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publicado em 16.12.2015
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No presente trabalho, partindo-se da apresentação das atribuições constitucionais e legais do Ministério Público da União, em particular o Ministério Público Federal, das quais deriva sua legitimidade ativa para a propositura de ações civis públicas, procura-se desenvolver o exame da competência para processar e julgar tais ações. Identificada a competência da Justiça Federal, para situar, nesta, a competência para processar e julgar ações civis públicas promovidas pelo Ministério Público Federal, busca-se verificar se basta, ou não, a presença do Ministério Público Federal no processo, como parte, para determinar-se a competência da Justiça Federal. Para tanto, são examinadas as três diferentes correntes de pensamento identificáveis, a respeito do assunto, na doutrina e na jurisprudência. Feita essa análise, com base em precedentes do Supremo Tribunal Federal e de outros tribunais, assim como em referências normativas e doutrinárias, procura-se demonstrar que é possível, sim, haver atuação do Ministério Público Federal em causas de competência da Justiça Estadual, quando verificada a incompetência da Justiça Federal. Palavras-chave: Direito Administrativo. Direito Processual Civil. Controle jurisdicional da administração pública. Ação civil pública. Ministério Público Federal. Legitimidade ativa. Competência. Justiça Federal. Justiça Estadual. Sumário: Introdução. 1 Ação civil pública e legitimatio ad causam do Ministério Público Federal. 2 Competência da Justiça Federal para o julgamento de ações civis públicas. 3 Basta o Ministério Público Federal ser parte para que se tenha a competência da Justiça Federal? 3.1 Primeira corrente de pensamento: o Ministério Público Federal identifica-se com a União, incidindo o art. 109, I, da Constituição Federal. 3.2 Segunda corrente de pensamento: o Ministério Público Federal é vinculado à Justiça Federal, sendo sua legitimatio ad causam decorrente da competência da Justiça Federal. 3.3 Terceira corrente de pensamento: a legitimidade do Ministério Público Federal para a ação civil pública não se vincula à competência da Justiça Federal. 4 Ação civil pública para a qual legitimado o Ministério Público Federal pode ser da competência da Justiça Estadual, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal. Conclusão. Referências bibliográficas. Introdução A ação civil pública constitui um dos principais instrumentos de que se pode valer o Ministério Público Federal para cumprir suas relevantes atribuições constitucionais e legais, quando necessário pleitear tutela jurisdicional. Ordinariamente, cabe ao Ministério Público dos estados promover ações civis públicas na Justiça Estadual. De igual modo, observa-se, por outro lado, uma atuação marcante do Ministério Público Federal na Justiça Federal. O mesmo ocorre na Justiça do Trabalho, onde tramitam inúmeras ações civis públicas promovidas pelo respectivo Ministério Público do Trabalho. Enfim, há, realmente, uma certa correspondência entre setores do Ministério Público e suas correspondentes “justiças”. Ocorrem situações específicas, porém, em que as atribuições do Ministério Público Federal não são exatamente coincidentes com as competências da Justiça Federal. Surge, então, a dúvida: seria possível haver legitimidade do Ministério Público Federal para propor uma ação civil pública que não seja da competência da Justiça Federal? Nesse caso, havendo legitimidade e sendo incompetente a Justiça Federal, admitir-se-ia a atuação do Ministério Público Federal na Justiça Estadual? E o contrário também seria possível, isto é, atuação do Ministério Público Estadual na Justiça Federal? A resposta a essas questões necessariamente deve passar pelo exame das atribuições do Ministério Público, das regras de competência e, por fim, das possibilidades que o sistema de justiça brasileiro oferece para que sejam conciliados os diferentes aspectos envolvidos. Mediante exame de diferentes referências normativas, doutrinárias e jurisprudenciais, inclusive oriundas do Supremo Tribunal Federal, procurar-se-á, neste trabalho, responder a essas perguntas. 1 Ação civil pública e legitimatio ad causam do Ministério Público Federal A ação civil pública, conforme estabelece a Lei nº 7.347/1985, art. 1º, é ação de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, por infração à ordem econômica, à ordem urbanística, à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos e ao patrimônio público e social. A legitimação do Ministério Público Federal para a propositura de ações civis públicas decorre não apenas da Lei nº 7.347/1985, art. 5º, I, mas também, e principalmente, de suas atribuições constitucionais e legais. Estabelece a Constituição Federal de 1988, em seu art. 129, acerca das atribuições do Ministério Público em geral, o que segue: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: No plano infraconstitucional, a Lei Complementar nº 75/1993 disciplina a estrutura, o funcionamento e as atribuições institucionais do Ministério Público da União, do qual faz parte o denominado Ministério Público Federal. Em seu art. 5º, estão previstas as funções institucionais do Ministério Público da União: “Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União: As atribuições do Ministério Público da União, previstas na Lei Complementar nº 75/1993, são bastante amplas. Disso decorre a amplitude, também, de sua legitimidade para agir, especialmente por meio de ações civis públicas. Eis o que consta de seu art. 6º, cujo inciso VII especificamente trata das ações civis públicas: “Art. 6º Compete ao Ministério Público da União: Justamente em razão da amplitude das atribuições e das competências do Ministério Público da União é que estabelece a mesma Lei Complementar nº 75/1993 a possibilidade da atuação do Ministério Público Federal perante “quaisquer juízes e tribunais” (art. 37, II). A bem da clareza, merece transcrição o que estabelece o seu art. 37, na disciplina desse ponto: “Art. 37. O Ministério Público Federal exercerá as suas funções: Note-se que a Lei Complementar nº 75/1993 é taxativa ao prever atuação do Ministério Público Federal nas causas de competência de “quaisquer juízes e tribunais”, isto é, não restritamente nas causas de competência da Justiça Federal. 2 Competência da Justiça Federal para o julgamento de ações civis públicas A competência da Justiça Federal é matéria constitucional, tanto do ponto de vista formal quanto do ponto de vista material. Estando posta na Constituição Federal, somente por meio de emenda à Constituição pode ser alterada, o que lhe confere, formalmente, natureza de matéria constitucional. Por envolver as atribuições de um dos ramos do Poder Judiciário da União, e ser, assim, inerente à separação de poderes e à própria forma federativa do Estado brasileiro, é a competência da Justiça Federal, também, matéria constitucional do ponto de vista substancial ou material, é assunto a ser necessariamente disciplinado na Constituição Federal. Tal competência está posta no art. 109 da Carta Magna: “Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: Não há, no art. 109 da Constituição Federal, qualquer referência à presença do Ministério Público Federal no processo, enquanto parte, como fato determinante da competência da Justiça Federal. Ao contrário, basta uma simples leitura dos citados dispositivos constitucionais (arts. 109 e 129 da CF/88) e legais (Lei Complementar nº 75/1993, arts. 5º, 6º e 37) para constatar que não há uma direta correspondência entre as atribuições e competências do Ministério Público Federal e a competência cível da Justiça Federal. É necessário, então, identificar a competência da Justiça Federal, quando nesta for proposta ação civil pública pelo Ministério Público Federal. 3 Basta o Ministério Público Federal ser parte para que se tenha a competência da Justiça Federal? A constatação de que a Justiça Federal é competente para processar e julgar uma ação civil pública não envolve maior dificuldade quando for parte ou interveniente a União ou alguma outra entidade integrante da administração pública federal, isto é, quando claramente incidente o art. 109, I, da Constituição Federal (competência em razão da pessoa). É o que ocorre quando ré a União, ou qualquer autarquia ou empresa pública federal, por exemplo. O mesmo se diga quando existente disputa sobre direitos indígenas, conforme art. 109, XI, da Constituição Federal (competência em razão da matéria), ou quando presente qualquer outra hipótese abarcada pelo art. 109 da Constituição. Dúvidas surgem quando, porém, sendo autor o Ministério Público Federal, nenhuma dessas causas determinantes da competência da Justiça Federal se faz presente. O Ministério Público Federal tem por prática, em ações civis públicas, nesses casos, requerer ao juízo federal, perante o qual proposta a demanda, a intimação da União, ou de alguma entidade em tese interessada (mas que não participe enquanto parte-ré, por exemplo), para que manifeste eventual interesse pela demanda. Havendo intervenção da União como assistente do Ministério Público Federal, por exemplo, desaparece o problema, pois tal intervenção, por si só, é motivo para se caracterizar a competência da Justiça Federal (art. 109, I, da Constituição Federal). Envolvendo o litígio, porém, interesse exclusivo de uma sociedade de economia mista, como o Banco do Brasil S/A ou a Petrobras S/A, apenas para citar dois exemplos muito conhecidos, não há, em princípio, competência da Justiça Federal. Além de óbvia a inaplicabilidade, a essas entidades, do art. 109, I, da Constituição Federal, a jurisprudência é pacífica nesse sentido.(1) A legitimidade ativa do Ministério Público Federal para a causa, todavia e em tese, é clara, pois a este compete a defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis, considerados, dentre outros, fundamentos e princípios como “a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a publicidade, relativas à administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União”. É inegável a aplicabilidade de tal norma às sociedades de economia mista, enquanto integrantes da administração indireta da União (art. 5º, I, h, da Lei Complementar nº 75/1993). É relevante, nesse caso, saber se a simples presença do Ministério Público Federal no polo ativo da demanda é suficiente, por si só, para determinar a competência da Justiça Federal. A dúvida não se encontra, ainda, resolvida na doutrina e na jurisprudência. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, em sua obra Competência cível da Justiça Federal, claramente expõe a controvérsia existente, indicando as três correntes de pensamento que podem ser identificadas na doutrina e na jurisprudência (2012, p. 77-81): “Discute-se se a intervenção do Ministério Público Federal no processo, seja como autor, na qualidade de substituto processual, seja como fiscal da lei, desloca a competência para a Justiça Federal. Podem ser identificadas, assim, três correntes de pensamento sobre a polêmica em questão: a) o Ministério Público Federal seria identificado com a União, decorrendo a competência da Justiça Federal de sua participação na causa, desde que legitimado para tanto (posição aparentemente dominante no Superior Tribunal de Justiça); b) haveria identificação do Ministério Público Federal com a Justiça Federal, partindo-se da competência desta para identificar o cabimento ou não de ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal (entendimento de Teori Albino Zavascki); c) a competência da Justiça Federal seria exaustiva, e as atribuições do Ministério Público Federal, desvinculadas desta, admitindo-se a atuação deste, então, na Justiça Estadual (posição identificada em acórdãos do Supremo Tribunal Federal, assim como na doutrina de Aluisio Gonçalves de Castro Mendes e de Fredie Didier Jr., como logo mais se verá). 3.1 Primeira corrente de pensamento: o Ministério Público Federal identifica-se com a União, incidindo o art. 109, I, da Constituição Federal Não sendo o Ministério Público Federal dotado de personalidade jurídica própria, há entendimento, de alguns, de que seria identificado com a União, incidindo o art. 109, I, da Constituição Federal, para ensejar a competência da Justiça Federal. É a posição aparentemente dominante, hoje, no Superior Tribunal de Justiça, como bem conclui Aluisio Gonçalves de Castro Mendes. Nesse sentido, os seguintes precedentes mais recentes, além do Conflito de Competência nº 4.927, da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, de 1993, citado por Aluisio Gonçalves de Castro Mendes: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – COMPETÊNCIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELO MPF – JUSTIÇA FEDERAL. I – Segundo entendimento pacífico no seio dos tribunais pátrios, a ação civil pública, como as demais, submete-se, quanto à competência, à regra estabelecida no art. 109, I, da Constituição, segundo a qual cabe aos juízes federais processar e julgar ‘as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho’. II – Assim, figurando como autor da ação o Ministério Público Federal, que é órgão da União, a competência para a causa é da Justiça Federal. III – Agravo de instrumento provido.” (TRF-2 – AG: 154212 RJ 2007.02.01.003871-3, relator: Desembargador Federal Reis Friede, data de julgamento: 26.09.2007, Sétima Turma Especializada, data de publicação: DJU – data: 18.02.2008 – página: 514) “PROCESSUAL CIVIL – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL CONTRA A UNIÃO E OUTROS – RECONHECIDA A ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA UNIÃO – EXCLUSÃO DA LIDE E REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. “PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ARTIGO 109, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRECEDENTES DO STJ. 1 – Predomina no Superior Tribunal de Justiça entendimento segundo o qual a presença do Ministério Público Federal no polo ativo da demanda é suficiente para determinar a competência da Justiça Federal, nos termos do artigo 109, inciso I, da Constituição Federal, o que não dispensa o magistrado de verificar a sua legitimação ativa para a propositura da demanda. 2 – A questão da competência é logicamente antecedente à da legitimidade. Fixada a competência, cumpre ao magistrado apreciar a legitimação ativa do Ministério Público Federal para promover a demanda. Por ora, o que restou decidido pelo magistrado de primeiro grau foi apenas em relação à competência da Justiça Federal, o que não prejudica posterior análise quanto à legitimidade do Ministério Público Federal para ajuizar a demanda. 3 – Agravo de instrumento provido.” (TRF-2 – AG: 201202010010905, relator: Desembargador Federal Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, data de julgamento: 18.06.2013, Quinta Turma Especializada, data de publicação: 03.07.2013) 3.2 Segunda corrente de pensamento: o Ministério Público Federal é vinculado à Justiça Federal, sendo sua legitimatio ad causam decorrente da competência da Justiça Federal O entendimento de que haveria vinculação de cada ramo do Ministério Público à respectiva “justiça” conta com o respaldo de Teori Albino Zavascki, ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça e atualmente ministro do Supremo Tribunal Federal. Eis a lição do renomado professor(2): “Atuação do Ministério Público: repartição de atribuições Não bastasse a doutrina citada, tal posicionamento já foi adotado pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso em Mandado de Segurança nº 4.146-8, de 1996, precedente também referido por Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, em nota de rodapé: “ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. LITISCONSÓRCIO ATIVO. ÓRGÃOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E ESTADUAL. INADMISSIBILIDADE. 3.3 Terceira corrente de pensamento: a legitimidade do Ministério Público Federal para a ação civil pública não se vincula à competência da Justiça Federal Além das duas correntes de pensamento antes expostas, há, ainda, um terceiro entendimento, segundo o qual as atribuições do Ministério Público Federal seriam desvinculadas da competência da Justiça Federal, não sendo suficiente, assim, a participação do Ministério Público Federal no processo para a caracterização da competência da Justiça Federal. Além de ser defendida por Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, esta é a posição também adotada por Fredie Didier Júnior, em ensaio extremamente claro, didático e objetivo, que segue em sua integralidade(3): “Este pequeno ensaio tem por objetivo apresentar uma solução à seguinte questão dogmática: a presença do Ministério Público Federal (MPF) como parte de um processo (autor de uma ação civil pública, p. ex.) é suficiente para que se atribua a competência para o processamento e o julgamento da demanda a um juiz federal? O caso ganha relevo, quando se constata o ajuizamento de inúmeras ações coletivas propostas pelo Ministério Público Federal que, a princípio, não se encaixam em nenhuma das hipóteses de competência da Justiça Federal. 4 Ação civil pública para a qual legitimado o Ministério Público Federal pode ser da competência da Justiça Estadual, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal A compreensão de que as atribuições do Ministério Público Federal são autônomas e desvinculadas da competência da Justiça Federal parece ser a posição que melhor compatibiliza os diferentes aspectos envolvidos em toda a celeuma: respeita e preserva as funções constitucionais e legais do Ministério Público Federal; respeita e observa as regras constitucionais disciplinadoras da competência da Justiça Federal; não incorre no erro de confundir a União (pessoa jurídica de direito público interno, a administração pública federal) com o Ministério Público Federal (órgão, de fato, sem personalidade jurídica própria, mas com inegável capacidade processual autônoma, fundada na própria Constituição Federal, e indiscutível independência e autonomia, desvinculado da União); trata o Ministério Público brasileiro como unidade que é, admitindo inclusive a atuação do Ministério Público Federal na Justiça Estadual, por exemplo. No âmbito do Supremo Tribunal Federal, parece ser este o entendimento que tem prevalecido. Nesse sentido, por exemplo, os seguintes precedentes: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. O Supremo Tribunal Federal assentou que a circunstância de figurar o Ministério Público Federal como parte na lide não é suficiente para determinar a competência da Justiça Federal para o julgamento da lide. 2. Compete à justiça comum processar e julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista, exceto se houver interesse jurídico da União no feito.” (STF, RE 596836 AgR, relator(a): Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, julgado em 10.05.2011, DJe-099, divulg. 25.05.2011, public. 26.05.2011, EMENT VOL-02530-02, PP-00325) “1. Competência: é da jurisprudência do Supremo Tribunal que, não havendo interesse jurídico da União Federal no feito, em se tratando de demanda entre empresa concessionária de serviço público e particular, a competência é da Justiça Estadual. Precedentes. 2. Ampla defesa: não ofende o art. 5º, LV, da Constituição acórdão que mantém o indeferimento de diligência probatória tida por desnecessária: precedente. 3. Recurso extraordinário: descabimento: controvérsia decidida à luz de legislação infraconstitucional: a alegada ofensa a dispositivos constitucionais, se ocorresse, seria reflexa ou indireta, de exame inviável no RE, incidência do princípio da Súmula 636. Ademais, ausente negativa de prestação jurisdicional ou inexistência de motivação do acórdão recorrido.” (STF, AI 607035 AgR, relator(a): Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, julgado em 12.12.2006, DJ 09.02.2007, PP-00035, EMENT VOL-02263-08, PP-01676) Há precedentes no mesmo sentido nos tribunais regionais federais e no próprio Superior Tribunal de Justiça (no qual, aparentemente, tem prevalecido, porém, entendimento contrário): “Processual civil – Competência para julgar litígio relativo a obra executada pela Prefeitura. Havendo expressa manifestação do SPU de que os quiosques construídos pela Prefeitura ao longo do passeio público estão fora da praia, competente para julgar eventual litígio entre os moradores e o poder local é a Justiça do Estado. O simples fato de haver sido proposta pelo Ministério Público Federal a ação civil pública, com vistas à preservação do meio ambiente, não justifica a deslocação da competência para a Justiça Federal. O Ministério Público, na caso, funciona como defensor dos direitos difusos, e não como representante da União Federal, que não é parte no feito.” (TRF da 2ª Região, 1ª Turma, unânime, rel. Desembargador Clelio Erthal, j. em 11.12.91) “AÇÃO CIVIL PÚBLICA – INTERESSES DIFUSOS – COMPETÊNCIA – MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. I – Ao Ministério Público Federal é conferida constitucionalmente capacidade postulatória ativa no caso de ação civil pública para a defesa de interesses difusos (art. 129 – III – C.F.). II – A circunstância de ter o MPF legitimidade ativa para ingressar com ação civil publica, por si só, não desloca ou fixa a competência da Justiça Federal, que se submete ao elenco taxativo do art. 109 da Constituição Federal. III – Envolvendo a lide apreciação de atos praticados pela autarquia federal Instituto Brasileiro do Café – I.B.C., impõe-se o seu chamamento prévio para manifestar se tem interesse no feito antes de se decidir pela incompetência da Justiça Federal. IV – Agravo parcialmente provido para anular a decisão recorrida.” (TRF da 3ª Região, AI nº 3.457, rel. Juiz Federal Convocado Sergio Lazzarini, unânime, DJ de 25.03.1991) “CONFLITO DE COMPETÊNCIA – AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EM FACE DO EX-PREFEITO POR DESVIO DE VERBAS – PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA – SÚMULA 209 DO STJ – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. Compete à Justiça Estadual processar e julgar ação de ressarcimento movida contra ex-prefeito, pela inaplicação de verbas federais repassadas por força de convênio, objetivando a estruturação de estabelecimento de ensino da municipalidade. 2. Ausência de manifestação de interesse da União em ingressar no feito, tendo em vista que a verba pleiteada já está incorporada ao patrimônio municipal. 3. ‘Compete ao juízo estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal’ – Súmula 209/STJ. 4. A propositura, pelo Ministério Público Federal, de ação civil pública com vistas à defesa de interesses difusos ou coletivos não é suficiente para a fixação da competência da Justiça Federal.” (STJ, 1ª Seção, CC nº 34.204-MG, unânime, rel. Ministro Luiz Fux, j. em 11.12.2002, DJ de 19.12.2002, p. 323) Esse entendimento, já manifestado pelo Supremo Tribunal Federal em mais de uma oportunidade, vem sendo frequentemente ignorado pelos demais tribunais, ao insistirem estes, por exemplo, na ideia de que o art. 109, I, da Constituição Federal seria aplicável ao Ministério Público Federal, equiparado este à União. O Supremo é o grande intérprete da Constituição, essa é a sua função primordial, parecendo razoável aguardar que, cedo ou tarde, acabe prevalecendo seu posicionamento no sentido de que não basta a participação do Ministério Público Federal, como parte-autora, para que seja da Justiça Federal a competência para processar e julgar ação civil pública por ele proposta. É compreensível haver resistência à ideia, assim como causar certa estranheza o fato de o Ministério Público Federal atuar, por exemplo, na Justiça Estadual. De fato, a constatação de que a simples participação do Ministério Público Federal no polo ativo da demanda é insuficiente para ensejar a competência da Justiça Federal importa em admitir que uma ação civil pública possa ser proposta pelo Ministério Público Federal na Justiça Estadual, e nesta ser processada e julgada. Deve-se considerar, porém, em primeiro lugar, que a competência da Justiça Federal é realmente, como visto, desvinculada das atribuições do Ministério Público Federal. Em segundo lugar, a atuação do Ministério Público Federal na Justiça Estadual não é vedada, sendo, ao contrário, claramente, contemplada pelo ordenamento jurídico, já que estabelecida pela Lei Complementar nº 75/1993 a possibilidade, sem quaisquer ressalvas, da atuação do Ministério Público Federal perante “quaisquer juízes e tribunais”. A própria Lei da Ação Civil Pública, em seu art. 5º, § 5º, é expressa ao dispor que “admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei”. Apesar da observação de Teori Zavascki, já citada neste trabalho, no sentido de que é de “duvidosa constitucionalidade”(4) tal disposição legal, há entendimento, aparentemente dominante, na doutrina, em sentido contrário. Eis a observação de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, em nota ao art. 5º, § 5º, da Lei nº 7.347/1985 (2010, p. 1446-1447): “Litisconsórcio facultativo entre MPs. Cada órgão do MP pode, sozinho, sem anuência do outro, ajuizar a ACP, e o eventual litisconsórcio que se formar entre eles será facultativo. O MP estadual pode ajuizar, sozinho, ACP na justiça federal, ao mesmo tempo em que o MP da União pode propor, sozinho, ACP na justiça estadual. O titular do direito de ação é o MP como instituição, e não por seus órgãos fragmentados. O problema, na verdade, não é de litisconsórcio, mas de representação do MP (Watanabe e Nery, CDC Coment. p. 832 e 1081-1020), que é instituição una e indivisível (CF 127, § 1º, e 128). Essa representação é questão interna corporis do MP, não sendo lícito ao juiz decidir a respeito, salvo se houver expressa previsão legal limitando o campo de atuação do MP. V., mais longamente, admitindo o litisconsórcio entre os MPs, Nery, CDC Coment., p. 1018-1020, Mancuso, ACP, n. 6.3.1, p. 107-137; Mazzilli, Int.Dif., p. 262-266; Mazzilli, RT 679/275. Contra, dizendo que o litisconsórcio viola o sistema federativo, Greco, Coment. CDC(Saraiva), 377.” Disposição semelhante ao art. 5º, § 5º, da Lei nº 7.347/1985 consta do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/1990, art. 210, § 1º, segundo o qual “admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União e dos estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei”. A Lei nº 9.966/2000, que “dispõe sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional e dá outras providências”, em seu art. 27, § 1º, ao dispor que “a Procuradoria-Geral da República comunicará previamente aos ministérios públicos estaduais a propositura de ações judiciais para que estes exerçam as faculdades previstas no § 5º do art. 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, na redação dada pelo art. 113 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Defesa do Consumidor”, veio inclusive a disciplinar o modo como deve haver, internamente, no Ministério Público como um todo, a divulgação da propositura de ação e a eventual atuação conjunta dos Ministérios Públicos Federal e Estadual. Por fim, a Lei nº 10.741/2003, que “dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências”, igualmente contém norma semelhante, ao estabelecer, em seu art. 81, § 1º, que “admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei”. São inúmeros os exemplos, assim, em nosso ordenamento jurídico, de disposições contempladoras, em alguma medida, de atuação conjunta de diferentes setores do Ministério Público, quer isso se trate ou não de litisconsórcio. Com razão, assim, conclui Hugo Nigro Mazzilli (2006, p. 313-314), após discorrer longamente sobre o assunto: “A atuação heterópica do Ministério Público não deveria causar tanta espécie, pois, embora sua organização guarde um certo paralelismo com a do Poder Judiciário, na verdade essa correspondência não é nem pode ser integral, dada a sua diversidade intrínseca. Assim, por exemplo, a própria lei já se encarrega de admitir que o Ministério Público Federal possa comparecer à Justiça Estadual para interpor recurso extraordinário nas representações de inconstitucionalidade – LC nº 75/93, art. 37, parágrafo único. Nesse caso, um eventual litisconsórcio do Ministério Público Federal com o estadual será perfeitamente possível.” Em idêntico sentido, a doutrina de Rodolfo de Camargo Mancuso, para o qual “a atuação conjunta dos procuradores da República e dos promotores/procuradores de justiça dos estados é não só possível, mas também desejável” (2011, p. 125). A ideia de que cada segmento do Ministério Público deva atuar apenas na respectiva “justiça” não tem respaldo no ordenamento jurídico: decorre, no caso, muito mais, ao que parece, de uma ideia pré-concebida de vinculação do Ministério Público Federal à Justiça Federal, haurida da prática forense e de uma mera concepção empírica que não pode, salvo melhor juízo, determinar a fixação da competência da Justiça Federal, na hipótese em questão. O pacto federativo não é violado ou contrariado no caso de haver atuação do Ministério Público Federal na Justiça Estadual, já que, como visto, a despeito da divisão de tarefas entre seus diferentes órgãos, é uno o Ministério Público brasileiro, assim como una a jurisdição, a despeito das regras de competência previstas na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, disciplinando a divisão de atribuições entre os diferentes “ramos” do Poder Judiciário ou órgãos jurisdicionais. Assim, se o Ministério Público Federal ajuíza ação civil pública na Justiça Federal e esta declina da competência para a Justiça Estadual, nada impede que o autor da ação, Ministério Público Federal, atue, no Judiciário estadual, acompanhado ou não pelo Ministério Público do estado. Pode ocorrer também de o Ministério Público Federal ser até mesmo substituído pelo Ministério Público Estadual, na medida em que autor da ação, na verdade, sempre é o Ministério Público lato sensu. Este é um ponto importante no exame do tema, que decorre da unidade do Ministério Público, com desdobramentos práticos relevantes. A possibilidade de uma causa proposta na Justiça Federal ser remetida à Justiça Estadual é algo que decorre de nosso ordenamento jurídico e, consequentemente, algo rotineiro na prática forense. Quanto ao ponto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que “compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, de suas autarquias ou suas empresas públicas” (Súmula nº 150). De igual modo, “excluído do feito o ente federal, cuja presença levara o juiz estadual a declinar da competência, deve o juiz federal restituir os autos, e não suscitar conflito” (Súmula nº 224). Por fim, é pacífico no Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que “a decisão do juízo federal que exclui da relação processual ente federal não pode ser reexaminada no juízo estadual” (Súmula nº 254). Não há qualquer razão para ser diferente em havendo propositura, na Justiça Federal, de ação civil pública pelo Ministério Público (no caso, o federal) e declaração de incompetência pelo juiz federal. O contrário – propositura de uma ação civil pública na Justiça Estadual, que acaba sendo remetida à Justiça Federal, em razão de regras de competência – igualmente ocorre e deve ser admitido com naturalidade, mesmo no caso de tratar-se de ação civil pública cujo autor seja o Ministério Público do estado. Isso pode ocorrer seja por incompetência originária da Justiça Estadual, seja em razão de “deslocamento” da competência para a Justiça Federal, por motivo superveniente (em razão do ulterior ingresso, no processo, por exemplo, de alguma entidade à qual se aplique o art. 109, I, da Constituição Federal de 1988). Nesses casos, pode haver (a) a atuação do Ministério Público Estadual, o autor original da ação, na Justiça Federal (por que não?), (b) a atuação conjunta do Ministério Público Estadual com o Ministério Público Federal (conforme expressa previsão legal constante do art. 5º, § 5º, da Lei nº 7.347/1985) ou, por fim, (c) a substituição de um segmento do Ministério Público por outro (no caso, o mais provável será passar o Ministério Público Federal a atuar na causa, no lugar do Ministério Público Estadual, o autor original da ação, no exemplo dado). Cabe ao próprio Ministério Público Federal ou Estadual, internamente, optar pela melhor solução, em cada caso concreto. Sendo autor da ação, em qualquer ação civil pública, repita-se, não o Ministério Público Federal ou Estadual, mas, sim, em última análise, o Ministério Público brasileiro, uno, nos termos do art. 127, § 1º, da Constituição Federal, é forçoso reconhecer, então, que tanto o Ministério Público Federal pode atuar na Justiça Estadual quanto o Ministério Público Estadual pode atuar na Justiça Federal, dependendo do litígio envolvido, da verificação das atribuições de cada segmento do Ministério Público, no específico caso concreto, e, por fim, e principalmente, das regras de competência aplicáveis para a definição do órgão jurisdicional competente. A simples presença do Ministério Público Federal na causa, na condição de autor, não é suficiente, como visto, para ensejar a competência da Justiça Federal. Em meio à enorme divergência que ainda se verifica na jurisprudência, especialmente entre os entendimentos aparentemente dominantes no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, vislumbra-se a tendência de que, cedo ou tarde, venha a prevalecer o entendimento do Supremo Tribunal Federal nesse sentido, seja por ser, em razão de todo o exposto, o mais bem embasado e mais coerente com o ordenamento jurídico brasileiro, seja por ser o Supremo Tribunal Federal o intérprete maior da Constituição Federal, na qual devem ser buscados, indubitavelmente, os fundamentos para a caracterização ou não da competência da Justiça Federal, mediante interpretação do art. 109 da Carta Magna. De todo o exposto, conclui-se que sim, é possível haver competência da Justiça Estadual para processar e julgar ação civil pública em que seja autor o Ministério Público Federal, caso não configurada alguma das hipóteses do art. 109 da Constituição Federal. Conclusão Diante do exposto, conclui-se: a) a ação civil pública constitui um dos principais instrumentos de que se pode valer o Ministério Público Federal para cumprir suas relevantes atribuições constitucionais e legais, quando necessário pleitear tutela jurisdicional; b) a legitimação do Ministério Público Federal para a propositura de ações civis públicas decorre não apenas da Lei nº 7.347/1985, art. 5º, I, mas, também, e principalmente, de suas atribuições constitucionais e legais, previstas na Constituição Federal de 1988, art. 129, e na Lei Complementar nº 75/1993, arts. 5º, 6º e 37; c) a Lei Complementar nº 75/1993, art. 37, II, é taxativa ao prever atuação do Ministério Público Federal nas causas de competência de “quaisquer juízes e tribunais”, isto é, não restritamente nas causas de competência da Justiça Federal; d) a competência da Justiça Federal é matéria constitucional, tanto do ponto de vista formal quanto do ponto de vista material, razão pela qual se encontra necessariamente disciplinada na Constituição Federal, e não há, no art. 109 da Constituição Federal, qualquer referência à presença do Ministério Público Federal, no processo, enquanto parte, como fato determinante da competência da Justiça Federal; e) envolvendo o litígio, por exemplo, interesse exclusivo de uma sociedade de economia mista, não há, em princípio, competência da Justiça Federal, embora haja, em tese, clara legitimidade ativa do Ministério Público Federal para a causa, pois a este compete a defesa da ordem jurídica e a preservação de princípios constitucionais relativos à administração pública indireta da União (art. 5º, I, h, da Lei Complementar nº 75/1993); f) podem ser identificadas três correntes de pensamento sobre a polêmica em torno da competência da Justiça Federal para ações civis públicas promovidas pelo Ministério Público Federal: f.1) o Ministério Público Federal seria identificado com a União, incidindo o art. 109, I, da Constituição Federal; f.2) haveria identificação do Ministério Público Federal com a Justiça Federal; f.3) a competência da Justiça Federal seria exaustiva, e as atribuições do Ministério Público Federal, desvinculadas desta, admitindo-se a atuação deste, então, na Justiça Estadual; g) a compreensão de que as atribuições do Ministério Público Federal são autônomas e desvinculadas da competência da Justiça Federal, adotada pelo Supremo Tribunal Federal em diversos precedentes, parece ser a posição que melhor compatibiliza os diferentes aspectos envolvidos em toda a celeuma: respeita e preserva as funções constitucionais e legais do Ministério Público Federal; respeita e observa as regras constitucionais disciplinadoras da competência da Justiça Federal; não incorre no erro de confundir a União (pessoa jurídica de direito público interno, a administração pública federal) com o Ministério Público Federal (órgão, de fato, sem personalidade jurídica própria, mas com inegável capacidade processual autônoma, fundada na própria Constituição Federal, e indiscutível independência e autonomia, desvinculado da União); trata o Ministério Público brasileiro como unidade que é, admitindo inclusive a atuação do Ministério Público Federal na Justiça Estadual, por exemplo; h) a ideia de que cada segmento do Ministério Público deva atuar apenas na respectiva “justiça” não tem respaldo no ordenamento jurídico, decorrendo muito mais, ao que parece, de uma ideia pré-concebida de vinculação do Ministério Público Federal à Justiça Federal, haurida da prática forense e de uma mera concepção empírica que não pode, salvo melhor juízo, determinar a fixação da competência da Justiça Federal; i) a Lei nº 7.347/1985, art. 5º, § 5º, é expressa ao dispor que se admite o litisconsórcio facultativo entre os ministérios públicos da União, do Distrito Federal e dos estados, em ações civis públicas; em sentido semelhante, a Lei nº 8.069/1990, art. 210, § 1º, a Lei nº 9.966/2000, art. 27, § 1º, e a Lei nº 10.741/2003, art. 81, § 1º; j) sendo autor da ação civil pública não o Ministério Público Federal ou Estadual, mas, sim, em última análise, o Ministério Público brasileiro, uno, nos termos do art. 127, § 1º, da Constituição Federal, constata-se que tanto o Ministério Público Federal pode atuar na Justiça Estadual quanto o Ministério Público Estadual pode atuar na Justiça Federal, dependendo do litígio envolvido, da verificação das atribuições de cada segmento do Ministério Público, no específico caso concreto, e, por fim, e principalmente, das regras de competência aplicáveis para a definição do órgão jurisdicional competente; l) conclui-se, pois, que sim, é possível haver competência da Justiça Estadual para processar e julgar ação civil pública em que seja autor o Ministério Público Federal, caso não configurada alguma das hipóteses do art. 109 da Constituição Federal, vislumbrando-se a tendência de que, cedo ou tarde, venha a prevalecer o entendimento do Supremo Tribunal Federal nesse sentido. Referências bibliográficas ASSIS, Araken de. Cumulação de ações. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 1. 6. ed. atual. pela Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Forense, 1991. BOCHENEK, Antonio César. Competência cível da Justiça Federal e dos juizados especiais cíveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e competência. 8. ed. rev. e ampl. de conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1997. CARVALHO, Milton Paulo. Manual da competência civil.São Paulo: Saraiva, 1995. CARVALHO, Vladimir Souza. Competência da Justiça Federal. 7. ed. rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2007. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo et al. Teoria geral do processo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. DIDIER JUNIOR, Fredie. Ministério Público Federal e competência da Justiça Federal. Disponível em: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 28. ed. 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1. STF, Súmula nº 508: “Compete à Justiça Estadual, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas em que for parte o Banco do Brasil, S.A.”. STF, Súmula nº 556: “É competente a justiça comum para julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista”. STJ, Súmula nº 42: “Compete à Justiça Comum estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu detrimento (Constituição Federal, art. 109, I e IV)”. 2. ZAVASCKI, Teori Albino. Ministério Público e ação civil pública. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/ 3. DIDIER JUNIOR, Fredie. Ministério Público Federal e competência da Justiça Federal. Disponível em: <http://www.frediedidier.com.br/wp-content/uploads/2012/06/Minist%C3%A9rio- 4. “A ação civil pública será proposta, portanto, pelo Ministério Público da União, quando se tratar de causa da competência da Justiça Federal; e será proposta pelo Ministério Público dos Estados, quando for causa de jurisdição local. Não há como adotar-se, hoje, sem ofensa ao caráter nacional e ao princípio da unidade do Ministério Público, regime legal que viabilize a presença simultânea de dois Ministérios Públicos (!) no mesmo processo, de modo a ensejar tanto ao Ministério Público Federal como ao Estadual a possibilidade de intervir, na qualidade de assistente litisconsorcial, na ação proposta pelo outro, como sugerido, antes da nova Carta, por autores de nomeada. É de duvidosa constitucionalidade, por idêntico fundamento, o § 8º do art. 5º da Lei nº 7.347/85, introduzido pelo art. 113 da Lei nº 8.078/90, ao admitir ‘o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida a lei’. A tese como certo, conforme se verá, que o Ministério Público é o substituto processual dos titulares do direito defendido, não haverá título para legitimação do outro, o litisconsorte facultativo, nem sobejará direito ou interesse que possa ele defender em nome próprio na ação civil pública”. ZAVASCKI, Teori Albino. Ministério Público e ação civil pública. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
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Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023:2002/ABNT): |
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