Resumo
Este estudo reflete sobre a importância do trabalho em equipe na atualidade, tanto no âmbito privado como no público. Distingue as equipes de trabalho dos meros grupos, conceituando-as e dispondo sobre o modo como são formadas. Destaca as equipes de trabalho de alto desempenho. Discorre sobre a evolução da administração pública e do serviço público. Enumera fatores que dificultam a criação de equipes de trabalho no setor público. Apresenta de forma não exaustiva medidas e providências passíveis de adoção para possibilitar a formação e o desenvolvimento de equipes de trabalho no serviço público.
Palavras-chave: Trabalho. Equipe. Desempenho. Administração Pública. Dificuldades. Soluções.
Sumário: Introdução. 1 Equipes de trabalho. 1.1 Conceito. 1.2 Formação e características de seus integrantes. 1.3 Equipe de alta performance. 2 A evolução da administração pública e do serviço público. 3 Grupos de trabalho no serviço público. 3.1 Formação de equipes no serviço público: dificuldades encontradas. 3.2 Formação de equipes no serviço público: soluções propostas. Conclusão. Referências bibliográficas.
Introdução
No contexto atual, em um mundo globalizado, em que o conhecimento se difunde rapidamente e a informação é de fácil acesso a todos, uma substancial alteração na forma de trabalhar vem ocorrendo. O trabalho individual perde espaço para o trabalho em grupo, com a finalidade de superação das limitações e majoração das capacidades individuais.
Como grupos de trabalho, as equipes se sobressaem, uma vez que nelas a responsabilidade pelos resultados e pelas metas é de todos os seus membros. Há integração do esforço individual.
Todavia, na administração pública, seja no Poder Executivo, seja nos Poderes Judiciário e Legislativo, a formação e o desenvolvimento de equipes encontram diversas barreiras.
É justamente sobre as equipes de trabalho, as dificuldades existentes no serviço público para sua formação e as possíveis soluções que trata o presente estudo.
1 Equipes de trabalho
Atualmente, muito se escreve e se estuda sobre o tema equipes de trabalho, com o objetivo de melhorar o desempenho e os resultados de organizações, tanto no âmbito privado como na esfera pública.
Isso porque, em um mundo globalizado, em que a circulação do conhecimento e o acesso à informação estão cada vez mais dinâmicos e democráticos e a tecnologia à disposição evolui em velocidade incomensurável, não se mostra mais suficiente e satisfatório o trabalho desempenhado de forma individual. Hodiernamente, o trabalho individual não apresenta mais a importância que possuía antigamente, e a ideia de trabalho em equipe ganha maior destaque e relevância, pois dificilmente alguém tem condições de dominar todo o conhecimento de sua área, enquanto em equipe isso é possível.
Para serem capazes de vencer suas limitações, ampliar suas capacidades e alcançar seus objetivos, os indivíduos precisam cooperar entre si.
Com efeito, as grandes corporações têm buscado profissionais que, além de possuírem relevante parcela de conhecimento em uma determinada área, conheçam os aspectos essenciais de outras áreas do conhecimento com que sua atividade se relaciona.
Assim é porque profissionais que possuem amplo conhecimento geral além do conhecimento específico de uma determinada área naturalmente têm maior aptidão para trabalhar em equipe.
Nos dizeres de Tonet et al. (2009, p. 18), no momento da abordagem do tema desenvolvimento de equipes, tratando sobre o histórico do movimento dos grupos,
“Há uma crescente percepção de que é importante para o indivíduo possuir habilidades que facilitem o trabalho em equipe, distintas e diferentes daquelas exigidas para o desempenho de tarefas individuais. De uma forma geral, todo processo seletivo feito nas organizações contemporâneas exige capacidade de trabalhar em equipe. As organizações estão deixando de buscar ‘estrelas’ para ocuparem posições isoladas, como forma de garantir os resultados e a competitividade em relação ao mercado, e estão dando destaque ao desempenho das equipes de trabalho; estão priorizando a aquisição e o desenvolvimento da competência para produzir em equipe, em vez da competência para produzir isoladamente. Moscovici, em 1994, afirmava o que hoje é uma constatação: o futuro e o sucesso da administração e da gestão estão vinculados ao desenvolvimento das equipes de trabalho.”
O trabalho está se tornando uma ação coletiva, deixando as tarefas de serem atribuições de indivíduos para se tornarem responsabilidade de um conjunto de pessoas, que podem formar apenas um grupo de trabalho ou chegar a compor uma equipe.
Conforme bem explanam Tonet et al. (2009, p. 25-36):
“Uma análise rápida dos cenários das organizações e empresas é suficiente para mostrar a importância do trabalho em equipe. O advento da globalização e a exigência de mudanças e inovações contínuas impostas a todos os mercados produtivos são apenas duas das razões que justificam a necessidade do trabalho em equipe. De forma crescente o trabalho vem se tornando uma ação coletiva, as tarefas deixam de ser atribuições de indivíduos e passam a ser de um conjunto de pessoas, que podem constituir um grupo e chegar mesmo a ser uma equipe. A operação de um processo de trabalho pode exigir a participação de diferentes pessoas, com múltiplos conhecimentos e habilidades, que se integram para gerar produtos e serviços cada vez mais específicos e diferenciados entre si.
Tal forma de atuar impõe comportamentos apropriados, exigindo que as pessoas se amoldem umas às outras, priorizando os objetivos coletivos e muitas vezes colocando em segundo plano os propósitos de caráter individual. De forma crescente, o resultado coletivo é o que mais importa. Embora cada indivíduo seja responsável por uma parcela do que deva ser feito, o resultado final decorre da sinergia provocada pelo conjunto das ações. Tem um valor agregado que supera a simples soma das várias ações realizadas.”
Por conseguinte, no contexto contemporâneo, é indiscutível a relevância do trabalho em equipe para obtenção de sucesso, entendido este como alcance de objetivos e satisfação dos destinatários de qualquer organização, seja privada, seja pública.
Consoante asseveram Macieira e Maranhão (2010, p. 53):
“As pessoas são o ativo mais importante de qualquer organização. Mesmo que haja excelentes sistemas, se não houver pessoas preparadas e compromissadas com os resultados, os sistemas não cumprem as suas finalidades. Pior, com o tempo, os bons sistemas tendem a degradar-se. Afinal de contas, são as pessoas que fazem os sistemas funcionarem, as únicas com inteligência para melhorá-los continuamente.”
1.1 Conceito
Alguns autores definem os grupos de acordo com a percepção de seus integrantes, enquanto outros utilizam como referência a motivação das pessoas para se unirem ao grupo e outros ainda se baseiam em características específicas para conceituá-los. Todavia, é consenso que, para a existência de um grupo, não basta a simples proximidade entre pessoas.
Em suma, um grupo de trabalho é formado por dois ou mais indivíduos, com objetivos e/ou interesses em comum, conta com um mínimo de organização entre os seus membros, visando à obtenção de seus objetivos e/ou interesses. No grupo de trabalho, os indivíduos interagem na busca de objetivos e/ou interesses comuns.
No entanto, em que pese uma equipe de trabalho ser um grupo, nem sempre um grupo será uma equipe de trabalho. Os grupos percorrem diversas fases até se transformarem em verdadeiras equipes. Isso porque, em uma equipe de trabalho, apesar de existir uma divisão de tarefas, a responsabilidade pelos resultados e, especialmente, pelo alcance das metas é de todos os seus membros. Existe uma integração do esforço individual.
Demais disso, nas equipes, em regra, os próprios componentes do grupo definem as suas metas e a forma de atingi-las, o que aumenta o grau de comprometimento com as tarefas e os objetivos fixados.
A equipe de trabalho surge quando o grupo começa a analisar a sua forma de trabalhar, busca continuamente a solução de seus problemas e o saneamento de suas deficiências, bem como procura estabelecer procedimentos que melhorem o seu funcionamento.
Tonet et al. (2009, p. 64-65), em levantamento doutrinário quanto ao tema equipes de trabalho, escrevem:
“Para Moscovici (1994), as equipes de trabalho são grupos com objetivos comuns e compartilhados, nos quais os membros possuem habilidades complementares, relacionando-se de forma aberta, comunicativa e cooperativa para o alcance dos objetivos e resultados. Entende que um grupo se transforma em equipe quando passa a observar sua própria forma de operar e procura resolver os problemas que afetam o seu funcionamento, em um processo contínuo de percepção, diagnose, planejamento, implementação, resolução de problemas e avaliação, o propósito e a direção do grupo são pautados pelos objetivos dos seus membros. (...)
Conforme Thiry-Cherques (2007), no trabalho em equipe predomina um coletivismo dependente, uma forma de trabalho que é resultante da harmonização da tarefa dividida. Nessa forma de trabalhar, cada indivíduo assume uma parte do esforço produtivo e da responsabilidade. Na equipe, a interdependência predomina como um atributo. O foco está na integração do esforço individual e na sinergia com os demais membros. O trabalhador nunca está sozinho; seus companheiros de trabalho estão sempre por perto.
Katzenbach e Smith (2001) entendem a equipe de trabalho como um grupo de pessoas com aptidões complementares, comprometidas com um objetivo comum, que realizam atividades interdependentes, e que são coletivamente responsáveis pelos resultados. (...)
Segundo Hackman (1987), a verdadeira equipe é um sistema social complexo, com fronteiras definidas entre seus membros, que operam dentro de um contexto organizacional e são responsáveis pela execução de tarefas que resultam em produtos mensuráveis. A verdadeira equipe de trabalho apresenta características que exigem esforço e persistência para serem conquistadas e desenvolvidas. Pode ser comparada a uma corrente, composta por vários elementos ou elos. A força ou o valor total da equipe, da mesma forma que na corrente, é igual à força ou ao valor do elo mais fraco. Portanto, na equipe, todos se empenham em fortalecer a si próprios e aos demais.”
É possível asseverar, nesses termos, que equipes são grupos de indivíduos com habilidades complementares reunidos com o propósito de gerar resultados melhores do que os alcançados por meio da soma dos resultados individuais.
1.2 Formação e características de seus integrantes
Uma equipe de trabalho não nasce pronta. Ela se forma e se desenvolve de forma continuada.
A formação de uma equipe deve ter como base os perfis dos profissionais, assumindo cada integrante as posições para as quais tem maior aptidão. Os membros de uma equipe de trabalho devem possuir papéis complementares, que sejam compatíveis com as suas características pessoais e profissionais. Conforme Tonet et al. (2009, p. 39), "a existência de um completo conjunto de papéis e competências complementares é que irá possibilitar os melhores resultados da equipe".
Para formação de uma equipe de trabalho, é imprescindível a reunião de algumas condições individuais e de contexto.
Entre as individuais, estão as competências de cada indivíduo para trabalhar com outras pessoas, para trabalhar em equipe e, em especial, para trabalhar em determinada equipe. Cada equipe é única e apresenta as suas próprias características. Quanto às de contexto, pode-se relacionar a clara definição dos objetivos alcançáveis, a confiança e a cooperação recíprocas, o compartilhamento de oportunidades e responsabilidades.
Por outro lado, há diversas variáveis que influenciam as equipes, tais como tamanho, organização, interação entre os integrantes, coesão do grupo, competências dos membros e recursos disponíveis, além do tempo previsto para sua duração.
1.3 Equipe de alta performance
O êxito na constituição de uma equipe de trabalho, com adequada seleção de seus membros e criação e manutenção de um ambiente adequado para o seu desenvolvimento, resulta em uma equipe de alto desempenho.
Uma equipe de alto desempenho conta com expectativas superiores às convencionais, apresenta padrões de desempenho elevados e possui membros profundamente comprometidos com o sucesso próprio, dos demais membros e da própria equipe. Apesar de cada integrante ter sua parte de responsabilidade, todos são responsáveis pelo alcance dos objetivos e atendimento das metas em sua totalidade.
2 A evolução da administração pública e do serviço público
De acordo com Paludo (2012, p. 51), a análise histórica da administração pública e do serviço público permite identificar três modelos distintos de administração:
“Dentro de uma perspectiva histórico-evolutiva, é possível distinguir três modelos diferentes de Administração Pública: a administração patrimonialista, a administração burocrática e a administração gerencial.
Embora, historicamente, seja marcante um tipo predominante de administração, é possível afirmar que, na atualidade, a administração gerencial é o modelo vigente; que a administração burocrática ainda é aplicada no núcleo estratégico do Estado e em muitas organizações públicas; e que persistem traços/práticas patrimonialistas nos dias atuais. É possível afirmar, ainda, que existem fragmentos de todas as teorias administrativas nas organizações públicas.”
A administração patrimonialista vigorou nos Estados de forma predominante até a segunda metade do século XIX. Nesse modo de administrar, a figura do soberano se confunde com a do próprio Estado, assim como se confunde o patrimônio público com o patrimônio particular do soberano. Além dessas, são características da administração patrimonialista o endeusamento do soberano, a corrupção, o nepotismo, a arbitrariedade e a discricionariedade das decisões, a ausência de carreiras administrativas, a desorganização do Estado e da administração e o descaso com o cidadão e as demandas sociais.
Na segunda metade do século XIX, surgiu a administração burocrática, cujo objetivo precípuo era combater a corrupção e o nepotismo patrimonialistas. Demais disso, a administração burocrática pretendida manter a ordem, administrar a justiça e garantir contratos e propriedade. São características da administração burocrática a observância de normas, a formalidade das comunicações, a racionalização e a divisão do trabalho, a hierarquia, as rotinas e os procedimentos padronizados, a impessoalidade das relações, a valorização da técnica e da meritocracia, a distinção clara do público e do privado, além da profissionalização dos funcionários e da previsibilidade do funcionamento.
Por seu turno, a administração pública gerencial surgiu na segunda metade do século XX, mantendo os méritos da administração burocrática, mas incorporando as culturas e as técnicas gerenciais modernas, normalmente oriundas e adaptadas da iniciativa privada, tais como busca de eficiência, redução de custos e aumento da qualidade, tendo como foco a prestação de um serviço adequado ao cidadão. A administração pública gerencial aplica nas atividades os conhecimentos oriundos da ciência da administração, especialmente a gestão de processos e a gestão de pessoas. Dentre as diversas tecnologias gerenciais oriundas da iniciativa privada, mas aplicáveis na administração pública gerencial, é possível citar o Benchmarking, a Melhoria Continua (Kaizen), o Ciclo PDCA, o Programa 5S, o Diagrama de Pareto, o Diagrama de Ishikawa, o Orçamento Participativo, a Reengenharia, o Balanced Scorecard e o Planejamento Estratégico.
Na atualidade, os órgãos públicos majoritariamente se enquadram no modelo de administração pública gerencial, apesar da subsistência relevante de órgãos baseados no modelo de administração burocrática e, lamentavelmente, de traços de administração patrimonialista.
A administração pública gerencial é influenciada por dois fenômenos da atualidade: a democracia consolidada e a globalização. A democracia consolidada exige dos governos eficiência, participação popular nas decisões e responsabilidade governamental, ao passo que a globalização traz para o Estado a necessidade de adoção das novas tecnologias da informação e da comunicação, além da competitividade.
3 Grupos de trabalho no serviço público
No serviço público, seja no Poder Judiciário, seja nos Poderes Executivo e Legislativo, os grupos de trabalho, geralmente, são formados por pessoas aprovadas em concursos de provas ou de provas e títulos ou em processos seletivos, que, por provimento inicial ou em decorrência de promoção ou remoção, desenvolvem suas atividades em órgão de um ente específico em um determinado local.
A exceção a essa regra são os cargos em comissão, declarados em lei de livre nomeação e exoneração, e as funções de confiança, privativas de servidores ocupantes de cargos efetivos, que se destinam exclusivamente às atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Assim, via de regra, os grupos não são formados em razão das competências, características e aptidões dos indivíduos que os compõem, nem em decorrência das relações profissionais ou pessoais formadas entres eles, mas pelo resultado da lotação dos servidores nas vagas existentes, de acordo com a vontade do interessado, com a oportunidade e, em algumas situações, por interesse do gestor.
Entretanto, com a evolução da administração pública para o modelo gerencial, na seara pública, assim como na privada, cada vez mais a satisfação do cliente, a melhoria da produtividade e da qualidade, a redução dos custos, a observância dos prazos e a obtenção de resultados positivos dependem do desempenho das pessoas, que, indubitavelmente, segundo assinalado anteriormente, é superior quando se trabalha em equipe, sendo, por conseguinte, indispensável o seu desenvolvimento.
As equipes de trabalho são, inquestionavelmente, indispensáveis para que, na sociedade atual, a administração pública tenha condições de atender ao comando do art. 37, caput, da Constituição Federal, de que a administração pública, em qualquer esfera, deverá obedecer, dentre outros, o princípio da eficiência.
É o que exsurge das palavras de Lenza (2103, p. 1375-1376), ao discorrer sobre o referido princípio da administração pública:
“Se, na iniciativa privada, se busca a excelência e a efetividade, na administração, outro não poderia ser o caminho, enaltecido pela EC n° 19/98, que, em boa hora, fixou a eficiência também para a Administração Pública.
A ordem do dia é a produtividade, e o Estado deve conseguir alcançar os resultados. Para tanto, mecanismos de incentivo devem existir para os servidores (e controle do desempenho deles), mas, também, a Administração terá que estar dotada de estrutura para a sua concretização.
José Afonso da Silva destaca que ‘o princípio da eficiência administrativa consiste na organização racional dos meios e recursos humanos, materiais e institucionais para prestação de serviços públicos de qualidade em condições econômicas de igualdade dos consumidores’.”
3.1 Formação de equipes no serviço público: dificuldades encontradas
A forma como são estruturados os grupos de trabalho no serviço público gera diversas barreiras à formação de equipes, principalmente, de equipes de alta performance, entendidas estas, consoante já mencionado, como grupos de trabalho em que os seus integrantes têm alto grau de comprometimento com o seu desempenho e com o desempenho dos demais membros, além de real responsabilidade pelos resultados e pelo alcance das metas.
O primeiro e talvez mais grave empecilho à constituição de uma equipe no serviço público é o modo como se dá sua formação, sem que o próprio gestor responsável pelo grupo seja imbuído dessa função em decorrência de suas aptidões e de seus conhecimentos gerenciais.
Diferentemente do que ocorre no setor privado, o gestor, na maioria das vezes, é colocado em atividade de chefia pela aprovação em concurso público ou processo seletivo ou pela nomeação para exercício de cargo em comissão ou função de confiança, mesmo sem ter qualquer formação na área de administração e de gestão de pessoas e sem receber qualquer treinamento ou capacitação para tanto.
Na mesma esteira, aludido gestor não dispõe de liberdade para selecionar todos os integrantes do grupo de trabalho por ele gerenciado, mas sim conta com as pessoas lotadas na unidade de trabalho sob sua gerência, por critérios não relacionados às suas características e competências. Quando muito, o gestor tem a possibilidade de selecionar um ou outro indivíduo externo à unidade, seja servidor público, seja particular, cujas características conhece e com quem possui relação de confiança.
Portanto, apesar de ser salutar o ingresso no serviço público por meio de concursos públicos ou processos seletivos (art. 37, II, da Constituição Federal), a fim de garantir a igualdade de oportunidades no acesso aos cargos e empregos públicos, certo é que tal circunstância dificulta a formação de efetivas equipes de trabalho, pois nem sempre as pessoas lotadas em determinada unidade possuem características complementares e compatíveis, compartilham dos mesmos objetivos pessoais e profissionais e têm aptidão ou disposição para trabalhar em grupo. Ademais, nem sempre um grupo formado nessas condições consegue obter o entrosamento necessário entre seus componentes para a constituição de uma equipe, de forma que todos disponibilizem seus conhecimentos e experiências individuais em prol dos interesses coletivos.
Deveras, equipes de trabalho, em especial as de alto desempenho, são formadas por pessoas que querem a elas pertencer, e não por indivíduos agrupados aleatoriamente.
Assim como o gestor não tem o poder de selecionar os integrantes de seu grupo de trabalho, também não goza de autoridade e poder para substituir aqueles que não se adaptam ao grupo e não se comprometem com suas atividades e com os objetivos estabelecidos, possuindo interesses e objetivos diversos, que prejudicam o funcionamento de toda a unidade. Não raras vezes o gestor da unidade de trabalho se vê obrigado a lidar com crises de relacionamento internas ou de deficiência de resultados, que não se resolvem por falta de vontade dos envolvidos, por incompatibilidade entre os membros ou por insuficiência de desempenho, sem ter qualquer poder decisório sobre a sua composição.
Por outro lado, muitos servidores públicos encontram-se lotados em órgãos, setores ou departamentos que desenvolvem atividades com as quais não têm qualquer afinidade, ou estão alocados em cidades diversas e/ou distantes dos locais em que residem seus familiares e amigos, o que faz com que se sintam em situação provisória e indefinida, apenas aguardando a possibilidade de serem transferidos, removidos ou promovidos para outra unidade, função ou local. Muitas dessas pessoas, que em várias ocasiões não conhecem a extensão do tempo em que perdurará essa situação temporária, acabam por não se envolver com o grupo que integram e por não se comprometer efetivamente com as metas e objetivos por ele definidos.
Ainda, deve ser registrado como fator que dificulta a formação de equipes no serviço público a visão antiga sobre a finalidade desse serviço que algumas pessoas ainda têm, caracterizada por traços da administração patrimonialista do serviço público, de confusão do interesse próprio com o interesse público.
De fato e infelizmente, parte dos servidores públicos e das pessoas que prestam concursos públicos ou participam de processos seletivos esquece-se de que a missão do servidor público é servir ao público, que seu cliente é a sociedade e que a esta deve ser prestado serviço de qualidade, com eficiência e presteza, colocando o serviço público em segundo plano em relação a qualquer interesse pessoal. Preocupam-se apenas com as vantagens pecuniárias e funcionais do cargo ou da função que ocupam ou pretendem ocupar e se olvidam de suas obrigações, especialmente após a obtenção da estabilidade, como se a remuneração fosse decorrente simplesmente da sua aprovação em concurso público ou teste seletivo, e não do serviço prestado com qualidade.
É com pesar que, na administração pública como um todo, alguns servidores (não como regra, mas como exceção) se valem de garantias como a estabilidade (art. 41 da Constituição Federal) para adotar condutas e comportamentos que no setor privado ensejariam demissão por justa causa e no serviço público acarretam, quando muito, uma sanção de advertência (art. 129 da Lei nº 8.112/90, no âmbito federal), que, para aqueles que não têm comprometimento para com o trabalho, nada significa.
Isso impede a formação de equipes não só em razão da falta de compromisso de um ou algum dos membros do grupo, mas também pela conduta do gestor que por vezes não adota as providências necessárias e cabíveis em desfavor de tais membros ou pela postura da organização a que pertence a unidade de trabalho, quando não ratifica as medidas adotadas pelo gestor, em decorrência do ainda existente vínculo à ideia burocrática e patrimonialista de serviço público, que, no entanto, a cada dia está diminuindo.
De outra parte, também é possível identificar como óbice à formação de equipes a política remuneratória fixa majoritariamente adotada pela administração pública. Efetivamente, a maioria dos servidores públicos é remunerada por um valor fixo mensal, que não varia conforme o resultado do seu trabalho. Dessa forma, não há estimulo para evolução no desempenho, inovação ou alcance de metas. Além disso, muitos servidores que por vocação buscam melhorar seu desempenho, inovar ou atingir metas sentem-se desestimulados por serem remunerados da mesma forma que outros servidores que não compartilham do mesmo esforço.
Outro aspecto que merece destaque é a falta de definição expressa e clara de objetivos e metas gerais por parte dos entes públicos e dos seus órgãos.
Com efeito, por mais que as atribuições dos órgãos públicos estejam adequadamente definidas, é comum que, mesmo diante da enorme carga e do consequente acúmulo de trabalho, não se defina de forma geral as prioridades e metas, considerando as dificuldades pessoais e materiais e a demanda de serviços de cada unidade.
Isso faz com que, em diversas situações, embora as metas estabelecidas pelo gestor direto sejam alcançadas pelo grupo de trabalho, o trabalho desempenhado não seja reconhecido pela organização ou por outros órgãos da entidade que ele integra, o que acaba por acarretar o desestímulo e a sensação de trabalho não reconhecido nos seus integrantes. Mais difícil restará, diante desse quadro, a formação de uma verdadeira equipe de trabalho, pois os indivíduos não têm real noção do que a organização objetiva e valoriza.
Também é relevante ponderar que, em razão da herança patrimonialista e burocrática de administração dos serviços públicos, muitas vezes o estabelecimento de metas pelo gestor e a exigência de cumprimento estrito das regras legais são equivocadamente confundidos com assédio moral ou falta de razoabilidade ou proporcionalidade, sendo esta invocada normalmente em prol do servidor, mas nunca em prol do serviço público e da sua eficiência.
Nessa esteira, é possível também identificar como circunstâncias capazes de obstar a formação de uma equipe de trabalho no serviço público a ausência, em grande parte dos setores, de recursos materiais e pessoais suficientes para que o grupo, mesmo com comprometimento, motivação, empenho e dedicação, atinja os objetivos buscados, bem como a falta de estímulo para capacitação, aprimoramento e desenvolvimento profissional dos servidores e por vezes a falta de interesse destes para tanto.
Do exposto, constata-se que são muitos os fatores que dificultam a criação e o desenvolvimento de equipes de trabalho na administração pública, principalmente de equipes de alta performance, o que demonstra a necessidade de se pensar em medidas capazes de afastar tais óbices.
3.2 Formação de equipes no serviço público: soluções propostas
A superação das dificuldades e dos óbices à formação de equipes de trabalho no setor público depende não apenas da atuação e da conduta do gestor direto, que integra o grupo, mas também do comportamento e da ação de toda a organização.
Certo é que, no contexto em que vivemos, não é adequada e admissível a alteração das formas de ingresso, movimentação e desligamento de servidores públicos. Entretanto, outras medidas podem ser adotadas para facilitar a criação e o desenvolvimento de equipes.
Primeiramente, mostra-se necessária a adoção de uma postura organizacional de valorização e promoção da capacitação dos seus membros, voltada ao desenvolvimento pessoal e profissional, além da implementação de uma metodologia de reconhecimento e premiação do bom trabalho realizado, como forma de estimular o envolvimento e o comprometimento com os objetivos assumidos e os resultados alcançados e de gerar o sentimento de inclusão.
Outrossim, deve ser priorizada a capacitação do gestor, no que concerne à gestão de pessoas, para que "assuma comportamentos que facilitem e estimulem o desempenho das pessoas" (TONET et al., 2009, p. 44), e de todos os envolvidos, relativamente ao trabalho em grupos e à formação e desenvolvimento de equipes.
Nos dizeres de Ferreira (2012, p. 13), quando discorre sobre o tema gestão de pessoas, com o objetivo de auxiliar na compreensão dos aspectos humanos das organizações de trabalho, "as políticas de gestão de pessoas precisam ser aplicadas de forma eficaz a todos os funcionários, independentemente do cargo que ocupam".
Por seu turno, ainda no âmbito institucional, impõe-se que os objetivos e prioridades gerais da organização sejam fixados, devidamente delimitados e constantemente reavaliados, considerando sempre a realidade e as dificuldades de cada setor.
Demais disso, é indispensável uma ação institucional voltada a promover a contínua e constante conscientização dos servidores acerca da relevância das atividades do grupo para os usuários e para a sociedade, da importância do trabalho de cada indivíduo para o próprio grupo, bem como de que todo o trabalho desenvolvido se destina à população, devendo o serviço ser prestado com qualidade e presteza,
Não suficiente, a organização sempre deve oferecer incentivos aos seus servidores, não apenas de ordem material, para que no desempenho de suas funções possam não somente atingir os objetivos organizacionais, mas também contemplar seus interesses pessoais, conforme bem ensina Chiavenato (2011, p. 322-323):
“A organização é um sistema de forças ou atividades, conscientemente coordenadas, de dois ou mais indivíduos. O desejo de cooperar depende dos incentivos oferecidos pela organização, e esta precisa influir no comportamento das pessoas por meio de incentivos materiais (como salário e benefícios sociais), oportunidades de crescimento, consideração, prestígio ou poder pessoal, condições físicas adequadas de trabalho etc. Em outros termos, a organização oferece incentivos para obter a cooperação das pessoas em todos os níveis hierárquicos. Dentro desse esquema, cada pessoa precisa alcançar os objetivos organizacionais (para se manter ou crescer na organização) e os seus objetivos pessoais (para obter satisfações).”
Não são outras as lições de Ferreira (2012, p. 10):
“Os funcionários só se tornam altamente produtivos, só colocam seus talentos, seu interesse, sua criatividade e seu comprometimento a favor do serviço que desempenham quando se sentem contemplados em seus interesses e objetivos pessoais.”
Quanto ao gestor, é de rigor que busque a formação necessária para o gerenciamento de pessoas e que, com base em seus conhecimentos e aptidões gerenciais, adote medidas direcionadas à mobilização da equipe em direção aos objetivos institucionais e aos comportamentos que facilitem e estimulem o desempenho de seus integrantes, de modo a obter o comprometimento dos servidores e a manutenção de um ambiente de trabalho saudável.
Nessa esteira, Macieira e Maranhão (2010, p. 53) lecionam:
“A boa gestão de pessoas deve ter como resultado duas condições indispensáveis e complementares entre si:
◗manter pessoas tecnicamente capacitadas para a execução apropriada daquilo que fazem (maturidade de tarefa);
◗manter as pessoas compromissadas para a execução correta de suas respectivas tarefas desde a primeira vez (maturidade psicológica).”
Finalmente, é indispensável que os servidores públicos, como um todo (inclusive os gestores), mudem seu modo de pensar e agir, passando a priorizar os objetivos coletivos. Entretanto, isso depende da vontade de cada um, do entendimento e da certeza de cada um de que, atingidos os objetivos coletivos, naturalmente serão alcançados os individuais.
Conclusão
A atuação em equipes é, indiscutivelmente, a melhor forma de trabalhar na atualidade, visto que somente coletivamente é possível reunir o conhecimento necessário para atender à demanda de um público que busca inovação, presteza e qualidade.
No serviço público não é diferente.
Todavia, no âmbito da administração pública, verificam-se vários fatores, não encontrados necessariamente na seara privada, que dificultam a formação de equipes.
Dentre esses fatores, podem ser anotados a forma como são admitidos, lotados e desligados os servidores públicos e, consequentemente, o modo como é composto o grupo de trabalho, com pouca ou nenhuma ingerência por parte do respectivo gestor; o caráter provisório das lotações; a visão antiga de algumas pessoas que integram o serviço público ou que procuraram nele ingressar, bem como o comportamento de determinados servidores; a política remuneratória fixa adotada; a ausência de definição expressa e clara de objetivos e metais gerais por parte dos entes públicos e seus órgãos; a falta de reconhecimento e valorização do trabalho realizado; a carência de recursos materiais e pessoais.
Não obstante, mesmo não sendo adequadas e admissíveis outras formas de ingresso, movimentação e desligamento de servidores públicos, entende-se que a construção de equipes de trabalho nessa esfera é possível, com a atuação não somente do gestor imediato, que faz parte do grupo de trabalho, mas de todos os envolvidos, inclusive da organização como um todo.
A facilitação da criação e do desenvolvimento de equipes passa pela adoção de uma postura organizacional de valorização e promoção da capacitação dos seus membros e pela implementação de uma metodologia de reconhecimento e premiação do bom trabalho realizado.
Pressupõe, ainda, a delimitação dos objetivos e prioridades gerais da organização, assim como a instituição de um programa de avaliação e revisão constantes de tais objetivos e prioridades.
Uma ação institucional voltada a promover a contínua conscientização dos servidores acerca da relevância das atividades do grupo para os usuários e para a sociedade, de que todo o trabalho desenvolvido a eles se destina e da importância do trabalho de cada indivíduo para o próprio grupo, também é imprescindível.
Por sua vez, o oferecimento de incentivos possibilita que os membros dos grupos de trabalho, no desempenho de suas funções, possam atingir não apenas os objetivos organizacionais, mas também atender seus interesses pessoais.
De outro lado, um gestor, com a devida capacitação, tem condições de mobilizar a equipe em direção aos objetivos institucionais, além de facilitar e estimular o desempenho de seus integrantes.
Conclui-se que são essas, de forma não exaustiva, as providências necessárias para que se possa formar verdadeiras equipes de trabalho no serviço público. Contudo, isso somente será viável se houver vontade, empenho e disposição de cada um dos envolvidos.
Referências bibliográficas
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TONET, Helena et al. Desenvolvimento de equipes. 2. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2009.
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