª Região – “foi o jeito que encontrei de acomodá-los razoavelmente”.

A ideia de que o livro e a biblioteca ajudam a viver foi expressada por diversos bibliófilos. Óssip Mandelstam,(36) no Rumor do tempo e a viagem à Armênia, no capítulo “O armário de livros”, descreve assim a biblioteca do pai na casa de madeira na cidade de Riga: “[...] um envidraçado armário de livros fechado por uma cortina de tafetá verde. É desse depósito de livros que quero falar. Um armário de livros em tenra infância é companheiro do homem para toda a vida”. Jorge Luis Borges,(37) na autobiografia Família, relata os acontecimentos mais importantes de sua infância e refere:

“Se me pedissem para nomear o acontecimento mais importante de minha vida, eu diria a biblioteca de minha vida, eu diria a biblioteca do meu pai. Na realidade, às vezes penso que nunca me perdi daquela biblioteca. Ainda posso descrevê-la. Ficava em uma sala só para ela, com prateleiras envidraçadas, e devia conter vários milhares de volumes.”

Moacyr Scliar, o imortal gaúcho, na crônica Ler faz bem à saúde, responde:(38) “Em uma entrevista recente, a jornalista perguntou a este notável neurocientista [...] Ivan Izquierdo qual a melhor forma de manter o cérebro ativo. Ivan Izquierdo foi taxativo: a leitura. [...] Em primeiro lugar, que a gente leia coisa interessante [...]”. Na crônica Literatura como tratamento, Scliar diz: “Toda pessoa se beneficiará do ato de ler e de escrever. É terapia, sim, e é terapia prazerosa, acessível a todos. O que, em nosso tempo, não é pouca coisa”.

Ray Bradbury,(39) autor de Fahrenheit 451,(40) no posfácio, conta que escreveu o romance na Biblioteca da Universidade da Califórnia: “eu ficava zanzando pela biblioteca. Ali eu vadiava perdido de amor, andando pelos corredores e percorrendo as estantes, tocando os livros, tirando-os das prateleiras, virando as páginas [...] afogando-me em todas as coisas boas que constituem a essência das bibliotecas”.

A propósito, o romance é uma grande homenagem ao livro e ao leitor e oferece um exemplo de uma política pública em um estado totalitário que proíbe a leitura de livros. É criada uma sociedade secreta chamada de “pessoas-livro”, em que as pessoas decoram os clássicos que seriam queimados para guardar o conhecimento. O fim dos livros, na referida obra ficcional, resulta na perda das emoções. As pessoas tomam comprimidos e assistem à televisão. Os leitores são delatados por parentes e vizinhos.

3.1 Livros eternos – os clássicos: ler e reler

A volta ao texto, a releitura dos “livros eternos”, configura a presença de um clássico. Italo Calvino(41) os define como aqueles livros dos quais se ouve dizer “estou relendo”, e nunca “estou lendo”. Seriam aqueles livros que nunca terminaram de dizer aquilo que tinham para dizer. São livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado.

O encontro com bibliotecas, verdadeiros templos, é refúgio durante a jornada. Para Jorge Luis Borges, a biblioteca era uma espécie de paraíso, que recebeu quando já estava cego. Compôs então o lindo “poema dos dons”,(42) dizendo que, por ironia de Deus, recebeu a cidade de livros quando seus olhos não tinham a luz e só podiam ler nas bibliotecas dos sonhos. William Joyce, nos Fantásticos livros voadores de Modesto Máximo,(43) concretiza a ideia de Lobato, de fazer livros onde as crianças possam morar, construindo a fábula em que o menino é levado por um furacão a uma imensa biblioteca onde passa a morar. Temos A menina que roubava livros, de Markus Zusak;(44) e O mundo de Sofia, de Jostein Gaarder.(45) A fantástica biblioteca imaginada por Umberto Eco(46) em O nome da rosa. Bibliotecas reais, imaginárias ou históricas perpassam o tempo. Consta ser a mais antiga a de Alexandria, que teria entre 400.000 e 700.000 rolos de papiro.

Aristóteles teria tido uma biblioteca, também Polícrates de Sámos. Os reis de Pergamon também formaram uma grande biblioteca, com acervo de 200.000 volumes, que teriam sido presenteados a Cleópatra por Marco Antônio. Em Roma, havia bibliotecas particulares, e Júlio César pretendia instituir uma biblioteca pública.

Voltando a Italo Calvino, recomenda que – para ler os clássicos – devemos definir “de onde” eles estão sendo lidos, caso contrário, tanto o livro quanto o leitor se perderiam no atemporal. O rendimento máximo da leitura deles advém para aquele que sabe alterná-lo com a leitura de atualidades em uma “sábia dosagem”. E não se pense que os clássicos devem ser lidos porque “servem” para alguma coisa. A única razão é que é melhor ter lido os clássicos do que não o ter feito. Termina por contar sobre o julgamento de Sócrates: enquanto era preparada a cicuta, Sócrates aprendia uma ária com a flauta. “Para que lhe servirá?” Teria respondido: “Para aprender esta ária antes de morrer”.

4 O livro-papel e a “era digital”

“Adoro aquele cheirinho de livro novo.”

“Adquiri a mania de grifar os trechos que mais me impressionam.”

Indagado se dispensaria o livro-papel para ingressar na “era digital”, afirma que não dispensaria o livro de papel, pois adora o cheiro do livro novo. Em viagens, os tablets permitem portar uma biblioteca, o que seria maravilhoso.
Não tinha coragem de marcar ou destacar trechos no corpo do livro, pois “julgava ser uma espécie de agressão à brancura e à leveza do papel”. Após, adquiriu o hábito de grifar os trechos que mais o impressionavam.

5 Recomendação para iniciar com os clássicos

“Acho que sempre é bom começar pelos gregos.”

Sobre os clássicos e uma recomendação para iniciar leituras, manifesta, inicialmente, prudência, mas pensa que seria adequado começar pelos gregos.

Sobre o aprender a fazer escolhas, Harold Bloom(47) refere que quem lê tem de escolher, pois não há, literalmente, tempo suficiente para ler tudo.

Entre os gregos, o Professor De Lucca sugere a vida de Sócrates,(48) que seria um paradigma, seja pelos Diálogos de Platão,(49) seja por Xenofonte,(50) e, para um primeiro contato com a filosofia, Aristóteles, na Ética a Nicômaco(51) e na Política, que seriam imperdíveis. O Diálogo sobre a amizade, de Cícero, seria indispensável. De Descartes, o Discurso sobre o método; Cervantes, com Dom Quixote de la Mancha. O sistema da vida ética, de Hegel. De Kant, a Fundamentação da metafísica dos costumes, a Paz perpétua e outros opúsculos.

O Professor De Lucca aconselha que, caso haja o propósito de um aprofundamento em alguma temática, as leituras devem ser em maior número. Exemplifica que, para elaborar o seu último livro, Da ética geral à ética empresarial,(52) com o qual conquistou a condição de Professor Titular da Faculdade de Direto da Universidade de São Paulo, na vaga deixada pelo Professor Fábio Konder Comparato, percorreu as obras de mais de vinte autores que trouxeram as maiores contribuições na matéria.

6 No gênero das biografias

De senectude, de Norberto Bobbio, é um desses livros que fazem a gente chorar”.

No gênero das biografias, o Desembargador Newton De Lucca destaca a de Bertrand Russel, autobiografia escrita com mais de noventa anos de idade, em que o autor propõe um código de conduta baseado em dez princípios, o primeiro dos quais é não termos a certeza de absolutamente nada. Destaca, também, o conjunto da obra de Bobbio,(53) em especial De senectute,(54) que seria um dos livros “que fazem a gente chorar”. Já outros esclarecem sobre muita bobagem que se ouve. Cita o livro de memórias de Carlos Alves de Souza,(55) antigo oficial da Marinha brasileira, intitulado Um embaixador em tempos de crise.

Na sua autobiografia, Diário de um século, Bobbio, no capítulo que denominou “Pré-história”, lembra que

“a paixão pela leitura começou tarde, mas logo se tornou intensa e onívora. Dela ficaram os traços nos elencos dos livros que eu lia a cada mês, anotados nas páginas do receituário do meu pai [...]. Dezoito livros em trinta dias [...] entre os quais também as poesias de Geraldy, um autor francês que agradava aos apaixonados [...] como testemunha da dispersiva variedade de interesses, típica do leitor voraz. [...] Nunca fui grande leitor de romances. Li muito Balzac porque em nossa casa de campo tínhamos a edição da ‘Pleiade’ [...] que eram leituras obrigatórias, li de Stendhal a Flaubert, de Dostoiévski a Tolstoi. O autor de quem li quase a obra completa em diferentes períodos de minha vida [...] foi Thomas Mann(56) [...]. Como esquecer A montanha mágica [...].”

6.1 Os livros de relevância histórica

Entre livros com relevância histórica, o Professor De Lucca recomenda, dos muitos que julga importantes para o conhecimento do Brasil, Raízes do Brasil,(57) de Sérgio Buarque de Holanda; Evolução política do Brasil(58) e História econômica do Brasil,(59) de Caio Prado; Formação econômica do Brasil”,(60) de Celso Furtado; e Fábio Konder Comparato.

6.2 Os poetas

“Confesso ter várias oitavas de Os Lusíadas decoradas desde a infância.”

Entre os poetas preferidos, o Professor De Lucca cita Camões, de cuja obra tem oitavas decoradas desde a infância. Fernando Pessoa, Bocage, Valéry, Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé. Dante Alighieri e Marinetti na Itália. Schiller e Goethe na Alemanha. Seféris e Kaváfis na Grécia Moderna. Maiakóvski, Pasternak(61) e Khliébnikov na Rússia; Neruda no Chile. No Brasil, a lista é muito grande, mas cita apenas Augusto dos Anjos, Castro Alves,(62) Olavo Bilac, Álvares de Azevedo, Manuel Bandeira, Mario Quintana, Murilo Mendes, João Cabral de Melo Neto, José Paulo Paes e o maior, Carlos Drummond de Andrade.

Sobre a poesia, refletiu Hermann Hesse(63):

“A poesia cria um mundo mágico, onde se reúne o que era inesperado, onde o impossível se torna realidade. A este espaço imaginário e irreal corresponde o tempo da poesia, do mito, da lenda, um tempo contrário ao calendário e à história, porém comum às sagas e lendas de todos os povos e de todos os poetas e, por mais rara que se tenha tornado a verdadeira magia, o certo é que ela vive hoje ainda na arte.”

Sobre a capacidade de entender a poesia: “quem não tem capacidade de entender o sentido da poesia não perceberá, mesmo ao ler boa prosa, o alto valor e encanto da linguagem”.

É definitivamente reconhecer, como fez Brodsky,(64) ao analisar a trajetória da poetisa Anna Akhmatova, que há períodos da história em que só a poesia é capaz de lidar com a realidade, transformando-a em algo compreensível, acalentando laços humanos, cortados pela violência, em especial, daqueles submetidos a regimes totalitários.

O verdadeiro poeta é aquele que vê as coisas na transparência de sua pureza e de sua beleza originárias, aquelas que só os olhos da alma descobrem e que só a capacidade criadora da fantasia pode revelar, enfim, o poeta tem a alma pura apoderada pelas musas, segundo Sócrates, em Fédon, de Platão. Segundo Theodor Adorno,(65) todavia, “depois de Auschwitz já não se pode fazer poesia”.(66)

Volto sempre a Pessoa,(67) para lembrar que a literatura, e a poesia especialmente, se situam na dimensão lunar da alma humana, lá na imaginação onde “Chove ouro baço, mas não no lá-fora... É em mim... Sou a Hora [...]”.(68) Chove ouro na imaginação dos poetas, e só os deuses da imaginação, perdidos porque não creem, sonham. “É por mim que, quando criança, sonhaste aqueles sonhos que são brinquedos [...]”. “Sou o espírito que cria sem criar [...]”. “Deus criou-me para que eu o imitasse de noite”. “Queria compreender tudo, saber tudo, realizar tudo, sofrer tudo. Mas nada disso faço”. “A minha vida é um sonho [...]”. “O poeta é um fingidor. Finge tão completamente [...]”.  “Sinta quem lê [...]”.(69)

Já para Rilke,(70) em A nona elegia, os poetas são “mestres corruptores das coisas torturadas que o utilitarismo transforma em um ‘fazer sem imagem’”.

6.3 No gênero da ficção científica

“Confesso nunca ter me interessado muito por ficção científica, mas a Constituição Brasileira de 1988, sem dúvida, ocupa lugar de destaque.”

O gênero de ficção científica(71) não se insere nas suas preferências literárias, mas refere que a Carta de 1988 poderia ocupar lugar de destaque no gênero.

Sobre livros que tenham sido inspirados ou retratem processos judiciais, prefere não indicar nenhum para não ser injusto.

6.4 Os “livros de cabeceira”

“Norberto Bobbio e Zygmunt Bauman são autores que me acompanham até a hora de ‘cair nos braços de Morfeu’.”

Sobre “livros de cabeceira”, que são aqueles livros ou livro que levaríamos para a ilha deserta, ou aqueles de que a gente não consegue se separar, lê algum trecho antes de dormir. Desses livros, os de Norberto Bobbio, “o inolvidável jusfilósofo itálico do qual não consigo me separar”, e Zygmunt Bauman,(72) o grande sociólogo e filósofo polonês da atualidade, são aqueles que acompanham o Professor De Lucca até na hora de dormir.

6.5 O que está lendo

No momento, está lendo O terceiro ausente,(73) de Bobbio; Modernidade e ambivalência,(74) de Bauman; As veias abertas da América Latina,(75) de Eduardo Galeano; e Direito, tempo e memória,(76) de Raffaelle De Giorgi.

Pelo que podemos observar, o leitor De Lucca não lê um livro de cada vez, mas vários ao mesmo tempo. Sobre “Um leitor”, uma página inesquecível é a de Borges(77):

“Que outros se jactem das páginas que escreveram;
a mim me orgulham as que tenho lido
[...]
a tarefa que empreendo é ilimitada
e há de acompanhar-me até o fim,
não menos misteriosa que o universo
e que eu, o aprendiz.”

6.6 O que gostaria de reler

Gostaria de reler O Estado sedutor,(78) de Regis Debray; A constelação pós-nacional,(79) de Habermas; O elogio da serenidade, de Bobbio;(80) Ética pós-moderna,(81) de Bauman; e todos os livros de Machado de Assis.

Com essas referências, penso ter oferecido uma pequena amostra das preferências literárias do Desembargador Newton De Lucca, e, como ele próprio afirmou: trata-se de breve lembrança que não esgota o universo de suas leituras. São inegavelmente um testemunho de seus hábitos como leitor. A viagem pelos textos, especialmente os mais antigos, nos sugere que não estamos sós nem somos poucos, e juntos poderemos agregar elementos para enriquecimento espiritual mútuo, pois melhor justiça se fará com literatura. É esta, assim, uma das funções da literatura, a melhor compreensão do fenômeno jurídico. A arte e, em especial, a literatura é uma forma de sensibilizar o olhar.

7 O direito fundamental à cultura: cultura, um conceito abrangente

“As palavras cultura, culto e colonização derivam do mesmo verbo latino colo, cujo particípio passado é cultus e cujo particípio futuro é culturus”.(82) Transposto ao idioma germânico, passou kultur a significar todos os aspectos espirituais de uma comunidade. Já a palavra francesa civilization referia-se às realizações de um povo.(83) Cultura e civilização comumente são utilizados para designar a mesma coisa. Trata-se de todo o complexo de conhecimento, crenças, arte, moral, costumes, leis e hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma comunidade. Há consenso entre os doutrinadores de que a cultura é aprendida, de que é possível ao homem adaptar-se. Ela se manifesta em instituições, padrões de pensamentos e construções materiais. É, enfim, a forma de um povo viver. Formulado inicialmente por Edward Tylor, o conceito de cultura sintetizou a ideia já disseminada entre os estudiosos. A partir do século XVIII, a cultura passa então a significar o resultado da educação dos homens, expressa em ações, objetos, feitos, isto é, todo o construído pelo homem, diferenciando-se do construído pela natureza. A cultura é móvel nesta relação da humanidade com o tempo e no tempo. A natureza é o reino da repetição, e a cultura, o da criação. Esse conceito amplo abrange o erudito e o popular, e a cultura é criada, recriada e alterada em processo contínuo.(84),(85) Uma polêmica recente é saber se “moda” é cultura; os estilistas, beneficiados, dizem que sim, contudo, na melhor compreensão do que é cultura, a moda desfilada(86) aí não se enquadra, pois não transcende o cronotopos de sua gênese e, no concreto, é mercadoria.

7.1 A cultura nas Constituições

Em breve resumo, a Constituição Federal de 1988 conferiu tratamento de maior destaque aos direitos culturais se comparada às anteriores. As Constituições de 1824 e 1891 não trataram da matéria. A Carta de 1934, no artigo 148, fazia rápida referência às “artes” e à “cultura em geral” para submeter o assunto à competência comum. Na Constituição de 1946, o artigo 174 inaugurou a expressão “o amparo à cultura é dever do Estado”. A Carta de 1967 manteve, em linhas gerais, a redação anterior, assim como a Emenda Constitucional nº 1/1969, e apenas em 1988 a Carta Política passou a dedicar um capítulo, incluído na ordem social, à educação e à cultura. O artigo 215 da Constituição Federal de 1988 garante as condições de acesso às fontes da cultura nacional de forma plena, apoiando a difusão das manifestações culturais, dispositivo que inclui, sem dúvida, o acesso ao livro, o incentivo à leitura e o estímulo ao exercício da escrita. Aquele que não lê mal fala, mal ouve, mal vê.(87)

7.2 A proteção e a promoção dos bens culturais

A legislação infraconstitucional oferece amparo legal aos aspectos culturais, inserindo-os no “meio ambiente cultural”. Lembramos, entre outros, o Decreto nº 25, de 30 de novembro de 1937, que organizou a proteção dos patrimônios histórico e artístico nacional, o Decreto nº 15.596, de 2 de agosto de 1922, e as Leis nos 4.845, de 19 de novembro de 1965, e 5.471, de 9 de julho de 1968, que proibiram, respectivamente, a saída do território nacional de obras de arte e documentos produzidos durante o período colonial e a monarquia e a exportação de bibliotecas e arquivos documentais. A transferência de bens culturais de forma sub-reptícia e ilícita foi objeto de Convenção da Unesco e internalizada pelo Decreto nº 72.312/1973. O Decreto nº 3.166, de 14 de setembro de 1999, internalizou a Convenção UNIDROIT sobre o retorno de bens culturais ilicitamente retirados do país, e pelo Decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000, foi instituído o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial. O maior risco aos bens culturais(88) ocorre durante conflitos armados e, bem por isso, no Direito Internacional, foram introduzidas a noção de “bens culturais” e a “categoria de patrimônio cultural da humanidade”. Em face da magnitude da tarefa de proteger o patrimônio natural e cultural internamente pelos povos e países menos desenvolvidos, a Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial foi um pioneiro instrumento multilateral. Ainda, convém lembrar a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, de 20 de outubro de 2005. Essa convenção busca coibir o aniquilamento da cultura das comunidades nacionais pela tendência de uniformização decorrente da globalização e perda das manifestações culturais das minorias étnicas em particular.(89)

Neste breve resumo, cumpre destacar o esforço no sentido da proteção do patrimônio cultural imaterial. A Declaração sobre Diversidade Cultural de 2001 e a Proclamação das Obras Primas do Patrimônio Oral e Intangível da Humanidade de 2001. Esse patrimônio cultural imaterial não é estanque ou fixo;(90) é recriado pelas comunidades de geração em geração, agregando um sentimento de identidade e continuidade. Os bens culturais de natureza imaterial são passíveis da medida protetiva de registro pelo Decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000. Aos bens culturais imateriais, o artigo 216 da Constituição Federal de 1988 conferiu uma proteção dinâmica e adaptável às contingências e às transformações da sociedade.(91),(92),(93)

7.3 O que é literatura

Há muitas tentativas de definir “literatura”. Aqui, utilizamos os conceitos desenvolvidos por Terry Eagleton,(94) no sentido da evolução da teoria literária nas últimas décadas. O conceito de literatura, leitura e crítica sofreu profundas alterações. É possível defini-la como escrita “imaginativa”, no sentido de ficção. A definição, contudo, é insuficiente, pois a distinção entre fato e ficção não parece ser apropriada. Refere que talvez a literatura seja definível não pelo fato de ser ficção ou “imaginativa”, mas pela razão de empregar a linguagem “de forma peculiar”. Representaria uma violência organizada contra a fala comum, afastada do linguajar cotidiano. A linguagem literária seria um tipo de linguagem que chama a atenção sobre si mesma.

A literatura pode ser vista como uma organização particular da linguagem. Para os mais formalistas, seria uma reunião mais ou menos arbitrária de “artifícios” ou elementos relacionados entre si, como som, imagem, ritmo, sintaxe, métrica, rima e técnica narrativa, e tais elementos reunidos teriam o efeito de “estranhamento”. Na linguagem cotidiana, tais aspectos estariam apagados, automatizados, e a literatura, impondo-nos uma consciência dramática da linguagem, revigoraria as nossas percepções e reações habituais, tornando mais intensa a reação ao texto.

A linguagem literária pode ser tida como um conjunto de desvios da norma, contudo, nem todos os desvios da norma são literatura ou poesia – a gíria, por exemplo, não é assim considerada. Não existiria uma “essência da literatura”. Qualquer fragmento ou bilhete pode ser lido ”não pragmaticamente”. A definição de literatura fica dependendo da maneira pela qual alguém lê ou resolve ler, e não da característica do que é lido. Não existiria essa essência da literatura. A bela escrita ou belles lettres é expressão ambígua. A literatura, embora a dificuldade de definição, é altamente valorizada e pode ter, ou tem, efeitos colaterais. Não se trata de categoria “objetiva” no sentido de eternidade e imutabilidade. A literatura não é apenas aquilo que caprichosamente queremos chamar de literatura:

“[...] o que descobrimos até agora não é apenas que a literatura não existe da mesma maneira que os insetos, e que os juízos de valor que a constituem não são historicamente variáveis, mas que esses juízos têm, eles próprios, uma estreita relação com as ideologias sociais. Eles se referem, em última análise, não apenas ao gosto particular, mas aos pressupostos pelos quais certos grupos sociais exercem e mantêm o poder sobre os outros.”(95)

Para Kothe,(96) a obra literária torna-se arte à medida que consegue transcender o cronotopos de sua gênese: desabrocha quando deixa de ser documento de um tempo e um lugar, sem os quais, contudo, não existiria.

Essa pequena referência a respeito do que seja “literatura” tem o objetivo de oferecer um conhecimento básico sobre o que pode ser a “literatura” e encaminhar a percepção de suas possibilidades e relações com o Direito. O que haveria de belo e bom na literatura? Alguns textos têm a força de ajudar-nos a viver, orientar-nos, gratificar-nos, impulsionar-nos. A maioria dos escritores que adoramos, contudo, não vive mais, está morta. Assim, viver nos livros demonstra, talvez, um apego ao passado, é um culto aos mortos. Por caminhos “na floresta dos homens esquecida”, sussurram lições sobre a vida, e sobre como viver a complexidade do ser humano. A história da literatura de um povo é a história das leituras empreendidas pelos leitores. Os textos, contudo, possibilitam leituras divergentes, e de qualquer forma podem privilegiar a reflexão sobre a complexidade de viver.

7.4 Direito e literatura

A utilidade da literatura para a compreensão e o estudo do direito não é questão nova. A leitura potencializa as reflexões críticas, sensibiliza o leitor para questões não enfrentadas ou percebidas no cotidiano.

Abre novas perspectivas, permite um olhar sob novo ângulo sobre o mundo e a complexidade da vida. A função social da literatura tende a ser a da emancipação do homem de sua situação pessoal e temporal. Nos dizeres de Lajolo: “lê-se para entender o mundo”.(97)

Como arte educativa, a literatura contribui para a formação do direito, abrindo perspectivas novas, e especialmente para a atividade interpretativa, por sua perspectiva humanizadora.

Ost(98) mostra com propriedade que as fontes do imaginário jurídico estão na literatura. Garapon(99) recorre à literatura para desvendar aspectos do ritual judiciário, destacando, entre outras, as obras de Kafka – O processo “é provavelmente um dos livros mais profundos jamais escritos sobre a justiça”. “O seu gênio não se deve tanto a sua mensagem, mas mais à experiência que proporciona ao leitor.” No Guardador de promessas, ao passo que destaca o aspecto simbólico da Justiça, refere que o direito deve apoiar-se em muitos saberes: “como o psicólogo, a contabilidade [...]”. Destaca que a Justiça se distancia do Legislativo e do Executivo para ser um “direito do juiz”.

A literatura é meio de conhecimento do direito, e o direito é também literatura. Ronald Dworkin(100) incluiu um capítulo (capítulo 6) na obra Uma questão de princípio denominado “De que maneira o Direito se assemelha à literatura”, no qual propõe que podemos melhorar nossa compreensão do Direito comparando a interpretação jurídica com a interpretação de outros campos do conhecimento, fazendo especial menção à literatura. Mais adiante, tentando obter um aproveitamento melhor de sua sugestão, adverte que o texto literário e a sua interpretação devem ser vistos sobre “certa luz” e avança considerações no sentido de não se confundir interpretação com crítica. Utiliza a peça Hamlet, de Shakespeare, e o romance A mulher do tenente francês, de John Fowles, e afirma o propósito de fazer da utilização da interpretação literária um modelo para o método central da análise jurídica, investigar os princípios que fundamentam as decisões judiciais anteriores. As decisões anteriores, os precedentes, constituem um romance em série, e “cada juiz, então, é como um romancista na corrente”. Os juízes federais seriam os “contistas morais”.

Percebe-se, então, que o autor aproveita como base a hipótese da estética literária para confrontar a visão puramente formal do direito. A interpretação de uma norma deve merecer por parte do intérprete a melhor interpretação possível, mostrando que a subjetividade estética pode ser benéfica.

Na avaliação de André Karan Trindade: “a literatura surge como uma disciplina capaz de colaborar para a formação de um novo paradigma, tudo para melhor compreender o fenômeno jurídico”. No livro citado, o autor analisa a obra O leitor, de Bernhard Schlink,(101) renomado jurista alemão e juiz do Tribunal da Renânia do Norte-Vestfália, 1988-2006, e também professor de Direito na Universidade Humboldt, 1992-2004. Trindade faz um exame esmerado do possível diálogo entre o Direito e a Literatura em suas diversas abordagens, a saber, o direito na literatura, o direito como literatura e o direito por meio da literatura, levantando e dissecando importantes questões teóricas.

Outro eminente jurista que utilizou a literatura para explanar sobre Ética foi Ives Gandra Martins Filho,(102) que exemplifica com a obra de J.R.R. Tolkien O senhor dos anéis (clássico cult) os desafios éticos que enfrentamos com nossas humanas limitações e defeitos, apontando paradigmas para a vida real, lembrando episódios das obras de C. S. Lewis, com As crônicas de Nárnia; J. K. Rowling, com Harry Potter; George Lucas, com Star Wars; e Michael Ende, com a História sem fim, todos inspirados em Tolkien.(103) Assinala que, para recuperar as forças e expandir a mente, a literatura fantástica tem um importante papel a desempenhar na busca de novos caminhos e novas soluções para problemas que afligem a sociedade moderna, arejando as mentes e distendendo os espíritos, olhando para o mundo com uma nova perspectiva.

A Revista Eletrônica Consultor Jurídico apresenta dois ilustres colaboradores que têm importantes contribuições na temática de Direito e Literatura. São eles: Lênio Streck,(104) com Senso incomum, e Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy,(105) com Embargos culturais. Mostram semanalmente, em bem-lançados estudos, que a narrativa literária pode ser propulsora de estudos e debates para questionar os fundamentos da justiça, os princípios jurídicos, do processo, dos ritos processuais, dos conflitos éticos. As narrativas literárias oferecem farto material para proveitosos estudos. O andamento processual, os ritos e os atos processuais a serem cumpridos podem ser discutidos tendo à mão O processo, de Kafka,(106) na peculiar situação ficcional em que “K foi avisado pelo telefone de que no domingo seguinte teria lugar um inquérito sobre o seu caso”. Em paródia à nossa realidade, podemos discutir toda a burocracia que ainda persiste no Judiciário. Finalmente, em recente julgamento no Supremo Tribunal Federal,(107) o eminente Ministro Marco Aurélio Mello recomendou a leitura da obra de John Steinbeck O inverno da nossa desesperança e citou Machado de Assis.(108)

7.4.1 Julgamento jurídico e julgamento estético

O sistema jurídico opera com o binômio excludente do lícito ou ilícito, não havendo espaço para ambiguidades. A Justiça, contudo, não é feita de forma tão exata, pois é obra humana imperfeita. O juiz, ao julgar, segundo a doutrina jurídica, formula um convencimento livre(109) sobre a prova produzida, de acordo com a lei, sempre imerso em valores. Já o juízo estético é um juízo de gosto, de beleza, de aprazibilidade. O justo, contudo, deve ser belo ao veredicto da consciência, ambos, o julgamento jurídico e o juízo estético, são atividades de síntese, mas também ambos partem de algum lugar.  

O conceito de Justiça, em qualquer de suas conhecidas formulações, abriga as ideias de equilíbrio, proporcionalidade, simetria, razoabilidade. Todos os elementos também estão presentes no juízo estético. O justo é o belo no veredicto da consciência. A leitura e a utilização dos paradigmas literários, especialmente dos clássicos mais conhecidos, é de grande auxílio na incansável tarefa humana de compreender a sua própria humanidade.

Conclusão

Para concluir, lembro da reflexão de Zygmunt Bauman,(110) de que o mercado insiste em promover uma cultura de “máximo impacto e obsolescência instantânea”. É necessário, então, um esforço de nossa parte, os simples leitores, para resistir. Não cair nos desvãos cinzas do mercado. Formar uma bagagem de leituras leva tempo, não se faz “em um click”. É tarefa sem fim e só faz por acumular experiência sem obsolescência. Para a magistratura, em especial, ter lido, ler e reler é mais do que um direito, é dever, pois Justiça também se faz com literatura e com magistrados sensibilizados para a condição humana.


Notas

1. AZEVEDO, Álvares de. Lira dos vinte anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996. (Coleção Poetas do Brasil). Fragmento do poema “Lembrança de morrer”.

2. DE LUCCA, Newton . Ética na saúde – conflito de interesses – dupla militância (Leis Stark). In: NOBRE, Milton Augusto de Brito; SILVA, Ricardo Augusto Dias da (org.). O CNJ e os desafios da efetivação do direito à saúde. Belo Horizonte: Fórum, 2011. v. 1. p. 377-404.

3. ALIGHIERI, Dante. A divina comédia. São Paulo: Atena, 1955. Canto XXVIII.

4. MELO NETO, João Cabral de. A educação pela pedra. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2008. “Tecendo a manhã”. Nesse texto poético, o autor se aproxima da prática ancestral metafórica da leitura. A atividade da leitura, que era, no início, solitária, individual, hoje pode ser coletiva, mas não pode ser alienante; “dinâmica”, essa “teia tênue” hoje solicita cada vez mais intermediários, mediadores, para constituir a “luz balão” e se elevar para ser reflexiva.
VIGOTSKI, Liev Semionovitch. A tragédia de Hamlet: príncipe da Dinamarca. São Paulo: Martins Fontes, 2009. Sobre essa misteriosa hora, pois existe uma hora em que a manhã já chegou, mas ainda é noite, nada mais expressivo e estranho nessa passagem da noite para o dia. Como pela manhã tudo está submerso na noite, é a hora mais aflitiva, é esta hora que a alma experimenta ao ler ou assistir a um texto poético ou dramático, segundo Vigotski.

5. ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. 2. ed. São Paulo: Cosac Naify, 2007.

6. PESSOA, Fernando. Poesias inéditas (1919-1930). Lisboa: Ática, 1956.
BRANDÃO, Junito. Mitologia grega: dicionário mítico-etimológico. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. O galo ocupa lugar de destaque na mitologia grega. Como o cisne branco, é uma “ave de Apolo”, símbolo do sol, espanta a noite e as trevas com um canto e conduz os que vão morrer ao Hades.

7. BARTHES, Roland. Aula – Aula inaugural da cadeira de Semiologia Literária do Colégio França. São Paulo: Cultrix, 2007.

8. ALIGHIERI, Dante (1265-1321). Escritor italiano, nascido na cidade de Florença. Obras: La divina commedia (A divina comédia), De vulgari eloquentia (Sobre a língua vulgar), Vida nova (Vida nova), Le rime (As rimas), Il convívio (O convívio), Monarchia (Monarquia).

9. CAMÕES, Luiz Vaz de (1524/1525-1580). Poeta português. Obras: Os Lusíadas (poema épico), Anfitriões (teatro), Auto de Filodemo (teatro), El-Rei Seleuco (teatro), Rimas (poesias líricas).

10. PESSOA, Fernando António Nogueira (1888-1935). Poeta português. Obras publicadas em vida: 35 Sonnets, Antinous, English Poems I, II e III, Mensagem.

11. BOCAGE, Manuel Maria Barbosa du (1765-1805). Poeta português.  Obras: Queixumes do Pastor Elmano contra a falsidade da pastora Urselina, Rimas, Mágoas Amoras de Elmano, A Morte de D. Ignez, A virtude laureada (drama recitado no Theatro do Salitre), entre outras.

12. BAUDELAIRE, Charles-Pierre (1821-1867). Poeta francês. Obras: As flores do mal, Paraísos artificiais, La Fanfarlo, Morale du joujou, Réflexions sur quelques-uns de mês contemporains, entre outras.

13. BILAC, Olavo Brás Martins dos Guimarães (1865-1918). Poeta e jornalista brasileiro. Obras: Via láctea, Sarças de fogo, O caçador de esmeraldas, Alma inquieta, As viagens, entre outras.

14. MELO NETO, João Cabral de (1920-1999). Diplomata, membro da Academia Brasileira de Letras, tomando posse em 1969. Obras: Morte e vida Severina, Pedra do sono, Auto do frade, Educação pela pedra. Influências da vanguarda realista, preocupação com a realidade social. “Essa cova em que estás, com palmos medida, é a cota menor que tiraste em vida [...]”.

15. ALENCAR, José Martiniano de (José de Alencar). Nasceu em 1829 na cidade de Messejana, Ceará, e faleceu em 1877 na cidade do Rio de Janeiro. Obras: O Guarani, Lucíola, Iracema, Senhora, Cinco minutos, As minas de prata. No conjunto magnífico de sua obra, traçou o perfil do Brasil, indianista, urbano, regionalista e histórico.

16. MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria (1839-1908). Mestiço pobre, autodidata, venceu na sociedade escravocrata. Memórias póstumas de Brás Cubas, revolução estética, trajetória inovadora, aprofunda a análise psicológica. Dom Casmurro, Memorial de Aires, Quincas Borba, Helena.

17. KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2012.

18. LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 6. ed. São Paulo: Ática, 2010. Prêmio Jabuti em 1994.

19. ALVES, Rubem. Rubem Alves: sob o feitiço dos livros. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u727.shtml>. Acesso em: 29 jul. 2013.

20. NERUDA, Pablo. Confesso que vivi. 23. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

21. MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

22. SCLIAR, Moacyr. Dialogando para promover a cultura. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Porto Alegre/RS, 2 jun. 2004. Entrevista.

23. LOBATO, Monteiro. Carta a Godofredo Rangel, Rio de Janeiro, 7 de maio de 1926. Há, atualmente, uma tentativa de censurar Monteiro Lobato por pretender sua obra racista. É um rematado equívoco. A obra é datada e retrata o espírito da época. A personagem Tia Anastácia é uma grande contadora de histórias e disciplinadora dos meninos. É lógico que houve e sempre haverá resistência.

24. MORIN, Edgar. Meus demônios. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.

25. SÃO VÍTOR, Hugo de. Didascálicon: da arte de ler. Petrópolis: Vozes, 2001. Filósofo, gramático e teólogo. Precursor da Universidade de Paris.

26. VÁSQUEZ, Guillermo Hoyos (1935-2013). Filósofo colombiano.

27. ESCALANTE, Jorge Luis Volpi. Escritor mexicano.

28. HESSE, Hermann. Lektüre für Minuten. Frankfurt: Suhrkamp Verlag, 1975. Tradução livre.

29. HESSE, Hermann. Nasceu em Württemberg, Alemanha, em 1887, falecendo em Montagnola, perto de Lugano, Suíça, em 1962. Prêmio Nobel de Literatura em 1946. Filho de missionário protestante na Índia, de início foi pregador protestante, mas inclinou-se pela poesia e pela literatura. Obras mais conhecidas: O lobo da estepe, Sidarta, Narciso e Goldmund. Foi considerado indesejável na Alemanha nazista e teve diversos livros proibidos e queimados em 10 de maio de 1933 na Bebelplatz. Incineraram-se 25 mil livros. Ver o painel translúcido no chão da praça Bebel, em frente à Universidade Humboldt, em Berlim, contra a censura e a queima de livros. Profecia do poeta Heine: “Onde se queimam livros, no final arderão pessoas”.

30. AGOSTINHO, Aurélio (354 d.C.-430 d.C.). Santo Agostinho – Agostinho de Hipona. Santo da fé Católica, Doutor da Igreja, nasceu em Tagaste, na Numídia, África do Norte, atualmente Argélia, e morreu em Hipona, aos 75 anos. Nasceu e criou-se na fé cristã graças à influência de sua mãe. Estudou em Cartago, adotou o maniqueísmo e após retornou à fé cristã, tornando-se bispo de Hipona. Principais obras: Cidade de Deus, em que trata do cristianismo, e Confissões, que trata da cristandade. Nas Confissões, trata do percurso da caminhada para aceitar e proclamar a grandeza de Deus e libertar o homem pela verdade. Caminhada que não acontece apenas no plano interior do homem, mas diante dos homens. “Confessar”, então, tem o sentido de praticar a verdade do divino nas realizações da vida. Como pensador, Santo Agostinho sempre está conosco, pois ao longo da vida temos as mesmas inquietações e fazemos as mesmas indagações para conquistar a nossa própria humanidade. Nunca se termina de ler as Confissões, pois o desafio de viver retorna sempre. Muitos trechos são belíssimos e destaco de Confissões (Traduzido por Oliveira Santos e Ambrósio Pina. 18. ed. Petrópolis: Vozes, 2002), do Livro X, 8, p. 224: “O palácio da memória”: “Chego aos campos e vastos palácios da memória, onde estão tesouros de inumeráveis imagens trazidas por percepções de toda espécie. Ali está também escondido tudo o que pensamos, quer aumentando, quer diminuindo ou até variando de qualquer modo os objetos que os sentidos atingiram [...]. Quando lá entro, mando comparecer diante de mim todas as imagens que quero”. Do Livro XI, 14, p. 278: “Que é, pois, o tempo? Quem poderá apreendê-lo, mesmo só como pensamento [...]. [...]. Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam. O que é, por conseguinte, o tempo? Se ninguém me perguntar, eu sei; se quiser explicá-lo a quem me fizer a pergunta, já não sei. Porém, atrevo-me a declarar, sem receio de contestação, que, se nada sobrevivesse, não haveria tempo futuro, e se agora nada houvesse, não existia o tempo presente”.

31. DOSTOIÉVSKI, Fiódor Mikhailovich. Nasceu em Moscou, em 1821, e faleceu em São Petesburgo, em 1881. Crime e castigo, Noites brancas, Memórias da casa dos mortos, Os irmãos Karamazov. Em Crime e castigo, o juiz Porfiri, um juiz ficcional. TOLSTOI, Liev. Guerra e paz, Os cossacos, A morte de Ivan Ilitch, O reino das trevas. Sobre eles, o comentário de CARPEAUX, Otto Maria. História da literatura Ocidental. São Paulo: Leya Brasil, 2012. 4 v.

32. MCDOWELL, Josh. Mestre em Teologia, Seminário Teológico Talbot, na Califórnia, Campus Crusade for Christ.
MCDOWELL, Josh; MACDOWLL, Sean. Mais que um carpinteiro. São Paulo: Hagnes, 2012. Título original: More than a carpenter. Os autores descrevem a identidade de Jesus Cristo, trazendo argumentos bíblicos. Pesquisaram as referências bíblicas para firmar convencimento sobre a divindade de Jesus. Entre os aspectos abordados, destaco o capítulo “O que torna Jesus uma pessoa tão diferente”, em que é feita uma análise do depoimento de Jesus perante o Sinédrio, a suprema corte israelita, e a explicação para o contido no Levítico 10.6, 21.10, pois a Lei proibia ao sumo sacerdote rasgar as vestes quando enfrentava problemas particulares, mas, quando essa autoridade fazia o papel de juiz, era-lhe permitido expressar assim a indignação diante de blasfêmia dita em sua presença. O autor evidencia que Jesus Cristo não foi julgado por ter feito ou praticado algum ato, mas foi julgado por quem alegava ser.

33. AIRES, Matias (1705-1763). Reflexões sobre a vaidade dos homens. São Paulo: Edipro, 2011. Matias Aires, caráter misantropo e rebelde. Viveu em oposição ao seu século. Nasceu em São Paulo e passou os onze primeiros anos no Brasil. Filho de José Ramos da Silva, tipo representativo do Brasil Colonial. Amealhou fortuna com o fornecimento de gêneros aos bandeirantes. O filho Matias Aires foi o primeiro filósofo e romancista brasileiro. A família retornou a Lisboa em 1716. Estudou em Coimbra e após em Paris. Levou uma vida solitária e triste, embora desfrutasse da colossal herança paterna. Transcrevo trechos do capítulo 136, sobre a ciência de julgar: “Na ciência de julgar, alguma vez é desculpável o erro do entendimento, o da vontade nunca; como se o entender mal não fosse crime, erro sim [...] o entendimento pode errar, porém só a vontade pode delinquir. [...] Querem os sábios enobrecer o erro, com o fazer vir do entendimento, e com ele encobrir o vício que trouxe da vontade; mas quem é que deixa de não ver que o nosso entendimento quase sempre se sujeita ao que nós queremos e que o seu maior empenho é servir a nossa inclinação; [...]. O entendimento é a parte que temos em nós mais lisonjeira; daqui vem que nem sempre segue a razão e a justiça, a inclinação sim; inclinamo-nos por vontade, e não por conselho; por amor, e não por inteligência; por eleição do gosto, e não por arbítrio do juízo: as paixões que nos movem, nos inclinam; a todas conhecemos, isto é, sabemos que amamos por amor, que aborrecemos por ódio, que buscamos por interesse e que desejamos por ambição: mas não sabemos sempre que também a vaidade nos faz amar, aborrecer, desejar, buscar; daqui vem que o julgador se engana quando se presume justo só porque não acha em si, nem amor, nem ódio, nem ambição, nem interesse; mas vê que é vaidoso e que a vaidade basta para fazer o injusto, cruel, tirano. [...] Que importa que o julgador se faça injusto, só por passar por justiceiro? A consequência da injustiça também vem a ser a mesma; o mal que se faz por vaidade não é menor que aquele que se faz por interesse; o dano que resulta da injustiça é igual; o juiz amante, ou vaidoso, sempre é em juiz injusto [...]. O caminho da justiça (para quem tem vontade de andar por ele) é um caminho direito, espaçoso, claro, fácil, e aprazível; as flores, que o bordam de uma, e outra parte, todas são perpétuas, [...] o caminho porém das injustiças é um caminho difícil, espantoso, e escuro; umas vezes é por cima de rochedos escarpados [...] outras vezes é por vales estreitos, sinuosos e profundos, e donde as árvores são todas infecundas, têm pálidas as folhas, e nascendo desordenadas, e confusas, fazem o lugar inseguro, e próprio para traições, aleivosias, furtos, assassínios [...] um ar caliginoso, e denso, apenas pode albergar aves nocturnas de presságio infausto [...]”. No Capítulo 138, a vaidade do sangue; no 140, as muitas vaidades que formam a vaidade da nobreza. “De todas as paixões, quem mais se esconde é a vaidade [...] conhecendo todos a vaidade alheia, nenhum conhece a sua [...]”. “Fogueira das vaidades”, em 1947, em Florença. Pregação de Savonarola, na Catedral del Fiore, para que a população abandonasse as vaidades, joias, obras de arte, sendo recolhidas e queimadas. Foi a “fogueira das vaidades”.

34. PLATÃO. A República. Escrita por volta de 375 a.C., quando Platão estava com pouco mais de 50 anos. Aristocrata ateniense, nascido em torno de 428 a.C. e falecido em 347 a.C.

35. PESSOA, Fernando. Poema “Liberdade”. Sobre não ter biblioteca.
GONZATTO, Marcelo. Biblioteca do comunicador Tatata Pimentel está à venda em sebo da Capital. Zero Hora, Porto Alegre, 14 ago. 2013. Segundo Caderno. Refere-se ao acervo do falecido Professor Roberto Valfredo Bicca Pimentel (Tatata Pimentel), que teria declarado: “a minha preocupação não é a morte, é quem vai herdar a minha biblioteca”. Os destaques do acervo: imensa coleção de autores franceses: Proust, Flaubert, Racine e Balzac. Primeira edição de Formação da Literatura Brasileira, de Antonio Candido. Livro raro: Estética, de György Lukács. Curiosidades escondidas nos livros: fotos com autores dos livros, v.g., uma com Roland Barthes; dedicatórias, mensagens dos autores ao professor, trechos sublinhados e com anotações de punho do jornalista, carimbo com o nome completo do jornalista, matérias jornalísticas sobre a obra. A parte mais valiosa do acervo foi dada pelos familiares à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

36. MANDELSTAM. O rumor do tempo e a viagem à Armênia. São Paulo: Trinta e Quatro, 2000.

37. BORGES, Jorge Luis. Elogio da sombra. Porto Alegre: Globo, 2001. “O guardião dos livros”. Nesse poema, metáforas estéticas contra o poder destruidor das guerras: “Na aurora dúbia, o pai de meu pai salvou livros. Aqui estão na torre onde jazo, recordando os dias que foram de outros [...]. Em meus olhos não há dias. As prateleiras estão muito altas e não as alcançam meus anos. Léguas de pó e sonhos cercam a torre. Por que me enganar? A verdade é que nunca soube ler [...]. Meu nome é Hsiang. Sou o que custodia os livros, que talvez sejam os últimos [...]”.

38. SCLIAR, Moacyr. Ler faz bem à saúde. Zero Hora, 31 maio 2003. In: ______. Território da emoção: crônicas de medicina e saúde. São Paulo: Cia. das Letras, 2013.

39. BRADBURY, Ray Douglas. Nasceu em Illinois, Estados Unidos, em 1920, falecendo em Los Angeles, Estados Unidos, em 2012, aos 91 anos de idade.

40. O filme Farenheit 451 é um clássico.  FARENHEIT 451 (filme). Direção: François Truffaut. Produção: Lewis M. Allen. Roteiro: Jean-Louis Richar e François Truffaut. Intérpretes: Oskar Werner (Guy Montag), Julie Christie (Linda/Clarisse), Cyril Cusack (Capitão) e outros. Inglaterra: Universal Pictures, 1966. (112 min).
1984 (filme). Direção: Michael Radford. Intérpretes: John Hurt (Winston Smith), Richard Burton (O’Brien), Cyrril Cusak (Charrington). Inglaterra: 1984. (113 min).  ORWELL, George (Eric Arthur Blair) (1903-1950). Escritor inglês. No livro e também no filme 1984, há uma política pública que é desenvolvida pelo “Ministério da Verdade”. Há a política de “purificação da língua”, isto é, a redução do idioma a poucas palavras. A palavra, a letra, como o pensamento, tornaram-se obsoletos. O cidadão é bombardeado com propaganda do governo o tempo todo.

41. CALVINO, Italo. Por que ler os clássicos. São Paulo: Cia. das Letras, 1993. Nascido em 1923, em Cuba, foi para a Itália, resistiu ao fascismo, faleceu em 1985.

42. BORGES, Jorge Luis. Poema dos dons (Poema de los dones), 1960.

43. JOYCE, William. Os fantásticos livros voadores de Modesto Máximo. Rio de Janeiro: Rocco, 2012.

44. ZUSAK, Markus. A menina que roubava livros. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2007.

45. GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.     

46. ECO, Umberto. O nome da rosa. Traduzido por Aurora Fornoni e Homero Freitas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.  O romance é de 1980, e o autor é Professor de Semiótica na Universidade de Bolonha. Dedica-se a temas como linguagem, teoria da literatura e da arte, sociologia da cultura. A trama se desenvolve em um mosteiro italiano em 1327. Sete crimes, em sete noites, vitimam sete monges, e os assassinatos se irradiam a partir da fantástica Biblioteca, a maior da cristandade. O nome da rosa era a expressão usada na Idade Média para designar o infinito poder das palavras: “Não me surpreendia que o mistério dos crimes rodasse em torno da biblioteca. Para esses homens devotados à escritura, a biblioteca era ao mesmo tempo a Jerusalém celeste e um mundo subterrâneo no limite entre a terra desconhecida e os infernos. Eles eram dominados pela biblioteca, por suas promessas e por suas proibições. Viviam com ela, por ela e talvez contra ela, aguardando culposamente o dia de violar todos os seus segredos”.

47. BLOOM, Harold. O cânone ocidental. Rio de Janeiro: 2010.

48. Sócrates (469 a.C.-399 a.C.) Não escreveu, seus pensamentos foram escritos pelo discípulo Platão. Foi julgado e condenado à morte por desrespeito aos deuses e por corromper jovens. Aceitou a sentença e tomou o veneno que o matou. Platão assistiu ao julgamento e conservou as ideias do mestre. Ver: ROCHA, Zeferino. A morte de Sócrates. São Paulo: Escrita, 2001. SÓCRATES. (filme) Direção: Roberto Rossellini. Intérpretes: Jean Sylvère (Socrate), Anne Caprile (Santippe). Espanha/Itália/França, 1971. (120 min).
A lenda da invenção da escrita está no Fédon, diálogo de Platão. Thoth, o deus inventor da escrita, encontra-se com o faraó egípcio Tamus e oferece uma maravilhosa invenção ao monarca: “eis um ramo do saber que irá aprimorar as memórias”. A invenção oferecia um remédio para aprimorar a sabedoria e a memória.

49. Platão (427 a.C.-347 a.C.). Aluno de Sócrates. Suas obras têm a forma de Diálogos, e as iniciais têm Sócrates como protagonista falante: A República e Das leis.

50. Xenofonte.

51. ALEXANDRE, o grande (filme). Direção: Robert Rossen. Intérpretes: Richard Burton (Alexander), Fredric March (Philip of Macedonia) e outros. EUA/Espanha, 1956. (135 min). Aristóteles pode ser visto como professor de Alexandre nesse clássico. Há a versão de 2004, Alexandre, de Oliver Stone, com mais ênfase nas conquistas militares, com Anthony Hopkins.

52. DE LUCCA, Newton. Da ética geral à ética empresarial. São Paulo: Quartier Latin, 2009.

53. BOBBIO, Norberto. De senectute. Madrid: Taurus, 1997.
Idem. Diário de um século: autobiografia. Rio de Janeiro: Campus, 1998.

54. Idem. O tempo da memória: De senectute e outros escritos autobiográficos. Rio de Janeiro: Campus, 1997. Foi escrito por ocasião do recebimento do diploma honoris causa, é uma lectio magistralis sobre um tema não acadêmico. Reflete sobre uma fase da vida a que jamais imaginava chegar. De fato, é emocionante e tocante a aula magna. O homem é o que lê e o que lembra: “É o passado revive na memória. O grande patrimônio do velho está no mundo maravilhoso da memória, fonte inesgotável de reflexões sobre nós mesmos, sobre o universo em que vivemos [...] e quando os revemos experimentamos a mesma emoção da primeira vez; e quantas melodias e canções, árias de óperas, trechos de sonatas e de concertos voltamos a cantarolar sozinhos [...]”.

55. SOUZA, Carlos Alves de. Um embaixador em tempos de crise. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979. O autor, nascido em 19 de maio de 1901, no Rio de Janeiro, foi Engenheiro Geógrafo Aspirante da Marinha em 1915. Ingressou no Ministério das Relações Exteriores em 1924, ascendendo à condição de Ministro de 1ª Classe em 1944. Prestou serviços em Paris, Viena, México, Belgrado, Havana, Roma e Londres, entre outras capitais. Apresentou-se em 1966 e, nos mais de 42 anos de serviços diplomáticos, foi diversas vezes condecorado. Tomava apontamentos no calor dos acontecimentos e guardava missivas e, recorrendo a tais apontamentos, traz uma contribuição inestimável para a história da pátria. Uma verdadeira joia. Alves de Souza, sempre de local privilegiado, assistiu e contribuiu para o renascimento da Marinha de Guerra e da Escola Naval. Integrou o primeiro grupo da aviação naval e rememora episódio em que pilotou um avião Curtiss. Deixou a Marinha, cursou a Faculdade de Direito. Letrado e poliglota, pela mão do Almirante Alexandrino Alencar ingressou no Corpo Diplomático em 1924. Serviu no Gabinete do Ministro Octávio Mangabeira e de muitas outras figuras de destaque na história nacional. Em momentos de grave crise internacional, foi testemunha ocular. Em Belgrado, teve papel decisivo em defesa das missões diplomáticas. Em Paris, após a chamada “guerra da lagosta”, contribuiu para a normalização das relações diplomáticas. Convenceu o Presidente João Goulart a aceitar o regime parlamentarista, que era proposto para o seu regresso. Trata-se de uma trajetória destacada e exemplar no Corpo Diplomático. Foi um homem perfeitamente ajustado e preparado para a importante função pública exercida, figuras das quais hoje carecemos. Conviveu com os mais importantes líderes políticos da época, durante a Era Vargas e a II Guerra Mundial. Repõe a verdade, esclarecendo que fora ele o autor da frase que é atribuída ao Gal. De Gaulle: “Luis Edgar, le Brésil n’est pas un pays sérieux”. Somente 25 anos depois a questão foi confirmada pelo porta-voz do Gal. De Gaulle à época dos fatos, em entrevista à TV Manchete, no Rio de Janeiro. Desfilam por suas memórias figuras como Arthur Bernardes, seu sogro, Oswaldo Aranha, João Neves da Fontoura, Guimarães Rosa, Benedicto Valladares, Octávio Mangabeira, Milton Campos e Juscelino Kubitscheck. Um relato extraordinário com informações históricas e indicação de fontes e fatos de época. Imperdível para quem aprecia o gênero. Está esgotado e só é encontrado em sebos.

56. MANN, Thomas (1875-1955). Doktor Faustus, em citação de Otto Maria Carpeaux (op. cit.), teria dito que “o romance do séc. XX tem de ser ao mesmo tempo romance, ensaio, tratado científico, também obra de história e reportagem”.

57. HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

58. PRADO JR., Caio. Evolução política no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

59. Idem. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 2006.

60. FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

61. PASTERNAK, Boris. Doutor Jivago. Rio de Janeiro: Best Seller, 2008. Segundo Italo Calvino, “perturbador e comovido [...] salvou a tensão no sentido do futuro, a interrogação comovida sobre o fazer da história”. Destaca a figura de Lara, para as possibilidades do feminino.

62. CASTRO ALVES, Antônio Frederico de (1847-1871). Espumas flutuantes, Os escravos, Gonzaga ou a Revolução de Minas. É da terceira geração dos românticos (1ª geração: Gonçalves Dias; 2ª geração: Álvares de Azevedo). Belíssimo representante com poesia voltada para a mulher, o escravo oprimido e a pátria oprimida pela monarquia. Linguagem grandiloquente, panfletária de contestação; 3ª geração: inspirados em Victor Hugo (geração condoreira).

63. HESSE (op. cit.). Troca de correspondência.

64. BRODSKY, Joseph. Menos que um: ensaios. São Paulo: Cia. das Letras, 1994. Prêmio Nobel de Literatura em 1987.

65. ADORNO, Theodor (1903-1969).

66. In: CARPEAUX (op. cit., p. 16).

67. PESSOA, Fernando. A hora do diabo. Lisboa: Assírio e Alvim, 1997.

68. PESSOA, Fernando. Poesias. Lisboa: Ática, 1973. “Hora absurda”.
Chuva Oblíqua, II 
“Ilumina-se a igreja por dentro da chuva deste dia,
E cada vela que se acende é mais chuva a bater na vidraça...
[...]
Através da chuva que é outro tão solene na toalha do altar..."

69. CAVALCANTI FILHO, José Paulo. Fernando Pessoa: uma quase autobiografia. Rio de Janeiro: Record, 2011.

70. RILKE, Rainer Maria (1875-1926). Elegias de Duíno. 2. ed. Traduzido por Dora Ferreira da Silva. São Paulo: Globo, 2001. O livro mais afamado é Cartas a um jovem poeta. Mostra ao neófito o mundo interior do escritor. Em Carta a Lou Salomé (Lou Salomé, minha amante, minha irmã), refere que o homem criador não pode fazer concessões à vida, pois a terra renasce “invisível a nós”.

71. Grandes autores na ficção científica são Arthur Clarke e Isaac Azimov. São aqueles que em um século antecipam o futuro. Do primeiro, Canções de uma pátria distante (1986); do segundo, Eu, robô. Sir Arthur Clarke, escritor e inventor britânico, desvendou o código secreto dos nazistas. Antecipou a atual realidade das comunicações instantâneas, imaginando os satélites em órbita da terra. A rota imaginária hoje é realidade e denomina-se “Clarke”.

72. BAUMAN, Zygmunt. Teórico da pós-modernidade. Nasceu na Polônia em 1925. Um dos mais influentes pensadores da atualidade, desde 1971 reside na Inglaterra. É professor emérito das Universidades de Varsóvia e Leeds. Autor de diversas obras, todas entre nós publicadas pela Zahar, Rio de Janeiro. Entre elas, Amor líquido, Arte da vida, Comunidade, Confiança e medo na cidade, Identidade, Medo líquido, Modernidade e ambivalência, Vida para consumo, Tempos líquidos, O mal-estar da pós-modernidade e Vidas desperdiçadas. A arte da vida, no original, The art of life, reflete sobre os parâmetros que nos norteiam na busca pela felicidade. O estado de felicidade muda constantemente e permanece como algo ainda a ser atingido. Expõe e reflete de forma brilhante sobre as escolhas e opções de vida e as influências da sociedade de consumo. Reflete sobre nós – “artistas da vida” –, sobre o que é felicidade e quais são as suas fronteiras, sobre os vínculos de amizade, de família e do amor. Arremata com considerações tocantes: “Para resumir: o amor não é algo que se possa encontrar; não é um object trouvé obj

u um ready-made. É algo que precisa ser sempre e novamente construído e reformado a cada dia, a cada hora; constantemente ressuscitado, reafirmado, servido e cuidado [...]”.

73. BOBBIO, Norberto. O terceiro ausente. Barueri: Manole, 2009.

74. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Rio de Janeiro: Zahar, 1999. Nessa obra, Bauman reflete sobre como viver em um mundo implacavelmente ambíguo. O estranhamento, a assimilação, em especial, os futuros da solidariedade.

75. GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. 45. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

76. GIORGI, Raffaelle De. Direito, tempo e memória. São Paulo: Quartier Latin, 2006. O autor é Professor Titular de Teoria Geral do Direito e Sociologia do Direito na Universidade de Lecce, Itália, e Diretor do Centro de estudos sobre o risco, em parceria com Niklas Luhmann. Provocador, estilo refinado. Em especial: A memória do Direito, entendida como princípio explicativo. Começa o texto com a citação de Borges: Funes, o memorioso. Também Direito Penal e teoria da ação, que introduz com referência ao conto A pane, de Friedrich Dürrenmatt.

77. BORGES, Jorge Luis. Elogio da sombra. Porto Alegre: Globo, 2001. “Um leitor” (1970).

78. DEBRAY, Regis. O Estado sedutor: as revoluções midiológicas do poder. Petrópolis: Vozes, 1994.

79. HABERMAS, Jürgen. A constelação pós-nacional: ensaios políticos. São Paulo: Littera Mundi, 2002.

80. BOBBIO, Norberto. Elogio da serenidade e outros escritos morais. São Paulo: Unesp, 2002.

81. BAUMAN, Zygmunt. Ética pós-moderna. São Paulo: Paulus, 1997. Nessa obra, o autor reflete sobre a possibilidade de conferir a um objeto ou evento mais de uma categoria. A ansiedade que experimentamos com a desordem, mas classificar significa separar, segregar.

82. BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

83. MENDONÇA, Gilson Martin. O direito fundamental à cultura: dos tratados internacionais à Constituição Federal de 1988. In: PIOVESAN, Flávia (coord.). Direitos Humanos. Curitiba: Juruá, 2006. v. I.

84. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 12. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.

85. CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2001.

86. ZERO Hora, Porto Alegre, 1 set. 2013. Caderno Donna.
GRAGNANI, Juliana; DINIZ, Pedro. Setores culturais reagem ao uso da lei Rouanet na moda. Folha de São Paulo, São Paulo, 28 ago. 2013. Comissão Nacional de Incentivo à Cultura nega incentivo da Lei Rouanet para a indústria da moda, mas o Ministério da Cultura, por direta intervenção da titular da pasta, aprova captação de 2,8 milhões da Lei Rouanet para desfiles de moda em Paris.
FREUD, Sigmund (1856-1939). O mal-estar na cultura. Traduzido por Renato Zwick. São Paulo: L&PM, 2010. A ele se deve a ideia da distinção entre o homem e a natureza.                                

87. MOREIRA, Carlos André. A 15ª Jornada Nacional de Literatura precisou driblar a falta de recursos e se reiventar. Zero Hora, Porto Alegre, 2 set. 20013. José Castilhos Marques Neto, na 15ª Jornada Nacional de Literatura, trouxe um dado alarmante: apenas 26% dos brasileiros têm capacidade plena de ler, entender e interpretar um texto. Os desafios da jornada. A situação retrata a negação do direito ao acesso livre à cultura.
MEIER, Bruno. A farra dos livros. Veja, São Paulo, n. 2339, p. 122-128, set. 2013. “A geração digital ainda se deixa encantar pelas letras.”
DESPERDÍCIO de papel e dinheiro em relação a Relatório de Atividades do Tribunal de Contas do Mato Grosso, 160 páginas em papel couchê. Zero Hora, Porto Alegre, 6 set. 2013. Polêmicas recentes em relação ao patrocínio público de livros, sem licitação.
CÂMARA de Vereadores questiona compra de livro para programa de prevenção ao uso de drogas em Porto Alegre. Zero Hora, 6 set. 2013. Secretário Carlos Casartelli teve de explicar o valor gasto com aquisição de 50 mil exemplares do livro O escudeiro da luz e os zumbis da pedra, desenvolvido pela Central Única das Favelas (Cufa-RS). O convênio custou R$ 1 milhão à prefeitura de Porto Alegre, sem licitação, e se destinaria ao combate ao consumo de drogas.

88. GONZATTO, Marcelo. Situação precária de monumentos de Porto Alegre leva prefeitura a buscar nova estratégia de conservação. Zero Hora, 29 ago. 2013. Obras do descaso. As obras de arte e os monumentos históricos de Porto Alegre estão em “situação de guerra”, com pichações, furtos e depedrações. A onda de destruição teve início em 1990. José Francisco Alves: “As nossas obras de arte estão sendo destruídas e ninguém vê. Há uma cegueira coletiva na cidade”.

89. SOARES, Guido Fernando Silva. Direito internacional do meio ambiente. São Paulo: Atlas: 2001.

90. SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Bens culturais e proteção jurídica. Porto Alegre: Unidade Editorial Porto Alegre, 1997.

91. MENDONÇA, Gilson Martins. O direito fundamental à cultura: dos tratados internacionais à Constituição Federal de 1988. In: PIOVESAN, Flávia (coord.). Direitos humanos. Curitiba: Juruá, 2007.

92. MOREIRA, op. cit. Embora toda a rede de proteção formal, a 15ª Jornada Nacional de Literatura precisou driblar a falta de recursos. Teve 28 mil inscritos e poucos recursos oficiais. A jornada tem compromisso com a formação do leitor e com as escolas e é organizada há 30 anos por Tânia Rösing.

93. O “Vale-Cultura” é uma questão tormentosa, e este pequeno estudo não seria adequado para dissecar a novel política dita de amparo à cultura e ao lazer.


94. EAGLETON, Terry. Teoria da literatura: uma introdução. Traduzido por Waltensir Dutra. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

95. EAGLETON, op. cit., 2006.
BLOOM, Harold. Shakespeare: a invenção do humano. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. Um exemplo da dominação aludida pelo crítico Eagleton é bem visível na obra de Bloom, em especial, na introdução do estudo das peças shakespearianas para só considerar a criação literária a partir dele. Vejamos exemplos: “A Bardolatria, isto é, a devoção a Shakespeare, deveria se tornar uma religião secular mais praticada do que já o é. As peças continuam a ser o limite máximo da realização humana”. Shakespeare “explica-nos em parte por que nos inventou [...]”, inventou o humano, o que hoje entendemos por humano. Referindo-se a Hamlet: “Hamlet parece ser mais do que um personagem literário ou dramático. Seu efeito na cultura mundial é incalculável. Depois de Jesus, Hamlet é a figura mais citada do Ocidente [...]”.
CARPEAUX, op. cit., p. 14. Sobre o viés elitista da literatura: “Até nos países culturalmente mais desenvolvidos a grande literatura só é lida por uma ínfima percentagem dos leitores potenciais”.

96. KOTHE, Flávio René. Fundamentos da teoria literária. Brasília: UnB, 2002.

97. LAJOLO, op. cit.

98. OST, François. Contar a lei: as fontes do imaginário jurídico. São Leopoldo: Unisinos, 2004.

99. GARAPON, Antoine. Bem julgar: ensaio sobre o ritual judiciário. Lisboa: Piaget, 1997.
Idem. O guardador de promessas: justiça e democracia. Lisboa: Piaget, 1996.
TRINDADE, André Karan; GUBERT, Roberta Magalhães. Direito e literatura: aproximações e perspectivas para se repensar o direito. In: TRINDADE, André Karan; GUBERT, Roberta Magalhães; COPETTI NETO, Alfredo (orgs.). Direito e literatura: ensaios críticos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
TRINDADE, André Karan; GUBERT, Roberta Magalhães; COPETTI NETO, Alfredo. Direito e literatura: discurso, imaginário e normatividade. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2010.

100. DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Traduzido por Luis Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
MARTINS FILHO, Ives Gandra. Ética e ficção: de Aristóteles a Tolkien. São Paulo: Campus Jurídico, 2010.

101. SCHLINK, Bernhard. Der Vorleser. Mais conhecido após o filme de Stephen Daldry: “The Reader”, 2008. É no livro que se tem conhecimento dos títulos que são lidos pelo “leitor” Michael para Hanna: de Homero, Odisseia; de Schiller, Intriga e amor; de Leon Tolstoi, Guerra e paz; de Hemingway, O velho e o mar, havendo referência, entre outros, a Goethe, Kafka, Heine, Kant e Hegel.

102. MARTINS FILHO, op. cit.

103. TOLKIEN, John Ronald Reuel (1892-1973). Nascido na África. Filólogo britânico, dominava 17 idiomas. Obras principais: O Silmarillion, O Hobbit e O senhor dos anéis (1928). Em On fairy stories, Tolkien exalta as três funções que os contos fantásticos desempenham na vida humana.

104. STRECK, Lenio Luiz. Senso incomum. Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br>.

105. GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Embargos culturais. Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br>.

106. KAFKA, Franz. O processo. São Paulo: Cia. das Letras, 2005.

107. Ação Penal nº 470, Supremo Tribunal Federal. “Mensalão”.

108. OLIVEIRA, Rosane. Jogada ensaiada. Zero Hora, Porto Alegre, 13 set. 2013.

109. KNIJNIK, Danilo (org.). Prova Judiciária: estudos sobre o novo Direito Probatório. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. “Livre” que não é tão livre assim. O eminente autor e professor não aborda o binômio Justiça-Literatura.
RICOEUR, Paul. Teoria da interpretação: o discurso e o excesso de significação. Lisboa: Edições 70, 1987.

110. BAUMAN, Zygmunt. Vida em fragmentos: sobre ética pós-moderna. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.



 

 

Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023:2002/ABNT):
. . Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n., dez. 2013. Disponível em:
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Acesso em: .


REVISTA DE DOUTRINA DA 4ª REGIÃO
PUBLICAÇÃO DA ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO - EMAGIS