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publicado em 30.06.2015
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Palavras-chave: Direito do Consumidor. Cláusula abusiva. Nulidade de pleno de direito. Aplicação restritiva. Súmula. Sumário: Introdução. 1 Âmbito normativo da Súmula 381 do STJ. 2 Limites interpretativos do enunciado sumular. Conclusão. Referências bibliográficas. Introdução No âmbito do Direito Privado, os sujeitos dotados de capacidade possuem autonomia para entabularem negócios jurídicos imantados de força cogente (pacta sunt servanda). A liberdade contratual é protegida pela legislação vigente de modo a assegurar que a vontade validamente manifestada pelas partes em torno de determinado objeto contratual (prestação e contraprestação), por qualquer forma válida, em especial por instrumento por escrito, tenham suas cláusulas obrigatoriamente executadas em caso de quebra contratual. A despeito da liberdade contratual, há ampla regulamentação no que se refere à formação e ao conteúdo dos contratos privados, especialmente se tratando de contratos de adesão protegidos pelo regramento protetivo do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, a lei consumerista interfere diretamente na relação contratual de consumo, com o intuito de corrigir eventual desequilíbrio entre o consumidor, parte hipossuficiente, e o fornecedor, segundo a diretriz constitucional prevista no art. 170, inc. V, da Constituição Federal. No caso de crise contratual, é possível a revisão das cláusulas contratuais para equacionar eventual abusividade, resgatando-se o equilíbrio de modo a restaurar a execução do programa contratual. No presente trabalho, o objeto de estudo é o limite de atuação do juiz nos contratos bancários, a partir da análise crítica da Súmula n° 381 do STJ, que vedou a declaração, de ofício, da abusividade de cláusulas nulas de pleno direito. 1 Âmbito normativo da Súmula 381 do STJ A Súmula n° 381 do Superior Tribunal de Justiça veda o julgador de conhecer, de ofício, a abusividade das cláusulas em contratos bancários, segundo se observa do enunciado sumular exarado pela 2ª Seção de Direito Privado, in verbis: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.” No que tange ao disposto no art. 51 do CDC, texto legal que trata da nulidade de pleno direito de cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços. A partir do inteiro teor dos precedentes indexados pelo Superior Tribunal de Justiça,(1) constatou-se que o fundamento da súmula é a aplicação do princípio do tantum devolutum quantum apellatum. Desse modo, em princípio, a impossibilidade se refere à limitação imposta ao julgador de segundo grau em analisar de ofício a validade das cláusulas abusivas não apreciadas previamente em primeiro grau. Não há a análise específica do âmbito de incidência do referido dispositivo consumerista no âmbito do direito substantivo. De todo modo, no instante do julgamento do Resp. 1061530/RS, DJE de 10.03.2009, em sede de recurso repetitivo, a questão referente à possibilidade de aplicação do art. 51 do CDC foi levada ao conhecimento da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, com a ressalva da Ministra Relatora Nancy Andrigui, enfatizando a seguinte preocupação: A ministra relatora, todavia, foi vencida, acompanhada, com fundamentos diversos, pelo Min. Luis Felipe Salomão. Os demais ministros que compuseram a sessão de julgamento, por sua vez, mantiveram a tese de que o juiz não está autorizado a proceder à revisão de ofício de cláusulas contratuais fazendo remissão a linha de orientação dos precedentes inicialmente comentados. O leading case de cristalização da linha interpretativa, o REsp. 1061530/RS, DJE de 10.03.2009, que dá substrato de legitimidade ao enunciado sumular em análise, não confrontou a questão pela perspectiva do direito material, mantendo a linha argumentativa de natureza estritamente processual, na esteira dos julgados anteriores daquela Corte Superior. Em conclusão, o âmbito normativo da Súmula n° 381 do STJ refere-se à extensão do princípio devolutivo que deve ser limitado ao objeto da impugnação feita pela parte nas razões do recurso, consoante enuncia o brocardo latino tantum devolutum quantum apellatum. 2 Limites interpretativos do enunciado sumular O ponto central da crítica à súmula é não ter sido feito a análise direta da extensão da força normativa do dispositivo do art. 51 do CDC, no que se refere à possibilidade de o magistrado, em especial o de primeiro grau, declarar a nulidade de ofício de cláusula abusivo em contrato de adesão. Muito embora seja possível admitir que o cerne da decisão seja ampliado de modo a abranger o princípio processual dispositivo e da congruência, no qual o juiz não poderia se manifestar de ofício sobre questão não ventilada pelas partes, assim como se afastar do conteúdo delimitado pelos pedidos das partes, o enunciado da súmula ao limitar-se em reproduzir a ratio decidendi dos precedentes que lhe deram origem esvaziou o conteúdo normativo material do dispositivo consumerista sem explicitar as possibilidade de aplicação da referida norma legal em situações diversas. A referida omissão inviabiliza a delimitação da raiz interpretativa do art. 51 do CDC, tornando-a compreensão de questões correlatas desguarnecidas de segura orientação jurisprudencial. Com efeito, a situação de o magistrado, em primeiro grau, declarar de ofício a nulidade de cláusula abusiva contratual, com fundamento na nulidade de pleno direito, ainda carece de enfrentamento. Considerando que todos os precedentes que deram origem à súmula referem-se à nulidade reconhecida em sede recursal, cuja matéria devolvida não tinha sido objeto de apreciação pela sentença de primeiro grau, o enunciado sumular se revela excessivamente abrangente no seu enunciado, desbordando dos fundamentos jurídicos que compõe sua ratio decidendi. Com isso, remanesce aberta a possibilidade de juiz de primeiro grau analisar de ofício a questão referente à nulidade da cláusula contratual nula de pleno direito. Por outra perspectiva, a súmula revela posição paradoxal da Corte Superior, conforme apontado pela Ministra Nancy Andrigui, na medida em que mantém posição firme quanto à possibilidade da declaração de ofício da cláusula de eleição de foro em contrato de adesão, matéria que, aliás, foi incorporada à legislação adjetiva posteriormente. Em suma, há claro descompasso entre o enunciado sumular com os fundamentos dos precedentes que originaram, na medida em que afastou a possibilidade de a cláusula ser anulada de ofício em grau recursal, porém não lançou luzes quanto à sua extensão normativa substantiva em relação a outras situações, como a possibilidade de o juiz de primeiro grau declarar a nulidade de pleno direito da cláusula contratual abusiva ou mesmo em grau recursal, se convertido o feito em julgamento, com o deferimento de prazo para manifestação das partes acerca de eventual nulidade de pleno direito de cláusula de contrato devolvido ao conhecimento por intermédio de instrumento recursal. Em âmbito sistêmico, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é contraditória com o núcleo valorativo da cláusula de eleição de foro, em que se admite o reconhecimento de ofício da nulidade da referida cláusula contratual. Por fim, considerando que as razões de decidir não são de cunho substancial, mas referentes aos princípios de natureza processual, não se verifica óbice, uma vez oportunizado o debate aos litigantes, que seja declarada de ofício em primeiro grau de jurisdição, ou mesmo em grau recursal, pois assim não se reconhece a presença de nulidade capaz de obstar a apreciação de ofício da nulidade de pleno direito da cláusula abusiva em contrato objeto de apreciação judicial, nos termos do art. 51 do CDC. Conclusão Em conclusão, a Súmula 381 do STJ tem aplicação restrita quando a questão é enfrentada em grau recursal, exclusivamente quando não tenha sido objeto de apreciação em primeiro grau. Não havendo óbice, por outro lado, à declaração de nulidade de pleno direito, de ofício, em primeiro grau, ou quando oportunizada a manifestação prévia das partes, em grau recursal, haja vista a ausência de questão prejudicial processual impeditiva. Referências bibliográficas AGUIAR JR, Rui Rosado. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor – resolução. De acordo com o novo Código Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Aide, 2003.
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Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023:2002/ABNT): |
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