|
||
publicado em 30.06.2015
|
||
O artigo analisa a atuação do Direito Tributário para a preservação e a recuperação do meio ambiente. Classifica os tributos ambientais de acordo com sua estrutura interna, com a vinculação do produto arrecadado ou com sua função extrafiscal. Discorre sobre as externalidades negativas originadas do processo de produção de bens e serviços. Analisa a extrafiscalidade como instrumento regulatório capaz de internalizar o custo das externalidades negativas e capaz de premiar as externalidades positivas. Examina o uso dos tributos ambientais extrafiscais à luz dos princípios constitucionais tributários da legalidade, da igualdade e da capacidade contributiva. Palavras-chave: Direito Tributário. Ambiental. Externalidade negativa. Extrafiscalidade. Sumário: Introdução. 1 Tributos ambientais. 2 Externalidades negativas. 3 Extrafiscalidade. 4 Limites à extrafiscalidade: princípios constitucionais tributários. Conclusão. Referências bibliográficas. Introdução A partir de quando o ser humano tomou consciência de que não podia continuar destruindo o meio ambiente, tornou-se claro que o Direito deveria dar sua contribuição para a proteção ambiental. 1 Tributos ambientais O tributo apresenta-se ambiental (i) na estrutura interna da norma impositiva ou (ii) pela vinculação ambiental do produto arrecadado ou (iii) pelo aspecto de extrafiscalidade dado ao tributo. 2 Externalidades negativas Um dos princípios mais importantes ao Direito Ambiental é o do poluidor-pagador, que tem por fundamento o pensamento econômico de que a degradação ambiental se deve ao uso abusivo dos bens que constituem o meio ambiente natural e cuja utilização é livre. Embora o uso desses recursos naturais seja livre, ele ocasiona custo para a coletividade, seja na forma de degradação ambiental, seja porque a sociedade deve suportar as despesas para corrigir a degradação (por exemplo: limpeza da água contaminada). “A produção privada de bens de consumo ou de serviços pode gerar efeitos danosos que, por sua vez, geram custos. Como esses custos são, em certo sentido, marginais em relação à produção e de verificação, muitas vezes, posterior, não comporão o preço do bem produzido. Esse custo ficará, então, diluído como custo de uma parcela da sociedade que pode não ter lucrado diretamente com a produção do bem, nem o utilizado diretamente para satisfação de suas necessidades. Um custo da produção e do consumo que não é arcado apenas por quem produz e consome, mas que se esparge para o entorno em que se insere. Um custo, muitas vezes, sequer razoavelmente previsto, porque se pode manifestar muito depois e pode ser percebido apenas com a evolução do pensamento e da ciência. Por outro lado, é possível que a produção ou o consumo gerem efeitos, talvez inesperados, indesejados ou imprevisíveis, positivos para o ambiente socioambiental em que se inserem. É a ‘economia externa’. Tanto deseconomia quanto economia externa são efeitos da produção e do consumo sobre o ambiente socioeconômico-ambiental em que se inserem. Efeitos que podem ser positivos ou negativos, mas são, em sentido estrito, externos à produção e ao consumo: são externalidades, positivas ou negativas.”(11) A neutralização, a recuperação ou a reparação da poluição ocasionada pelo processo produtivo nem sempre são internalizadas no preço do produto ou do serviço. Assim, a sociedade acaba arcando com os danos causados pelo processo produtivo, ainda que nem todos os integrantes da coletividade sejam consumidores do produto ou do serviço ou beneficiários do processo de sua produção. “As externalidades consistem em custos produzidos pelos agentes econômicos que não são internalizados no processo produtivo. O exemplo mais frequente refere-se à poluição causada pela produção industrial, cujo custo não é internalizado – não atinge os produtores ou os consumidores diretos do produto –, pois o preço praticado pelo industrial não contempla o custo necessário à recomposição do meio ambiente. Como resultado, a coletividade deverá arcar com os danos causados, ou com o custo necessário ao seu afastamento. O regulador agiria impedindo a transferência indevida para terceiros dos custos inerentes à atividade econômica.”(12) É necessário, portanto, que o agente degradante suporte ao menos parte do custo da utilização do meio ambiente – por ser uma questão de justiça e porque o custo induzirá à redução da atividade contaminante. Luis Eduardo Schoueri sintetiza: "quem polui está em vantagem em relação àquele que age conforme as exigências ambientais e por isso incorre em maiores custos".(13) 3 Extrafiscalidade Há muito tempo os teóricos e os políticos reconheceram que os tributos exerciam papel mais amplo do que a mera arrecadação de valores para fazer frente às despesas estatais.(14) É assente que a tributação pode e deve orientar práticas de produção e consumo, e aí reside a importância da orientação teleológica da tributação e do destino da arrecadação. 4 Limites à extrafiscalidade: princípios constitucionais tributários De que maneira a extrafiscalidade lida com os principais princípios tributários, quais sejam, a legalidade, a igualdade e a capacidade contributiva? O princípio do poluidor pagador, que escora a extrafiscalidade dos tributos ambientais, tem relação remota com o princípio da capacidade contributiva, que fundamenta os tributos de finalidade reditícia ou fiscal. José Casalta Nabais mostra-se contrário à ideia de que a tributação ambiental provocou uma alteração profunda no critério tradicional de suporte e medida dos impostos. Ele considera inviável substituir os tributos ancorados no princípio da capacidade contributiva por tributos fundamentados no princípio do poluidor-pagador. Até mesmo porque os tributos fundados nesse último princípio são bem mais limitados do que os fundados no princípio da capacidade contributiva, o que reduziria a carga fiscal – redução essa que os Estados atualmente não têm a menor condição para oferecer. “aos impostos sempre se reconheceu a possibilidade de prosseguir outros objectivos para além do objectivo fiscal, sobretudo a partir do momento que se abandonou a ideia das finanças públicas neutras ou praticamente neutras. E, todavia, jamais se pretendeu suportar essa extrafiscalidade no princípio da capacidade contributiva (...). Efectivamente, a legitimidade constitucional dos impostos ambientais, quer quanto aos fins prosseguidos, quer no respeitante ao seu pressuposto e ao critério da sua medida, assenta na tarefa constitucional imposta ao Estado, sobretudo ao legislador, no domínio da tutela do meio ambiente e, bem assim, no princípio do poluidor-pagador. E, porque se trata de utilizar o instrumento fiscal para prosseguir objectivos extrafiscais, o mais normal é que aquele princípio base dos impostos fiscais colida ou conflitue com este outro princípio base dos impostos extrafiscais. Uma colisão ou conflito para cuja solução é convocado naturalmente o princípio da proporcionalidade em sentido lato. Daí que os impostos ambientais em causa, para passarem com êxito no teste da sua legitimidade constitucional, terão de se revelar necessários, adequados e proporcionais em sentido estrito face ao objectivo ambiental que se visam prosseguir.” Quanto aos falsos tributos ambientais, o princípio da capacidade contributiva – enquanto suporte do pressuposto e do critério de medida – não sofre nenhuma atenuação pelo fato de o legislador ter-se guiado também por uma preocupação de natureza ambiental. Aqui é um tributo fiscal, cuja finalidade é obter receitas públicas. Conclusão A preservação e a recuperação do meio ambiente são urgentes e devem ser buscadas pelo Direito. O princípio do desenvolvimento sustentável, de matriz ambiental, perpassa todos os ramos jurídicos, inclusive o tributário. A finalidade arrecadatória do tributo não pode descurar dos efeitos que o tributo induz na produção e no consumo. A extrafiscalidade tributária, veiculada por meio de tributos mais gravosos às atividades poluentes (internalização das externalidades negativas) e dos benefícios e incentivos fiscais (externalidades positivas), é realidade. A extrafiscalidade da tributação, fundada no princípio ambiental do poluidor-pagador, não conflita com a finalidade reditícia ou fiscal dos tributos, ancorada no princípio constitucional tributário da capacidade contributiva. Referências bibliográficas CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. FOLLONI, André. Sustentabilidade, tributo e o art. 3o do Código Tributário Nacional. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 105, p. 259, jul. 2012. GABRIEL FILHO, Paulo Sérgio Miranda. Curso de Direito Tributário Ambiental. Curitiba: CRV, 2014. 207 p. LEBBOS, Carolina Moura. Regulação econômico-social e extrafiscalidade. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 65, dez. 2014. Disponível em: NABAIS, José Casalta. Tributos com fins ambientais. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 80, p. 253, maio 2008. PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 13. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras em matéria ambiental. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 235-256. SOUZA, James J. Marins de; TEODOROVICZ, Jeferson. Extrafiscalidade ambiental. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 90, p. 73, jan. 2010. TABOADA, Carlos Palao. El principio "quien contamina paga" y el principio de capacidad económica. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 83. TESSLER, Marga Inge Barth. O juiz e a tutela ambiental: a fundamentação das sentenças. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 24, jun. 2008. Disponível em: 1. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 2. Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 2010) 3. Art. 5º A Política Nacional de Mobilidade Urbana está fundamentada nos seguintes princípios: (...) II – desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais; 4. Art. 6º O gerenciamento do risco socioambiental das instituições mencionadas no art. 1º deve considerar: (...) III – avaliação prévia dos potenciais impactos socioambientais negativos de novas modalidades de produtos e serviços, inclusive em relação ao risco de reputação; e (...). 6. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) III – função social da propriedade; 7. § 2º – A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. 8. Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. 9. § 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. 10. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) 11. FOLLONI, André. Sustentabilidade, tributo e o art. 3º do Código Tributário Nacional. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 105, p. 259, jul. 2012. 12. LEBBOS, Carolina Moura. Regulação econômico-social e extrafiscalidade. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 65, p. 3-4, dez. 2014. 13. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras em matéria ambiental. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 237. 14. James J. Marins de Souza e Jéferson Teodorovicz relatam o desenvolvimento do conceito de extrafiscalidade, nos seus aspectos econômico, político e jurídico, no artigo Extrafiscalidade ambiental, publicado na Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 90, p. 73, jan. 2010. 16. NABAIS, José Casalta. Tributos com fins ambientais. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 80, p. 253, maio 2008. 17. Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição. § 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado. § 2º Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso. § 3º O disposto neste artigo não se aplica: I – às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1º; II – ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança. 18. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; 19. Art 14 – Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: (...) II – à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo poder público;
|
||
Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023:2002/ABNT): |
||
|